A situação concreta foi a seguinte:
Romero Britto, é um artista
plástico brasileiro, nascido em Recife (PE) e que se tornou mundialmente
famoso.
Ele mora há muitos anos em Miami,
nos Estados Unidos, onde mantém sua galeria.
Seus desenhos e esculturas são
marcados pelo uso de cores vibrantes, sendo classificada por alguns como
“neocubismo pop”.
O nome de batismo de Romero Britto é Romero Francisco da Silva Brito.
Repare que o seu sobrenome
(patronímico, apelido de família) é grafado com apenas uma letra “t” (Brito).
No entanto, sua assinatura artística é escrita com duas letras “t” (Britto).
Diante disso, o artista ajuizou
ação de retificação de registro civil, com fulcro no art. 109 da Lei nº
6.015/73, pedindo a alteração de seu sobrenome (de Brito para Britto).
Argumentou que é reconhecido internacionalmente
como “Romero Britto” e, de modo a conciliar o nome artístico com aquele que lhe
foi conferido por ocasião de seu assento de nascimento, propôs a demanda em
questão, a fim de proceder à retificação.
Pediu, ao final, a alteração do
registro, para que seu nome passe a ser “Romero Francisco da Silva Britto”.
O juiz negou o pedido, sentença
que foi mantida pelo TJ/SP.
O autor interpôs recurso
especial.
O STJ concordou com a
mudança do sobrenome?
NÃO.
O sobrenome, apelido de família ou patronímico, enquanto
elemento do nome, transcende o indivíduo, dirigindo-se, precipuamente, ao grupo
familiar, de modo que só são admitidas modificações nas hipóteses legais. É o
caso, por exemplo, da mudança em razão da alteração de estado (adoção,
casamento, divórcio).
Também se admite a mudança, excepcionalmente, se houver
justo motivo, conforme prevê o art. 57 da Lei nº 6.015/73.
Como o sobrenome é também uma
característica exterior de qualificação familiar, não é possível a sua livre
disposição.
Assim, o indivíduo não pode
alterar o patronímico (apelido de família) para satisfazer interesse
exclusivamente estético e pessoal.
O apelido de família, ao
desempenhar a precípua função de identificação de estirpe, não pode ser
alterado pela vontade individual de um dos integrantes do grupo familiar.
No caso, a modificação pretendida
alteraria a própria grafia do apelido de família e, assim, representaria
violação à regra registral que exige a preservação do sobrenome, com o objetivo
de indicar a estirpe familiar, o que tem relação com o próprio interesse
público.
Para o STJ, a discrepância entre
a assinatura artística e o nome registral não representa situação excepcional nem
motivo justificado para a alteração pretendida.
Vale ressaltar que o nome do
autor da obra de arte, lançado por ele nos trabalhos que executa, pode ser
escrito da forma como ele bem desejar, sem que tal prática importe em
consequência alguma ao autor ou a terceiros, pois se trata de uma opção de
cunho absolutamente subjetivo, sem impedimento de qualquer ordem. Todavia, a
utilização de nome de família, de modo geral, que extrapole o objeto criado
pelo artista, com acréscimo de letras que não constam do registro original, não
para sanar equívoco, mas para atender a desejo pessoal, não está elencado pela
lei como um motivo que autorize a modificação do assento de nascimento.
Em suma:
A discrepância entre a assinatura artística e o nome
registral não consubstancia situação excepcional e motivo justificado à alteração
da grafia do apelido de família.
STJ. 4ª
Turma. REsp 1.729.402-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 14/12/2021 (Info
723).
DOD Plus – informações extras
Algumas situações nas quais o STJ
já aceitou a alteração/modificação do patronímico:
a) acréscimo, a título de
homenagem, dos sobrenomes dos responsáveis pela criação da autora, diversos dos
seus pais biológicos (Res 605.708/RJ);
b) inclusão de mais um sobrenome
materno no nome de criança, sem a supressão dos demais (Resp 1.256.074/MG);
c) inclusão do patronímico de
companheiro (Resp 1.206.656/GO);
d) autorização de supressão de
dois apelidos de família, porque, mesmo com a redução, a identificação do grupo
familiar seria preservada (Resp 1.673.048/RJ);
e) acréscimo de sobrenome materno
(Resp 1.393.195/MG).