Imagine a seguinte situação adaptada:
Rita e Adriana trabalhavam em uma
repartição pública.
Rita ligou para o ramal
telefônico de Adriana para falar sobre um requerimento de abono de faltas que
ela havia solicitado.
Adriana avisou, então, que
Reginaldo (chefe do setor) havia indeferido o pedido.
Ao saber de tal fato, Rita passou
a proferir ofensas contra ele, afirmando para Adriana: “este macaco, preto sem
vergonha está indeferindo a minha falta” (sic).
Vale ressaltar, contudo, que,
momentos antes, Reginaldo, que estava no mesmo setor que Adriana, havia
retirado o telefone do gancho para fazer uma ligação e acabou por ouvir as
palavras injuriosas proferidas por Rita.
O Ministério Público ofereceu denúncia contra Rita
pela prática do crime de injúria racial (art. 140, § 3º do CP):
Art. 140 (...)
§ 3º Se a injúria consiste na
utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a
condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
Pena - reclusão de um a três anos e
multa.
Houve crime de injúria?
NÃO. Para o
STJ, não houve crime.
A ausência de previsibilidade de que a ofensa chegue
ao conhecimento da vítima afasta o dolo específico do delito de injúria,
tornando a conduta atípica
STJ. 6ª Turma. REsp 1.765.673-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior,
julgado em 26/05/2020 (Info 672).
A acusada não tinha como saber
que a vítima estava ouvindo o teor da conversa pela extensão telefônica.
Consumação da injúria e
elemento subjetivo especial
O delito de injúria se consuma
quando a ofensa chega ao conhecimento da vítima, sendo necessário dolo
específico de ofender a honra subjetiva da vítima.
Como a injúria se consuma com a
ofensa à honra subjetiva de alguém, não há falar em dolo específico no caso em
que a vítima não era seu interlocutor na conversa telefônica e, acidentalmente,
tomou conhecimento do teor da conversa.
O tipo penal em questão exige que
a ofensa seja dirigida ao ofendido com a intenção de menosprezá-lo,
ofendendo-lhe a honra subjetiva.
Veja outro julgado semelhante a
esse:
(...) No caso dos autos, verifica-se que em uma conversa
particular travada via e-mail com outro membro do Ministério Público, o
paciente teria proferido ofensas contra a vítima, tendo o diálogo chegado ao
conhecimento desta em razão de um descuido do acusado, que, ao invés de
responder unicamente ao remetente, encaminhou as mensagens acidentalmente para
todos os membros do Ministério Público do Estado do Espírito Santo, o que
demonstra a ausência de intenção de macular a honra do querelante, já que em
momento algum desejou dar publicidade às mensagens trocadas com seu colega.
5. Ademais, não se pode afirmar que no âmbito restrito dos
e-mails trocados entre o paciente e o outro querelado teria havido o dolo de
ofender a honra de quem quer que seja, pois o conteúdo das mensagens entre eles
trocada revela, nitidamente, que estariam desabafando um com o outro, sem a
intenção específica de denegrir o suposto ofendido. (...)
STJ. 5ª Turma. HC 256.989/ES, Min. Jorge Mussi, DJe 5/2/2014.
DOD Dicas
Dois aspectos sobre o crime de
injúria são muito cobrados em provas objetivas:
1) a
redação do §§ 1º, 2º e 3º do art. 140:
Art. 140 (...)
§ 1º O juiz pode deixar de aplicar a
pena:
I - quando o ofendido, de forma
reprovável, provocou diretamente a injúria;
II - no caso de retorsão imediata, que
consista em outra injúria.
§ 2º Se a injúria consiste em violência
ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem
aviltantes:
Pena - detenção, de três meses a um
ano, e multa, além da pena correspondente à violência.
§ 3º Se a injúria consiste na
utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a
condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
Pena - reclusão de um a três anos e
multa.
++ (DPE/AM 2018 FCC) Comete o
crime de injúria aquele que ofende a dignidade de alguém com utilização de
elementos referentes à condição de pessoa idosa. (certo)
++ (MP/GO 2019) No crime de
injúria, o juiz pode deixar de aplicar a pena quando o ofendido, de forma
reprovável, provocou diretamente a injúria; e também no caso de retorsão
imediata, que consista em outra injúria. (certo)
2) a ação penal no crime de
injúria:
Regra: ação penal PRIVADA.
Exceções:
2.1) ação pública incondicionada:
se da injúria real resultar lesão grave ou gravíssima (art. 145, caput).
2.2) ação pública condicionada à
requisição do Ministro do Justiça: se a injúria foi praticada contra Presidente
da República ou chefe de governo estrangeiro (art. 145, parágrafo único).
2.3) ação pública condicionada à
representação do ofendido:
a) em caso de crime contra
funcionário público no exercício de suas funções (Súmula 714 do STF).
b) se da injúria real resultar
lesão leve (art. 145, caput, do CP).
c) injúria qualificada do § 3º do
art. 140 (injúria com preconceito).
++ (Juiz de Direito TJ/MS 2020
FCC) Quanto aos crimes contra a honra, a ação penal é pública incondicionada na
injúria com preconceito. (errado)
++ (MP/GO 2019) O crime de
injúria consistente na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia,
religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência é de
ação pública incondicionada. (errado)
++ (Juiz de Direito TJ/MS 2020
FCC) Quanto aos crimes contra a honra, possível a propositura de ação penal
privada no caso de servidor público ofendido em razão do exercício de suas
funções. (certo)
++ (MP/SP 2019) Nos crimes contra
a honra, a ação penal,
A) no crime contra chefe de
governo estrangeiro, será pública condicionada à representação.
B) no crime contra funcionário
público, em razão de suas funções, será pública condicionada à representação.
C) no crime de injúria real, será
de iniciativa privada, ainda que resulte lesão corporal.
D) no crime de injúria racial,
será de iniciativa privada.
E) no crime contra Presidente de
República, será pública condicionada à representação.