Imagine a seguinte situação hipotética:
“A”,
atriz, ingressa com ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por
danos morais contra o site “X”,
especializado em celebridades, tendo como pedido (objeto) que o referido site retire de suas páginas fotos
íntimas da autora e cuja publicação ela não autorizou. Além disso, a atriz pede
indenização por danos morais.
O
juiz analisa a petição inicial e entende que há elementos que evidenciam a
probabilidade do direito e o perigo de dano. Diante disso, o magistrado concede
liminarmente a tutela de urgência determinando que o site retire, em 24 horas, as fotos de suas páginas.
O
juiz, para que sua decisão tenha “força” e desperte no réu a ânsia de
cumpri-la, impôs uma multa cominatória (astreinte). O magistrado determinou que
o réu retirasse as fotos em até 24 horas, sob pena de multa de R$ 1 mil
por cada hora de descumprimento. A direção do site recebeu a intimação, mas
somente retirou as fotos 40 horas depois do fim do prazo estipulado.
Ao final, o juiz proferiu sentença condenando o site a
pagar:
a) R$ 100 mil a título de danos morais;
b) R$ 40 mil de multa cominatória (astreinte) pelo fato de o
réu ter demorado a retirar as fotografias.
Houve trânsito em julgado;
c) 10% de honorários advocatícios sobre o valor da
condenação.
Execução dos honorários advocatícios
O advogado da atriz deu início a execução dos honorários
advocatícios.
Na execução, o advogado cobra 10% de R$ 140 mil (100 + 40).
O executado, por sua vez, argumenta que o valor da multa
cominatória (astreintes) não integra a base de cálculo da verba honorária.
Logo, seria devido somente 10% de R$ 100 mil.
Quem tem razão: o exequente ou o executado?
O executado. Segundo decidiu o
STJ:
O
valor da multa cominatória (astreintes) não integra a base de cálculo da verba
honorária disciplinada pelo CPC/73.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.367.212-RR, Rel.
Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 20/6/2017 (Info 608).
Veja o que diz o CPC:
CPC/1973
|
CPC/2015
|
Art.
20. (...)
§
3º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o
máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação,
atendidos:
a)
o grau de zelo do profissional;
b)
o lugar de prestação do serviço;
c)
a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o
tempo exigido para o seu serviço.
|
Art.
85. (...)
§
2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por
cento sobre o valor da condenação, do proveito
econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado
da causa, atendidos:
I
- o grau de zelo do profissional;
II
- o lugar de prestação do serviço;
III
- a natureza e a importância da causa;
IV
- o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
|
O que se entende por valor da condenação? As astreintes estão incluídas
no conceito de valor da condenação para fins de honorários advocatícios
sucumbenciais?
NÃO. Quando se fala em “valor da condenação”, na fase de
conhecimento do processo, deve-se entender que é o “valor do bem pretendido
pelo demandante”, ou seja, o montante econômico da questão litigiosa conforme o
direito material (Min. Ricardo Villas Bôas Cueva).
Assim, a base de cálculo dos honorários advocatícios sucumbenciais
na fase de conhecimento é a condenação referente ao mérito principal da causa.
Astreintes é um instrumento processual
A multa cominatória constitui instrumento de direito
processual criado para a efetivação da tutela específica perseguida, ou para a
obtenção de resultado prático equivalente, nas ações de obrigação de fazer ou
não fazer, constituindo, portanto, medida de execução indireta.
Em virtude de sua natureza inibitória, destina-se a impedir
a violação de um direito, de forma imediata e definitiva.
Ademais, por ser um meio de coerção indireta ao cumprimento
do julgado, a decisão que arbitra astreintes
não faz coisa julgada material, podendo, por isso mesmo, ser modificada, a
requerimento da parte ou de ofício, seja para aumentar ou diminuir o valor da
multa ou, ainda, para suprimi-la.
Verifica-se, assim, que as astreintes, sendo apenas um
mecanismo coercitivo posto à disposição do Estado-Juiz para fazer cumprir as
suas decisões, não ostentam caráter condenatório, tampouco transitam em
julgado, o que as afastam da base de cálculo dos honorários advocatícios.
O julgado acima comentado permanece válido com o CPC/2015?
Penso que sim. A redação do art. 85, § 2º do CPC/2015 também
fala em “valor da condenação”, de forma que deve ser aplicado o mesmo entendimento.