Clique AQUI para baixar em pdf ou leia os comentários abaixo.
Súmula 647-STJ: São
imprescritíveis as ações indenizatórias por danos morais e materiais
decorrentes de atos de perseguição política com violação de direitos
fundamentais ocorridos durante o regime militar.
STJ. 1ª Seção. Aprovada em
10/03/2021.
Imagine
a seguinte situação hipotética:
João
foi vítima de intensa perseguição política praticada pelo governo federal
durante a época do regime militar instalado no Brasil em 1964.
Ele sofreu
prejuízos econômicos em razão dessas perseguições, além de ter sido torturado.
Esses
fatos ocorreram em 1969.
Em 2001,
João ajuizou ação de indenização contra a União pedindo a reparação pelos danos
morais e materiais que sofreu durante o período.
A
União alegou que a pretensão estaria prescrita, considerando que as ações
contra o Poder Público devem ser propostas dentro do prazo de 5 anos, nos
termos do art. 1º do Decreto 20.910/1932.
A
pretensão encontra-se prescrita?
NÃO.
As
ações de indenização por danos morais e materiais decorrentes de perseguição,
tortura e prisão, por motivos políticos, ocorridas durante o regime militar,
são imprescritíveis.
Para
esses casos, não se aplica o prazo prescricional de 5 anos previsto no art. 1º
do Decreto 20.910/1932.
Tais
demandas são imprescritíveis porque se referem a um período em que a ordem
jurídica foi desconsiderada, com legislação de exceção, tendo havido incontáveis
abusos e violações dos direitos fundamentais, especialmente do direito à
dignidade da pessoa humana (STJ. 1ª Turma. AgRg no Ag 1391062/RS, Rel. Min.
Benedito Gonçalves, julgado em 09/08/2011).
Nessa
época, as vítimas não tinham a plena liberdade para exercer suas pretensões,
razão pela qual não há que se falar em prescrição:
O prazo quinquenal
previsto no Decreto n. 20.910/1932 é inaplicável às ações que objetivam
reparação por danos morais ocasionados por torturas sofridas durante o período
do regime militar, demandas que são imprescritíveis, tendo em vista as
dificuldades enfrentadas pelas vítimas para deduzir suas pretensões em juízo.
STJ. 1ª Turma. AgInt no
REsp 1569337/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 03/05/2018.
Conforme
argumenta a Min. Regina Helena Costa, a Constituição Federal não prevê prazo
prescricional para o exercício do direito de agir quando se trata de defender o
direito inalienável à dignidade humana, sobretudo quando violados durante o
período do regime de exceção (REsp 1.565.166-PR).
É
certo que a prescrição é a regra no ordenamento jurídico. Assim, em regra, para
uma pretensão ser considerada imprescritível deverá haver um comando expresso
no texto constitucional, como é o caso do art. 37, § 5º da CF/88.
O STJ, no entanto, excepcionalmente, afirma que,
mesmo sem uma previsão expressa, é possível considerar que as pretensões que
buscam reparações decorrentes do regime militar de exceção são imprescritíveis,
considerando que envolvem a concretização da dignidade da pessoa humana. Nesse
sentido:
(...) 1. A dignidade da
pessoa humana, valor erigido como um dos fundamentos da República Federativa do
Brasil, experimenta os mais expressivos atentados quando engendradas a tortura
e a morte, máxime por delito de opinião.
(...)
4. À luz das cláusulas pétreas
constitucionais, é juridicamente sustentável assentar que a proteção da
dignidade da pessoa humana perdura enquanto subsiste a República Federativa,
posto seu fundamento.
5. Consectariamente, não
há falar em prescrição da ação que visa implementar um dos pilares da
República, máxime porque a Constituição não estipulou lapso prescricional ao
direito de agir, correspondente ao direito inalienável à dignidade.
(...)
12. A exigibilidade a
qualquer tempo dos consectários às violações dos direitos humanos decorre do
princípio de que o reconhecimento da dignidade humana é o fundamento da
liberdade, da justiça e da paz, razão por que a Declaração Universal inaugura
seu regramento superior estabelecendo no art. 1º que "todos os homens
nascem livres e iguais em dignidade e direitos".
13. A Constituição
federal funda-se na premissa de que a dignidade da pessoa humana é inarredável
de qualquer sistema de direito que afirme a existência, no seu corpo de normas,
dos denominados direitos fundamentais e os efetive em nome da promessa da
inafastabilidade da jurisdição, marcando a relação umbilical entre os direitos
humanos e o direito processual.
(...)
STJ. 1ª Turma. REsp
1165986/SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 16/11/2010.