Imagine a seguinte situação
adaptada:
A Esso Petróleo Ltda, após obter licença
ambiental do Instituto de Proteção Ambiental do Paraná – IAP (autarquia estadual),
construiu um posto de gasolina.
Para a construção do empreendimento, foi necessário
o corte de 3 hectares de vegetação, o que estava autorizado na licença
concedida (autorização de desmate).
Ocorre que, depois de algum tempo, o
Ministério Público ajuizou ação de indenização contra a empresa alegando que o
corte das árvores foi indevido porque realizado em vegetação integrante da Mata
Atlântica, área ambiental protegida.
O Ministério Público alegou, portanto, que a licença
não deveria ter sido concedida, razão pela qual a obra foi irregular.
A empresa se defendeu alegando que agiu
amparado pela licença ambienta. que acreditava ser legítima e que, portanto, foi
vítima do erro do IAP, que deve ser considerado exclusivo responsável pela
reparação do dano.
Argumentou, em suma, que houve culpa exclusiva
de terceiro.
A questão chegou até o STJ.
O Tribunal concordou com os argumentos da empresa?
NÃO.
Responsabilidade ambiental
é objetiva
Os danos ambientais são regidos
pelo modelo da responsabilidade objetiva, previsto genericamente no parágrafo
único do art. 927 do Código Civil e, de forma específica, na Lei nº 6.938/81.
O objetivo é garantir a reparação
do dano, independentemente da verificação de culpa.
Teoria do risco integral
A
responsabilidade por danos ambientais, além de ser objetiva, é regida pela teoria
do risco integral, nos termos do art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81,
recepcionado pelo art. 225, §§ 2º, e 3º, da CF/88:
Art. 14 (...)
§ 1º Sem obstar a aplicação das
penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da
existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente
e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos
Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal,
por danos causados ao meio ambiente.
Teoria do risco integral é
justificada pelo princípio do poluidor-pagador
Os danos ambientais são regidos
pela teoria do risco integral, o que se justifica pelo princípio do
poluidor-pagador e pela vocação redistributiva do Direito Ambiental.
Segundo o princípio do
poluidor-pagador, os custos sociais externos que estão ligados ao processo
produtivo (“prejuízos que aquela atividade econômica pode causar para a sociedade”
- ex: danos ambientais) devem ser internalizados, ou seja, devem ser levados em
consideração pela empresa no momento de calcular seus custos e, como
contrapartida, caso esses danos realmente aconteçam, a empresa será sempre obrigada
a repará-los.
Esse modelo oferece maior
proteção do meio ambiente, patrimônio coletivo da sociedade, impondo aos
agentes econômicos a internalização dos custos externos envolvidos em sua
atividade privada. Com isso, evita-se a “privatização de lucros e a
socialização de perdas”.
O que significa, na prática,
adotar a teoria do risco integral?
A adoção da teoria do risco
integral significa que o causador do dano ambiental não pode invocar causas
excludentes de responsabilidade, tais como o caso fortuito, a força maior, fato
de terceiro ou culpa exclusiva da vítima. Nesse sentido:
A responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela
teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que
permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação,
pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de
responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar.
STJ. 2ª Seção. REsp 1374284/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado
em 27/08/2014.
Veja a importância de estudar
jurisprudência:
++ (Juiz TJ/RS 2018 VUNESP) A
responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco
integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco
se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa
responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para
afastar sua obrigação de indenizar. (certo)
A empresa que explora a atividade
econômica se coloca na posição de garantidor da preservação ambiental, e os
danos que digam respeito à atividade estarão sempre vinculados a ela. Por isso,
é descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de
excludentes de responsabilidade civil para afastar a sua obrigação de
indenizar.
Para que haja responsabilidade
basta que se prove a ocorrência de resultado prejudicial ao homem e ao ambiente
advinda de uma ação ou omissão do responsável.
Voltando ao caso concreto:
A tese da empresa é a de que o erro
na concessão da licença ambiental deveria configurar fato de terceiro capaz de
interromper o nexo causal, o que, por sua vez, deveria isentar-lhe da obrigação
de reparar a lesão ao meio ambiente.
Essa alegação não pode ser
acolhida em virtude da adoção da teoria do risco integral.
Por se tratar de dano ambiental,
regido pela teoria do risco integral, não cabe ao responsável pela atividade –
exploração econômica de posto de combustíveis – a alegação de qualquer causa
exonerativa da responsabilidade, mesmo que pela suposta interrupção do nexo
causal por fato de terceiro.
Assim, mesmo que se considere que
a instalação do posto de combustíveis somente tenha ocorrido em razão de erro
na concessão da licença ambiental, é o exercício dessa atividade, de
responsabilidade da empresa, que gera o risco concretizado no dano ambiental,
razão pela qual não há possibilidade de eximir-se da obrigação de reparar a
lesão ambiental verificada.
Em suma:
Os danos ambientais são regidos pela teoria do risco
integral. A pessoa que explora a atividade econômica ocupa a posição de
garantidor da preservação ambiental, sendo sempre considerado responsável pelos
danos vinculados à atividade. Logo, não se pode admitir a exclusão da
responsabilidade pelo fato exclusivo de terceiro ou força maior.
No caso concreto, a construção de um posto de
gasolina causou danos em área ambiental protegida. Mesmo tendo havido a
concessão de licença ambiental – que se mostrou equivocada – isso não é causa
excludente da responsabilidade do proprietário do estabelecimento.
Mesmo que se considere que a instalação do posto de
combustível somente tenha ocorrido em razão de erro na concessão da licença
ambiental, é o exercício dessa atividade, de responsabilidade do empreendedor,
que gera o risco concretizado no dano ambiental, razão pela qual não há
possibilidade de eximir-se da obrigação de reparar a lesão verificada.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.612.887-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado
em 28/04/2020 (Info 671).