Decisão do STF restringindo o foro
No último dia 03/05, o STF decidiu restringir o foro por
prerrogativa de função dos Deputados Federais e Senadores.
O art. 53, § 1º e o art. 102, I, “b”, da CF/88 preveem que,
em caso de crimes comuns, os Deputados Federais e os Senadores, serão julgados
pelo STF.
Ocorre que o Supremo conferiu uma interpretação restritiva a
esses dispositivos e afirmou o seguinte: o foro por prerrogativa de função
aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados
às funções desempenhadas (STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto
Barroso, julgado em 03/05/2018).
Em outras palavras, os Deputados Federais e Senadores
somente serão julgados pelo STF se o crime tiver sido praticado durante o
exercício do mandato de parlamentar federal e se estiver relacionado com essa
função.
O entendimento do STF restringindo o foro por prerrogativa de função
vale para todas as hipóteses de foro privilegiado?
Formalmente, não. A decisão proferida na AP 937 QO restringindo
o foro abrangeu, formalmente, apenas Deputados Federais e Senadores. Isso
porque a questão de ordem discutia apenas a situação de parlamentares federais.
A tendência, contudo, é que o STF estenda essa mesma
interpretação para outras autoridades.
Nesse sentido, confira as palavras do Min. Roberto Barroso,
em entrevista para a imprensa:
“A decisão só se refere a
parlamentares, mas ela é embasada num princípio que eu acho que é comum e que,
portanto, vai levar à rediscussão de todas as demais situações de foro, mesmo
as que não envolvam parlamentares”.
Isso significa que, muito provavelmente, quando o STF for
chamado a analisar especificamente o caso de outras previsões de foro
privilegiado, ele tome a mesma decisão.
Significa também que os demais Tribunais (exs: STJ, TJ, TRF)
podem adotar o mesmo raciocínio que o STF e passar a restringir o foro por
prerrogativa de função nos processos que ali tramitam. E foi isso que fez o
STJ.
Decisão do STJ aplicando a restrição ao foro privilegiado
Quatro dias após a AP 937 QO, o Ministro do STJ Luís Felipe
Salomão aplicou, para um Governador de Estado, o mesmo raciocínio adotado pelo
STF sobre a restrição do foro dos Deputados Federais e Senadores.
Segundo o art. 105, I, da CF/88, compete ao STJ julgar
originariamente os crimes comuns praticados pelos Governadores de Estado.
O Min. Salomão afirmou o seguinte: esse art. 105, I, deve
ser agora interpretado seguindo a mesma lógica adotada pelo STF. Logo, o STJ
somente deverá julgar os crimes cometidos pelos Governadores se o delito foi
praticado durante o exercício do cargo e estiver relacionado com as funções
desempenhadas.
O Governador do Estado da Paraíba, Ricardo Coutinho, estava
denunciado no STJ pela suposta prática de 12 crimes cometidos na época em que
era Prefeito de João Pessoa. Diante desse novo entendimento, o Min. Salomão,
que era relator desta ação penal no STJ, determinou que esse processo seja
remetido para julgamento em 1ª instância, ou seja, em uma das varas criminais
de João Pessoa (PB). Isso porque os delitos praticados, em tese, por Coutinho,
não foram cometidos na condição de Governador nem têm relação com este cargo.
Nas palavras do Min. Salomão:
“1. Diante da recente
e notória decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar questão de
ordem na AP 937, da relatoria do Ministro Roberto Barroso, conferindo nova e
conforme interpretação ao art. 102, I, b e c da CF, assentando a competência da
Corte Suprema para processar e julgar os membros do Congresso Nacional
exclusivamente quanto aos crimes praticados no exercício e em razão da função
pública, e que tem efeitos prospectivos, em linha de princípio, ao menos em
relação às pessoas detentoras de mandato eletivo com prerrogativa de foro perante
este Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, I, "a"), faz-se
necessária igual observância da regra constitucional a justificar eventual
manutenção, ou não, do trâmite processual da presente ação penal perante a
Corte Especial deste Tribunal Superior.
(...)
4. No caso em exame, é
ação penal na qual foi ofertada denúncia em face de RICARDO VIEIRA COUTINHO,
atual Governador do Estado da Paraíba, pela suposta prática de 12 (doze) crimes
de responsabilidade de prefeitos (art. 1º, inciso XIII, do DL 201/67),
decorrente da nomeação e admissão de servidores contra expressa disposição de
lei, ocorridos entre 01.01.2010 e 01.02.2010, quando o denunciado exercia o
cargo de Prefeito Municipal de João Pessoa/PB, ou seja, delitos que, em tese,
não guardam relação com o exercício, tampouco teriam sido praticados em razão
da função pública atualmente exercida pelo denunciado como Governador.
Nessa conformidade,
reconhecida a inaplicabilidade da regra constitucional de prerrogativa de foro
ao presente caso, por aplicação do princípio da simetria e em consonância com a
decisão da Suprema Corte antes referida, determino a remessa dos autos ao
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, para distribuição a uma das Varas
Criminais da Capital, e posterior prosseguimento da presente ação penal perante
o juízo competente.” (STJ AP 866/DF)
Vale ressaltar que ainda se trata de uma decisão monocrática e, provavelmente, haverá recurso da defesa. No entanto, penso que a Corte Especial do STJ manterá o entendimento e também restringirá, naquele Tribunal, os casos de foro por prerrogativa de função.
Fonte originária da notícia: www.jota.info