quarta-feira, 7 de julho de 2021
É possível a fixação de guarda compartilhada mesmo que um dos genitores possua domicílio em cidade distinta?
Imagine a seguinte situação
hipotética:
João e Regina foram casados e
tiveram uma filha, chamada de Ana.
Após a separação, João passou a
mora em Londrina (PR) e Regina continuou vivendo em São Paulo (SP).
Assim, os pais da criança passaram
a viver em cidades distintas e distantes entre si.
Regina pleiteou a guarda
unilateral da criança, argumentando que a distância da residência de João
inviabilizaria a guarda compartilhada, já que não seria possível a divisão
equânime das responsabilidades.
João, por sua vez, defendeu a
fixação da guarda compartilhada, sustentando que essa é a regra do direito
brasileiro e que melhor atenderia aos interesses da filha. Ademais, argumentou
que a residência em cidades distintas não impede a fixação de guarda
compartilhada, que deve ser estabelecida mesmo sem consenso dos genitores.
O caso chegou até o STJ. O que
decidiu o Tribunal? O fato de os pais da criança morarem em cidades diferentes
representa óbice à fixação da guarda compartilhada?
NÃO.
A guarda
compartilhada é a regra no direito brasileiro.
O fato de
os genitores possuírem domicílio em cidades diversas, por si só, não representa
óbice à fixação de guarda compartilhada.
STJ. 3ª
Turma. REsp 1.878.041-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 25/05/2021 (Info
698).
Vamos entender com calma, aproveitando
para fazer uma revisão geral sobre o tema.
Guarda
A guarda consiste no dever de
prestar assistência educacional, material e moral ao menor. Trata-se do
exercício do poder familiar e de responsabilidades, direitos e deveres
concernentes à criação da criança ou do adolescente.
Observe que a guarda ora
analisada se refere àquela decorrente do exercício do poder familiar, com
previsão no Código Civil, entre os arts. 1.583 a 1.590. Não se trata aqui da
guarda como modalidade de colocação em família substituta, prevista no art. 33
do ECA.
Espécies de guarda
Existem quatro espécies de guarda
que serão vistas abaixo. As duas primeiras estão previstas expressamente no
Código Civil e as duas outras são criações da doutrina.
O Código Civil fala em guarda unilateral e em guarda
compartilhada:
Art. 1.583. A guarda será unilateral
ou compartilhada.
a) Unilateral (exclusiva):
Ocorre quando um dos pais fica
com a guarda e a outra pessoa possuirá apenas o direito de visitas.
Segundo a definição do Código
Civil, a guarda unilateral é aquela “atribuída a um só dos genitores ou a
alguém que o substitua” (art. 1.583, § 1º).
Ainda hoje é bastante comum.
Ex: João e Regina se divorciaram;
ficou combinado que Regina ficará com a guarda da filha de 5 anos e que o pai
tem direito de visitas aos finais de semana.
Vale ressaltar que, mesmo sendo
fixada a guarda unilateral, o genitor que ficar sem a guarda continuará com o
dever de supervisionar os interesses dos filhos. Para possibilitar tal
supervisão, qualquer dos pais sempre será parte legítima para solicitar
informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou
situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a
educação de seus filhos (§ 5º do art. 1.583).
b) Compartilhada (conjunta):
Ocorre quando ambos os pais são
responsáveis pela guarda do filho.
A guarda é de responsabilidade dos
dois e as decisões a respeito do filho são tomadas em conjunto, baseadas no
diálogo e consenso.
O instituto da guarda compartilhada
teve origem na Common Law, do Direito Inglês, com a denominação
de joint custody. Porém, foi nos
Estados Unidos que a denominada “guarda conjunta” ganhou força e se
popularizou.
Segundo o Código Civil
brasileiro, entende-se por guarda compartilhada “a responsabilização conjunta e
o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo
teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns” (art. 1.583, § 1º).
É considerada a melhor espécie de
guarda porque o filho tem a possibilidade de conviver com ambos e os pais, por
sua vez, sentem-se igualmente responsáveis.
Vale ressaltar que nessa espécie
de guarda, apesar ambos os genitores possuírem a guarda, o filho mora apenas
com um dos dois.
Ex: João e Regina se divorciaram;
ficou combinado que a filha do casal ficará morando com a mãe; apesar disso,
tanto Regina como João terão a guarda compartilhada (conjunta) da criança, de
forma que ela irá conviver constantemente com ambos e as decisões sobre ela
serão tomadas em conjunto pelos pais.
Tempo de convivência. Na guarda compartilhada, o tempo de convívio
com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com os pais, sempre tendo
em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos (§ 2º do art. 1.583).
Orientação técnico-profissional. Para estabelecer as atribuições dos
pais e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício
ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação
técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar, que deverá visar à divisão
equilibrada do tempo com os genitores (§ 3º do art. 1.584 do CC).
Assim, com a ajuda de psicólogos,
assistentes sociais e outros profissionais, o juiz já deverá estabelecer as
atribuições que caberão a cada um dos pais e o tempo de convivência com o
filho.
Ex: João irá buscar o filho no
colégio todos os dias às 12h; no período da tarde, a criança continuará na
companhia do pai e, às 18h, ele deverá deixá-lo na casa da mãe.
þ
(Promotor MP/GO 2019) Acerca do instituto da guarda compartilhada no Código
Civil, assinale a alternativa incorreta:
a) A guarda compartilhada encontra suas origens na “Common
Law” do Direito Inglês, com a denominação de “joint custody”. A partir da década
de 1960, se difundiu tal conceito pela Europa, porém, foi nos Estados Unidos da
América que a denominada guarda conjunta avançou em virtude de intensas
pesquisas em decorrência da transformação das famílias. Daí, é possível
concluir que a adoção de previsão legal da guarda compartilhada no Brasil
retrata uma crescente tendência mundial, fortalecida pela Convenção de Nova
Iorque sobre Direitos da Criança (ONU, 1989).
b) A guarda compartilhada define os dois genitores como
detentores da autoridade parental para tomar todas as decisões que afetem os
filhos, visando manter os laços de afetividade e abrandar os efeitos que o fim
da sociedade conjugal pode trazer à prole, ao passo que tenta manter de forma
igualitária a função parental, consagrando os direitos da criança e de seus
genitores. Em face disso, a guarda compartilhada, como regra, é recomendável,
não se aplicando, porém, quando um dos genitores declarar ao magistrado que não
deseja a guarda do menor ou um dos genitores não estiver apto a exercer o poder
familiar.
c) Em sede de medida cautelar de separação de corpos, em sede
de medida cautelar de guarda ou em outra sede de fixação liminar de guarda, a
decisão sobre guarda de filhos, salvo se provisória, será proferida
preferencialmente após a oitiva de ambas as partes perante o juiz.
d) A guarda pode ser deferida para outra pessoa que não seja
o pai ou a mãe. Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a
guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda a pessoa que revele compatibilidade
com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e
as relações de afinidade e afetividade.
Letra C
Confira o que dizem o art. 1.548, § 5º e art. 1.585 do CC:
Art. 1.584 (...) § 5º Se o juiz
verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe,
deferirá a guarda a pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida,
considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e
afetividade. (Redação dada pela Lei nº 13.058/2014)
Art. 1.585. Em sede de medida cautelar de separação de
corpos, em sede de medida cautelar de guarda ou em outra sede de fixação
liminar de guarda, a decisão sobre guarda de filhos, mesmo que provisória, será
proferida preferencialmente após a oitiva de ambas as partes perante o juiz,
salvo se a proteção aos interesses dos filhos exigir a concessão de liminar sem
a oitiva da outra parte, aplicando-se as disposições do art. 1.584. (Redação
dada pela Lei nº 13.058/2014)
c) Alternada:
Ocorre quando os pais se revezam
em períodos exclusivos de guarda, cabendo ao outro direito de visitas.
Em outras palavras, é aquela na
qual durante alguns dias um genitor terá a guarda exclusiva e, em outros
períodos, o outro genitor terá a guarda exclusiva.
Ex: João e Regina se divorciaram;
ficou combinado que durante uma semana a filha do casal ficará morando com a
mãe (e o pai não pode interferir durante esse tempo) e, na semana seguinte, a
filha ficará vivendo com o pai (que terá a guarda exclusiva nesse período).
Essa escolha é criticada pela doutrina:
“Essa forma de
guarda não é recomendável, eis que pode trazer confusões psicológicas à
criança. Com tom didático, pode-se dizer que essa é a guarda pingue-pongue,
pois a criança permanece com cada um dos genitores por períodos ininterruptos.
Alguns a denominam como a guarda do mochileiro, pois o filho sempre deve
arrumar a sua malinha ou mochila para ir à outra casa. É altamente
inconveniente, pois a criança perde seu referencial, recebendo tratamentos
diferentes quando na casa paterna e na materna.” (TARTUCE, Flávio. Manual
de Direito Civil. Volume único. São Paulo: Método, 2013, p. 1224).
d) Aninhamento (nidação):
Ocorre quando a criança permanece
na mesma casa onde morava e os pais, de forma alternada, se revezam na sua
companhia.
Assim, é o contrário da guarda
alternada, já que são os pais que, durante determinados períodos, se mudam.
Ex: João e Regina se divorciaram;
ficou combinado que a filha do casal ficará morando no mesmo apartamento onde
residia e no qual já possui seus amiguinhos na vizinhança. Durante uma semana,
a mãe ficará morando no apartamento com a criança (e o pai não pode interferir
durante esse tempo). Na semana seguinte, a mãe se muda temporariamente para
outro lugar e o pai ficará vivendo no apartamento com a filha.
Defendida por alguns como uma
forma de a criança não sofrer transtornos psicológicos por ter que abandonar o
meio em que já vivia e estava familiarizada. Apesar disso, é bastante rara
devido aos inconvenientes práticos de sua implementação.
A palavra “aninhamento” vem de
“aninhar”, ou seja, colocar em um ninho. Transmite a ideia de que a criança
permanecerá no mesmo ninho (mesmo lar) e os seus pais é quem se revezarão em
sua companhia.
Como já dito acima, o Código
Civil somente fala em unilateral ou compartilhada (art. 1.583), mas as demais
espécies também existem na prática.
Como é definida a espécie de
guarda que será aplicada?
O ideal é que a guarda seja definida por consenso entre os
pais. Por isso, o Código Civil determina que seja feita uma audiência de
conciliação. A Lei também afirma que o juiz deverá incentivar que os pais façam
um acordo adotando a guarda compartilhada:
Art. 1.584 (...)
§ 1º Na audiência de conciliação, o
juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua
importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as
sanções pelo descumprimento de suas cláusulas.
Se não houver acordo, o juiz é quem irá fixar a espécie de
guarda a ser seguida:
Art. 1.584. A guarda, unilateral ou
compartilhada, poderá ser:
I – requerida, por consenso, pelo pai
e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio,
de dissolução de união estável ou em medida cautelar;
II – decretada pelo juiz, em atenção a
necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo
necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.
Em regra, o juiz não deve
conceder a guarda sem ouvir a outra parte.
A decisão sobre guarda de filhos,
mesmo que provisória, será proferida preferencialmente após a oitiva de ambas
as partes perante o juiz, salvo se a proteção aos interesses dos filhos exigir
a concessão de liminar sem a oitiva da outra parte (art. 1.585 do CC).
Guarda compartilhada como regra
Vimos acima que, se não houver
acordo, o juiz é quem irá fixar a guarda. Neste caso, qual é a espécie de
guarda que o magistrado deverá determinar?
REGRA: guarda compartilhada.
O Código determina que, quando não houver acordo entre a mãe
e o pai quanto à guarda do filho, o juiz deverá aplicar a guarda compartilhada
(art. 1.584, § 2º):
Art. 1.584 (...)
§ 2º Quando não houver acordo entre a
mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a
exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos
genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.
EXCEÇÕES:
Não será aplicada a guarda
compartilhada se:
a) um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do
menor;
b) um dos genitores não estiver apto a exercer o poder familiar.
A guarda compartilhada depende da
concordância dos genitores? Ex: o pai deseja a guarda unilateral e a mãe também;
nenhum dos dois quer a guarda compartilhada; o juiz deverá determinar outra
espécie de guarda?
NÃO. A implementação da
guarda compartilhada não se sujeita à transigência dos genitores. Em
outras palavras, a guarda compartilhada é a regra, independentemente de
concordância entre os genitores acerca de sua necessidade ou oportunidade (STJ.
3ª Turma. REsp 1605477/RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em
21/06/2016).
Veja como esse tema já foi exigido em prova:
þ
(Juiz de Direito TJ/SC 2019 CEBRASPE) De acordo com o STJ, o estabelecimento da
guarda compartilhada não se sujeita à transigência dos genitores. (certo)
A guarda compartilha depende da
divisão do tempo de convívio igualitário entre cada um dos genitores?
NÃO. A guarda compartilhada não
exige:
·
a custódia física conjunta de ambos os genitores; ou
·
o tempo de convívio igualitário para cada um dos pais.
A guarda compartilha poderá ser
exercida por formas diversas. Trata-se de uma espécie de guarda flexível,
visando a sua implementação concreta.
Não há um modelo fixo de guarda
compartilhada que exija a custódia física conjunta ou a determinação de
convívio igualitário entre os genitores. Assim, é possível que seja instituído,
por exemplo, regime de visitas, formas de convivência, dentro da própria guarda
compartilhada.
E se não for possível mesmo a
guarda compartilhada?
Nas hipóteses em que seja
inviável a guarda compartilhada, a atribuição ou alteração da guarda dar-se-á
por preferência ao genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou
adolescente com o outro genitor (art. 7º da Lei nº 12.318/2010).
CASO CONCRETO: GUARDA COMPARTILHADA EM CIDADES DIFERENTES
O fato de um dos pais morar
definitivamente em outra cidade, é impeditivo à instituição da guarda
compartilhada?
Vimos acima que não.
A guarda compartilhada é a regra
no direito brasileiro.
Entende-se que a guarda
compartilhada é a modalidade mais adequada para preservar os interesses do
menor, desde que, obviamente, ambos os genitores estejam aptos.
A Lei nº 13.058/2014, que alterou
§2º do art. 1.584 do Código Civil, esclareceu que guarda compartilhada não é
apenas prioritária ou preferencial, mas sim obrigatória, só sendo afastada quando um
genitor declarar que não deseja a guarda ou quando não estiver apto ao
exercício do poder familiar.
A residência do genitor em outra
cidade, outro estado ou mesmo em outro país, não se enquadra entre as exceções
para a não fixação da guarda compartilhada.
Tanto isso é verdade que o Código Civil, no art. 1.583, §3º,
estabelece um critério para a definição da cidade que deverá ser considerada
como base da moradia dos filhos na guarda compartilhada, qual seja, a que
melhor atender aos interesses da criança ou do adolescente. Portanto, o próprio
Código Civil previu a possibilidade da guarda compartilhada com um dos
genitores residindo em cidade distinta:
Art. 1.583 (...)
§ 3º Na guarda compartilhada, a cidade
considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos
interesses dos filhos.
Na realidade, na guarda
compartilhada, o recomendável é que seja fixada uma residência única para a
criança ou adolescente, para que o menor tenha um referencial fixo de lar,
distinguindo-se, portanto, da guarda alternada.
O outro genitor, que não reside
definitivamente com o menor, poderá exercer os direitos e deveres inerentes à
guarda compartilhada através de fórmulas diversas, do modo que melhor se adeque
ao interesse da criança ou do adolescente.
Assim, com o avanço tecnológico,
passa a ser plenamente possível que os genitores compartilhem as
responsabilidades referentes aos filhos, mesmo que à distância.
Observe posicionamento doutrinário neste sentido:
“A guarda
compartilhada tem por finalidade essencial a igualdade na decisão em relação ao
filho ou corresponsabilidade, em todas as situações existenciais e
patrimoniais. Consequentemente, não há impedimento a que seja escolhida ou
decretada pelo juiz, quando os pais residirem em cidades, estados ou até mesmo
países diferentes, pois as decisões podem ser tomadas a distâncias, máxime com
o atual desenvolvimento tecnológico das comunicações (...) A atual tecnologia
da informação permite o contato virtual instantâneo, com visualização das
imagens dos interlocutores, favorecendo a comunicação entre os pais separados e
entre estes e seus filhos. Essa comunicação fluente e permanente, sem rigidez
de horários, contribui muito mais para a formação afetiva e cognitiva da
criança do que os episódicos períodos de visitas.” (LÔBO, Paulo. Direito civil:
famílias. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 200-201)
Não confunda a situação
acima analisada com o julgado que trata da responsabilidade civil do pais por
ato de filho menor, em que um dos genitores reside em cidade diversa:
Responsabilidade civil dos pais por danos causados por filho
menor
A responsabilidade dos pais por filho menor (responsabilidade
por ato ou fato de terceiro) é objetiva, nos termos do art. 932, I, do CC,
devendo-se comprovar apenas a culpa na prática do ato ilícito daquele pelo qual
são os pais responsáveis legalmente (ou seja, é necessário provar apenas a
culpa do filho).
Contudo, há uma exceção: os pais só respondem pelo filho incapaz que esteja sob
sua autoridade e em sua companhia; assim, os pais, ou responsável, que não
exercem autoridade de fato sobre o filho, embora ainda detenham o poder
familiar, não respondem por ele. Desse modo, a mãe que, à época de acidente
provocado por seu filho menor de idade, residia permanentemente em local
distinto daquele no qual morava o menor — sobre quem apenas o pai exercia
autoridade de fato — não pode ser responsabilizada pela reparação civil advinda
do ato ilícito, mesmo considerando que ela não deixou de deter o poder familiar
sobre o filho. STJ. 3ª Turma. REsp 1232011-SC, Rel. Min. João Otávio de
Noronha, julgado em 17/12/2015 (Info 575).
Esse julgado não discute a guarda
ou o poder familiar da mãe, mas sim, o exercício de autoridade sobre o filho.
Autoridade é diferente de poder familiar.
O inciso I do art. 932 do CC
exige, para responsabilizar os pais, que os filhos menores estejam “sob sua
autoridade e em sua companhia”.
“Autoridade” não é sinônimo de “poder
familiar”.
Poder familiar é um conjunto de
direitos e deveres conferido aos pais com relação ao filho menor de 18 anos
(não emancipado), dentre eles o poder de dirigir a criação e a educação, de
conceder consentimento para casar, de exigir que preste obediência, e outros
previstos no art. 1.634 do CC.
“Autoridade” é expressão mais
restrita que “poder familiar” e pressupõe uma ordenação, ou seja, que o pai ou
mãe tenha poderes para organizar de forma mais direta e imediata a vida do
filho.
Todo pai/mãe que tem autoridade
sobre o filho, possui também poder familiar. Mas o contrário não é verdadeiro,
ou seja, nem todo pai/mãe que possui poder familiar tem necessariamente
autoridade sobre o filho.
Assim, por mais que a mãe ainda
permanecesse com o poder familiar (que não foi perdido por ela estar em outra
cidade), o certo é que ela não detinha “autoridade” sobre o filho.
A mãe que não exerce autoridade
de fato sobre o filho, embora ainda detenha o poder familiar, não deve
responder pelos danos que ele causar.