Reincidência influencia na
concessão de benefícios da execução penal
Se o condenado é reincidente ele
terá requisitos mais gravosos no momento de receber eventuais benefícios na
execução penal.
É o caso, por exemplo, da
progressão de regime.
Se o
condenado por crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça for
primário, ele poderá progredir após cumprir 16% da pena. Por outro lado, se for
reincidente, terá que cumprir 20% da pena. É o que preveem os incisos I e II do
art. 112 da LEP:
Art. 112. A pena privativa de
liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime
menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao
menos:
I - 16% (dezesseis por cento) da pena,
se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa
ou grave ameaça;
II - 20% (vinte por cento) da pena, se
o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave
ameaça;
(...)
Suponhamos que na sentença
condenatória não constou que o apenado é reincidente. O juízo da execução,
contudo, na fase de cumprimento da pena, percebeu que o condenado é
reincidente. O juízo da execução penal poderá reconhecer essa circunstância
negativa no momento de analisar se concede ou não os benefícios (ex:
progressão)? Para facilitar o entendimento, imagine a seguinte situação
hipotética:
Em 2015, João praticou o crime “A”,
tendo sido condenado em 2016, com trânsito em julgado.
Em 2017, João cometeu o crime
“B”, tendo sido condenado em 2018, com trânsito em julgado.
O juízo que condenou João pelo
crime “B” deveria ter reconhecido que ele é reincidente. Contudo, isso não
constou expressamente na sentença.
Diante disso, na guia de execução
penal de João ficou registrada a informação de que ele seria primário.
João iniciou o cumprimento da
pena. O juízo da execução penal percebeu que o apenado é reincidente e que o
atestado de pena está errado (consta que o condenado é primário).
O juízo da execução penal
poderá determinar a retificação do atestado de pena e considerar, para todos os
efeitos, que o condenado é reincidente mesmo isso não tendo constado
expressamente na sentença?
SIM.
Na condução da execução penal, o
magistrado deverá fazer cumprir aquilo que consta na sentença (título executivo
penal) a respeito do quantum da pena, do regime inicial, bem como do fato de
ter sido a pena privativa de liberdade substituída ou não por restritiva de
direitos.
Por outro lado, as condições
pessoais do condenado, como, por exemplo, a reincidência, podem e devem ser
analisadas pelo juízo da execução penal, independentemente de tal condição ter
sido considerada na sentença condenatória. Isso porque é também atribuição do
juízo da execução individualizar a pena.
Conforme
explica a doutrina:
“A individualização da pena no processo de
conhecimento visa aferir e quantificar a culpa exteriorizada no fato passado. A
individualização no processo de execução visa propiciar oportunidade para o
livre desenvolvimento presente e efetivar a mínima dessocialização possível.
Daí caber à autoridade judicial adequar a pena às condições pessoais do
sentenciado.” (BARROS, Carmen Silvia de Moraes. A Individualização da Pena
na Execução Penal. São Paulo: RT, 2001, p. 23).
A individualização da pena se
realiza, essencialmente, em três momentos:
a) na cominação da pena em
abstrato ao tipo legal, pelo Legislador;
b) na sentença penal
condenatória, pelo Juízo de conhecimento; e
c) na execução penal, pelo Juízo
das Execuções.
O reconhecimento da
reincidência apenas pelo juízo da execução penal representaria reformatio in
pejus ou afronta à coisa julgada?
NÃO. Isso porque não há
desrespeito ao comando da sentença considerando que não haverá o agravamento da
pena estabelecida no título executivo nem modificação do regime inicial para um
mais severo.
O reconhecimento da reincidência
ocorrerá para fins de progressão de regime, livramento condicional e outros
institutos diretamente ligados à execução penal e que não são tratados na
sentença condenatória.
O reconhecimento da reincidência
no processo de conhecimento possui fins específicos, quais sejam, agravar a
pena e trazer mais rigor ao regime prisional inicial.
O reconhecimento da reincidência
no processo de execução tem outras finalidades, que estão diretamente relacionadas
com os benefícios do cumprimento da pena.
Assim, a intangibilidade da
sentença penal condenatória transitada em julgado não retira do Juízo das
Execuções Penais o dever de adequar o cumprimento da sanção penal às condições
pessoais do réu.
Em suma:
O Juízo da Execução pode promover a retificação do
atestado de pena para constar a reincidência, com todos os consectários daí
decorrentes, ainda que não esteja reconhecida expressamente na sentença penal
condenatória transitada em julgado.
STJ. 3ª Seção. EREsp 1.738.968-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado
em 27/11/2019 (Info 662).