Dizer o Direito

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Não é necessária prévia autorização do cônjuge para que a pessoa preste aval em títulos de créditos típicos



Títulos de crédito
O título de crédito é um documento por meio do qual se prova que existe uma obrigação entre o(s) credor(es) e o(s) devedor(es), nos termos do que ali está escrito.
O conceito tradicional de título de crédito foi dado há décadas por um jurista italiano chamado Cesare Vivante: “título de crédito é o documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele contido ou mencionado”.
Essa definição foi adotada pelo CC-2002:
Art. 887. O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei.

Os títulos de crédito são muito importantes para a economia porque eles facilitam a obtenção e a circulação do crédito, além de conferirem maior segurança para os credores. Ex: se a pessoa quer comprar uma mercadoria, mas não tem dinheiro no momento, ela poderá assinar uma nota promissória e entregá-la ao vendedor, comprometendo-se a pagar a quantia em 30 dias. Houve a concessão de um crédito de forma simplificada e o credor terá em mãos uma garantia de pagamento. Com isso, mais negócios podem ser realizados.

Títulos de créditos típicos e atípicos
Existe uma classificação que divide os títulos de crédito em:
a) Típicos (nominados): são aqueles criados por uma legislação específica, que os regulamenta. Exs: letra de câmbio, nota promissória, cheque, duplicata, cédulas e notas de crédito.
b) Atípicos (inominados): são aqueles criados pela vontade dos próprios particulares segundo seus interesses. Isso é permitido, desde que não violem as regras do Código Civil. Como não são regulados por uma legislação específica, devem obedecer as normas do Código Civil que tratam sobre títulos de crédito.

O art. 903 do CC explica que a codificação privada (Código Civil) somente se aplica para os títulos de crédito atípicos. Veja:
Art. 903. Salvo disposição diversa em lei especial, regem-se os títulos de crédito pelo disposto neste Código.

Aval
Aval é o ato cambial de garantia por meio do qual um indivíduo, chamado de “avalista”, mesmo sem ser o devedor principal, se compromete a pagar o valor do título de crédito.
Nas palavras de Fábio Ulhoa Coelho:
“O aval é o ato cambiário pelo qual uma pessoa (avalista) se compromete a pagar título de crédito, nas mesmas condições que um devedor desse título (avalizado).” (Curso de Direito Comercial. Vol. 1. Direito de Empresa. 16ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 539).

Se uma pessoa vai dar o seu aval, ela precisará da concordância do seu cônjuge? Exige-se outorga uxória ou marital (concordância do cônjuge) para que a pessoa seja avalista?
• Leis que regem os títulos de crédito: NÃO. Não há previsão exigindo.
• Código Civil: SIM. Exige-se autorização do cônjuge, nos termos do art. 1.647, III:
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
(...)
III - prestar fiança ou aval;

Diante disso, indaga-se: o art. 1.647, III, do Código Civil aplica-se para todos os títulos de crédito? Se uma pessoa for dar um aval, por exemplo, em uma duplicata, será necessária a autorização do seu cônjuge?
NÃO.

O art. 1.647, III, do Código Civil somente se aplica para os títulos de crédito inominados (atípicos).
No caso de títulos de crédito nominados (típicos), é desnecessária a outorga uxória ou marital, não se aplicando a regra do Código Civil.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.526.560-MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 16/3/2017 (Info 604).

Conforme já explicado, no que tange aos títulos de crédito nominados, o Código Civil tem uma aplicação apenas subsidiária, respeitando-se as disposições especiais, pois o objetivo básico da regulamentação dos títulos de crédito, no Código Civil, foi apenas o de permitir a criação dos denominados títulos  atípicos  ou  inominados.
Assim, não deve ser aplicado art. 1.647, III, do CC aos títulos nominados porque esta regra é incompatível com as características dos títulos de crédito típicos.
A exigência de autorização do cônjuge do avalista enfraquece a garantia dos títulos de crédito, gerando intranquilidade e insegurança.
O aval consiste em uma declaração unilateral de vontade inserida no próprio título por meio da qual o avalista declara garantir o pagamento do valor inscrito no título. É, portanto, um instituto comercial muito mais ágil e informal do que a fiança, que é feita por intermédio de contrato.
A outorga uxória ou marital é compatível com o contrato de fiança, mas não com o aval que, como dito, é uma declaração unilateral. O portador do título de crédito, em regra, não tem contato algum com o avalista e, menos ainda, com algum documento de identificação deste por meio do qual possa descobrir seu estado civil.



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