quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022
É cabível a condenação em honorários advocatícios no julgamento de reclamação?
O que é uma reclamação?
Reclamação é uma...
- ação
- proposta pela parte interessada
ou pelo MP
- com o objetivo de cassar uma
decisão judicial ou um ato administrativo que tenha violado:
a) a competência de um tribunal
(Tribunal de 2º grau ou Tribunal Superior);
b) a autoridade de uma decisão do
tribunal (Tribunal de 2º grau ou Tribunal Superior);
d) súmula vinculante;
e) decisão do STF em controle
concentrado de constitucionalidade;
f) acórdão proferido em
julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de
assunção de competência.
Natureza jurídica
A reclamação possui
natureza jurídica de ação.
A reclamação constitucional
é ação vocacionada para a tutela específica da competência e autoridade das
decisões proferidas por este Supremo Tribunal Federal, não consubstanciando
sucedâneo recursal (STF. 1ª Turma. Rcl 49352 AgR, Rel. Min. Rosa Weber,
julgado em 04/11/2021).
Hipóteses de cabimento
O CPC/2015 previu um rol de hipóteses de cabimento da
reclamação:
Art. 988.
Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:
I - preservar a competência do
tribunal;
II - garantir a autoridade das
decisões do tribunal;
III - garantir a observância de
enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em
controle concentrado de constitucionalidade;
IV - garantir a observância de acórdão
proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de
incidente de assunção de competência;
(...)
§ 4º As hipóteses dos incisos III e IV
compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos
que a ela correspondam.
Existe ainda uma quinta hipótese que está prevista no § 5º
do art. 988. Trata-se da reclamação proposta contra decisão que tenha
descumprido tese fixada pelo STF em recurso extraordinário julgado sob o rito
da repercussão geral. A Lei exige, no entanto, que, antes de a parte apresentar
a reclamação, ela deve ter esgotado todos os recursos cabíveis nas “instâncias
ordinárias”. Veja a redação do dispositivo:
Art. 988 (...)
§ 5º É inadmissível a reclamação:
(...)
II – proposta para garantir a
observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral
reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou
especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias.
No processo de reclamação,
existe a angularização?
SIM.
O CPC/2015, inovando a disciplina legal do instituto, passou
a prever a angularização da relação processual na reclamação, com a citação do
beneficiário da decisão impugnada, para apresentar sua contestação, nos termos
do art. 989, III:
Art. 989. Ao despachar a reclamação, o
relator:
(...)
III - determinará a citação do
beneficiário da decisão impugnada, que terá prazo de 15 (quinze) dias para
apresentar a sua contestação.
É cabível a condenação em
honorários advocatícios no julgamento de reclamação?
SIM.
A partir da vigência do CPC/2015, firmou-se o entendimento
doutrinário e jurisprudencial no sentido de que o instituto da reclamação
possui natureza de ação, de índole constitucional, e não de recurso ou
incidente processual, sendo admitida a aplicação do princípio geral da
sucumbência, com a consequente condenação da parte vencida ao pagamento de
honorários advocatícios.
STJ. 2ª Seção. EDcl na Rcl 35.958/CE, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, julgado em 26/06/2019.
Para que haja a condenação
em honorários advocatícios na reclamação é necessário que tenha havido a
angularização?
SIM.
A reclamação pode ser
indeferida liminarmente?
Após a reclamação ser proposta, o
relator irá verificar se ela preenche os requisitos inerentes à demanda (pressupostos
processuais e condições da ação).
Como se trata de uma ação, o
relator poderá:
• indeferir a inicial (art. 330
do CPC); ou
• julgar liminarmente
improcedente o pedido (art. 332).
Se a reclamação for
liminarmente indeferida, haverá condenação em honorários advocatícios?
Em regra, não. Isso porque, em
regra, não terá havido a angularização. Nesse sentido:
No caso, não houve a angularização da relação processual, já
que, à vista da decisão que liminarmente negou seguimento à reclamação,
inexistiu ordem para a citação da parte beneficiária, nos termos do art. 989,
III, do CPC/15.
STJ. 2ª Seção. EDcl no AgInt na Rcl 33.971/DF, Rel. Min. Paulo
de Tarso Sanseverino, julgado em 23/05/2018.
Não angularizada a relação processual mediante a citação do
beneficiário do ato impugnado (art. 989, III, do CPC/15), em razão do
indeferimento liminar da petição inicial da reclamação, é incabível a fixação
de honorários advocatícios de sucumbência.
STJ. 2ª Seção. EDcl no AgInt na Rcl 36.771/RJ, Rel. Min. Nancy
Andrighi, julgado em 15/09/2020.
Imagine agora a seguinte
situação:
A parte ingressou com reclamação
e o relator indeferiu liminarmente a petição inicial. Neste caso, não caberia
honorários advocatícios considerando que não houve angularização. Ocorre que o
reclamante decidiu recorrer contra a decisão. Foi aí que o reclamado
(beneficiário) compareceu espontaneamente nos autos apresentando contrarrazões.
Sendo a decisão de indeferimento mantida, o reclamante deverá ser condenado a
pagar honorários?
SIM. Como já explicado acima, com
a vigência do CPC/2015, a jurisprudência se firmou no sentido de que a
reclamação possui natureza de ação, prevendo o art. 989, III, a angularização
da relação processual, com a citação do beneficiário, que passou a ter um
tratamento semelhante ao da parte, podendo promover a defesa de seus
interesses, com a consequente condenação ao pagamento de honorários de acordo
com a sucumbência.
Assim, na hipótese de
indeferimento inicial da reclamação, é firme a jurisprudência do STJ no sentido
de que a relação processual não se aperfeiçoou, não sendo cabível a condenação
em honorários.
É preciso diferenciar, porém, o
simples indeferimento da inicial daquelas situações em que o reclamante
ingressa com recurso contra a decisão que indefere a petição inicial ou contra
a que julga o pedido improcedente liminarmente.
Com efeito, de acordo com o art.
331 do CPC/2015, nas hipóteses em que a petição inicial é indeferida e contra
essa decisão é interposta apelação, não havendo reconsideração, o réu é citado
ou, se já tiver comparecido aos autos, é intimado para apresentar defesa e,
sendo mantida a decisão, é cabível a condenação em honorários.
Assim, trazendo a situação para a
reclamação, uma vez interposto recurso contra decisão que liminarmente
indeferiu a petição inicial, não sendo o caso de reconsideração, o beneficiário
que comparecer aos autos, apresentando contrarrazões, faz jus ao recebimento de
honorários advocatícios.
Em suma:
É cabível condenação em honorários advocatícios no
julgamento de reclamação indeferida liminarmente na qual a parte comparece
espontaneamente para apresentar defesa.
STJ. 2ª Seção.
Rcl 41.569-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 09/02/2022 (Info
724).
Veja outro caso parecido também
julgado pelo STJ:
O novo Códex, inovando a disciplina legal do instituto, passou a
prever a angularização da relação processual na reclamação, com a citação do
beneficiário da decisão impugnada, para apresentar sua contestação, nos termos
do art. 989, III, do CPC/15.
Nessa nova moldura, em que o ajuizamento da reclamação
nitidamente inaugura nova relação jurídica processual, mostra-se viável a
aplicação do princípio geral da sucumbência, a fim de que seja a parte vencida
- reclamante ou beneficiária do ato impugnado - condenada ao pagamento das
custas e honorários advocatícios, na linha em que tem entendido o Supremo
Tribunal Federal (Rcl 24417 AgR/SP e Rcl 24.464 AgR/RS).
Hipótese em que, apesar de frustrada a tentativa de citação, o
beneficiário do ato reclamado compareceu espontaneamente nos autos, com efetiva
atuação na defesa dos seus interesses, a caracterizar o aperfeiçoamento da
relação processual. Assim, diante do julgamento de improcedência da reclamação,
é impositiva a condenação da parte reclamante, vencida, ao pagamento de
honorários advocatícios.
STJ. 2ª Seção. EDcl na Rcl 33.747/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 12/12/2018.