Dizer o Direito

sexta-feira, 31 de março de 2017

INFORMATIVO Comentado 856 STF




Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 856 STF.

Confira abaixo o índice. Bons estudos.


ÍNDICE DO INFORMATIVO 856 DO STF

Direito Constitucional
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
Na ADI a causa de pedir é aberta.

COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS
Estado-membro pode legislar sobre a concessão, por empresas privadas, de bolsa de estudos para professores.

DEFENSORIA PÚBLICA
Para que a DPE atue no STJ é necessário que possua escritório de representação em Brasília.

DIREITO PENAL
CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Receber propina sob o disfarce de doações eleitorais oficiais e tipificação penal.

CRIMES DA LEI DE LICITAÇÕES
O crime do art. 89 da Lei 8.666/93 exige dano ao erário?
Critérios para verificação judicial da viabilidade da denúncia pelo art. 89.

DIREITO PROCESSUAL PENAL
NULIDADES
A investigação criminal contra Prefeito deverá ser feita com o controle jurisdicional do TJ.
Declarações colhidas em âmbito estritamente privado sem acompanhamento de autoridade pública não apresentam confiabilidade.
A denúncia contra Prefeito por crime em licitação municipal deve indicar sua participação ou conhecimento acerca dos fatos.
Em caso de denúncia envolvendo crime do DL 201/67 e delito diverso, deverá ser assegurada a defesa prévia para ambas as imputações.

DIREITO TRIBUTÁRIO
IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS
Os livros eletrônicos gozam de imunidade tributária.
Os componentes eletrônicos que fazem parte de curso em fascículos de montagem de placas gozam de imunidade tributária

ICMS
Inconstitucionalidade de lei estadual que concede isenção de ICMS para empresas patrocinadoras de bolsas de estudo.
Inconstitucionalidade de lei estadual que concede vantagens no parcelamento do ICMS para empresas que aderirem a programa de geração de empregos.













INFORMATIVO Comentado 856 STF - Versão Resumida


Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 856 STF - Versão Resumida.

Bons estudos.










quinta-feira, 30 de março de 2017

Errata - Revisões MP/MG e TJ/PR



Olá pessoal, fazer essas revisões para as provas dá um imenso trabalho porque tenho que checar centenas de julgados para saber qual deles é importante para cada carreira e também verificar se algum já foi superado.

Nesta atividade, pode ser que eu cometa alguns erros. E foi o que, infelizmente, aconteceu nas revisões para os concursos do MP/MP e TJ/PR.

Gostaria, por favor, que consertassem três erros:

Pág. 80 (MP/MG) - Pág. 6 (TJ/PR)

Cláusula que prevê prorrogação da fiança em caso de prorrogação do contrato principal
Fazer uma observação de que a súmula 214 do STJ somente se aplica para contratos Lei nº 12.112/2009.

O art. 39 da Lei de Locações foi alterado pela Lei nº 12.112/2009 e passou a ter a seguinte redação:
Art. 39. Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado, por força desta Lei.

Esse assunto foi explicado no Livro Principais Julgados 2012, que está disponível gratuitamente aqui no site.

Pág. 117 (MP/MG) - Pág. 34 (TJ/PR)

Constou aqui o seguinte julgado:
Abusividade na distinção de preço para pagamento em dinheiro, cheque ou cartão de crédito
Caracteriza prática abusiva quando o fornecedor de bens e serviços prevê preços mais favoráveis para o consumidor que paga em dinheiro ou cheque em detrimento daquele que paga em cartão de crédito. STJ. 2ª Turma. REsp 1.479.039-MG, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 6/10/2015 (Info 571).

Ocorre que no final do ano passado foi editada a MP 764/2016, permitindo que os estabelecimentos comerciais (e outros fornecedores de bens ou serviços) possam cobrar mais caro pelo produto caso o consumidor opte por pagar com cartão de crédito ou com cheque em vez de pagar com dinheiro. Expliquei o tema neste post.

A MP ainda não foi aprovada. Então, no momento da prova, é importante ficar atento ao enunciado da questão. Pode ser que exijam a MP.

Pág. 117 (MP/MG) - Pág. 34 (TJ/PR)

Constou aqui a reprodução da súmula 321 do STJ, mas ela já foi cancelada, conforme expliquei aqui.

Agradeço aos leitores que me enviaram o alerta sobre os equívocos acima expostos.



Os livros eletrônicos gozam de imunidade tributária


Imunidade tributária
Imunidade tributária consiste na determinação feita pela Constituição Federal de que certas atividades, rendas, bens ou pessoas não poderão sofrer a incidência de tributos.
Trata-se de uma dispensa constitucional de tributo.
A imunidade é uma limitação ao poder de tributar, sendo sempre prevista na própria CF.
As normas de imunidade tributária constantes da Constituição objetivam proteger valores políticos, morais, culturais e sociais essenciais e não permitem que os entes tributem certas pessoas, bens, serviços ou situações ligadas a esses valores.

Imunidade do art. 150, VI, “d”, da CF/88
O art. 150, VI, “d”, da CF/88 prevê que os “livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão” gozam de imunidade tributária quanto aos impostos:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI – instituir impostos sobre:
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.

Vamos estudar um pouco mais sobre esta previsão:

Nomenclatura
É chamada pela doutrina de imunidade tributária “cultural” ou “de imprensa”.

Razão de sua existência
Esta imunidade foi prevista pelo legislador constituinte como uma forma de fomentar a difusão da cultura, do ensino e da liberdade de expressão, evitando que tais manifestações fossem impedidas ou dificultadas por força do pagamento de impostos.

Histórico desta imunidade
O Min. Dias Toffoli, em rico voto no RE 330817/RJ, aponta as razões históricas que motivaram a previsão desta imunidade.
No período histórico conhecido como Estado Novo (1937 a 1945), o Governo cobrava elevado imposto dos jornais que divulgavam ideias contrárias ao regime quando estes importavam papeis. Por outro lado, concediam benefícios fiscais aos jornais partidários do Governo. Era uma forma de censura indireta.
A Constituição Federal de 1946, com o intuito de acabar com este controle estatal da imprensa, conferiu imunidade tributária ao “papel” e, além disso, com o objetivo de estimular a produção editorial, também estendeu esta imunidade para os livros.
A Constituição Federal de 1967 manteve a imunidade, prevendo que era vedado criar imposto sobre “o livro, os jornais e os periódicos, assim como o papel destinado à sua impressão” (art. 20, III, d).
A Constituição Federal de 1969 (para alguns, apenas uma Emenda Constitucional à CF/67) manteve a imunidade, com pequena alteração em seu texto.

Imunidade objetiva
As alíneas “a”, “b” e “c” do inciso VI do art. 150 da CF/88 tratam de imunidade subjetiva.
A imunidade desta letra “d” (imunidade cultural) é classificada com objetiva (ou real). Isso porque recai apenas sobre bens (livros, jornais, periódicos e o papel) e não se refere a impostos pessoais.
“A aplicação da imunidade independe da pessoa que os produza ou que os comercialize; ou seja, não importa se se está diante de uma editora, uma livraria, uma banca de jornal, um fabricante de papel, um vendedor de livros, do autor ou de uma gráfica, pois o que importa à imunidade é o objeto e não a pessoa.” (Min. Dias Toffoli).

Exemplos dessa imunidade
Quando o livro sai da gráfica, não paga IPI; quando é vendido pela livraria, não paga ICMS; quando é importado, não paga Imposto de Importação.

Estão fora da imunidade cultural
Pelo fato da imunidade cultural não ser subjetiva, a gráfica, a livraria e o importador pagarão IR por conta da renda que obtiverem. Isso porque as pessoas (sujeitos) que trabalham com livros, jornais, periódicos etc. não gozam de imunidade.
De igual forma, não é qualquer bem que goza da imunidade, mas tão-somente os livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão. Assim, por exemplo, a imunidade não abrange:
• os carros da editora/jornal (deverão pagar IPVA);
• os imóveis da editora/jornal (deverão pagar IPTU).

O conteúdo do jornal, da revista ou do periódico influencia no reconhecimento da imunidade? O Fisco pode cobrar o imposto se a revista não tiver “conteúdo cultural”?
NÃO. Não importa o conteúdo do livro, jornal ou periódico. Assim, um livro sobre piadas, um álbum de figurinhas ou uma revista pornográfica gozam da mesma imunidade que um compêndio sobre Medicina ou História.
O STF já reconheceu que até mesmo as listas telefônicas são imunes (AI 663747 AgR).
Em suma, todo livro, revista ou periódico é imune, considerando que a CF/88 não estabeleceu esta distinção, não podendo ela ser feita pelo intérprete (STF RE 221.239/SP).

Imunidade incondicionada
A norma constitucional que prevê a imunidade cultural é dotada de eficácia plena e aplicabilidade imediata, não precisando de lei para regulamentá-la. Por essa razão, é classificada como uma imunidade incondicionada (não depende do preenchimento de nenhuma condição prevista em lei, bastando ser livro, jornal, periódico ou o papel destinado à sua impressão).

Conceito de livros
O conceito de livro deve ser utilizado em sentido amplo. Assim, incluem-se aqui os manuais técnicos e as apostilas (STF RE 183.403/SP).

Livros veiculados em formato digital (e-books) estão abrangidos pela imunidade?
SIM. A imunidade de que trata o art. 150, VI, “d” da CF/88 alcança o livro digital (“e-book”). O STF, apreciando o tema sob a sistemática da repercussão geral, fixou a seguinte tese:

A imunidade tributária constante do art. 150, VI, “d”, da Constituição Federal (CF), aplica-se ao livro eletrônico (“e-book”), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo.
STF. Plenário. RE 330817/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 8/3/2017 (repercussão geral) (Info 856).

Segundo afirmou o STF, a imunidade do art. 150, VI, “d”, da CF/88 não abrange apenas os livros produzidos pelo “método gutenberguiano”.
Antes de prosseguir na explicação do julgado, é importante esclarecer uma curiosidade: Johann Gutenberg foi um alemão que, no século XV, teria inventado (ou aperfeiçoado) a máquina de impressão tipográfica. Antes dele, os livros eram todos manuscritos. Assim, o primeiro livro impresso do mundo foi feito na máquina desenvolvida por este alemão. Trata-se de uma Bíblia em latim, que ficou historicamente conhecida como a “Bíblia de Gutemberg”.
Desse modo, quando o STF fala em livro produzido pelo “método gutenberguiano”, o que ele está querendo dizer é livro impresso.
Voltando ao julgado.
O livro pode ser veiculado em diversos tipos de suporte, seja ele tangível (ex: papel) ou intangível (ex: digital). Aliás, no passado, os livros já foram feitos de diferentes materiais: entrecasca de árvores, folha de palmeira, bambu reunido com fios de seda, placas de argila, placas de madeira, pergaminho (proveniente da pele de carneiro) etc.
Isso tudo nos leva à conclusão de que o papel é apenas um elemento acidental no conceito de livro.
Quando se fala que algo é um elemento acidental, isso significa que ele pode existir ou não. Ao contrário, quando se diz que algo é um elemento essencial, obrigatoriamente ele tem que estar presente.
O papel é um elemento acidental (e não essencial) do conceito de livro. Em outras palavras, existe livro mesmo sem papel.
Nas palavras do Min. Dias Toffoli: “o suporte das publicações é apenas o continente (“corpus mechanicum”) que abrange o conteúdo (“corpus misticum”) das obras e, portanto, não é o essencial ou o condicionante para o gozo da imunidade.”
O fato de os livros eletrônicos permitirem uma maior capacidade de interação com o leitor/usuário (a partir de uma máquina), em comparação com os livros contidos nos códices (livros impressos em papel), não é motivo para se negar a eles a imunidade tributária. O aumento dessa interação é natural e está ligado ao processo evolutivo da cultura escrita trazendo novas funcionalidades como a busca de palavras, o aumento ou a redução do tamanho da fonte etc. Além disso, o usuário pode carregar consigo centenas de livros armazenados no leitor digital. Isso tudo facilita a difusão da cultura.

Os “e-readers”, ou seja, aparelhos eletrônicos utilizados exclusivamente para ler livros digitais também gozam da imunidade tributária? Ex: um Kindle (Amazon), Lev (Saraiva), Kobo (Livraria Cultura) também estariam protegidos pela imunidade tributária?
SIM. O avanço na cultura escrita fez com que fossem criadas novas tecnologias para o suporte dos livros, como o papel eletrônico (“e-paper”) e o aparelho eletrônico para leitura de obras digitais ( “e-reader”). Tais aparelhos tem a função de imitar a leitura em papel físico. Por essa razão, eles estão igualmente abrangidos pela imunidade cultural, por equipararem-se aos livros tradicionais.
Assim, a partir de uma interpretação teleológica conclui-se que a regra de imunidade alcança também os aparelhos leitores de livros eletrônicos (“e-readers”) confeccionados exclusivamente para esse fim.
Vale ressaltar que a maioria dos “e-readers” possuem algumas funcionalidades acessórias ou rudimentares, como a possibilidade de acesso à internet para fazer o “download” dos livros digitais, dicionários, possibilidade de alteração de tipo e tamanho da fonte, marcadores, espaçamento, iluminação do texto etc. Essas funcionalidades são acessórias e têm por objetivo permitir a função principal: a leitura. Por essa razão, mesmo com essas funcionalidades, os “e-readers” são considerados como um suporte utilizado exclusivamente para fixar o livro eletrônico e, portanto, gozam de imunidade.

É possível ler livros digitais em “smartphones”, “tablets” e “laptops”. Isso significa que eles também devem gozar de imunidade tributária?
NÃO. O STF afirmou que a imunidade tributária aplica-se ao livro eletrônico e aos “suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo”.
Um “smartphone”, um “tablet” ou um “laptop” não podem ser considerados suportes utilizados exclusivamente para fixar um livro eletrônico. Ao contrário, tais aparelhos possuem centenas de funcionalidades e a leitura de livros digitais neles é apenas uma das possibilidades, podendo até mesmo ser considerada secundária.
Dessa forma, os tablets não gozam da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, “d”, da CF/88.

Imagine que o livro digital está contido dentro de um CD-Rom, sendo assim vendido para o público. Esse CD-Rom gozará de imunidade tributária?
SIM. Neste caso, o CD-Rom é apenas um corpo mecânico ou suporte. Aquilo que está nele fixado (seu conteúdo textual) é o livro. Por essa razão, tanto o suporte (o CD-Rom) quanto o livro (conteúdo) estão abarcados pela imunidade do art. 150, VI, “d”, da CF/88.

A imunidade tributária alcança também o audiolivro (“áudio book”)?
SIM. Para que seja considerado livro e possa gozar da imunidade não é necessário que o destinatário (consumidor) tenha necessariamente que passar sua visão pelo texto e decifrar os signos da escrita.
Dessa forma, a imunidade alcança o denominado “audio book” (audiolivro), ou seja, os livros gravados em áudio e que estejam salvos em CD, DVD ou qualquer outro meio.
Essa é a conclusão a que se chega a partir de uma interpretação teleológica da norma, que tem por objetivo garantir a liberdade de informação, a democratização e a difusão da cultura, bem como a livre formação da opinião pública.
Vale relembrar que os audiolivros cumprem importante função social por permitirem levar cultura e informação aos cegos e também aos analfabetos.

Havia um argumento no sentido de que durante os debates da constituinte de 1988 foi aventada a possibilidade de se incluir os livros digitais na imunidade e que isso teria sido expressamente rejeitado, o que revelaria a intenção do legislador de restringir o benefício ao livro físico. Essa alegação é pertinente?
NÃO. Segundo defendeu o Min. Dias Toffoli, o argumento de que a vontade do legislador histórico foi restringir a imunidade ao livro editado em papel não se sustenta em face da própria interpretação histórica e teleológica do instituto.
Ainda que se partisse da premissa de que o objetivo do legislador constituinte de 1988 tivesse sido restringir a imunidade, seria de se invocar, ainda, a interpretação evolutiva, método interpretativo específico das normas constitucionais.
Os fundamentos racionais que levaram à edição do art. 150, VI, “d”, da CF/88 continuam a existir mesmo quando levados em consideração os livros eletrônicos, inequívocas manifestações do avanço tecnológico que a cultura escrita tem experimentado.
Utilizando-se de uma interpretação evolutiva da norma, chega-se à conclusão de que os livros eletrônicos estão sim inseridos no âmbito dessa imunidade tributária.

Componentes eletrônicos que compõem o material didático. Imagine a seguinte situação: determinada editora comercializa fascículos (uma espécie de apostila) nas quais ensina como montar computadores. O consumidor que compra esses fascículos recebe também, dentro deles, pequenos componentes eletrônicos para que ele possa aplicar, na prática, aquilo que está lendo na apostila. Quando a editora vai adquirir esses componentes eletrônicos para colocar nos fascículos, tais bens serão também imunes?
SIM. A parte impressa (fascículos) e o material demonstrativo (componentes eletrônicos) formam um conjunto com o qual se ensina como montar as placas de computadores.
O Min. Marco Aurélio afirmou que o dispositivo constitucional que garante imunidade tributária a livros, jornais, periódicos e ao papel destinado a sua impressão deve ser interpretado de forma ampliada para abranger peças e componentes a serem utilizados como material didático que acompanhe publicações.
O art. 150, inciso VI, “d”, da CF/88 deve ser lido de acordo com os avanços tecnológicos ocorridos desde sua promulgação, em 1988. Desde então, ocorreram diversos avanços no campo da informática.
O Direito, a Constituição e o STF não podem ficar avessos às transformações, sob pena de se tornarem obsoletos. Afirmou ainda que, na medida do possível, o Supremo deve ser intérprete contemporâneo das normas. Para o Ministro, o “constituinte originário não poderia antever tamanho avanço tecnológico”.
No caso concreto, essas pequenas peças nada representam sem o curso teórico, ou seja, as ditas “pecinhas” nada mais são do que partes integrantes dos fascículos, estando, portanto, esse conjunto abarcado pela referida imunidade tributária.
O STF apreciou o caso sob a sistemática da repercussão geral e fixou a seguinte tese:

A imunidade da alínea “d” do inciso VI do art. 150 da CF/88 alcança componentes eletrônicos destinados, exclusivamente, a integrar unidade didática com fascículos.
STF. Plenário. RE 595676/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 8/3/2017 (repercussão geral) (Info 856).

Jornais
Os jornais gozam de imunidade, mesmo que contenham publicidade em seu corpo (anúncios, classificados etc.), considerando que isso constitui fonte de renda necessária para continuar a difusão da cultura (Ricardo Alexandre).
Contudo, algumas vezes, junto com o jornal vêm alguns folhetos separados contendo publicidade de supermercados, lojas etc. Tais encartes publicitários não são parte integrante (indissociável) do jornal e não se destinam à difusão da cultura (possuem finalidade apenas comercial), razão pela qual NÃO gozam de imunidade (RE 213.094/ES).

Papel
O papel utilizado para a impressão de livros, jornais e periódicos também é imune.
Não importa o tipo e a qualidade do papel. Basta que ele seja utilizado para a produção de livros, jornais e periódicos.
Esta imunidade não alcança o barbante, a liga, a cola e outros insumos utilizados na produção e que não sejam papel.

(...) O Supremo Tribunal Federal possui entendimento no sentido de que a imunidade tributária prevista no art. 150, VI, d, da Constituição Federal deve ser interpretada restritivamente e que seu alcance, tratando-se de insumos destinados à impressão de livros, jornais e periódicos, estende-se, exclusivamente, a materiais que se mostrem assimiláveis ao papel, abrangendo, por consequência, os filmes e papéis fotográficos. Precedentes. (...)
(RE 504615 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado em 03/05/2011)

A imunidade pode abranger filmes e papéis fotográficos:
Súmula 657-STF: A imunidade prevista no art. 150, VI, “d”, da Constituição Federal abrange os filmes e papeis fotográficos necessários à publicação de jornais e periódicos.

Chapas de impressão: NÃO são imunes
A imunidade tributária prevista no art. 150, VI, "d," da CF/88 deve ser interpretada finalisticamente à promoção da cultura e restritivamente no tocante ao objeto, na medida em que alcança somente os insumos assimiláveis ao papel.
STF. 1ª Turma. ARE 930133 AgR-ED, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 23/09/2016.

Listas telefônicas: são imunes
A edição de listas telefônicas goza de imunidade tributária prevista no art. 150, VI, "d", da CF/88.
A imunidade tributária prevista em prol de livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão, ostenta caráter objetivo e amplo, alcançando publicações veiculadoras de informações genéricas ou específicas, ainda que desprovidas de caráter noticioso, discursivo, literário, poético ou filosófico.
STF. 1ª Turma. RE 794285 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 24/05/2016.

Papel para propaganda: não é imune
Os veículos de comunicação de natureza propagandística de índole eminentemente comercial e o papel utilizado na confecção da propaganda não estão abrangidos pela imunidade definida no art. 150, VI, "d", da CF/88, uma vez que não atendem aos conceitos constitucionais de livro, jornal ou periódico contidos nessa norma.
STF. 2ª Turma. ARE 807093 ED/MG, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 05/08/2014.

Serviços de distribuição de livros, jornais e periódicos: NÃO são imunes
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que a distribuição de periódicos, revistas, publicações, jornais e livros não está abrangida pela imunidade tributária da alínea “d” do inciso VI do art. 150 da CF/88.
STF. 2ª Turma. RE 630462 AgR, Rel. Min. Ayres Britto, julgado em 07/02/2012.

Serviços de composição gráfica: NÃO são imunes
Segundo o STF, as prestadoras de serviços de composição gráfica, que realizam serviços por encomenda de empresas jornalísticas ou editoras de livros, não estão abrangidas pela imunidade tributária prevista no art. 150, VI, d, da CF.
As empresas que fazem composição gráfica para editoras, jornais etc. são meras prestadoras de serviço e, por isso, a elas não se aplica a imunidade tributária.
STF. 2ª Turma. RE 434826 AgR/MG, rel. orig. Min. Cezar Peluso, red. p/ o acórdão Min. Celso de Mello, julgado em 19/11/2013 (Info 729).


quarta-feira, 29 de março de 2017

O STF, ao julgar ações de controle abstrato de constitucionalidade, não está vinculado aos fundamentos jurídicos invocados pelo autor



Imagine a seguinte situação:
O Paraná editou a Lei nº 15.054/2006 prevendo que as empresas privadas que aderissem a um determinado programa de geração de empregos no Estado teriam direito a vantagens no parcelamento de débitos do ICMS.
Vale ressaltar que esta Lei foi de iniciativa parlamentar.

ADI
O Governador do Estado ajuizou ADI alegando que a referida lei seria:
a) formalmente inconstitucional por vício de iniciativa;
b) materialmente inconstitucional por ofensa ao princípio da isonomia;

O STF rejeitou esses dois argumentos, mas resolveu declarar a Lei inconstitucional com base em um terceiro fundamento que não foi alegado pelo autor da ADI: o de que a Lei violou o art. 155, § 2º, XII, “g”, da CF/88, que prevê que qualquer benefício fiscal relacionado com ICMS somente pode ser concedido após deliberação dos Estados.

Isso é possível? O STF poderá declarar uma lei inconstitucional com base em outro fundamento jurídico que não foi alegado pelo autor da ADI?
SIM.

O STF, ao julgar as ações de controle abstrato de constitucionalidade, não está vinculado aos fundamentos jurídicos invocados pelo autor.
Assim, pode-se dizer que na ADI, ADC e ADPF, a causa de pedir (causa petendi) é aberta.
Isso significa que todo e qualquer dispositivo da Constituição Federal ou do restante do bloco de constitucionalidade poderá ser utilizado pelo STF como fundamento jurídico para declarar uma lei ou ato normativo inconstitucional.
STF. Plenário. ADI 3796/PR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 8/3/2017 (Info 856).

Por outro lado, pelo fato de a causa de pedir ser aberta, se o STF julgar improcedente uma ADI, isso quer dizer que o Tribunal afirmou que a lei impugnada não violou nenhum dispositivo da Constituição Federal, quer tenha sido invocado pelo autor ou não (STF. 1ª Turma. RE 372535 AgR-ED, Rel. Min. Carlos Britto, julgado em 09/10/2007).

Veja como Nathalia Masson explica o tema:
"Quanto aos fundamentos, não vale a regra da adstrição. Isso significa que o Supremo Tribunal não se vincula aos fundamentos jurídicos apresentados na peça inaugural, de forma que a causa de pedir pode ser considerada aberta. Assim, o legitimado ativo está obrigado a apresentar a fundamentação do seu pedido, sob pena de, não o fazendo, a Corte não conhecer a ação direta; todavia a Corte pode julgar com base em fundamentos diversos. Para ilustrar, imaginemos que o legitimado ativo ingresse com uma ADI alegando a inconstitucionalidade da lei "X", que instituiu um tributo, ao argumento de que ela violou o princípio da legalidade. O STF decide-se pela procedência do pedido, no entanto, por fundamento diverso: a lei em análise não afetou o princípio da legalidade, ao contrário, é inconstitucional por ofensa ao princípio da anterioridade tributária.
É importante reconhecer a necessidade de a Corre percorrer todos os dispositivos constitucionais para decidir, afinal, quando ela afirma que uma determinada lei é constitucional, isso importa no reconhecimento de sua compatibilidade com rodos os preceitos da Constituição. Por isso, não basta que o STF avalie somente os fundamentos apresentados pelo autor, eis que a lei não pode ser considerada constitucional só porque não ofende o parâmetro indicado pelo legitimado ativo nos fundamentos: ela é constitucional somente se além de não ofender o parâmetro constitucional indicado pelo legitimado, não ofender também nenhum outro dispositivo constitucional." (MASSON, Nathalia. Manual de Direito Constitucional. 3ª ed., Salvador: Juspodivm, 2015, p. 1106-1107).


terça-feira, 28 de março de 2017

INFORMATIVO Comentado 855 STF




Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 855 STF.

Confira abaixo o índice. Bons estudos.


ÍNDICE DO INFORMATIVO 855 DO STF

DIREITO PROCESSUAL CIVIL
COMPETÊNCIA
STF não é competente para julgar ação proposta por juiz federal pleiteando licença-prêmio.

DIREITO PENAL
LATROCÍNIO
Agente que participou do roubo pode responder por latrocínio ainda que o disparo que matou a vítima tenha sido efetuado pelo corréu.

DIREITO PROCESSUAL PENAL
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
Renovação das interceptações.

NULIDADES
"Denúncia anônima" e interceptação telefônica.

DIREITO TRIBUTÁRIO
IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
A imunidade tributária subjetiva é aplicada se a entidade imune for contribuinte de fato?
Os requisitos para o gozo de imunidade devem estar previstos em lei complementar.

ICMS
Constitucionalidade de regime tributário opcional com redução da base de cálculo condicionada à renúncia ao regime de apuração normal de créditos e débitos.













INFORMATIVO Comentado 855 STF - Versão Resumida


Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 855 STF - Versão Resumida.

Bons estudos.










domingo, 26 de março de 2017

Estou há 5 anos estudando para concursos e não sou aprovado. Por que isso acontece?


Uma pessoa nos mandou a seguinte pergunta: estou estudando há 5 anos para concursos e ainda não fui aprovado. Qual é o problema? Por que isso acontece?

Neste vídeo explicamos as prováveis razões para isso estar acontecendo.


Baixe o livro gratuito em PDF do Método de Aprovação no link: http://www.metododeaprovacao.com.br/dizerodireito/livro.html  

Grande Abraço,

Gerson Aragão e Márcio Cavalcante


Revisão para o concurso de Juiz de Direito TJ/PR


Olá amigos do Dizer o Direito,

Está disponível a revisão para o concurso de Juiz de Direito do Paraná.

Boa prova.


sábado, 25 de março de 2017

Revisão para o concurso de Promotor MP/MG 2017


Olá amigos do Dizer o Direito,

Está disponível a revisão para o concurso de Promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais.

Boa prova.



sexta-feira, 24 de março de 2017

Se há uma única subtração patrimonial, mas com dois resultados morte, haverá concurso formal de latrocínios ou um único crime de latrocínio?



Imagine a seguinte situação hipotética:
Carlos e Luiza, casal de namorados, estão entrando no carro quando são rendidos por João, assaltante armado que deseja subtrair o veículo.
Carlos acaba reagindo e João atira contra ele e Luiza, matando o casal.
João foge levando o carro.
Repare que, na situação concreta, houve a subtração do patrimônio de uma única pessoa (carro de Carlos), mas ocorreram duas mortes.
Diante disso, o Ministério Público alegou que João deveria responder por dois latrocínios em concurso formal. Além disso, para o Parquet, trata-se de concurso formal impróprio, uma vez que o agente teria desígnios autônomos já que ele efetuou dois disparos de arma de fogo, um contra cada vítima.
A defesa, por sua vez, alegou que houve um único crime de latrocínio.

Qual das duas teses é acolhida pela jurisprudência? Se há uma única subtração patrimonial, mas com dois resultados morte, haverá concurso formal de latrocínios ou um único crime de latrocínio?
STJ: concurso formal
STF e doutrina: 
um único crime de latrocínio
É pacífico na jurisprudência do STJ o entendimento de que há concurso formal impróprio no latrocínio quando ocorre uma única subtração e mais de um resultado morte, uma vez que se trata de delito complexo, cujos bens jurídicos tutelados são o patrimônio e a vida.
STJ. 5ª Turma. HC 336.680/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 17/11/2015.

Prevalece, no STJ, o entendimento no sentido de que, nos delitos de latrocínio - crime complexo, cujos bens jurídicos protegidos são o patrimônio e a vida -, havendo uma subtração, porém mais de uma morte, resta configurada hipótese de concurso formal impróprio de crimes e não crime único.
STJ. 6ª Turma. HC 185.101/SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 07/04/2015.
(...) 7. Caracterizada a prática de latrocínio consumado, em razão do atingimento de patrimônio único. 8. O número de vítimas deve ser sopesado por ocasião da fixação da pena-base, na fase do art. 59 do CP. (...)
STF. 2ª Turma. HC 109539, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 07/05/2013.

(...) Segundo entendimento acolhido por esta Corte, a pluralidade de vítimas atingidas pela violência no crime de roubo com resultado morte ou lesão grave, embora único o patrimônio lesado, não altera a unidade do crime, devendo essa circunstância ser sopesada na individualização da pena (...)
STF. 2ª Turma. HC 96736, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 17/09/2013.

Em suma:
• STJ: ocorrendo uma única subtração, porém com duas ou mais mortes, haverá concurso formal impróprio de latrocínios.
• STF: sendo atingido um único patrimônio, haverá apenas um crime de latrocínio, independentemente do número de pessoas mortas. O número de vítimas deve ser levado em consideração na fixação da pena-base (art. 59 do CP). É a posição também da doutrina majoritária.



quarta-feira, 22 de março de 2017

Quando a entidade imune é apenas contribuinte de fato, haverá mesmo assim imunidade tributária?


Imunidade tributária
Imunidade tributária consiste na determinação feita pela Constituição Federal de que certas atividades, rendas, bens ou pessoas não poderão sofrer a incidência de tributos.
Trata-se de uma dispensa constitucional de tributo.
A imunidade é uma limitação ao poder de tributar, sendo sempre prevista na própria CF.

Imunidades subjetiva, objetiva e mista
Como vocês sabem, a doutrina adora criar classificações sobre os institutos jurídicos.
As imunidades também são classificadas segundo diversos critérios.
Uma das classificações diz que existem três espécies de imunidades:

a) SUBJETIVA (PESSOAL)
b) OBJETIVA (REAL)
c) MISTAS
Ocorre quando a imunidade foi instituída em razão das características de uma determinada pessoa.
Ocorre quando a imunidade foi instituída em função de determinados fatos, bens ou situações.
Verifica-se quando ocorre uma combinação entre os dois critérios anteriores.
Ex: art. 150, VI, "a", "b" e "c", da CF/88.
Ex: art. 150, VI, "d", da CF/88.
Ex: art. 153, § 4º, II, da CF/88.
Assim, a imunidade que beneficia instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos é uma imunidade subjetiva, considerando que foi criada em função da condição pessoal dessas instituições.
A imunidade que recai sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão é objetiva porque não interessa quem seja a pessoa envolvida, mas sim esta lista de bens.
A CF/88 prevê que o ITR não incide sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore o proprietário que não possua outro imóvel.
"Tal imunidade é mista porque depende de aspectos subjetivos (o proprietário possuir apenas um imóvel) e objetivos (a área da pequena gleba estar dentro dos limites da lei" (ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário, p. 206).

Tributos indiretos
Tributos indiretos são aqueles que permitem a transferência do seu encargo econômico para uma pessoa diferente daquela definida em lei como sujeito passivo. Exemplos mais conhecidos: IPI, ICMS, ISS e IOF.
Assim, quando você recebe a conta de energia elétrica, por exemplo, vai ter um campo chamado detalhamento da conta. Nele você irá encontrar a discriminação dos itens que você está pagando enquanto consumidor:
Consumo: R$ xxx
ICMS: yyy
Total: xxx + yyy

Dessa forma, o "contribuinte de direito" ("pela lei") do ICMS é a empresa concessionária de energia elétrica. No entanto, ela oficialmente está autorizada a repassar este tributo para o consumidor. Logo, o consumidor final é quem acaba sendo o "contribuinte de fato".
Como explica Ricardo Alexandre:
"O ICMS é tributo indireto. Todo o seu ônus econômico-financeiro é transferido para o consumidor que, ao pagar o preço da mercadoria, paga também o valor do imposto que naquele preço se acha embutido". (ob. cit., p. 225).

Tributos diretos são aqueles que, oficialmente, não permitem tal transferência.

Contribuinte de direito e contribuinte de fato
Assim, pode-se dizer que nos tributos indiretos surgem as figuras do contribuinte de direito e do contribuinte de fato:
a) Contribuinte de direito: é a pessoa que realiza o fato gerador.
b) Contribuinte de fato: é a pessoa que paga efetivamente o imposto considerando que o contribuinte de direito transferiu para ele este encargo.

Quando a entidade imune é contribuinte de direito, haverá imunidade?
Imagine a seguinte situação:
A CF/88 prevê que as entidades de assistência social, sem fins lucrativos, na forma da lei, gozam de imunidade tributária (art. 150, VI, "c").
Imagine que determinada entidade de assistência social comercialize camisas. A venda de camisas está sujeita, em tese, ao pagamento de ICMS.
Ocorre que esta entidade argumentou que não deveria incidir ICMS neste caso porque ela goza de imunidade tributária.
O Fisco estadual, por sua vez, refutou o argumento afirmando que o ICMS é um tributo indireto e que esta entidade iria repassar o encargo econômico do imposto para o consumidor final (contribuinte de fato). Logo, para a Fazenda Pública, deveria sim incidir o imposto já que quem iria pagar não era a entidade imune.

Qual das duas teses foi acolhida pelo STF?
A tese das entidades imunes, ou seja, haverá imunidade neste caso.

E quando a entidade imune é contribuinte de fato, haverá imunidade?
Vamos modificar o exemplo:
Determinada entidade de assistência social adquire na loja um forno para preparar comida para pessoas carentes.
No momento de pagar o valor, ao conferir a nota fiscal, o diretor da entidade percebe que está sendo cobrado dele o ICMS sobre a mercadoria vendida. Ele não se conforma e alega que não deverá pagar o imposto porque a entidade é imune.

A tese da entidade foi acolhida pelo STF?
NÃO. Segundo entende o STF, mesmo que o comprador da mercadoria seja uma entidade que goza de imunidade tributária, ainda assim deverá haver a normal incidência do imposto.
As imunidades deverão ser interpretadas sob o aspecto formal (e não econômico). Dessa forma, tem-se que:
·       se a entidade imune for contribuinte de direito, o imposto não incidirá;
·       se a entidade imune for apenas contribuinte de fato, o imposto incidirá normalmente.

O STF apreciou o tema sob a sistemática da repercussão geral e fixou a seguinte tese:
A imunidade tributária subjetiva aplica-se a seus beneficiários na posição de contribuinte de direito, mas não na de simples contribuinte de fato, sendo irrelevante, para a verificação da existência do beneplácito constitucional, a repercussão econômica do tributo envolvido.
STF. Plenário. RE 608872/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 22 e 23/2/2017 (repercussão geral) (Info 855).

Assim, a imunidade tributária subjetiva aplica-se ao ente beneficiário se ele for o contribuinte de direito, não importando discutir se o tributo em questão pode ou não ter repercussão econômica para terceiros.
Não se pode estender ao particular vendedor (contribuinte de direito) a imunidade tributária subjetiva que detém o adquirente de mercadoria (contribuinte de fato).

O STF possui um enunciado antigo que transmite essa mesma ideia:
Súmula 591-STF: A imunidade ou a isenção tributária do comprador não se estende ao produtor, contribuinte do imposto sobre produtos industrializados.

Sobre o tema, já explicou Leandro Paulsen:
“Importa, para a verificação da existência ou não da imunidade, a posição de contribuinte, nos moldes do raciocínio que inspirou a Súmula nº 591 do STF. Conforme orientação atual do STF, seguindo a linha da referida súmula, descabe verificar se o ente imune é ou não contribuinte de fato, pois a repercussão econômica não está em questão. Ora, se a Constituição diz que é vedado cobrar impostos das entidades de assistência social, é porque nega competência para tanto, não sendo dado ao intérprete perquirir quanto à repercussão econômica do tributo para efeito de decidir se é devido ou não." (PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, p. 106).

No exemplo que demos acima em que a entidade beneficente compra o forno, tal pessoa jurídica irá realmente arcar com o ônus financeiro dos impostos envolvidos nessa venda (IPI e ICMS) caso tenham sido realmente transferidos pelo vendedor (contribuinte de direito). No entanto, este valor que será pago pela entidade não possui natureza jurídica de tributo, mas sim de "preço", decorrente de uma relação contratual. Em outras palavras, a entidade está pagando apenas o preço total no qual, obviamente, o vendedor embutiu todos os seus custos (a fim de que ele possa ter lucro). Vale reiterar, porém, que o valor pago pela entidade não é tributo, mas sim preço.

Hugo de Brito Machado trata sobre o tema com maestria, dando o exemplo de uma entidade do Poder Público (que é imune, nos termos do art. 150, VI, "a") que compra uma mercadoria. Veja:
“O argumento de que o imposto sobre produtos industrializados (IPI) assim como o imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias (ICMS) não incidem na saída de mercadorias que o particular (industrial, comerciante ou produtor) vende ao Poder Público, porque o ônus financeiro respectivo recai sobre este, não tem qualquer fundamento jurídico. Pode ser válido no âmbito da Ciência das Finanças. Não no Direito Tributário. A relação tributária instaura-se entre o industrial, ou comerciante, que vende, e por isto assume a condição de contribuinte, e a Fazenda Pública, ou fisco, credor do tributo. Entre o Estado comprador da mercadoria e o industrial, ou comerciante, que a fornece, instaura-se uma relação jurídica inteiramente diversa, de natureza contratual. O Estado comprador paga simplesmente o preço da mercadoria adquirida. Não o tributo. Este pode estar incluído no preço, mas neste também está incluído o salário dos empregados do industrial, ou comerciante, e nem por isto se pode dizer que há no caso pagamento de salários. Tal inclusão pode ocorrer, ou não. É circunstancial e independe de qualquer norma jurídica. Em última análise, no preço de um produto poderão estar incluídos todos os seus custos, mas isto não tem relevância para o Direito, no pertinente à questão de saber quem paga tais custos” (MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 30ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 286/287)

Resumindo:
• Se a entidade imune for contribuinte de direito: incide a imunidade subjetiva.
• Se a entidade imune for contribuinte de fato: não incide a imunidade subjetiva.

Pagamento indevido de ICMS nas contas de energia elétrica e legitimidade para pedir a restituição
Como vimos acima, tributos indiretos são aqueles que permitem a transferência do seu encargo econômico para uma pessoa diferente daquela definida em lei como sujeito passivo. Exemplos mais conhecidos: IPI, ICMS, ISS e IOF.
Tributos diretos são aqueles que, oficialmente, não permitem tal transferência.
Se houver pagamento indevido de tributo, o sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo (art. 165 do CTN). A isso se dá o nome de repetição de indébito.
Nos tributos diretos, a regra relativa às restituições é simples: quem pagou um valor indevido ou maior que o devido tem direito à restituição.
Nos tributos indiretos, a questão é um pouco mais complexa.

Se o contribuinte de direito repassou oficialmente o encargo econômico do tributo a um terceiro e, mais tarde, percebeu-se que tal ônus não correspondia ao previsto na lei, havendo direito à restituição, seria justo restituir o excesso ao primeiro? Em outras palavras, sendo o tributo indireto, quem detém a legitimidade ativa ad causam para pleitear a restituição do indébito?
Trata-se de questão difícil e polêmica. O STJ estabeleceu a seguinte distinção:
1) REGRA GERAL: a legitimidade para pleitear a restituição é do CONTRIBUINTE DE DIREITO.
Argumento: o contribuinte de fato não integra a relação jurídica tributária.
Ex: no caso de pagamento indevido de IPI sobre a fabricação de bebidas, o STJ decidiu que a legitimidade ativa ad causam para pleitear a restituição do indébito é do fabricante de bebida (contribuinte de direito) (REsp 903.394/AL, DJe de 26/04/2010).

2) No caso de tributos pagos indevidamente por CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA: a legitimidade para pleitear a restituição é do CONTRIBUINTE DE FATO (consumidor).
Argumentos: a concessionária sempre evitará embates desgastantes com o Poder Público. Além disso, em caso de aumento de tributos, poderá repassar esse valor nas tarifas. Logo, o STJ concluiu que não haveria interesse das concessionárias em pleitear a restituição do indébito em caso de terem sido tributadas indevidamente. Desse modo, o consumidor iria arcar com a repercussão econômica do tributo pago a maior e, como a concessionária não iria pleitear a repetição do indébito, essa situação de abusividade na cobrança iria se perpetuar, em prejuízo ao usuário dos serviços públicos.
Veja as palavras do Min. Cesar Asfor Rocha:
“Sem dúvida, no caso das concessionárias do serviço público, diante de tudo o que foi dito acima, entendo que a legitimidade do consumidor final permanece. Decidir de forma  diversa  impede  qualquer  discussão,  por  exemplo,  sobre  a  ilegalidade  –  já reconhecida  neste  Tribunal  Superior  –  da  incidência  do  ICMS  sobre  a  demanda "contratada  e  não  utilizada",  contrariando  as  normas  que  disciplinam  as  relações envolvidas  nas  concessões  de  serviço  público.  Isso  porque,  volto  a  afirmar,  em  casos como o presente, inexiste conflito de interesses entre a Fazenda Pública, titular do tributo, e as concessionárias, que apenas repassam o custo tributário à tarifa por força do art. 9º,  §§ 2º e 3º, da Lei n. 8.987/1995.
(...)
Situação diversa é a da fabricação e do comércio de bebidas, objeto do REsp  903.394/AL  (repetitivo), não aplicável ao caso em debate. Se o fabricante simplesmente  repassar  ao  preço  do  seu  produto  de  venda  o  valor  do  ICMS  cobrado indevidamente,  as  suas  vendas  poderão  cair.  Em virtude da concorrência no setor privado – o que dificilmente ocorre no fornecimento de energia elétrica –, o distribuidor (adquirente da bebida) poderá buscar outro fabricante, com produtos inferiores ou importados, com preços menores. Para compensar o ICMS pago a mais e a fim de não reduzir as vendas, terá o fabricante que reduzir custos e lucros, ao menos até que volte a dominar o mercado. Sem dúvida, portanto, nessa situação, há conflitos de interesses entre o credor do tributo e o fabricante, o que viabiliza o ingresso de ações na Justiça por parte deste.” (REsp 1.299.303/SC).

Este entendimento do STJ permanece válido mesmo com a decisão do STF acima explicada.



Dizer o Direito!