quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017
Guarda compartilhada
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017
ESPÉCIES DE GUARDA
Existem quatro espécies de guarda
que serão vistas abaixo. As duas primeiras estão previstas expressamente no
Código Civil e as duas outras são criações da doutrina.
Art. 1.583. A guarda será
unilateral ou compartilhada.
a) Unilateral (exclusiva):
Ocorre quando o pai ou a mãe fica
com a guarda e a outra pessoa possuirá apenas o direito de visitas.
Segundo a definição do Código
Civil, a guarda unilateral é aquela “atribuída a um só dos genitores ou a
alguém que o substitua” (art. 1.583, § 1º).
Ainda hoje é bastante comum.
Ex: João e Maria se divorciaram;
ficou combinado que Maria ficará com a guarda da filha de 5 anos e que o pai
tem direito de visitas aos finais de semana.
Vale ressaltar que, mesmo sendo fixada
a guarda unilateral, o pai ou a mãe que ficar sem a guarda continuará com o dever
de supervisionar os interesses dos filhos. Para possibilitar tal supervisão,
qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações
e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que
direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de
seus filhos (§ 5º do art. 1.583).
b) Compartilhada (conjunta):
Ocorre quando o pai e a mãe são
responsáveis pela guarda do filho.
A guarda é de responsabilidade de
ambos e as decisões a respeito do filho são tomadas em conjunto, baseadas no
diálogo e consenso.
O instituto da guarda
compartilhada teve origem na Common Law,
do Direito Inglês, com a denominação de joint
custody. Porém, foi nos Estados Unidos que a denominada “guarda conjunta” ganhou
força e se popularizou.
Segundo o Código Civil brasileiro,
entende-se por guarda compartilhada “a responsabilização conjunta e o exercício
de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto,
concernentes ao poder familiar dos filhos comuns” (art. 1.583, § 1º).
É considerada a melhor espécie de
guarda porque o filho tem a possibilidade de conviver com ambos e os pais, por
sua vez, sentem-se igualmente responsáveis.
Vale ressaltar que nessa espécie
de guarda, apesar de tanto o pai como a mãe possuírem a guarda, o filho mora
apenas com um dos dois.
Ex: João e Maria se divorciaram;
ficou combinado que a filha do casal ficará morando com a mãe; apesar disso,
tanto Maria como João terão a guarda compartilhada (conjunta) da criança, de
forma que ela irá conviver constantemente com ambos e as decisões sobre ela
serão tomadas em conjunto pelos pais.
E se os pais morarem em cidades
diferentes? A Lei estabeleceu que a cidade considerada base de moradia dos
filhos será aquela que melhor atender aos interesses dos filhos (§ 3º do art.
1.584).
Tempo de convivência
Na guarda compartilhada, o tempo
de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e
com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos
(§ 2º do art. 1.583).
Orientação técnico-profissional
Para estabelecer as atribuições
do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz,
de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em
orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar, que deverá visar
à divisão equilibrada do tempo com o pai e com a mãe (§ 3º do art. 1.584 do
CC).
Assim, com a ajuda de psicólogos,
assistentes sociais e outros profissionais, o juiz já deverá estabelecer as
atribuições que caberão a cada um dos pais e o tempo de convivência com o
filho.
Ex: João irá buscar o filho no
colégio todos os dias às 12h; no período da tarde, a criança continuará na
companhia do pai e, às 18h, ele deverá deixá-lo na casa da mãe.
c) Alternada:
Ocorre quando o pai e a mãe se revezam
em períodos exclusivos de guarda, cabendo ao outro direito de visitas.
Em outras palavras, é aquela na
qual durante alguns dias a mãe terá a guarda exclusiva e, em outros períodos, o
pai terá a guarda exclusiva.
Ex: João e Maria se divorciaram;
ficou combinado que durante uma semana a filha do casal ficará morando com a
mãe (e o pai não pode interferir durante esse tempo) e, na semana seguinte, a
filha ficará vivendo com o pai (que terá a guarda exclusiva nesse período).
“Essa forma de guarda não é
recomendável, eis que pode trazer confusões psicológicas à criança. Com tom
didático, pode-se dizer que essa é a guarda pingue-pongue, pois a criança
permanece com cada um dos genitores por períodos ininterruptos. Alguns a
denominam como a guarda do mochileiro, pois o filho sempre deve arrumar a sua
malinha ou mochila para ir à outra casa. É altamente inconveniente, pois a
criança perde seu referencial, recebendo tratamentos diferentes quando na casa
paterna e na materna.” (TARTUCE, Flávio. Manual
de Direito Civil. Volume único. São Paulo: Método, 2013, p. 1224).
d) Aninhamento (nidação):
Ocorre quando a criança permanece
na mesma casa onde morava e os pais, de forma alternada, se revezam na sua
companhia.
Assim, é o contrário da guarda
alternada, já que são os pais que, durante determinados períodos, se mudam.
Ex: João e Maria se divorciaram;
ficou combinado que a filha do casal ficará morando no mesmo apartamento onde
residia e no qual já possui seus amiguinhos na vizinhança. Durante uma semana,
a mãe ficará morando no apartamento com a criança (e o pai não pode interferir
durante esse tempo). Na semana seguinte, a mãe se muda temporariamente para
outro lugar e o pai ficará vivendo no apartamento com a filha.
Defendida por alguns como uma
forma de a criança não sofrer transtornos psicológicos por ter que abandonar o
meio em que já vivia e estava familiarizada. Apesar disso, é bastante rara
devido aos inconvenientes práticos de sua implementação.
A palavra “aninhamento” vem de
“aninhar”, ou seja, colocar em um ninho. Transmite a ideia de que a criança
permanecerá no mesmo ninho (mesmo lar) e os seus pais é quem se revezarão em
sua companhia.
Como já dito acima, o Código
Civil somente fala em unilateral ou compartilhada (art. 1.583), mas as demais
espécies também existem na prática.
DEFINIÇÃO DA GUARDA
Como é definida a espécie de
guarda que será aplicada?
O ideal é que a guarda seja
definida por consenso entre o pai e a mãe. Por isso, o Código Civil determina
que seja feita uma audiência de conciliação. A Lei também afirma que o juiz
deverá incentivar que os pais façam um acordo adotando a guarda compartilhada:
Art. 1.584 (...) § 1º Na
audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda
compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos
aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas.
Se mesmo assim não houver acordo,
o juiz irá fixar a guarda de forma compulsória.
Art. 1.584. A guarda,
unilateral ou compartilhada, poderá ser:
I – requerida, por
consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de
separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar;
II – decretada pelo juiz,
em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de
tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.
Em regra, o juiz não deve
conceder a guarda sem ouvir a outra parte
A decisão sobre guarda de filhos,
mesmo que provisória, será proferida preferencialmente após a oitiva de ambas
as partes perante o juiz, salvo se a proteção aos interesses dos filhos exigir
a concessão de liminar sem a oitiva da outra parte (art. 1.585 do CC).
GUARDA COMPARTILHADA COMO REGRA
Vimos acima que, se não houver
acordo, o juiz é quem irá fixar a guarda. Neste caso, qual é a espécie de
guarda que o magistrado deverá determinar?
REGRA: guarda compartilhada.
O Código determina que, quando
não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, o juiz deverá
aplicar a guarda compartilhada (art. 1.584, § 2º).
EXCEÇÕES:
Não será aplicada a guarda
compartilhada se:
a) um dos genitores declarar ao
magistrado que não deseja a guarda do menor;
b) um dos genitores não estiver
apto a exercer o poder familiar.
A doutrina em geral aplaude essa
solução legal?
Não. Isso porque a lei impõe aos
pais algo que, na prática, não funciona se não for consensual.
A
guarda compartilhada exige como pressuposto que haja um mínimo de convivência harmônica
entre os pais, já que as decisões a respeito do filho deverão ser tomadas em
conjunto, com base no diálogo e consenso.
Ora, se os pais da criança não
gozam de uma relação harmoniosa, é extremamente improvável que consigam
dialogar e decidir, de forma amistosa, pontos conflituosos em relação ao filho,
como, por exemplo, a escola em que ele irá estudar, o tempo que cada um passará
com a criança, as obrigações de cada genitor etc.
Na guarda compartilhada muito
pouco adianta que tais cláusulas sejam impostas pelo juiz porque o Poder
Judiciário não terá condições de acompanhar, no dia-a-dia, o cumprimento de
tais medidas e a sua efetividade será mínima se não houver disposição e
compromisso dos pais em respeitá-las.
Enfim, apesar de a guarda
compartilhada ser a espécie ideal, ela tem que ser conquistada com a
conscientização e nunca pela imposição, o que gerará um efeito inverso e talvez
acirre o relacionamento já desgastado dos pais da criança.
A guarda compartilhada depende da
concordância dos genitores? Ex: o pai deseja a guarda unilateral e a mãe
também; nenhum dos dois quer a guarda compartilhada; mesmo assim, o juiz pode
determinar esta espécie de guarda?
SIM. A implementação da guarda
compartilhada não se sujeita à transigência dos genitores. Em outras
palavras, a guarda compartilhada é a regra, independentemente de concordância
entre os genitores acerca de sua necessidade ou oportunidade (STJ. 3ª Turma. REsp
1605477/RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 21/06/2016.
O § 2º do art. 1.584 afirma que
“encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar”, será
aplicada a guarda compartilhada. O que significa essa expressão: “genitores
aptos a exercer o poder familiar”? Quando o genitor não estará apto a exercer o
poder familiar?
Ainda não há
uma posição tranquila sobre o tema. No entanto, segundo a Min. Nancy Andrighi, o
genitor somente pode ser considerado inapto para exercer o poder familiar se,
antes da ação onde se discute a guarda, tiver havido uma decisão judicial
determinando a suspensão ou a perda do poder familiar. Veja:
A guarda compartilhada somente deixará de ser aplicada quando houver
inaptidão de um dos ascendentes para o exercício do poder familiar, fato que
deverá ser declarado, prévia ou incidentalmente à ação de guarda, por meio de
decisão judicial.
STJ. 3ª Turma. REsp
1.629.994-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 6/12/2016 (Info 595).
Assim, para a Ministra, a guarda
compartilhada somente não será aplicada em dois casos:
1) se o genitor declarar que não
deseja a guarda do menor;
2) se houver uma decisão judicial
suspendendo ou determinando a perda do poder familiar do genitor (inaptidão
para o exercício do poder familiar).
Nas palavras da Ministra, “um
ascendente só poderá perder ou ter suspenso o seu poder/dever consubstanciado
no poder familiar por meio de uma decisão judicial e, só a partir dessa
decisão, perderá a condição essencial para lutar pela guarda compartilhada da
prole, pois deixará de ter aptidão para exercer o poder familiar." (REsp
1629994).
O §
2º do art. 1.584 somente admite duas exceções em que não será aplicada a guarda
compartilhada. A interpretação desse dispositivo pode ser relativizada? É
possível afastar a guarda compartilhada com base em peculiaridades do caso
concreto mesmo que não previstas no § 2º do art. 1.584 do CC?
O STJ está
dividido, havendo decisões em ambos os sentidos:
1ª) NÃO. Pela redação do art.
1.584 do CC, a guarda compartilhada apresenta força vinculante, devendo ser
obrigatoriamente adotada, salvo se um dos genitores não estiver apto a exercer
o poder familiar ou se um deles declarar ao magistrado que não deseja a guarda
do menor. Nesse sentido: STJ. 3ª Turma. REsp 1626495/SP, Rel. Min. Nancy
Andrighi, julgado em 15/09/2016.
2ª)
SIM. As peculiaridades do caso concreto podem servir como argumento para que
não seja implementada a guarda
compartilhada. Ex: se houver dificuldades geográficas (pai mora em uma
cidade e mãe em outra, distante). Isso porque deve-se atentar para o princípio
do melhor interesse dos
menores. Assim, as partes poderão demonstrar a existência de impedimento
insuperável ao exercício da guarda compartilhada, podendo o juiz aceitar mesmo
que não expressamente previsto no art. 1.584, § 2º. A aplicação obrigatória da
guarda compartilhada pode ser mitigada se ficar constatado que ela será
prejudicial ao melhor interesse do menor. Nesse talante: STJ. 3ª Turma. REsp
1605477/RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 21/06/2016. Veja
outro precedente sustentando essa interpretação relativizada:
(...) 1. A
guarda compartilhada deve ser buscada no exercício do poder
familiar entre pais
separados, mesmo que
demande deles reestruturações,
concessões e adequações diversas para que os filhos possam usufruir,
durante a formação, do ideal psicológico de duplo referencial
(precedente).
2. Em
atenção ao melhor interesse do menor, mesmo na ausência
de consenso dos pais, a guarda compartilhada deve ser aplicada, cabendo ao
Judiciário a imposição das atribuições de cada um.
Contudo, essa
regra cede quando
os desentendimentos dos
pais ultrapassarem o mero
dissenso, podendo resvalar,
em razão da imaturidade de ambos e da atenção aos próprios interesses
antes dos do menor, em
prejuízo de sua formação e
saudável desenvolvimento (art. 1.586 do CC/2002). (...)
STJ. 3ª Turma. REsp
1417868/MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 10/05/2016.
Simples animosidade
Vale ressaltar, ainda, e isso
pode ser cobrado em sua prova, que o STJ já decidiu que
A simples animosidade entre os genitores e suas diferenças de ponto de
vista sobre a criação dos filhos não são impedimento para a fixação da guarda
compartilhada.
STJ. 3ª Turma. REsp
1626495/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/09/2016.
OUTROS TEMAS
A guarda pode ser deferida para
outra pessoa que não seja o pai ou a mãe?
SIM. Se o juiz verificar que o
filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda a
pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de
preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade (§
5º do art. 1.584).
O exemplo mais comum dessa
situação é a guarda atribuída aos avós.
Dever de os estabelecimentos
públicos e privados prestarem informações aos pais
Seja na guarda compartilhada, seja na guarda unilateral, tanto o
pai como a mãe possuem o direito de acompanhar e fiscalizar a educação e saúde
de seus filhos.
Pensando nisso, e a fim de evitar qualquer embaraço, o § 6º ao
art. 1.584 do CC determinou que os estabelecimentos públicos e privados são
obrigados a fornecer informações ao pai ou a mãe sobre a situação dos seus
filhos. Veja:
§ 6º Qualquer
estabelecimento público ou privado é obrigado a prestar informações a qualquer
dos genitores sobre os filhos destes, sob pena de multa de R$ 200,00 (duzentos
reais) a R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia pelo não atendimento da
solicitação.
Essa regra vale mesmo que o pai (ou a mãe) que esteja requerendo a
informação não detenha a guarda do filho. Ex: João e Maria divorciaram-se e a
mãe ficou com a guarda exclusiva da criança; determinado dia, João foi até o
colégio de sua filha para ter acesso às notas do boletim escolar, tendo a
escola negado, afirmando que somente a mãe poderia obtê-lo. Esse
estabelecimento de ensino poderá ser multado, na forma do § 6º do art. 1.584 do
CC. O mesmo vale para um hospital, por exemplo.
A multa deve ser cobrada na via
judicial, devendo o pai (ou a mãe) comprovar que fez a solicitação não
atendida.
Descumprimento das regras
A alteração não autorizada ou o
descumprimento imotivado de cláusula de guarda unilateral ou compartilhada
poderá implicar a redução de prerrogativas atribuídas ao seu detentor (§ 4º do
art. 1.584). Ex: ficou acertado que João tem o direito de ficar com sua filha
todos os sábados, devendo entregá-la à mãe no domingo às 8h; ocorre que ele
sempre leva a criança atrasado, chegando por volta das 12h; neste caso, a lei
prevê a possibilidade de ele ter reduzido este direito.