sexta-feira, 7 de agosto de 2020
Lei 14.034/2020: dispõe sobre medidas emergenciais para a aviação civil brasileira em razão da pandemia da Covid-19
sexta-feira, 7 de agosto de 2020
Olá, amigos do Dizer o Direito,
Foi publicada ontem (06/08) a Lei
nº 14.034/2020, que dispõe sobre medidas emergenciais para a aviação civil
brasileira em razão da pandemia da Covid-19.
Podemos dividir a lei em duas
partes:
1) Na primeira, realmente a Lei
nº 14.034/2020 prevê medidas emergenciais para atenuar os efeitos da crise econômica
decorrente da pandemia da Covid-19 na aviação civil brasileira. São regras com
efeitos temporários, tendo como objetivo dar um “fôlego” econômico às
companhias aéreas.
2) Na segunda parte, contudo, a
Lei nº 14.034/2020 aproveita a oportunidade para promover alterações na legislação
que rege a aviação civil brasileira. Essas mudanças não são temporárias e não
possuem relação direta com a pandemia da Covid-19.
Neste primeiro post, irei tratar
apenas da primeira parte, ou seja, das medidas emergenciais para atenuar os
efeitos da crise econômica decorrente da pandemia da Covid-19 na aviação civil
brasileira.
CANCELAMENTO DO VOO PELA
COMPANHIA E OPÇÕES DADAS AO CONSUMIDOR
Em razão das medidas restritivas
decorrentes do coronavírus, muitos voos foram cancelados.
Diante disso, os consumidores que
adquiriram os bilhetes precisam ser ressarcidos.
Ocorre que, como houve um fluxo
muito grande imediato de cancelamentos, as companhias argumentaram que não
tinham condições de fazer o reembolso imediato de todos os clientes, sob pena
de terem que interromper suas atividades.
A Lei nº 14.034/2020 acolheu esse
pleito e previu as seguintes opções:
1) Reembolso do valor da
passagem aérea em até 12 meses
Art. 3º O reembolso do valor da passagem aérea devido
ao consumidor por cancelamento de voo no período compreendido entre 19 de março
de 2020 e 31 de dezembro de 2020 será realizado pelo transportador no prazo de
12 (doze) meses, contado da data do voo cancelado, observadas a atualização
monetária calculada com base no INPC e, quando cabível, a prestação de
assistência material, nos termos da regulamentação vigente.
Vale ressaltar que esse reembolso
é feito em dinheiro (em espécie ou mediante depósito na conta do cliente).
2) Crédito
Em vez de fazer o reembolso, a
companhia aérea poderá também oferecer ao consumidor a opção de ele receber um
“crédito”, que poderá ser utilizado na compra de outros produtos ou serviços
oferecidos pela empresa.
Ex: o consumidor pagou R$ 800,00
na passagem aérea, mas o voo foi cancelado em razão da pandemia; a companhia
aérea oferece para o consumidor o reembolso do valor (em até 12 meses) ou um
crédito de R$ 800,00 (ou mais) para que o cliente adquira outra passagem para
si ou para um terceiro (parente, amigo etc.).
Esse crédito pode ser utilizado
em até 18 meses, contados de seu recebimento.
O crédito deverá ser concedido
pela companhia no prazo máximo de 7 dias, contado de sua solicitação pelo
passageiro.
Veja a previsão legal:
Art. 3º (...)
§ 1º
Em substituição ao reembolso na forma prevista no caput deste artigo,
poderá ser concedida ao consumidor a opção de receber crédito de valor maior ou
igual ao da passagem aérea, a ser utilizado, em nome próprio ou de terceiro,
para a aquisição de produtos ou serviços oferecidos pelo transportador, em até
18 (dezoito) meses, contados de seu recebimento.
3) Reacomodação ou remarcação
Uma terceira opção prevista pela
Lei é a reacomodação do cliente em outro voo ou a remarcação imediata da
passagem:
Art. 3º (...)
§ 2º Se houver cancelamento de voo, o
transportador deve oferecer ao consumidor, sempre que possível, como
alternativa ao reembolso, as opções de reacomodação em outro voo, próprio ou de
terceiro, e de remarcação da passagem aérea, sem ônus, mantidas as condições
aplicáveis ao serviço contratado.
Se a compra tiver sido
parcelada no cartão, a companhia aérea deverá comunicar a operadora para que
não cobre nenhuma parcela pendente do consumidor
Em caso de cancelamento do voo, o
transportador, por solicitação do consumidor, deve adotar as providências
necessárias perante a instituição emissora do cartão de crédito ou de outros
instrumentos de pagamento utilizados para aquisição do bilhete de passagem, com
vistas à imediata interrupção da cobrança de eventuais parcelas que ainda não
tenham sido debitadas (art. 3º, § 8º).
DESISTÊNCIA DO VOO PELO
CONSUMIDOR
Vimos acima situações nas quais a
companhia aérea que cancelou o voo.
No entanto, houve muitos casos em
que o próprio cliente foi quem optou por não mais viajar (exs: ficou com receio
de ser infectado, a reunião presencial na qual participaria foi desmarcada,
decidiu adiar as férias etc.).
O que acontece nesses casos?
O consumidor que desistir do voo
terá as seguintes opções:
1) Reembolso (descontada a
multa contratual)
O consumidor poderá pedir para
receber o reembolso do valor gasto, no entanto, a companhia aérea terá o prazo
de até 12 meses para efetuar o pagamento, contado da data do voo cancelado, com
atualização monetária calculada com base no INPC.
A grande diferença aqui é que, se
o consumidor foi quem desistiu do voo, a companhia poderá cobrar dele eventuais
penalidades contratuais. Isso porque, a depender da “tarifa” (preço da
passagem) paga, o contrato firmado com a companhia prevê a cobrança de multa para
o caso de o consumidor desistir ou remarcar o voo (ex: tarifa promocional,
tarifa light, tarifa promo etc.).
Assim, essa multa poderá ser
cobrada pela companhia.
Ex: Ricardo comprou uma passagem
de R$ 2.000,00; contudo, por razões pessoais, ele desistiu de viajar; a tarifa
paga por Ricardo era promocional e uma das cláusulas do contrato eletrônico que
ele assinou ao comprar o bilhete previa o pagamento de multa de R$ 200,00 para
o caso de cancelamento ou remarcação. Assim, Ricardo receberá apenas R$
1.800,00, quantia que será paga em até 12 meses.
2) Crédito (sem multa)
O cliente pode optar por receber
o crédito do valor correspondente ao da passagem aérea. Em outras palavras, ele
não pede para receber o dinheiro de volta, permanecendo com esse crédito junto
à companhia para utilizar futuramente.
Ex: Letícia comprou uma passagem
de R$ 1.000,00; ela desistiu de viajar; a tarifa paga era promocional e previa
o pagamento de multa de R$ 100,00 para o caso de cancelamento ou remarcação;
Letícia não pediu o reembolso, dizendo que quer ficar com o crédito. Significa
que ela terá R$ 1.000,00 (sem qualquer desconto) para utilizar na compra de
outra passagem aérea ou outro serviço fornecido pela companhia (exs: mala
extra, espaço conforto etc.).
Esse crédito deve ser utilizado
no prazo de até 18 meses, contados de seu recebimento.
O crédito deverá ser concedido
pela companhia no prazo máximo de 7 dias, contado de sua solicitação pelo
passageiro.
O objetivo da Lei aqui foi
incentivar que o consumidor que não viajou não retire o dinheiro que havia pagado
do setor de aviação civil, apenas postergando a viagem.
Confira a redação do dispositivo:
Art. 3º (...)
§ 3º O consumidor que desistir de voo
com data de início no período entre 19 de março de 2020 e 31 de dezembro de
2020 poderá optar por receber reembolso, na forma e no prazo previstos no caput
deste artigo, sujeito ao pagamento de eventuais penalidades contratuais, ou por
obter crédito de valor correspondente ao da passagem aérea, sem incidência de
quaisquer penalidades contratuais, o qual poderá ser utilizado na forma do § 1º
deste artigo.
Exceção. Se a desistência
do consumidor foi feita com antecedência igual ou superior a 7 dias, aplicam-se
as regras gerais
Art. 3º (...)
§ 6º O disposto no § 3º deste artigo
não se aplica ao consumidor que desistir da passagem aérea adquirida com
antecedência igual ou superior a 7 (sete) dias em relação à data de embarque,
desde que o faça no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, contado do recebimento
do comprovante de aquisição do bilhete de passagem, caso em que prevalecerá o
disposto nas condições gerais aplicáveis ao transporte aéreo regular de
passageiros, doméstico e internacional, estabelecidas em ato normativo da
autoridade de aviação civil.
Atrasos e interrupções
As regras acima explicadas valem
também para as hipóteses de atraso e de interrupção previstas nos arts. 230 e
231 da Lei nº 7.565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica):
Art. 230. Em caso de atraso da partida
por mais de 4 (quatro) horas, o transportador providenciará o embarque do
passageiro, em voo que ofereça serviço equivalente para o mesmo destino, se
houver, ou restituirá, de imediato, se o passageiro o preferir, o valor do
bilhete de passagem.
Art. 231. Quando o transporte sofrer
interrupção ou atraso em aeroporto de escala por período superior a 4 (quatro)
horas, qualquer que seja o motivo, o passageiro poderá optar pelo endosso do
bilhete de passagem ou pela imediata devolução do preço.
Não muda nada o fato de a
passagem ter sido comprada por pontos, milhas etc.
O direito ao reembolso, ao
crédito, à reacomodação ou à remarcação do voo acima explicado independe do
meio de pagamento utilizado para a compra da passagem, que pode ter sido
efetuada em pecúnia, crédito, pontos ou milhas (art. 3º, § 7º).
Reembolso das tarifas
aeroportuárias
Quando compramos uma passagem
aérea, além do valor cobrado pela companhia, pagamos também tarifas aeroportuárias.
Esses valores são arrecadados pelas companhias, mas se destinam à INFRAERO e demais operadores aeroportuários.
A Lei prevê que também haverá o
reembolso dessas tarifas com as seguintes regras:
Art. 3º (...)
§ 9º O reembolso dos valores
referentes às tarifas aeroportuárias ou de outros valores devidos a entes
governamentais, pagos pelo adquirente da passagem e arrecadados por intermédio
do transportador, deverá ser realizado em até 7 (sete) dias, contados da
solicitação, salvo se, por opção do consumidor, a restituição for feita
mediante crédito, o qual poderá ser utilizado na forma do § 1º deste artigo.
DIFERIMENTO DO PAGAMENTO DAS
CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS PELOS CONCESSIONÁRIOS
As empresas que possuem a
concessão e aeroportos precisam pagar, por força de contrato, determinados
valores ao governo federal. A Lei autorizou que os pagamentos relativos ao ano
de 2020 sejam feitos somente no fim do ano (até 18 de dezembro de 2020):
Art. 2º As contribuições fixas e
variáveis com vencimento no ano de 2020 previstas em contratos de concessão de
aeroportos firmados pelo governo federal poderão ser pagas até o dia 18 de dezembro
de 2020, com atualização monetária calculada com base no Índice Nacional de
Preços ao Consumidor (INPC).
Parágrafo único. É vedado ao governo
federal promover o reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos referidos no
caput deste artigo em decorrência exclusivamente do adiamento dos pagamentos de
que trata este artigo.