Olá amigos do Dizer o Direito,
Foi publicada ontem (09/05/2017) mais
uma importante novidade legislativa.
Trata-se da Lei nº 13.441/2017,
que altera o ECA para prever a infiltração de agentes de polícia na internet
com o fim de investigar crimes contra a dignidade sexual de criança e de
adolescente.
Vamos fazer breves comentários a
respeito dessa Lei.
Investigação de crimes
relacionados com pedofilia na internet
Infelizmente, apesar de toda a
repressão policial e da sociedade, ainda são comuns os crimes sexuais tendo
como vítimas crianças e adolescentes. Tais delitos são, em geral, praticados
por meio da internet, onde os criminosos trocam entre si materiais de
pedofilia, além de atraírem crianças e adolescentes para que estas sejam
posteriormente vítimas de estupro de vulnerável, corrupção de menores,
favorecimento da prostituição, entre outros.
A investigação desses crimes é
muito complexa porque os criminosos interagem em redes sociais fechadas, com
pseudônimos e códigos, sendo extremamente difícil que a Polícia consiga
descobrir onde estão ocorrendo essas comunicações e troca de material de
pedofilia.
A única forma de descobrir a real
identidade dos criminosos e coletar provas da materialidade é conseguir fazer
com que os policiais consigam ingressar e participar por um tempo dessa rede de
pedófilos.
Essa prática é, inclusive,
utilizada em outros países do mundo, como os EUA, nos quais agentes do FBI se
fazem passar por pedófilos e conseguem ter acesso aos grupos fechados que
trocam esse tipo de material.
Pensando nisso, foi editada a Lei
nº 13.441/2017, que autoriza expressamente a infiltração de agentes de polícia
na internet com o fim de investigar crimes contra a dignidade sexual de criança
e de adolescente.
O tema foi tratado nos arts.
190-A a 190-E do ECA que foram acrescentados pela nova Lei.
O que é a infiltração de agentes?
A infiltração de agentes é uma
técnica especial de investigação por meio da qual um policial, escondendo sua
real identidade, finge ser também um criminoso a fim de ingressar na
organização criminosa e, com isso, poder coletar elementos informativos a
respeito dos delitos que são praticados pelo grupo, identificando os seus
integrantes, sua forma de atuação, os locais onde moram e atuam, o produto dos
delitos e qualquer outra prova que sirva para o desmantelamento da organização
e para ser utilizado no processo penal.
Por que a infiltração policial
precisa de regulamentação?
O policial infiltrado terá que
esconder sua real identidade, forjar documentos de identificação falsos, acompanhar
criminosos e, eventualmente, poderá até mesmo ser obrigado a praticar condutas
típicas.
Desse modo, são atividades que
precisam de um acompanhamento e fiscalização por parte do Ministério Público e
do Poder Judiciário a fim de que, em uma ponderação de interesses, seja
analisada a proporcionalidade de sua adoção no caso concreto, evitando-se
abusos e o desvirtuamento da medida.
Infiltração policial na Lei do
Crime Organizado
A infiltração policial não é uma
novidade em nosso país.
Essa técnica de investigação já
havia sido prevista no art. 53, I, da Lei nº 11.343/2006 e no art. 10 da Lei do
Crime Organizado (Lei 12.850/2013).
A Lei 12.850/2013 traz regras
sobre investigação criminal, prova e procedimento aplicáveis às:
• Infrações penais praticadas por
organização criminosa (art. 1º, § 1º);
• Infrações penais previstas em
tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no País, o
resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;
• Organizações terroristas
internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito internacional, por
foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo, bem como
os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas, ocorram ou possam
ocorrer em território nacional.
Agora nós temos uma terceira
previsão de infiltração policial no Brasil disciplinada pelos arts. 190-A a
190-E do ECA, inseridos pela Lei nº 13.441/2017.
INFILTRAÇÃO POLICIAL NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
|
||
Lei de Drogas
(art. 53, I)
|
Lei do Crime Organizado
(arts. 10 a 14)
|
ECA
(arts. 190-A a 190-E)
|
Principais
características:
• Não
prevê prazo máximo.
• Não
disciplina procedimento a ser adotado.
|
Principais
características:
• Prazo
de 6 meses, podendo ser sucessivamente prorrogada.
• Só
poderá ser adotada se a prova não puder ser produzida por outros meios
disponíveis.
|
Principais
características:
•
Prazo de 90 dias, sendo permitidas renovações, mas o prazo total da
infiltração não poderá exceder 720 dias.
•
Só poderá ser adotada se a prova não puder ser produzida por outros meios
disponíveis.
•
A infiltração de agentes ocorre apenas na internet.
|
Vamos aqui estudar, então, essa
nova modalidade de infiltração prevista no ECA.
Crimes para os quais poderá haver
a infiltração de que trata o ECA
Segundo o novo art. 190-A do ECA,
a infiltração de agentes de polícia na internet pode ocorrer para investigar os
seguintes crimes:
1) Produzir, filmar, registrar
etc. cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente (art.
240 do ECA);
2) Vender vídeo que contenha cena
de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente (art. 241
do ECA);
3) Oferecer, trocar,
disponibilizar, transmitir etc. fotografia ou vídeo que contenha cena de sexo
explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente (art. 241-A do ECA);
4) Adquirir, possuir ou armazenar
fotografia ou vídeo que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo criança ou adolescente (art. 241-B do ECA);
5) Simular a participação de
criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de
adulteração de fotografia ou vídeo (art. 241-C do ECA);
6) Aliciar, assediar, instigar ou
constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela
praticar ato libidinoso (art. 241-D do ECA);
7) Invadir dispositivo
informático alheio (art. 154-A do CP);
8) Estupro de vulnerável (art.
217-A do CP);
9) Corrupção de menores (art. 218
do CP);
10) Satisfação de lascívia
mediante presença de criança ou adolescente (art. 218-A do CP);
11) Favorecimento da prostituição
de criança, adolescente ou vulnerável (art. 218-B do CP).
É possível ampliar esse rol de crimes?
Em outras palavras, é permitida a infiltração policial na internet para a
investigação de outros delitos que não os acima listados?
Penso que não. Apesar de a lei
não ter expressamente proibido a utilização da infiltração policial para outros
delitos, o certo é que a regulamentação foi restrita, limitando-se a esses
crimes.
Além disso, o agente policial
infiltrado, a fim de não ser descoberto, pratica, em tese, condutas que
poderiam ser crimes. Justamente por isso, o art. 190-C do ECA afirma que
"não comete crime o policial que oculta a sua identidade para, por meio da
internet, colher indícios de autoria e materialidade dos crimes previstos nos
arts. 240, 241, 241-A, 241-B, 241-C e 241-D desta Lei e nos arts. 154-A, 217-A,
218, 218-A e 218-B do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código
Penal)."
Como esse art. 190-C do ECA
isenta o policial de crime apenas para a investigação dos delitos nele
listados, conclui-se que o agente que se infiltrasse para a prática de outros crimes
estaria sujeito a responder penalmente por ocultar a sua identidade.
Importante mencionar, contudo,
que a Lei nº 12.850/2013 (Lei do Crime Organizado) também permite a infiltração
de agentes de polícia. A Lei nº 12.850/2013 não trata de forma específica sobre
a infiltração na internet, mas ao prever a infiltração de forma genérica, abarca
tanto o mundo físico e o virtual.
Desse modo, além do rol do art.
190-A do ECA, é possível também a infiltração de agentes policiais na internet
nos seguintes casos tratados pela Lei nº 12.850/2013:
• Infrações penais praticadas por
organização criminosa;
• Infrações penais previstas em
tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no País, o
resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;
• Organizações terroristas
internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito internacional, por
foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo, bem como
os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas, ocorram ou possam
ocorrer em território nacional.
Serendipidade
Vale ressaltar que é
perfeitamente possível que o agente policial seja infiltrado para investigar
algum dos delitos do art. 190-A do ECA e, durante a infiltração, descubra
outros crimes, como, por exemplo, tráfico de drogas, tráfico de pessoas,
favorecimento da prostituição de adultos etc.
Neste caso, os elementos
indiciários ("provas") desses outros crimes, coletados pelo agente
infiltrado, também serão considerados válidos. Isso porque, neste caso, ocorreu
o chamado fenômeno da serendipidade, que consiste na descoberta fortuita de
delitos que não são objeto da investigação.
A serendipidade (tradução literal
da palavra inglesa serendipity), também é conhecida como “descoberta casual” ou
“encontro fortuito”.
Esse é o entendimento do STJ nos
casos de interceptação telefônica, raciocínio que pode ser transportado para a
infiltração policial. Confira precedente recente do Tribunal:
(...) 1. Não
há violação ao princípio
da ampla defesa a ausência das decisões que decretaram a quebra de sigilo telefônico
em investigação originária, na qual de modo fortuito ou serendipidade se
constatou a existência de indícios da prática de crime diverso do que se buscava, servindo os documentos juntados
aos autos como mera notitia criminis, em razão da total independência e
autonomia das investigações por não haver conexão delitiva.
2. O chamado fenômeno da serendipidade
ou o encontro fortuito de provas - que se
caracteriza pela descoberta de outros crimes ou sujeitos ativos em investigação
com fim diverso - não acarreta qualquer nulidade
ao inquérito que se sucede no foro competente, desde que remetidos os autos à instância
competente tão logo verificados indícios em face da autoridade. (...)
(RHC 60.871/MT, Rel. Ministro NEFI
CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 04/10/2016, DJe 17/10/2016)
Decisão judicial
A infiltração somente será
permitida se for previamente autorizada por decisão judicial devidamente
circunstanciada e fundamentada, que estabelecerá os limites da infiltração para
obtenção de prova.
O magistrado não deverá,
portanto, deferir pedidos de infiltração feitos de forma genérica e sem elementos
relacionados com o caso concreto.
Antes de decidir, o juiz deverá
ouvir o Ministério Público, caso este não tenha sido o autor do pedido.
Caráter subsidiário
A infiltração de agentes de
polícia na internet não será admitida se a prova puder ser obtida por outros
meios (art. 190-A, § 3º do ECA).
Desse modo, a infiltração
policial deverá ser considerada a ultima
ratio, ou seja, trata-se de prova subsidiária.
Quem pode requerer?
A infiltração será apreciada pelo
juiz a partir de:
a) requerimento do Ministério
Público; ou
b) representação do Delegado de
Polícia
Requistos do requerimento
O requerimento ou a representação
pedindo a infiltração deverá demonstrar:
• a necessidade da medida;
• o alcance das tarefas dos
policiais;
• os nomes ou apelidos das
pessoas investigadas e, quando possível,
• os dados de conexão ou
cadastrais que permitam a identificação dessas pessoas;
Dados de conexão são as
informações referentes a hora, data, início, término, duração, endereço de
Protocolo de Internet (IP) utilizado e terminal de origem da conexão.
Dados cadastrais, por sua vez,
são as informações referentes a nome e endereço de assinante ou de usuário
registrado ou autenticado para a conexão a quem endereço de IP, identificação
de usuário ou código de acesso tenha sido atribuído no momento da conexão.
Prazo de duração
A infiltração não poderá exceder
o prazo de 90 dias, sendo permitidas renovações, desde que demonstrada sua
efetiva necessidade.
Apesar de a Lei não ser expressa,
penso que o prazo máximo de cada renovação também é de 90 dias.
Pode haver sucessivas renovações
("várias renovações"), mas o prazo total da infiltração não poderá
exceder 720 dias (pouco menos de 2 anos).
A renovação da infiltração, assim
como ocorre com o seu deferimento inicial, também depende de autorização
judicial devidamente fundamentada.
Crítica à fixação de prazo máximo
O objetivo da Lei nº 13.441/2017,
ao fixar o prazo máximo de 720 dias para a infiltração, foi o de evitar que,
assim como ocorre com a interceptação telefônica, houvesse medidas que durassem
períodos muito longos, como 3 ou 4 anos.
Apesar da preocupação do
legislador não ser desarrazoada, não concordo com a escolha feita.
No caso da interceptação
telefônica, penso que seria adequada uma mudança legislativa para fixar um
prazo máximo. Talvez 2 anos, o que equivale a 730 dias. No entanto, na hipótese
de infiltração do policial na internet, penso que essa limitação não deveria
existir por três razões:
A primeira é que as redes
criminosas que envolvem pedofilia na internet são extremamente fechadas e
restritas. O agente policial não conseguirá se infiltrar facilmente no meio
desses grupos, considerando que tais criminosos se cercam de várias cautelas e
não admitem a participação de qualquer pessoa, salvo após um longo processo de
aquisição de confiança, que pode sim durar anos.
Logo, limitar esse prazo a 720
dias significa dizer que, em alguns casos, a infiltração terá que ser
interrompida quando o agente policial estava muito próximo de ingressar na rede
criminosa ou quando havia acabado de penetrar neste submundo, mas ainda não
tinha conseguido identificar a real identidade dos criminosos ou dados de
informática que permitam uma medida de busca e apreensão, por exemplo.
Dessa forma, este prazo de 720
dias, apesar de parecer longo, mostra-se, para quem trabalha com o tema, um
período insuficiente para o desmantelamento dos grandes grupos criminosos que,
quanto maiores, mais se cercam de anteparos para não serem descobertos.
A segunda razão pela qual penso
que não deveria haver prazo está no fato de que a medida de infiltração, ao
contrário da interceptação telefônica, não relativiza, de forma tão intensa,
direitos fundamentais dos investigados.
No caso da interceptação telefônica
existe uma invasão profunda na intimidade dos interlocutores, que terão todas
as suas conversas telefônicas ouvidas pelo Estado.
Já na hipótese da infiltração
policial, a intervenção estatal nos direitos fundamentais é bem menor,
considerando que o investigado é quem irá revelar, para o policial infiltrado,
aspectos relacionados com a sua intimidade, não havendo, contudo, interceptação
feita por terceiro que não participa do relacionamento.
A terceira razão está no fato de
que a infiltração policial prevista na Lei do Crime Organizado (Lei nº
12.850/2013) não prevê limite para o número de renovações, permitindo que elas
ocorram tantas vezes quantas forem necessárias (art. 10, § 3º). Vale ressaltar
que a infiltração policial da Lei do Crime Organizado é muito mais grave porque
envolve a presença física do agente policial no âmbito da organização criminosa,
enquanto que o art. 190-A do ECA autoriza apenas a infiltração pela internet.
Desse modo, para a interceptação
telefônica e para a infiltração de agentes da Lei do Crime Organizado,
situações graves, não existe prazo máximo. No entanto, para a infiltração do
art. 190-A do ECA, o legislador fixou o limite de 720 dias.
Medidas para ocultar a identidade
do policial infiltrado
A fim de garantir o sucesso da
infiltração e não ser descoberto, o policial será obrigado a adotar uma identidade
falsa. Para tanto, a Lei prevê que o juiz poderá determinar aos órgãos de
registro e cadastro público que incluam nos seus bancos de dados as informações
necessárias para efetivar a identidade fictícia criada.
Essa inclusão deverá ser feita
por meio de procedimento sigiloso numerado e tombado em livro específico. Isso
significa, por exemplo, que os cartórios de Registro de Pessoas Naturais
deverão manter esse livro específico para fazer tais registros.
Excludente de responsabilidade
penal
A Lei prevê que não comete crime
o policial que oculta a sua identidade para, por meio da internet, colher
indícios de autoria e materialidade dos crimes para os quais é permitida a
infiltração (art. 190-C do ECA).
Ex: se o agente policial tem que
fazer uma carteira de identidade falsa e utilizá-la para não ser descoberto
pela organização criminosa, não responderá por uso de documento falso (art. 304
do CP).
Vale ressaltar que esse art.
190-C do ECA disse menos do que deveria. Além dos delitos relacionados com a
ocultação de sua identidade, o agente policial também não irá responder por outros
crimes que ele seja obrigado a cometer para ingressar ou se manter na
organização criminosa e coletar informações sobre o grupo.
Ex: se o agente for obrigado a
retransmitir para outro integrante da organização imagens pornográficas de
crianças que ele recebeu, não responderá pelo crime do art. 241-A do ECA por
inexigibilidade de conduta diversa (causa excludente de culpabilidade), podendo
ser invocada a regra do art. 13, parágrafo único, da Lei nº 12.850/2013:
Art. 13 (...) Parágrafo único. Não é
punível, no âmbito da infiltração, a prática de crime pelo agente infiltrado no
curso da investigação, quando inexigível conduta diversa.
Excessos são punidos
O agente policial infiltrado que
deixar de observar a estrita finalidade da investigação responderá pelos
excessos praticados (art. 190-C, parágrafo único do ECA).
Ex: o agente foi infiltrado para
investigar crimes de pornografia infantil na internet. Não há sentido que ele mate
alguém, por exemplo, para demonstrar lealdade ao líder da organização
criminosa. Neste caso ele responderia por homicídio doloso e não poderia
invocar a excludente tendo em vista a desproporcionalidade existente entre a
sua conduta e a finalidade da investigação. Nesse sentido: NUCCI, Guilherme de
Souza. Leis penais e processuais penais.
Vol. 2, 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
Relatório circunstanciado
Concluída a investigação, todos
os atos eletrônicos praticados durante a operação deverão ser registrados,
gravados, armazenados e encaminhados ao juiz e ao Ministério Público,
juntamente com relatório circunstanciado.
Esses atos eletrônicos deverão
ser reunidos em autos apartados e apensados ao processo criminal juntamente com
o inquérito policial.
Deverá ser preservada a
identidade do agente policial infiltrado e a intimidade das crianças e dos
adolescentes envolvidos.
Relatórios parciais
Além disso, a autoridade judicial
e o Ministério Público poderão requisitar relatórios parciais da operação de
infiltração antes do término do prazo da medida.
Sigilo das informações da
operação
As informações da operação de
infiltração serão encaminhadas diretamente ao juiz responsável pela autorização
da medida, que zelará por seu sigilo.
Antes da conclusão da operação, o
acesso aos autos será reservado ao juiz, ao Ministério Público e ao Delegado de
Polícia responsável pela operação, com o objetivo de garantir o sigilo das
investigações.
Contraditório diferido
Diz-se que o contraditório é
diferido (postergado) porque, somente após o encerramento da diligência, a
defesa terá oportunidade de ter acesso ao relatório da infiltração, podendo
impugná-lo.
O que se veda é a publicidade da
infiltração durante o período em que ela estiver ocorrendo, sob pena de
frustrar a medida.
Direitos do agente policial
infiltrado
A atividade de infiltração
policial pode se revelar bastante penosa e arriscada ao agente incumbido dessa
diligência. Caso descoberto, o policial infiltrado pode ser morto. Após a
organização criminosa ser desmantelada, seria também possível a ocorrência de retaliações
contra o agente que estava infiltrado.
Ciente dessa situação, a Lei nº
12.850/2013, ao tratar sobre a infiltração de agentes nos casos de organização criminosa,
previu alguns direitos do agente infiltrado. Confira o texto legal:
Art. 14. São direitos do agente:
I - recusar ou fazer cessar a atuação
infiltrada;
II - ter sua identidade alterada,
aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 9º da Lei no 9.807, de 13 de
julho de 1999, bem como usufruir das medidas de proteção a testemunhas;
III - ter seu nome, sua qualificação,
sua imagem, sua voz e demais informações pessoais preservadas durante a
investigação e o processo criminal, salvo se houver decisão judicial em
contrário;
IV - não ter sua identidade revelada,
nem ser fotografado ou filmado pelos meios de comunicação, sem sua prévia
autorização por escrito.
Penso que seja possível estender
esses direitos também ao agente infiltrado de que trata o art. 190-A do ECA por
duas razões:
a) trata-se de analogia com a
finalidade de proteger a integridade física de um agente estatal;
b) a maioria dos grupos
criminosos que praticam delitos contra a dignidade sexual de crianças e
adolescentes na internet caracterizam-se como organizações criminosas (art. 1º,
§ 1º da Lei nº 12.850/2013), aplicando-se, por consequência, o art. 14 dessa
Lei.
Quem poderá atuar como agente
infiltrado?
A infiltração é feita por
"agentes de polícia" (art. 190-A do ECA).
O art. 144 da CF/88 menciona a
existência dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária
federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos
de bombeiros militares.
Desse rol, a Polícia Federal e a
Polícia Civil são os dois órgãos que possuem a função precípua de apurar
infrações penais (investigar crimes), nos termos do art. 144, § 1º, I e § 4º da
CF/88. Os demais têm funções mais relacionadas com policiamento ostensivo.
Assim, conclui-se que quem poderá
atuar como agente infiltrado, no caso do art. 190-A do ECA, são os agentes de Polícia
Federal e de Polícia Civil.
Obs1: mesmo que os fatos estejam
sendo apurados pelo Ministério Público por meio de procedimento de investigação
criminal (PIC), não será possível designar servidores do órgão para atuarem
como agentes infiltrados, considerando que não se tratam de agentes policiais.
Obs2: agentes do Sistema
Brasileiro de Inteligência (Sisbin) e da Agência Brasileira de Inteligência
(Abin) não podem atuar como agentes infiltrados, considerando que são
classificados como agentes de inteligência (e não agentes de polícia).
Obs3: é proibida a infiltração de
particulares. "No entanto, caso um dos integrantes da organização
criminosa resolva colaborar com as investigações para fins de ser beneficiado
com a celebração de possível acordo de colaboração premiada, há quem entenda
ser possível que o colaborador atue de modo infiltrado. Nesse caso, por mais
que esse colaborador não seja servidor policial, desde que haja autorização
judicial para a conjugação dessas duas técnicas especiais de investigação -
colaboração premiada e agente infiltrado -, é possível que o colaborador
mantenha-se infiltrado na organização criminosa com o objetivo de coletar
informações capazes de identificar os demais integrantes do grupo." (LIMA,
Renato Brasileiro de. Legislação criminal
especial comentada. 3ª ed., Salvador: Juspodivm, 2015, p. 574).
Márcio André Lopes Cavalcante
Professor