Disciplina
O condenado que está cumprindo pena, bem como o
preso provisório, possuem o dever de obedecer determinadas normas
disciplinares. A LEP trata sobre o tema nos arts. 44 a 60.
Faltas disciplinares
Caso o indivíduo descumpra alguma das normas de
disciplina impostas, dizemos que ele praticou uma falta disciplinar. As faltas
disciplinares classificam-se em: leves, médias e graves.
Onde estão previstas as faltas disciplinares?
• Faltas leves e médias: são definidas pela
legislação local (estadual), que deverá prever ainda as punições aplicáveis.
• Faltas graves: estão previstas nos arts. 50 a 52
da LEP. Vale lembrar que a competência para legislar sobre direito
penitenciário é concorrente, conforme determina o art. 24, I, da CF/88.
Sanções disciplinares
Se ficar realmente comprovado que o reeducando
praticou uma falta, ele receberá uma sanção disciplinar. Como vimos, no caso de
faltas leves e médias, as sanções disciplinares devem ser definidas pela lei
estadual. Na hipótese de faltas graves, a própria LEP é quem as prevê.
Para que seja aplicada a sanção disciplinar, é imprescindível
a prévia realização de processo administrativo disciplinar, com contraditório e
ampla defesa?
O STJ entendia que sim. O Tribunal editou
até um enunciado sobre o tema:
Súmula 533-STJ: Para o reconhecimento da prática de falta
disciplinar no âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de
procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional,
assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado constituído ou defensor
público nomeado.
Aprovada em 10/06/2015, DJe 15/06/2015.
Tese levantada pelo MP
Ocorre que o Ministério Público não se conformou
com essa posição e recorreu ao STF alegando que, se o apenado é ouvido em
audiência judicial na qual ele tem a possibilidade de se defender
(“justificar”) da alegação de que cometeu falta grave, essa audiência já supre
a necessidade de processo administrativo disciplinar. Isso porque não haveria,
neste caso, prejuízo.
O STF concordou com o argumento do MP?
SIM.
O STF tem entendido que a oitiva do condenado em
audiência de justificação realizada na presença do defensor e do Ministério
Público afasta a necessidade de prévio Procedimento Administrativo Disciplinar
(PAD), assim como supre a eventual ausência ou a insuficiência de defesa
técnica no PAD.
Se a audiência de justificação foi realizada, conseguiu-se
alcançar, por outro meio, a finalidade essencial que era pretendida no procedimento
administrativo disciplinar. Logo, não há que se falar em inobservância dos
preceitos constitucionais do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e
LV, da CF/88).
O procedimento judicial conta com mais e maiores garantias
que o procedimento administrativo. Esta é a razão pela qual a decisão
administrativa sempre pode ser revista judicialmente, prevalecendo, sempre, a
decisão judicial sobre a administrativa. É o chamado “sistema de jurisdição
una”.
E essa audiência de justificação é realizada com
frequência? Qual é a base legal para isso?
SIM. A prática de falta grave acarreta
a regressão de regime (salvo se ele já estiver no regime fechado). Para o
apenado regredir, a LEP exige a realização da audiência de justificação, nos
termos do art. 118, § 2º:
Art. 118. A execução da pena privativa
de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para
qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado:
I - praticar fato definido como crime
doloso ou falta grave;
(...)
§ 2º Nas hipóteses do inciso I e do
parágrafo anterior, deverá ser ouvido previamente o condenado.
Mas o art. 59 da LEP fala que deve ser realizado procedimento
administrativo disciplinar...
Veja o estabelece o art. 59:
Art. 59. Praticada a falta disciplinar,
deverá ser instaurado o procedimento para sua apuração, conforme
regulamento, assegurado o direito de defesa.
O art. 59 da LEP, ao exigir a instauração de um
processo administrativo disciplinar, pretendeu impedir que houvesse a imposição
arbitrária de sanções pela autoridade administrativa, sem que fosse assegurado
o contraditório e a ampla defesa. No entanto, esse dispositivo não impede que a
apuração da falta grave ocorra em juízo, com a observância dessas garantias. Assim,
a realização da audiência de justificação supre a exigência do art. 59.
Na audiência de justificação, o apenado só irá dar
sua versão dos fatos ou ele poderá produzir outras provas?
Poderá produzir provas.
Na audiência de justificação, não há impedimento de
que o apenado junte documentos e arrole testemunhas, exercendo assim de forma
plena o seu direito à ampla defesa e ao contraditório.
Logo, é redundante fazer o processo administrativo
disciplinar e depois a audiência de justificação.
Em uma estrutura congestionada como o da execução
penal, qualquer atividade redundante ou puramente formal significa desvio de
recursos humanos ou da atividade principal do Juízo, inclusive e notadamente, a
de assegurar os benefícios legais para que ninguém permaneça no cárcere em
prazo superior à condenação.
De modo que a apuração de falta grave em
procedimento judicial, com as garantias a ele inerentes, perante o juízo da
Execução Penal, não só é compatível com os princípios do contraditório e da
ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CF) como torna desnecessário o prévio procedimento
administrativo, o que atende, por igual, ao princípio da eficiência (art. 37 da
CF/88).
Tese
O STF fixou a seguinte tese a respeito do tema:
STF. Plenário. RE 972598, Rel. Roberto Barroso,
julgado em 04/05/2020 (Repercussão Geral – Tema 941) (Info 985 – clipping).
E o STJ?
O STJ passou a se curvar ao entendimento do STF.
Nesse sentido:
(...) 4. Comprovado que se assegurou ao paciente o regular
exercício do direito de defesa, na sede da audiência de justificação realizada
no caso concreto, inexiste qualquer nulidade a ser sanada, nem constrangimento
ilegal a ser reparado. (...)
STJ. 6ª Turma. AgRg no HC 581.854/PR, Rel. Min. Nefi Cordeiro,
julgado em 04/08/2020.
Isso significa que está superada – apesar de não
formalmente cancelada – a Súmula 533 do STJ.
Também risque dos seus materiais a Tese 4 do
Jurisprudência em Teses do STJ (Ed. 7), que tem a mesma redação da Súmula 533
do STJ.