SÚMULA VINCULANTE 33 – ANTES DA EC 103/2019
O que é aposentadoria especial?
Aposentadoria especial é aquela cujos requisitos e
critérios exigidos do beneficiário são mais favoráveis que os estabelecidos
normalmente para as demais pessoas.
Quem tem direito à aposentadoria especial no
serviço público?
Antes da Reforma da Previdência (EC 103/2019), a Constituição Federal dizia o seguinte:
Art. 40
(...) § 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a
concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo,
ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de
servidores:
I -
portadores de deficiência;
II - que
exerçam atividades de risco;
III - cujas
atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a
integridade física.
O § 4º do art. 40 da CF exigia,
portanto, que fossem editadas leis complementares definindo os critérios para a
concessão da aposentadoria especial aos servidores públicos em cada uma das
hipóteses dos incisos acima listados.
A lei complementar de que trata o inciso III já tinha
sido editada?
NÃO.
O que acontecia, já que não existia a LC?
Como ainda não havia a referida lei complementar
disciplinando a aposentadoria especial do servidor público, o STF reconheceu
que o Presidente da República estava em “mora legislativa” por ainda não ter
enviado ao Congresso Nacional o projeto de lei para regulamentar o antigo art.
40, § 4º, III da CF/88. Diante disso, o STF, ao julgar o Mandado de Injunção nº
721/DF (e vários outros que foram ajuizados depois), determinou que, enquanto
não fosse editada a LC regulamentando o antigo art. 40, § 4º, III, da CF/88, deveriam
ser aplicadas, aos servidores públicos, as regras de aposentadoria especial dos
trabalhadores em geral (regras do Regime Geral de Previdência Social — RGPS),
previstas no art. 57 da Lei nº 8.213/91.
Logo, os servidores públicos que exerciam
atividades sob condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou integridade
física (antigo art. 40, § 4º, III da CF/88) teriam direito de se aposentar com
menos tempo de contribuição que os demais agentes públicos.
O STF editou uma súmula espelhando o entendimento:
Súmula vinculante 33-STF: Aplicam-se ao servidor público, no que
couber, as regras do Regime Geral de Previdência Social sobre aposentadoria
especial de que trata o artigo 40, parágrafo 4º, inciso III, da Constituição
Federal, até edição de lei complementar específica.
Vale ressaltar que a SV 33-STF somente trata sobre
a aposentadoria especial do servidor público baseada no inciso III do § 4º do
art. 40 da CF/88 (atividades sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou
a integridade física), não abrangendo as hipóteses dos incisos I (deficientes)
e II (atividades de risco).
CONVERSÃO DO TEMPO
ESPECIAL EM TEMPO COMUM – ANTES DA EC 103/2019
Imagine a seguinte situação hipotética:
A lei prevê a aposentadoria especial para aqueles
que trabalharam durante 25 anos em condições insalubres.
Maria laborou, em uma empresa privada, durante 20
anos em atividades especiais (trabalho exposto a radiação) e 6 anos em
atividade comum (não insalubres). Logo, não terá direito à aposentadoria
especial, que exige 25 anos de atividades especiais para o caso de radiação
(item 1.1.4 do Decreto nº 53.831/64).
Poderá ela somar os 20 anos de atividades insalubres
com os 6 anos de atividades comuns?
SIM.
Ao converter estes 20 anos de atividades especiais
em tempo de atividades comuns, haverá algum tipo de acréscimo (contagem de
tempo diferenciada)?
SIM. O tempo de trabalho exercido sob condições
especiais consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será
convertido em “tempo comum” (exercido em atividade comum) e nesta conversão vão
ser aplicados alguns índices matemáticos que farão com que o tempo se torne
maior.
Ex.: 20 anos = 7300 dias de tempo comum. No
entanto, como esses 20 anos foram prestados em atividade especial, para serem
convertidos em tempo comum, eles devem ser multiplicados por 1,2. Assim,
teremos 7.300 x 1,2 = 8.760.
Logo, 7.300 dias trabalhados sob o regime especial
podem se transformar em 8.760 dias caso este período de tempo especial seja
convertido em tempo comum.
No exemplo acima, Maria
trabalhou 20 anos (7.300 dias) em atividades especiais e 6 anos (2.190 dias) em
atividade comum. Logo, não conseguirá a aposentadoria especial (que exige 25
anos de atividade especial).
Maria irá, então, somar os períodos para ver se
consegue a aposentadoria comum (não especial).
Os 7.300 dias trabalhados irão virar 8.760 dias.
Dessa forma, ela irá somar 8.760 + 2.190 = 10.950
dias (30 anos) para fins de aposentadoria.
Onde está previsto este índice de conversão de
1,20?
Os índices de conversão de “tempo especial” em
“tempo comum” estão previstos no art. 70 do Decreto nº 3.048/99. Ressalte-se
que há outros índices, além deste de 1,20 e eles irão variar de acordo com a
atividade especial (Obs.: há muitas polêmicas sobre esse tema, mas elas não
interessam para os objetivos desta explicação).
Antes da Reforma da Previdência (EC 103/2019), os
servidores públicos que exerçam atividades sob condições especiais
que prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 40, § 4º, III
da CF/88) podiam se valer destes índices para fazer a conversão do “tempo
especial” trabalhado em “tempo comum”?
SIM.
Até a edição da EC 103/2019, o direito à conversão,
em tempo comum, do prestado sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou
a integridade física de servidor público era possível. Isso decorria da
previsão contida na CF/88 no sentido de que deveriam ser adotados requisitos e
critérios diferenciados para a jubilação (aposentadoria) da pessoa enquadrada
na hipótese prevista no inciso III do § 4º do art. 40 da CF/88.
Logo, deveriam ser aplicadas as normas da aposentadoria
especial do regime geral, previstas na Lei nº 8.213/91 enquanto não houvesse
lei complementar disciplinando a matéria.
Exemplo:
João era servidor público estadual, ocupando o
cargo de assistente agropecuário. Durante 10 anos, ele exerceu esse cargo, prestando
o serviço em condições insalubres. Em seguida, ele pediu exoneração.
João não chegou a completar o tempo necessário para
adquirir a aposentadoria especial. No entanto, a despeito disso, ele terá
direito de averbar o tempo de serviço prestado em atividades prejudiciais à
saúde, com a conversão em tempo comum, mediante contagem diferenciada, para a obtenção
de benefícios previdenciários. Em outras palavras, ele poderá utilizar os índices
matemáticos de conversão para aproveitar esse tempo especial como tempo comum.
REGIME POSTERIOR À EC
103/2019
A Reforma da Previdência (EC 103/2019) alterou a redação do §
4º do art. 40:
CONSTITUIÇÃO FEDERAL |
|
Antes da EC 103/2019 |
Depois da EC 103/2019 |
Art. 40 (...) § 4º É vedada a adoção de
requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos
abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos
definidos em leis complementares, os casos de servidores: I - portadores de deficiência; II - que exerçam atividades de
risco; III - cujas atividades sejam
exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física. |
Art. 40 (...) § 4º É vedada a adoção de requisitos ou critérios
diferenciados para concessão de benefícios em regime próprio de previdência
social, ressalvado o disposto nos §§ 4º-A, 4º-B, 4º-C e 5º. |
Não havia § 4º-C. |
Art. 40 (...) § 4º-C. Poderão ser estabelecidos por lei
complementar do respectivo ente federativo idade e tempo de contribuição
diferenciados para aposentadoria de servidores cujas atividades sejam
exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos
prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização
por categoria profissional ou ocupação. |
A EC 103/2019 previu agora que ente federado poderá
estabelecer, por lei complementar, idade e tempo de contribuição diferenciados
para aposentadoria de servidores cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição
a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação
desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação.
Desse modo, após EC 103/2019, não se pode mais afirmar
que os servidores tenham direito à conversão com base na aplicação do regime
geral. Para se ter direito à conversão, é necessário que o respectivo ente
edite uma lei complementar prevendo.
Em suma:
Até a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019,
o direito à conversão, em tempo comum, do prestado sob condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física de servidor público decorre da
previsão de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a jubilação
daquele enquadrado na hipótese prevista no então vigente inciso III do § 4º do
art. 40 da Constituição da República, devendo ser aplicadas as normas do regime
geral de previdência social relativas à aposentadoria especial contidas na Lei
nº 8.213/91 para viabilizar sua concretização enquanto não sobrevier lei
complementar disciplinadora da matéria.
Após a vigência da EC nº 103/2019, o direito à
conversão em tempo comum, do prestado sob condições especiais pelos servidores
obedecerá à legislação complementar dos entes federados, nos termos da
competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da Constituição da República.
STF. Plenário. RE 1014286, Rel. Luiz Fux, Relator
p/ Acórdão Edson Fachin, julgado em 31/08/2020 (Repercussão Geral – Tema 942)
(Info 992 – clipping).
Observação:
Cuidado com o segundo parágrafo da tese acima exposta. Isso
porque essa tese, aparentemente, está em desarmonia com o § 3º do art. 10 da EC
103/2019. Veja:
Art. 10. Até que entre em vigor lei
federal que discipline os benefícios do regime próprio de previdência social
dos servidores da União, aplica-se o disposto neste artigo.
(...)
§ 3º A aposentadoria a que se refere o
§ 4º-C do art. 40 da Constituição Federal observará adicionalmente as condições
e os requisitos estabelecidos para o Regime Geral de Previdência Social,
naquilo em que não conflitarem com as regras específicas aplicáveis ao regime
próprio de previdência social da União, vedada a conversão de tempo especial em
comum.
O STF não debateu com profundidade
o tema porque o objeto do recurso envolvia um caso anterior à EC 103/2019. Mais
para frente esse assunto deverá ser novamente discutido com maior atenção pela
Corte.
Por enquanto, para fins de
provas, guarde essas duas afirmações como corretas:
• Após a vigência da EC nº
103/2019, o direito à conversão em tempo comum, do prestado sob condições
especiais pelos servidores obedecerá à legislação complementar dos entes
federados, nos termos da competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da
Constituição da República. (certo)
• A aposentadoria especial a que
se refere o § 4º-C do art. 40 da Constituição Federal observará adicionalmente
as condições e os requisitos estabelecidos para o Regime Geral de Previdência
Social, naquilo em que não conflitarem com as regras específicas aplicáveis ao
regime próprio de previdência social da União, vedada a conversão de tempo
especial em comum. (certo).