Olá amigos do Dizer o Direito,
O Estado de Pernambuco aprovou o primeiro Código de
Procedimentos em matéria processual do Brasil.
O Presidente da comissão que auxiliou os Deputados na
elaboração do texto foi o grande processualista civil Leonardo José Carneiro da
Cunha.
Uma pergunta que muitos de vocês podem estar se fazendo é a seguinte: o
Estado-membro possui competência para editar um Código de Procedimentos em
matéria processual?
SIM. Isso porque neste caso o Estado-membro não está
legislando sobre Processo Civil, que é de competência privativa da União (art.
22, I, da CF/88).
Trata-se de uma lei sobre PROCEDIMENTOS, sendo isso de
competência concorrente, nos termos do art. 22, XI, da CF/88:
Art. 24. Compete à União, aos Estados
e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
(...)
XI - procedimentos em matéria
processual;
PROCESSO: competência privativa da União.
PROCEDIMENTOS em matéria processual: competência concorrente
da União, Estados e DF.
Dessa feita, em matéria de procedimento, cabe à União
estabelecer as normas gerais (art. 24, § 1º) e os Estados têm competência para
suplementar, ou seja, complementar (detalhar) essas normas gerais.
O CPC (Lei federal nº 13.105/2015) traz regras de processo e
também algumas normas gerais sobre procedimento.
Desse modo, os Estados-membros podem legislar sobre
procedimentos naquilo que não contrariar as normas gerais da União.
Se não houver normas gerais da União tratando sobre
procedimento, os Estados possuem competência legislativa plena.
É isso que preveem os parágrafos do art. 24:
Art. 24 (...)
§ 1º No âmbito da legislação
concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.
§ 2º A competência da União para
legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.
§ 3º Inexistindo lei federal sobre
normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para
atender a suas peculiaridades.
§ 4º A superveniência de lei federal
sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for
contrário.
Assim, não há qualquer inconstitucionalidade formal na
edição de um Código de Procedimentos em matéria processual por parte dos
Estados-membros. Ao contrário, trata-se de medida salutar, que aumenta a
transparência e garante segurança jurídica. Como já explicou o Min. Gilmar
Mendes:
“(...) a prerrogativa de legislar
sobre procedimentos possui também o condão de transformar os Estados em
verdadeiros laboratórios legislativos. Ao conceder-se aos Entes federados o
poder de regular o procedimento de uma matéria, baseando-se em peculiaridades próprias,
está a possibilitar-se que novas e exitosas experiências sejam formuladas. Os
Estados passariam a ser partícipes importantes no desenvolvimento do direito
nacional e a atuar ativamente na construção de possíveis experiências que
poderão ser adotadas por outros Entes ou em todo território federal.” (STF.
Plenário. ADI 2922/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/4/2014).
Obviamente, o Código Estadual de Procedimentos não pode
contrariar o CPC nem qualquer outra norma geral da União sobre procedimentos.
De igual forma, o Código Estadual deverá ficar restrito a tratar de normas de
procedimento, não podendo extravasar sua competência e tratar sobre regras
processuais.
Qual é a diferença entre normas de processo e normas de procedimento?
Carnelutti define procedimento como “uma sucessão de atos
não só finalmente mas também causalmente vinculados, porquanto cada um deles
supõe o precedente e assim o último supõe o grupo todo”. Já o processo seria “o
conjunto de todos os atos necessários em cada caso para a composição da lide”
(CARNELUTTI, Francesco. Instituições do
Processo Civil. V. 1 Tradução: Adrián Sotero De Witt Batista. Campinas:
Servanda, 1999, p. 472-473).
Humberto Theodoro Júnior explica que
“Processo e procedimento são
conceitos diversos e que os processualistas não confundem.
Processo, como já se afirmou, é o
método, isto é, o sistema de compor a lide em juízo através de uma relação
jurídica vinculativa de direito público, enquanto procedimento é a forma
material com que o processo se realiza em cada caso concreto.
(...)
O processo, outrossim, não se
submete a uma única forma. Exterioriza-se de várias maneiras diferentes,
conforme as particularidades da pretensão do autor e da defesa do réu. Uma ação
de cobrança não se desenvolve, obviamente, como uma de inventário e nem muito
menos como uma possessória. O modo próprio de desenvolver-se o processo,
conforme as exigências de cada caso, é exatamente o procedimento do feito, isto
é, o seu rito.
É o procedimento, de tal sorte,
que dá exterioridade ao processo, ou à relação processual, revelando-lhe o
modus faciendi com que se vai atingir o escopo da tutela jurisdicional. Em
outras palavras, é o procedimento que, nos diferentes tipos de demanda, define
e ordena os diversos atos processuais necessários.” (Curso de Direito Processual Civil. Vol. I, 56ª ed., Rio de Janeiro:
Forense, 2015, p. 156).
São exemplos de normas PROCESSUAIS aquelas que tratam sobre:
·
condições da ação;
·
pressupostos processuais;
·
intervenção de terceiros;
·
provas;
·
recursos;
·
coisa julgada.
São exemplos de normas de PROCEDIMENTO:
·
forma de autuação das petições;
·
forma de registro das decisões, sentenças e
acórdãos;
·
regras sobre o funcionamento do serviço de
protocolo;
·
regras sobre a expedição de certidões;
·
disciplina do arquivamento dos processos;
·
instruções sobre o levantamento dos alvarás
judiciais;
·
instruções sobre a sistemática para carga dos
autos;
·
informações que devem constar nos mandados de
prisão e nos alvarás de soltura.
Vale ressaltar, contudo, que nem sempre é fácil estabelecer
essa distinção.
Clique AQUI para ler o Código Pernambucano de Procedimentos
em matéria processual.