Olá, amigos do Dizer o Direito,
Foi publicada ontem (26/03), a Lei nº 14.128/2021, que dispõe sobre compensação financeira a ser paga pela União aos profissionais e trabalhadores de saúde que ficaram permanentemente incapacitados para o trabalho em razão da Covid-19.
Veto
Vale ressaltar que esse projeto
aprovado havia sido vetado pelo Presidente da República em 04/08/2020, apresentando
as seguintes razões:
“Apesar do mérito da propositura
e a boa intenção do legislador em determinar o pagamento de indenização pela
União para familiares de profissionais de saúde que atuam diretamente no
combate à pandemia e venham a falecer, bem como para aqueles que ficaram
incapacitados permanentemente para o trabalho, a proposta, ao impor o apoio
financeiro na forma do projeto, contém os seguintes óbices jurídicos.
A proposta viola o art. 8º da
recente Lei Complementar nº 173, de 2020, por se estar prevendo benefício
indenizatório para agentes públicos e criando despesa continuada em período de
calamidade no qual tais medidas estão vedadas.
O segundo óbice está na falta de
apresentação de estimativa do impacto orçamentário e financeiro, em violação às
regras do art. 113 do ADCT.
Ademais da violação ao art. 113
do ADCT, tendo em vista que o período do benefício supera o prazo de 31.12.2020
(Art. 1º do Decreto Legislativo nº 6 de 2020), revela-se incompatível com os
arts. 15, 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal, cuja violação pode
acarretar responsabilidade para o Presidente da República.
O terceiro problema é a
inconstitucionalidade formal, por se criar benefício destinado a outros agentes
públicos federais e a agentes públicos de outros entes federados por norma de
iniciativa de parlamentar federal, a teor do art. 1º e art. 61 § 1º da
Constituição.
Por fim, ao dispor que durante o
período de emergência decorrente da Covid-19, a imposição de isolamento
dispensará o empregado da comprovação de doença por 7 (sete) dias, veicula
matéria análoga ao do PL nº 702/2020, o qual foi objeto de veto presidencial,
por gerar insegurança jurídica ao apresentar disposição dotada de imprecisão
técnica, e em descompasso com o conceito veiculado na Portaria nº 356, de 2020,
do Ministério da Saúde, e na Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que
tratam situação análoga como isolamento.”
Veto derrubado
O Congresso Nacional, no entanto,
em sessão realizada no dia 17/03/2021, decidiu derrubar o veto, razão pela qual
o projeto foi promulgado e publicado no dia 26/03/2021.
O que prevê a Lei nº
14.128/2021?
A Lei nº 14.128/2021 determina
que a União pague...
- uma compensação financeira
- aos profissionais e
trabalhadores de saúde que
- tornarem-se permanentemente
incapacitados para o trabalho,
- durante o período de emergência
de saúde pública decorrente do novo coronavírus,
- por terem trabalhado no
atendimento direto a pacientes de Covid-19,
- ou por terem realizado visitas
domiciliares (no caso de agentes comunitários de saúde ou de combate a endemias).
Caso o indivíduo tenha falecido,
a compensação financeira será paga ao seu cônjuge ou companheiro, aos seus
dependentes e aos seus herdeiros necessários.
COMPENSAÇÃO
FINANCEIRA DA LEI 14.128/2021 |
|
A União
deve pagar uma compensação financeira... |
I - ao profissional ou
trabalhador de saúde que ficar incapacitado permanentemente para o trabalho
em decorrência da Covid-19; |
II - ao agente comunitário de
saúde e de combate a endemias que ficar incapacitado permanentemente para o
trabalho em decorrência da Covid-19, por ter realizado visitas domiciliares
em razão de suas atribuições durante o Espin-Covid-19; |
|
III - ao cônjuge/companheiro,
aos dependentes e aos herdeiros necessários, caso o profissional de saúde ou os
agentes mencionados tenham falecido nas situações descritas nos incisos I e
II acima. |
Quem é considerado
profissional ou trabalhador da saúde?
a) aqueles cujas profissões, de
nível superior, são reconhecidas pelo Conselho Nacional de Saúde, além de
fisioterapeutas, nutricionistas, assistentes sociais e profissionais que
trabalham com testagem nos laboratórios de análises clínicas;
b) aqueles cujas profissões, de
nível técnico ou auxiliar, são vinculadas às áreas de saúde, incluindo os
profissionais que trabalham com testagem nos laboratórios de análises clínicas;
c) os agentes comunitários de
saúde e de combate a endemias;
d) aqueles que, mesmo não
exercendo atividades-fim nas áreas de saúde, auxiliam ou prestam serviço de
apoio presencialmente nos estabelecimentos de saúde para a consecução daquelas
atividades, no desempenho de atribuições em serviços administrativos, de copa,
de lavanderia, de limpeza, de segurança e de condução de ambulâncias, entre
outros, além dos trabalhadores dos necrotérios e dos coveiros; e
e) aqueles cujas profissões, de
nível superior, médio e fundamental, são reconhecidas pelo Conselho Nacional de
Assistência Social, que atuam no Sistema Único de Assistência Social;
Quem são os dependentes?
São aqueles assim definidos pelo
art. 16 da Lei nº 8.213/91.
A Lei divide
os dependentes em três classes:
1ª CLASSE |
a)
Cônjuge b)
Companheiro (hétero ou homoafetivo) c)
Filho menor de 21 anos, desde que não tenha
sido emancipado; d)
Filho inválido (não importa a idade); e)
Filho com deficiência intelectual ou mental ou
deficiência grave (não importa a idade). |
Para que recebam os benefícios
previdenciários, os membros da 1ª classe NÃO precisam provar que eram
dependentes economicamente do segurado (a dependência econômica é presumida pela
lei). |
2ª CLASSE |
Pais do segurado. |
Para que recebam os benefícios
previdenciários, os membros da 2ª e 3ª classes PRECISAM provar que eram
dependentes economicamente do segurado. |
3ª CLASSE |
a) Irmão menor de 21 anos,
desde que não tenha sido emancipado; b) Irmão inválido (não importa
a idade); c) Irmão com deficiência
intelectual ou mental ou deficiência grave (não importa a idade). |
A Lei fala em Espin-Covid-19.
O que é isso?
Espin-Covid-19 é o estado de
emergência de saúde pública de importância nacional em decorrência da infecção
humana pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2).
Esse estado
de emergência foi iniciado juridicamente no Brasil com a Portaria nº 188/2020, do
Ministério da Saúde:
Portaria nº 188, de 3 de fevereiro de
2020
Declara Emergência em Saúde Pública de
importância Nacional (ESPIN) em decorrência da Infecção Humana pelo novo
Coronavírus (2019-nCoV).
O estado de
emergência só se encerrará com a publicação de novo ato do Ministro de Estado
da Saúde, na forma dos §§ 2º e 3º do caput do art. 1º da Lei nº 13.979/2020:
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre as
medidas que poderão ser adotadas para enfrentamento da emergência de saúde
pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo
surto de 2019.
(...)
§ 2º Ato do Ministro de Estado da
Saúde disporá sobre a duração da situação de emergência de saúde pública de que
trata esta Lei.
§ 3º O prazo de que trata o § 2º deste
artigo não poderá ser superior ao declarado pela Organização Mundial de Saúde.
Comprovação de que a
incapacidade permanente foi causada pela Covid-19
Presume-se a Covid-19 como causa
da incapacidade permanente para o trabalho ou óbito, mesmo que não tenha sido a
causa única, principal ou imediata, desde que mantido o nexo temporal entre a
data de início da doença e a ocorrência da incapacidade permanente para o
trabalho ou óbito, se houver:
I - diagnóstico de Covid-19
comprovado mediante laudos de exames laboratoriais; ou
II - laudo médico que ateste
quadro clínico compatível com a Covid-19.
Perícia médica
A concessão da compensação
financeira nas hipóteses de incapacidade permanente para o trabalho estará
sujeita à avaliação de perícia médica realizada por servidores integrantes da
carreira de Perito Médico Federal.
Se o profissional ou
trabalhador da saúde que ficou incapacitado ou que faleceu tinha comorbidades
(exs: cardiopatia, obesidade, diabetes etc.) antes da contaminação pela
Covid-19, ele ficará sem receber a compensação financeira?
NÃO. A presença de comorbidades
não afasta o direito ao recebimento da compensação financeira.
Se o trabalhador ou profissional
da saúde ficou incapacitado ou morreu de Covid-19 antes da Lei nº 14.128/2021, mesmo
assim haverá pagamento da compensação financeira?
SIM. A compensação financeira será
devida inclusive nas hipóteses de óbito ou incapacidade permanente para o
trabalho anterior à data de publicação da Lei, desde que a infecção pelo novo
coronavírus (Sars-CoV-2) tenha ocorrido durante o Espin-Covid-19.
Se o trabalhador ou profissional
da saúde ficou incapacitado ou morreu de Covid-19 depois do fim da Espin-Covid-19,
mesmo assim haverá pagamento da compensação financeira?
SIM. A compensação financeira será
devida inclusive nas hipóteses de óbito ou incapacidade permanente para o
trabalho superveniente à declaração do fim do Espin-Covid-19, desde que a
infecção pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2) tenha ocorrido durante o
Espin-Covid-19.
Compensação financeira
A compensação financeira prevista
na Lei nº 14.128/2021 será composta por duas verbas:
I – 1 (uma) única prestação em valor fixo de R$ 50.000,00
(cinquenta mil reais).
Esse valor é pago ao profissional
ou trabalhador de saúde incapacitado permanentemente.
Se ele tiver morrido, o valor
será pago ao seu cônjuge ou companheiro, aos seus dependentes e aos seus
herdeiros necessários. Nesse caso, será feito um rateio entre os beneficiários,
em partes iguais, ao cônjuge ou companheiro e a cada um dos dependentes e
herdeiros necessários.
II – 1 (uma) única prestação de valor variável paga a cada um dos
dependentes do profissional ou trabalhador de saúde falecido.
Vale ressaltar, no entanto, que
somente terão direito a essa prestação:
·
os dependentes menores de 21 anos;
·
os dependentes menores de 24 anos, se estiverem cursando curso superior;
·
os dependentes com deficiência, independentemente da idade.
Qual é o valor dessa prestação do
inciso II?
O valor será calculado mediante a
multiplicação da quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelo número de anos
inteiros e incompletos que faltarem, para cada um deles, na data do óbito do
profissional ou trabalhador de saúde, para atingir a idade de 21 anos
completos, ou 24 anos se cursando curso superior.
Ex: João era profissional da
saúde e faleceu em decorrência da Covid-19. Ele deixou um filho (Lucas) de 11
anos. Lucas receberá prestação no valor de R$ 100.000,00 (10 mil x 10 anos que
faltam para ele completar 21).
Ex2: Pedro era profissional da
saúde e faleceu em decorrência da Covid-19. Ele deixou uma filha (Sofia) de 20
anos, que está na faculdade. Sofia receberá prestação no valor de R$ 40.000,00
(10 mil x 4 anos que faltam para ela completar 24).
E se for dependente com deficiência?
O 1º do art. 3º da Lei traz a
seguinte regra:
Art. 3º (...)
§ 1º A prestação variável de que trata
o inciso II do caput deste artigo será devida aos dependentes com deficiência
do profissional ou trabalhador de saúde falecido, independentemente da idade,
no valor resultante da multiplicação da quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais)
pelo número mínimo de 5 (cinco) anos.
Vejamos os seguintes exemplos que
ilustram três situações possíveis:
·
Ex1: dependente com deficiência tinha 11 anos no momento da morte do profissional
de saúde. Ele receberá prestação no valor de R$ 100.000,00 (10 mil x 10 anos
que faltam para ele completar 21).
·
Ex2: dependente com deficiência tinha 18 anos no momento da morte do profissional
de saúde e não cursava curso superior. Ele receberá prestação no valor de R$ 50.000,00.
Se fosse aplicar a regra geral (regra dos dependentes sem deficiência), ele receberia
R$ 30.000,00 (10 mil x 3 anos que faltam para ele completar 21). Ocorre que o §
1º do art. 3º, acima transcrito, trouxe uma regra mais favorável ao dizer que o
dependente com deficiência deverá receber, no mínimo, as parcelas referentes a
5 anos. Logo, ele receberá R$ 50.000,00 (10 mil x 5 anos).
·
Ex3: dependente com deficiência tinha 30 anos no momento da morte do profissional
de saúde. Ele receberá prestação no valor de R$ 50.000,00 (10 mil x 5 anos).
Governo pode parcelar em
até três vezes o pagamento da compensação financeira
Art. 3º (...) § 3º A integralidade da
compensação financeira, considerada a soma das parcelas devidas, quando for o
caso, será dividida, para o fim de pagamento, em 3 (três) parcelas mensais e
sucessivas de igual valor.
Despesas de funeral também deverão
ser pagas pela União
No caso de óbito do profissional
ou trabalhador de saúde, será agregado o valor relativo às despesas de funeral
à compensação financeira.
Regulamento ainda irá
definir o órgão competente para a análise e deferimento dos pedidos
A compensação financeira será
concedida após a análise e o deferimento de requerimento com esse objetivo
dirigido ao órgão competente, na forma a ser definida em regulamento.
Não incide imposto de renda
A compensação financeira de que
trata a Lei nº 14.128/2021 possui natureza indenizatória e não poderá
constituir base de cálculo para a incidência de imposto de renda ou de
contribuição previdenciária.
Benefícios previdenciários
ou assistenciais continuam sendo devidos
O recebimento da compensação
financeira não prejudica o direito ao recebimento de benefícios previdenciários
ou assistenciais previstos em lei.
OUTRO ASSUNTO TRATADO PELA LEI
14.128/2021
Além da compensação financeira, a
Lei nº 14.128/2021 trata de outro assunto, qual seja, a comprovação do empregado
em geral que está doente e que não poderá comparecer ao trabalho.
A Lei nº 605/49 trata sobre o repouso
semanal remunerado e o pagamento de salário nos dias feriados civis e
religiosos.
O art. 6º, 1º, “f” da Lei nº
605/49 afirma que o trabalhador em geral (não estou mais tratando apenas sobre
trabalhadores da área da saúde) que estiver comprovadamente doente e, por essa
razão, faltar ao trabalho, não sofrerá qualquer desconto em sua remuneração:
Art. 6º Não será devida a remuneração
quando, sem motivo justificado, o empregado não tiver trabalhado durante toda a
semana anterior, cumprindo integralmente o seu horário de trabalho.
§ 1º São motivos justificados:
(...)
f) a doença do empregado, devidamente
comprovada.
Vale ressaltar que, em regra, essa
doença deverá ser devidamente comprovada para haver esse abono da falta. Segundo
a jurisprudência do TSE, essa comprovação é feita pelo serviço médico próprio da
empresa ou àquele que for mantido mediante convênio. SE a empresa não possui
médico próprio, é possível que o trabalhador apresente atestado emitido por outro
médico de sua escolha.
Ocorre que, neste período de
pandemia, não tem sido fácil obter essa comprovação.
Pensando
nisso, a Lei nº 14.128/2021 acrescentou dois parágrafos ao art. 6º prevendo que,
nesse período, o trabalhador que estiver doente não precisará comprovar a doença
se o seu afastamento for de até 7 dias:
Art. 6º (...)
§ 4º Durante período de emergência em saúde pública decorrente da
Covid-19, a imposição de isolamento dispensará o empregado da comprovação de
doença por 7 (sete) dias.
A partir do 8º
dia, se o trabalhador ainda não estiver apto a retornar ao trabalho, ele poderá
apresentar documento de unidade de saúde do SUS ou documento eletrônico
regulamentado pelo Ministério da Saúde:
Art. 6º (...)
§ 5º No caso de imposição de isolamento em razão da Covid-19, o
trabalhador poderá apresentar como justificativa válida, no oitavo dia de
afastamento, além do disposto neste artigo, documento de unidade de saúde do
Sistema Único de Saúde (SUS) ou documento eletrônico regulamentado pelo
Ministério da Saúde.
Vigência
A Lei nº 14.128/2021 entrou em
vigor na data de sua publicação (26/03/2021).