Contribuições para a seguridade social
A CF/88 prevê, em seu art. 195, as
chamadas “contribuições para a seguridade social”.
Consistem em uma espécie de tributo cuja arrecadação é
utilizada para custear a seguridade social (saúde, assistência e previdência
social). Veja o texto da Constituição:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de
forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das
seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma
da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou
creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo
sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;
II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não
incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime
geral de previdência social de que trata o art. 201;
III - sobre a receita de concursos de prognósticos;
IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a
ele equiparar.
A CF/88 determina
que os recursos arrecadados com as contribuições previstas no art. 195, I, “a”
e II serão destinados exclusivamente para o pagamento de benefícios
previdenciários do RGPS (administrado pelo INSS).
Em razão disso, a maioria dos autores
de Direito Previdenciário denomina as contribuições do art. 195, I, “a” e II de
“contribuições previdenciárias”, como se fossem uma subespécie das
contribuições para a seguridade social. Nesse sentido: Frederico Amado.
Contribuições
previdenciárias
A contribuição previdenciária é uma
espécie de tributo cujo dinheiro arrecadado é destinado ao pagamento dos
benefícios do RGPS (aposentadoria, auxílio-doença, pensão por morte etc.)
Existem duas espécies de contribuição previdenciária:
Paga por quem |
Incide sobre o que |
1ª) Trabalhador e demais segurados do
RGPS (art. 195, II). |
Incide sobre o salário de
contribuição, exceto no caso do segurado especial. |
2ª) Empregador, empresa ou entidade
equiparada (art. 195, I, “a”). |
Incide sobre a folha de salários e
demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à
pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício. |
Para que incida a contribuição
previdenciária sobre os valores pagos aos empregados é necessário que a verba
paga tenha duas características cumulativas:
a) precisa ter natureza remuneratória;
e
b) deve ter um caráter de habitualidade.
Vamos analisar se os valores pagos a
título de férias estão, ou não, sujeitos à contribuição previdenciária.
Férias
O art. 7º, XVII, da CF/88
assegura aos trabalhadores o direito a férias anuais.
No mês das férias, o trabalhador, além de ter direito ao
descanso, receberá uma verba adicional correspondente a um terço a mais do seu
salário normal. A isso chamamos de “terço constitucional de férias” porque foi
introduzido pela CF/88.
Art. 7º São direitos dos trabalhadores
urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XVII - gozo de férias anuais
remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;
Ex: João recebe o salário de R$ 1
mil. Na época das férias, ele receberá R$ 1.300,00, ou seja, o salário normal
(R$ 1 mil) acrescido de um terço (R$ 300,00).
Incide contribuição previdenciária
sobre o salário do trabalhador pago durante as férias por ele gozadas? Ex: no mês de março João estava
de férias, mesmo assim, a empresa terá que pagar a contribuição previdenciária?
SIM. Incide
contribuição previdenciária sobre o pagamento de férias gozadas.
Isso porque essa verba possui natureza remuneratória e salarial, nos
termos do art. 148 da CLT. Logo, integra o salário de contribuição.
Em nosso exemplo, a alíquota da
contribuição será aplicada sobre os R$ 1 mil.
Incide contribuição previdenciária
sobre o valor do terço
de férias gozadas? No momento de fazer o cálculo da quantia que a
empresa irá pagar como contribuição previdenciária, deverá a alíquota recair
também sobre o terço de férias?
• STJ: decidiu que não, ou seja, que não deveria incidir. Isso
porque, para o STJ, o terço de férias gozadas não teria natureza remuneratória e,
além disso, não seria um ganho habitual do empregado. Logo, não preencheu nenhum
dos dois requisitos acima mencionados. Veja:
A importância paga
a título de terço constitucional de férias possui natureza
indenizatória/compensatória, e não constitui ganho habitual do empregado, razão
pela qual sobre ela não é possível a incidência de contribuição previdenciária
(a cargo da empresa).
STJ. 1ª Seção. REsp
1230957/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 26/02/2014 (Recurso Repetitivo
– Tema 479) (Info 536).
Assim, em nosso exemplo, segundo
o entendimento do STJ, a empresa teria que pagar a contribuição previdenciária
sobre o valor das férias (alíquota que incidirá sobre 1.000 reais), mas não
sobre o valor do terço de férias (300 reais).
• STF: seis anos depois do entendimento acima fixado, o STF
decidiu de forma diversa. Confira:
É legítima a incidência de
contribuição social, a cargo do empregador, sobre os valores pagos ao empregado
a título de terço constitucional de férias gozadas.
STF.
Plenário. RE 1072485, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 31/08/2020
(Repercussão Geral – Tema 985) (Info 993 – clipping).
Para o STF, o terço constitucional de
férias preenche esses dois pressupostos.
Primeiro requisito: ser verba
remuneratória
Segundo o Min. Marco Aurélio, quando se
fala em natureza remuneratória, isso engloba todos “os rendimentos pagos em
decorrência do contrato de trabalho em curso”, com exceção das verbas nitidamente
indenizatórias. Verbas nitidamente indenizatórias seria aquelas “destinadas a
recompor o patrimônio jurídico do empregado, em razão de alguma perda ou violação
de direito”.
O terço constitucional pago não teria caráter
de verba indenizatória. Logo, seria remuneratória.
Segundo requisito: ter natureza de habitualidade
É habitual porque se trata de verba
auferida, periodicamente, como complemento à remuneração. Adquire-se o direito,
conforme o decurso do ciclo de trabalho, sendo um adiantamento em reforço ao
que pago, ordinariamente, ao empregado, quando do descanso.
O contrário de habitual é eventual. Eventual
é um recebimento desprovido de previsibilidade. Não se pode dizer que seja o pagamento
do terço constitucional de férias seja eventual. Isso porque ele se repete em
um contexto temporal e decorre de uma previsibilidade inerente ao contrato de
trabalho.
Desse modo, como o tema envolve a
interpretação do texto constitucional, o STJ terá que se adequar ao
entendimento fixado pelo STF. Acompanhem.
Vale registrar que, no que se refere ao
âmbito do imposto de renda, o STJ já tinha o entendimento de que essa verba tem
natureza remuneratória. Veja:
Incide imposto de
renda sobre o adicional de 1/3 (um terço) de férias gozadas.
Essa verba tem
natureza remuneratória (e não indenizatória) e configura acréscimo patrimonial.
STJ. 1ª Seção.
REsp 1459779-MA, Rel. para acórdão Min. Benedito Gonçalves, julgado em
22/04/2015 (recurso repetitivo) (Info 573).
Vamos analisar agora um último aspecto
relacionado com o assunto.
O que acontece se a pessoa for
mandada embora sem ter gozado as férias a que tem direito?
Nesse caso, o empregador deverá
pagar uma indenização ao trabalhador. A isso chamamos de “férias indenizadas”.
Além da indenização, o trabalhador receberá também o adicional de 1/3.
Incide contribuição previdenciária
sobre o valor das
férias indenizadas? Incide contribuição previdenciária sobre o valor do terço de férias indenizadas?
NÃO. A resposta é não para as duas perguntas.
Não incide contribuição previdenciária
sobre o pagamento de férias indenizadas.
Também não incide
contribuição previdenciária a cargo da empresa sobre o valor pago a título de
terço constitucional de férias indenizadas.
A própria Lei nº 8.212/91 afirma que não incide a
contribuição previdenciária. Veja:
Art. 28 (...)
§ 9º Não integram o
salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente:
d) as importâncias recebidas a título
de férias indenizadas e respectivo adicional
constitucional, inclusive o valor correspondente à dobra da remuneração
de férias de que trata o art. 137 da Consolidação das Leis do Trabalho-CLT;
Para finalizar, trago à colação os ensinamentos do Min. Maurício
Godinho Delgado:
“Terço
constitucional de férias é a parcela suplementar que se agrega,
necessariamente, ao valor pertinente às férias trabalhistas, à base de um terço
desse valor. À figura tem sido consignada também a equívoca denominação “abono constitucional
de férias”.
A análise de sua natureza jurídica desenvolve-se a partir da constatação de que a verba tem nítido caráter acessório: trata-se de percentagem incidente sobre as férias. Como acessório que é, assume a natureza da parcela principal a que se acopla. Terá, desse modo, caráter salarial nas férias gozadas ao longo do contrato; terá natureza indenizatória nas férias indenizadas na rescisão.” (Curso de direito do trabalho. 11ª ed. São Paulo: LTr, 2012, p. 1003).