Dizer o Direito

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Breves comentários à Lei 13.505/2017, que acrescenta dispositivos à Lei Maria da Penha



Olá amigos do Dizer o Direito,

Foi publicada no último dia 09/11 (quinta-feira), a Lei nº 13.505/2017, que acrescenta alguns dispositivos na Lei de Violência Doméstica (Lei Maria da Penha – Lei nº 11.340/2006).

Vejamos abaixo um resumo dos dispositivos que foram inseridos (arts. 10-A, 12-A e 12-B).

Atendimento policial e pericial especializado
A mulher que esteja em situação de violência doméstica e familiar tem o direito de receber atendimento policial e pericial especializado, ininterrupto e prestado por servidores previamente capacitados.
Os servidores responsáveis por esse atendimento deverão ser preferencialmente do sexo feminino.

Diretrizes e cuidados que deverão ser adotados para a inquirição da vítima e das testemunhas de crimes de violência doméstica contra a mulher:
1) Deverá ser garantia da salvaguarda (proteção) da integridade física, psíquica e emocional da depoente, considerada a sua condição peculiar de pessoa em situação de violência doméstica e familiar;
2) Em nenhuma hipótese deverá ser permitido o contato direto da vítima (mulher), de seus familiares e das testemunhas com os investigados/suspeitos ou com as pessoas que tenham relação com eles;
3) Não se deve permitir a “revitimização” da depoente. Para isso, deve-se evitar que a vítima seja sucessivas vezes ouvida sobre o mesmo fato nos âmbitos criminal, cível e administrativo. Também se deve evitar questionamentos sobre a sua vida privada.

Em que consiste a chamada “revitimização”?
A vítima de um crime, especialmente em delitos sexuais ou violentos, todas as vezes em que for inquirida sobre os fatos, ela é, de alguma forma, submetida a um novo trauma, um novo sofrimento ao ter que relatar um episódio triste e difícil de sua vida para pessoas estranhas, normalmente em um ambiente formal e frio. Desse modo, a cada depoimento, a vítima sofre uma violência psíquica.
Assim, revitimização consiste nesse sofrimento continuado ou repetido da vítima ao ter que relembrar esses fatos.
Para evitar a revitimização, o Poder Público deverá adotar providências a fim de que a vítima não seja ouvida repetidas vezes sobre o mesmo tema. Além disso, deve-se fazer com que o ambiente em que os depoimentos são prestados seja acolhedor. Por fim, deve-se evitar perguntas que invadam a vida privada da vítima ou que induzam à ideia de que ela teve “culpa” pelo fato, transformando a investigação ou o processo em um “julgamento” sobre o comportamento da vítima.
Alguns autores afirmam que a revitimização é uma forma de “violência institucional” cometida pelo Estado contra a vítima.
“A revitimização no atendimento às mulheres em situação de violência, por vezes, tem sido associada à repetição do relato de violência para profissionais em diferentes contextos o que pode gerar um processo de traumatização secundária na medida em que, a cada relato, a vivência da violência é reeditada.
Além da revitimização decorrente do excesso de depoimentos, revitimizar também pode estar associado a atitudes e comportamentos, tais como: paternalizar; infantilizar; culpabilizar; generalizar histórias individuais; reforçar a vitimização; envolver-se em excesso; distanciar-se em excesso; não respeitar o tempo da mulher; transmitir falsas expectativas. A prevenção da revitimização requer o atendimento humanizado e integral, no qual a fala da mulher é valorizada e respeitada.” (Diretrizes gerais e protocolos de atendimento. Programa “Mulher, viver sem violência”. Brasil: Governo Federal. Secretaria Especial de Políticas para mulheres. 2015).

Procedimento a ser adotado para a inquirição
Na inquirição de mulher em situação de violência doméstica ou das testemunhas deverá ser adotado, preferencialmente, o seguinte procedimento:
I - a inquirição será feita em recinto especialmente projetado para esse fim, o qual conterá os equipamentos próprios e adequados à idade da mulher em situação de violência doméstica e familiar ou testemunha e ao tipo e à gravidade da violência sofrida;
II - quando for o caso, a inquirição será intermediada por profissional especializado em violência doméstica e familiar designado pela autoridade judiciária ou policial;
III - o depoimento será registrado em meio eletrônico ou magnético, devendo a degravação e a mídia integrar o inquérito.

Unidades especializadas
Os Estados e o Distrito Federal, na formulação de suas políticas e planos de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, darão prioridade, no âmbito da Polícia Civil, à criação de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams), de Núcleos Investigativos de Feminicídio e de equipes especializadas para o atendimento e a investigação das violências graves contra a mulher.

Requisição por parte dos Delegados
A autoridade policial poderá requisitar os serviços públicos necessários à defesa da mulher em situação de violência doméstica e familiar e de seus dependentes.

Veto
O projeto de lei aprovado previa que os Delegados de Polícia poderiam aplicar, provisoriamente, até deliberação judicial, medidas protetivas de urgência em favor da mulher, como a determinação para que o suposto agressor ficasse distante da vítima. Isso estava previsto no art. 12-B, que seria inserido na Lei Maria da Penha. Confira:
Art. 12-B. Verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física e psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar ou de seus dependentes, a autoridade policial, preferencialmente da delegacia de proteção à mulher, poderá aplicar provisoriamente, até deliberação judicial, as medidas protetivas de urgência previstas no inciso III do art. 22 e nos incisos I e II do art. 23 desta Lei, intimando desde logo o agressor.
§ 1º O juiz deverá ser comunicado no prazo de 24 (vinte e quatro) horas e poderá manter ou rever as medidas protetivas aplicadas, ouvido o Ministério Público no mesmo prazo.
§ 2º Não sendo suficientes ou adequadas as medidas protetivas previstas no caput, a autoridade policial representará ao juiz pela aplicação de outras medidas protetivas ou pela decretação da prisão do agressor.

Tal previsão foi, contudo, vetada pelo Presidente da República sob o argumento de que a prerrogativa de impor medidas protetivas de urgência é privativa do Poder Judiciário, não podendo ser estendida à Polícia. Veja as razões apresentadas:
 “Os dispositivos, como redigidos, impedem o veto parcial do trecho que incide em inconstitucionalidade material, por violação aos artigos 2º e 144, § 4º, da Constituição, ao invadirem competência afeta ao Poder Judiciário e buscarem estabelecer competência não prevista para as polícias civis.”

Dessa forma, com o veto, a competência para impor medidas protetivas de urgência continua sendo privativa da autoridade judicial. Cabe ao Delegado de Polícia apenas remeter ao juiz pedido da ofendida para a concessão de medidas protetivas de urgência (art. 12, III, da Lei nº 11.340/2006).

Vigência
A Lei nº 13.505/2017 entrou em vigor no dia de sua publicação (09/11/2017).



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