Dizer o Direito

sábado, 13 de abril de 2019

Caso a parte faça o requerimento da gratuidade da justiça no recurso e o relator indefira o pedido, deverá intimar o recorrente para realizar o preparo antes de decretar a deserção





PREPARO
O que é preparo?
Preparo consiste no pagamento das despesas relacionadas com o processamento do recurso.
No preparo incluem-se:
• taxa judiciária (custas);
• despesas postais com o envio dos autos (chamado de “porte de remessa e de retorno” dos autos).

Desse modo, “preparar” o recurso é nada mais que pagar as despesas necessárias para que a máquina judiciária dê andamento à sua apreciação. O pagamento do preparo é feito, comumente, na rede bancária conveniada com o Tribunal.
O CPC afirma que a parte que está recorrendo da decisão precisa comprovar o preparo no momento da interposição do recurso. Logo, o preparo (recolhimento do valor) deve ser feito antes da interposição do recurso e, junto com o recurso interposto, o recorrente deve juntar o comprovante do pagamento.
O recorrente que não comprovar, no ato de interposição do recurso, o recolhimento do preparo, inclusive porte de remessa e de retorno, será intimado, na pessoa de seu advogado, para realizar o recolhimento em dobro, sob pena de deserção (art. 1.007, § 4º, do CPC/2015).
Deserção é a inadmissibilidade do recurso pela falta de preparo. Se o recurso foi deserto, significa que ele não foi conhecido (não foi sequer apreciado). Gramaticalmente, desertar é mesmo que abandonar.

ASSISTÊNCIA JURÍDICA INTEGRAL E GRATUITA
Garantia de assistência jurídica integral e gratuita
A CF/88 prevê a garantia da assistência jurídica integral e gratuita em seu art. 5º, LXXIV: “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”.
Esse dispositivo constitucional consagra duas garantias:
I – Assistência jurídica integral e gratuita
II – Gratuidade da justiça
(Assistência Judiciária Gratuita – AJG).
Fornecimento pelo Estado de orientação e defesa jurídica, de forma integral e gratuita, a ser prestada pela Defensoria Pública, em todos os graus, aos necessitados (art. 134 da CF).
Regulada pela Lei Complementar 80/94.
Isenção das despesas que forem necessárias para que a pessoa necessitada possa defender seus interesses em um processo judicial.
Era regulada pela Lei nº 1.060/50, mas o CPC/2015 passou a tratar sobre o tema, revogando quase toda essa lei.

Quem tem direito à gratuidade da justiça?
Tem direito à gratuidade da justiça a pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios (art. 98 do CPC/2015).

Quem está abrangido por ela?
• pessoas físicas (brasileiras ou estrangeiras);
• pessoas jurídicas (brasileiras ou estrangeiras).

A pessoa beneficiada pela justiça gratuita está dispensada do pagamento de quais verbas?
A gratuidade da justiça compreende:
I - as taxas ou as custas judiciais;
II - os selos postais;
III - as despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em outros meios;
IV - a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse;
V - as despesas com a realização de exame de código genético - DNA e de outros exames considerados essenciais;
VI - os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira;
VII - o custo com a elaboração de memória de cálculo, quando exigida para instauração da execução;
VIII - os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório;
IX - os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido.

Dispensa parcial
A gratuidade da justiça poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou pode consistir apenas na redução percentual das despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento (§ 5º do art. 98 do CPC/2015).

Parcelamento
A depender do caso concreto, o juiz poderá conceder ao requerente o direito de parcelar as despesas processuais que tiver de adiantar no curso do procedimento (§ 6º do art. 98 do CPC/2015).

Despesas processuais e honorários advocatícios de sucumbência
Mesmo sendo beneficiária da justiça gratuita, a pessoa terá que pagar as despesas processuais e os honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência (§ 2º do art. 98 do CPC/2015).
No entanto, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade. Em outras palavras, em até 5 anos, o credor deverá demonstrar que o devedor passou a ter condições de custear tais despesas.
Passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário são consideradas extintas (§ 3º do art. 98 do CPC/2015).

Multas processuais
Mesmo sendo beneficiária da justiça gratuita, a pessoa terá o dever de pagar, ao final, as multas processuais que lhe foram impostas (§ 4º do art. 98 do CPC/2015). Ex: multa por litigância de má-fé.

O juiz poderá conceder de ofício o benefício da assistência judiciária gratuita?
NÃO. É vedada a concessão “ex officio” do benefício de assistência judiciária gratuita pelo magistrado. Assim, é indispensável que haja pedido expresso da parte (STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 1740075/RJ, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 18/09/2018).

Qual é o momento em que deverá ser formulado o pedido de justiça gratuita?
Normalmente, o pedido de justiça gratuita é feito na própria petição inicial (no caso do autor) ou na contestação (no caso do réu). No entanto, o certo é que o pedido de justiça gratuita pode ser formulado a qualquer tempo.
Veja o que diz o 1º do art. 99 do CPC/2015:
Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.
§ 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso.
(...)

É possível requerer a assistência jurídica gratuita no ato da interposição do recurso?
SIM. Mesmo antes do CPC/2015, o STF já possuía julgado dizendo que era cabível deferir-se a gratuidade na fase recursal, salvo se houvesse fraude, como por exemplo, quando a parte não efetuasse o preparo e, depois, requeresse que se relevasse a deserção.
O Min. Marco Aurélio afirmou que é plausível imaginar a situação de uma pessoa que, no início do processo pudesse custear as despesas processuais, e, no entanto, depois de um tempo, com a mudança de sua situação econômica, não tivesse mais condições de pagar o preparo do recurso, devendo então ter direito de pleitear a assistência judiciária nessa fase processual (STF. 1ª Turma. AI 652139 AgR/MG, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, julgado em 22/5/2012).
O CPC/2015 deixou mais clara a possibilidade de o pedido ser feito a qualquer tempo, inclusive no momento do recurso:
Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.

Caso o pedido de justiça gratuita seja formulado no momento do recurso, ele deverá ser realizado por meio de petição avulsa ou pode ser feito no corpo do próprio recurso?
No corpo do próprio recurso:
É possível a formulação de pedido de assistência judiciária gratuita na própria petição recursal, dispensando-se a exigência de petição avulsa, quando não houver prejuízo ao trâmite normal do processo.
STJ. Corte Especial. AgRg nos EREsp 1.222.355-MG, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 4/11/2015 (Info 574).
STJ. Corte Especial. EAREsp 693.082/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 21/11/2018.

Como vimos acima, em regra, a parte que interpuser um recurso precisa comprovar o preparo no momento da interposição. Imagine que o juiz já deferiu para a parte o benefício da justiça gratuita no curso do processo. Se essa parte for interpor um recurso, ela precisará fazer preparo?
NÃO. A parte beneficiária da justiça gratuita não precisa de preparo para a interposição de recurso.

E se a parte ainda não é beneficiária da justiça gratuita e está formulando esse pedido somente agora, no momento do recurso? Dito de outro modo: se a parte, ao interpor o recurso, está pedindo a concessão do benefício da justiça gratuita, ela precisa fazer o preparo? O preparo prévio é exigido da parte que recorre e, no recurso, pede a justiça gratuita?
NÃO. O § 7º do art. 99 do CPC/2015 dispensa o preparo nesses casos:
Art. 99 (...)
§ 7º Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo (...)

Providências que o relator deverá adotar quando chegar o recurso com pedido de gratuidade
O relator, ao receber um recurso no qual há pedido de gratuidade, deverá apreciar imediatamente esse requerimento e adotar uma das seguintes posturas:
a) deferir o requerimento de gratuidade; ou
a) indeferi-lo se entender que há elementos nos autos que afastem a alegada hipossuficiência do requerente.
Se o relator indeferir esse requerimento, ele deverá fixar um prazo para que o recorrente realize o recolhimento do preparo.
Assim, mesmo que o relator considere que o recorrente não tem direito à gratuidade, ele não pode declarar imediatamente a deserção.
No caso de indeferimento, há que se oportunizar à parte o pagamento do preparo.
Essa é a previsão da parte final do § 7º do art. 99 do CPC/2015:
Art. 99 (...)
§ 7º Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento.

É também o entendimento do STJ mesmo em situações envolvendo o Código pretérito:
O interessado deverá ser intimado para a realização do preparo recursal nas hipóteses de indeferimento ou de não processamento do pedido de gratuidade da justiça.
STJ. Corte Especial. EAREsp 742.240-MG, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 19/09/2018 (Info 643).

Essa solução é a que melhor atende os direitos fundamentais de assistência jurídica das pessoas economicamente hipossuficientes (art. 5º, LXXIV, da CF/88) e de amplo acesso à Justiça (art. 5º, XXXV) para que seja assegurada ao jurisdicionado não somente a possibilidade de protocolizar o pedido de assistência judiciária por qualquer meio processual e em qualquer fase do processo, mas também, caso indeferido o pedido, sua intimação para que realize o recolhimento das custas e porte de remessa e retorno, quando for o caso.
Entendimento diverso vai na contramão da evolução histórica do direito processual e dos direitos fundamentais dos cidadãos, privilegiando uma jurisprudência defensiva em detrimento do princípio da primazia do julgamento de mérito.



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