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sexta-feira, 12 de março de 2021

Súmula 647 do STJ comentada


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Súmula 647-STJ: São imprescritíveis as ações indenizatórias por danos morais e materiais decorrentes de atos de perseguição política com violação de direitos fundamentais ocorridos durante o regime militar.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 10/03/2021.

 

Imagine a seguinte situação hipotética:

João foi vítima de intensa perseguição política praticada pelo governo federal durante a época do regime militar instalado no Brasil em 1964.

Ele sofreu prejuízos econômicos em razão dessas perseguições, além de ter sido torturado.

Esses fatos ocorreram em 1969.

Em 2001, João ajuizou ação de indenização contra a União pedindo a reparação pelos danos morais e materiais que sofreu durante o período.

A União alegou que a pretensão estaria prescrita, considerando que as ações contra o Poder Público devem ser propostas dentro do prazo de 5 anos, nos termos do art. 1º do Decreto 20.910/1932.

 

A pretensão encontra-se prescrita?

NÃO.

As ações de indenização por danos morais e materiais decorrentes de perseguição, tortura e prisão, por motivos políticos, ocorridas durante o regime militar, são imprescritíveis.

Para esses casos, não se aplica o prazo prescricional de 5 anos previsto no art. 1º do Decreto 20.910/1932.

Tais demandas são imprescritíveis porque se referem a um período em que a ordem jurídica foi desconsiderada, com legislação de exceção, tendo havido incontáveis abusos e violações dos direitos fundamentais, especialmente do direito à dignidade da pessoa humana (STJ. 1ª Turma. AgRg no Ag 1391062/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 09/08/2011).

Nessa época, as vítimas não tinham a plena liberdade para exercer suas pretensões, razão pela qual não há que se falar em prescrição:

O prazo quinquenal previsto no Decreto n. 20.910/1932 é inaplicável às ações que objetivam reparação por danos morais ocasionados por torturas sofridas durante o período do regime militar, demandas que são imprescritíveis, tendo em vista as dificuldades enfrentadas pelas vítimas para deduzir suas pretensões em juízo.

STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 1569337/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 03/05/2018.

 

Conforme argumenta a Min. Regina Helena Costa, a Constituição Federal não prevê prazo prescricional para o exercício do direito de agir quando se trata de defender o direito inalienável à dignidade humana, sobretudo quando violados durante o período do regime de exceção (REsp 1.565.166-PR).

É certo que a prescrição é a regra no ordenamento jurídico. Assim, em regra, para uma pretensão ser considerada imprescritível deverá haver um comando expresso no texto constitucional, como é o caso do art. 37, § 5º da CF/88.

O STJ, no entanto, excepcionalmente, afirma que, mesmo sem uma previsão expressa, é possível considerar que as pretensões que buscam reparações decorrentes do regime militar de exceção são imprescritíveis, considerando que envolvem a concretização da dignidade da pessoa humana. Nesse sentido:

(...) 1. A dignidade da pessoa humana, valor erigido como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, experimenta os mais expressivos atentados quando engendradas a tortura e a morte, máxime por delito de opinião.

(...)

4. À luz das cláusulas pétreas constitucionais, é juridicamente sustentável assentar que a proteção da dignidade da pessoa humana perdura enquanto subsiste a República Federativa, posto seu fundamento.

5. Consectariamente, não há falar em prescrição da ação que visa implementar um dos pilares da República, máxime porque a Constituição não estipulou lapso prescricional ao direito de agir, correspondente ao direito inalienável à dignidade.

(...)

12. A exigibilidade a qualquer tempo dos consectários às violações dos direitos humanos decorre do princípio de que o reconhecimento da dignidade humana é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz, razão por que a Declaração Universal inaugura seu regramento superior estabelecendo no art. 1º que "todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos".

13. A Constituição federal funda-se na premissa de que a dignidade da pessoa humana é inarredável de qualquer sistema de direito que afirme a existência, no seu corpo de normas, dos denominados direitos fundamentais e os efetive em nome da promessa da inafastabilidade da jurisdição, marcando a relação umbilical entre os direitos humanos e o direito processual.

(...)

STJ. 1ª Turma. REsp 1165986/SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 16/11/2010.


 


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