terça-feira, 15 de novembro de 2016
Possibilidade de aplicação da teoria da causa madura em julgamento de agravo de instrumento
terça-feira, 15 de novembro de 2016
Julgamento do mérito diretamente
pelo Tribunal ("teoria da causa madura")
O CPC/1973, em seu art. 515, §
3º, permitia que o TJ ou o TRF, ao decidir a apelação interposta contra
sentença terminativa, julgasse ele próprio (o Tribunal) o mérito da ação caso
entendesse que o juiz não deveria ter extinguido o processo sem resolução do
mérito.
Ex: João ajuíza ação contra Pedro e o
magistrado profere sentença extinguindo o processo sem resolução do mérito por
entender que o autor seria parte ilegítima. João interpõe apelação ao TJ. O
Tribunal analisa o recurso e entende que ele é sim parte legítima, ou seja, não
havia razão jurídica para o magistrado ter extinguido o processo sem examinar o
mérito. Em vez de mandar o processo de volta à 1ª instância, o próprio TJ
poderá julgar o mérito da demanda. Para isso, no entanto, a causa tem que estar
em condições de imediato julgamento (ex: se a sentença indeferiu a petição
inicial, não há condições de o Tribunal julgar o mérito; ao contrário, se a sentença
foi proferida após a fase instrutória, em tese, já haveria essa possibilidade).
O CPC/2015 repetiu essa regra do
Código revogado e foi além trazendo mais três hipóteses em que o Tribunal, ao
dar provimento a apelação, poderá julgar diretamente o mérito, sem ter que
devolver a questão ao juiz.
Nomenclatura
Esse julgamento do mérito
diretamente pelo Tribunal ficou conhecido na prática como "teoria da causa
madura", ou seja, estando a causa "em condições de imediato
julgamento" (leia-se: madura), o Tribunal já deverá decidir desde logo o
mérito.
Comparativo
Com uma melhor redação, o
CPC/2015 repetiu a regra do § 3º do art. 515 do Código passado. Além disso,
acrescentou três novas hipóteses (incisos II, III e IV). Algumas delas já eram
admitidas pela jurisprudência, mas agora constam expressamente na legislação.
Compare:
CPC/1973
|
CPC/2015
|
Art.
515 (...)
§
3º Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o
tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente
de direito e estiver em condições de imediato julgamento.
|
Art.
1.013. (...)
§
3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve
decidir desde logo o mérito quando:
I
- reformar sentença fundada no art. 485;
II
- decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites
do pedido ou da causa de pedir;
III
- constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá
julgá-lo;
IV
- decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.
|
Em provas de concurso, fiquem
atentos para a redação dos incisos II a IV do § do art. 1.013 porque eles serão
exaustivamente cobrados.
Feitas estas considerações, imagine
agora a seguinte situação hipotética:
O Ministério Público ingressou
com ação de improbidade contra João, Paulo e Pedro pedindo a indisponibilidade
dos bens dos requeridos.
O juiz, por meio de decisão
interlocutória, deferiu a indisponibilidade em relação a todos eles, no
entanto, na decisão não houve qualquer fundamentação quanto ao réu Pedro.
Diante disso, ele interpôs agravo
de instrumento contra a decisão.
O Tribunal, analisando o agravo,
decidiu que a decisão realmente é nula quanto à Pedro por ausência de
fundamentação. No entanto, em vez de mandar o juiz exarar nova decisão, o
Tribunal decidiu desde lodo o mérito do pedido e deferiu a medida cautelar de
indisponibilidade dos bens de Pedro, apontando os argumentos pelos quais este
requerido também praticou, em tese, ato de improbidade.
Pedro interpôs recurso especial
contra a decisão do Tribunal argumentando que o CPC, ao tratar sobre a
teoria da causa madura, é expresso ao falar em "sentença". Além
disso, o parágrafo que trata sobre esse assunto esta inserido dentro do artigo
que cuida da apelação. Assim, não seria possível a aplicação da teoria da causa
madura para agravos de instrumento.
Agiu corretamente o Tribunal
neste caso? É possível que o Tribunal, ao julgar agravo de instrumento, aplique
a teoria da causa madura e aprecie desde logo o mérito?
SIM.
Admite-se
a aplicação da teoria da causa madura (art. 515, § 3º, do CPC/1973 / art.
1.013, § 3º do CPC/2015) em julgamento de agravo de instrumento.
STJ. Corte Especial. REsp
1.215.368-ES, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 1/6/2016 (Info 590).
O entendimento adotado pelo STJ é
amplamente aceito pela doutrina:
"(...) Está aí, portanto, a
questão da dimensão do disposto pelo novo parágrafo do art. 515 - se ele
abrange apenas o recurso de apelação, ou também outros. Figure-se a hipótese da
decisão interlocutória com que o juiz determina a realização de uma prova e a
parte manifesta agravo de instrumento com o pedido de que essa prova não seja
realizada: se o tribunal aceitar os fundamentos do recurso interposto, para que
a prova não se realize, e entender também que nenhuma outra existe a ser
realizada, é de rigor que passe desde logo ao julgamento do meritum causae, porque assim é o
espírito da Reforma - acelerar a oferta da tutela jurisdicional, renegando
mitos seculares, sempre que isso não importe prejuízo à efetividade das garantias
constitucionais do processo nem prejuízo ilegítimo às partes (...)"
(DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da
reforma. 6ª ed., São Paulo: Malheiros, 2003, p. 162-163).
"Inclinamo-nos pela
admissibilidade de aplicação do art. 515, §3º também ao agravo de instrumento. (...)"
(WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos
no CPC brasileiro. 4ª ed., São Paulo: RT, 2006, p. 350).
"Cumpre esclarecer que o §3º
do art. 515 não se restringe ao âmbito do recurso de apelação, sendo comum a
todos os meios de impugnação, tendo em vista que, salvo exceções, a modificação
legislativa não é restritiva, mas sim extensiva a todo o sistema recursal."
(ROGRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de
Direito Processual Civil. 5ª ed., São Paulo, RT, p. 644).
Já sob a égide do novo CPC,
Daniel Assumpção Neves também defende o mesmo entendimento:
"Conforme se nota da
expressa previsão do art. 1.013, § 3.º, I, do Novo CPC, a norma diz respeito à
apelação, sabidamente uma das espécies recursais. Ocorre, entretanto, que
parcela considerável da doutrina entende ser a regra pertencente à teoria geral
dos recursos. Dessa forma, defende-se a aplicação da regra em todo e qualquer
recurso, em especial no agravo de instrumento (...)" (NEVES, Daniel Amorim
Assumpção. Novo CPC comentado. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 1.680).