Noções gerais sobre o reexame necessário
O chamado “reexame necessário”
ou “duplo grau de jurisdição obrigatório” é um instituto previsto no art. 496
do CPC/2015 e em algumas leis esparsas:
Art. 496. Está sujeita ao duplo grau
de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal,
a sentença:
I - proferida contra a União, os
Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e
fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo
ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1º Nos casos previstos neste artigo,
não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos
ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal
avocá-los-á.
§ 2º Em qualquer dos casos referidos
no § 1o, o tribunal julgará a remessa necessária.
Deixa eu explicar melhor:
- Se a sentença proferida pelo juiz de 1ª instância: a) for
contra a Fazenda Pública; ou b) julgar procedentes os embargos do devedor na
execução fiscal (o que também é uma sentença contra a Fazenda Pública);
- Essa sentença deverá ser, obrigatoriamente, reexaminada
pelo Tribunal de 2º grau (Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal);
- Mesmo que a Fazenda Pública não recorra;
- E enquanto não for realizado o reexame necessário não
haverá trânsito em julgado.
Obs: o reexame necessário não possui natureza jurídica de
recurso. Desse modo, é tecnicamente incorreto denominar este instituto de
“recurso ex officio”, “recurso de
ofício” ou “recurso obrigatório”.
Exceções ao reexame necessário
O CPC prevê, em dois parágrafos,
situações em que, mesmo a sentença se enquadrando nos incisos do art. 496, não
haverá a obrigatoriedade do reexame necessário:
§ 3º Não se aplica o disposto neste
artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor
certo e líquido inferior a:
I - 1.000 (mil) salários-mínimos para
a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - 500 (quinhentos) salários-mínimos
para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de
direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;
III - 100 (cem) salários-mínimos para
todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito
público.
§ 4º Também não se aplica o disposto
neste artigo quando a sentença estiver fundada em:
I - súmula de tribunal superior;
II - acórdão proferido pelo Supremo
Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos
repetitivos;
III - entendimento firmado em
incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
IV - entendimento coincidente com
orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público,
consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.
Reexame necessário “invertido” previsto na Lei de Ação Popular
A Lei nº 4.171/65 prevê que se o
juiz concluir pela carência ou pela improcedência da ação popular, essa
sentença estará sujeita ao reexame necessário. Veja:
Art. 19. A sentença que concluir pela
carência ou pela improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de
jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal; da
que julgar a ação procedente caberá apelação, com efeito suspensivo.
Assim, quando a sentença da ação popular for procedente, não
haverá reexame necessário. Perceba, portanto, que o art. 19 inverte a lógica da
remessa necessária do CPC. Lá, se a Fazenda “perde”, haverá reexame. Aqui, o
reexame necessário ocorre se o cidadão perde.
Em virtude disso, podemos dizer que esse art. 19 traz uma
hipótese de duplo grau de jurisdição invertido, ou seja, um duplo grau que ocorre
em favor do cidadão (e não necessariamente da Fazenda Pública).
É possível aplicar esse art. 19 da Lei nº 4.171/65 para as ações de
improbidade administrativa?
SIM.
A
sentença que concluir pela carência ou pela improcedência de ação de
improbidade administrativa está sujeita ao reexame necessário, com base na
aplicação subsidiária do CPC e por aplicação analógica da primeira parte do
art. 19 da Lei nº 4.717/65.
STJ. 1ª Seção. EREsp 1.220.667-MG,
Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 24/5/2017 (Info 607).
Vale ressaltar que se a ação de improbidade administrativa
for julgada improcedente haverá a necessidade de remessa oficial
independentemente do valor da sucumbência (STJ. 2ª Turma. AgInt no REsp
1379659/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 28/03/2017).