Dizer o Direito

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

A opção prevista no § 2º do art. 109 da CF/88 é aplicável também para os processos de mandado de segurança?



Competência da Justiça Federal
A competência da Justiça Federal vem prevista nos arts. 108 e 109 do Texto Constitucional.
No art. 109 estão elencadas as competências dos juízes federais, ou seja, a competência da Justiça Federal de 1ª instância.
O art. 108, por sua vez, define as competências da Justiça Federal de 2ª instância, isto é, dos Tribunais Regionais Federais.

Competência material da Justiça Federal
As matérias que são julgadas pela Justiça Federal estão previstas nos incisos do art. 109 da CF/88.

Competência territorial da Justiça Federal
A Justiça Estadual é dividida em comarcas.
A Justiça Federal, por sua vez, é organizada em seções judiciárias.
Assim, em se tratando de Justiça Federal, não é correto falarmos em comarca, mas sim seção judiciária.
Cada Estado-membro é sede de uma seção judiciária. Exs: seção judiciária de Minas Gerais (vinculada ao TRF da 1ª Região); seção judiciária do Rio de Janeiro (TRF2); seção judiciária de São Paulo (TRF3); seção judiciária do Paraná (TRF4); seção judiciária de Pernambuco (TRF5).
No início, somente havia Justiça Federal nas capitais e outras grandes cidades. No entanto, isso foi mudando com o movimento chamado de “interiorização da Justiça Federal”.
No interior do Estado, a Justiça Federal é organizada em Subseções Judiciárias. Ex: na seção judiciária da Bahia, cuja sede é Salvador, existem 24 varas federais. No entanto, além disso, existem varas federais no interior do Estado. Lá, elas são chamadas de subseções judiciárias. É o caso da subseção judiciária de Feira de Santana (BA), onde existem três varas federais.

Recapitulando:
• A Justiça Federal divide-se em seções judiciárias.
• Existe uma seção judiciária em cada Estado (sendo a sede na capital).
• As seções judiciárias subdividem-se em subseções judiciárias (com sede no interior do Estado).

Quais são as regras de competência territorial aplicáveis à Justiça Federal? Em outras palavras, em qual seção (ou subseção) judiciária deverão ser propostas as ações?

Se a União for a autora:
As causas em que a União for autora serão proposta na seção (ou subseção) judiciária onde tiver domicílio a outra parte, ou seja, no foro do domicílio do réu.
§ 1º As causas em que a União for autora serão aforadas na seção judiciária onde tiver domicílio a outra parte.

Se a União for a ré:
O autor terá quatro opções, podendo ajuizar a demanda contra a União na seção (ou subseção) judiciária:
a)      em que for domiciliado o autor;
b)      onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda;
c)       onde estiver situada a coisa; ou
d)      no Distrito Federal.

Vejam que interessante: mesmo o autor ou a causa não tendo nenhuma relação com o Distrito Federal, a ação poderá ser lá proposta porque é o domicílio legal da União.

Essas "opções" do autor estão previstas no art. 109, § 2º da CF/88. Veja:
§ 2º - As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal.

O § 2º somente fala em “União”. Se o autor quiser propor uma ação contra autarquia federal, ele terá as mesmas opções previstas no § 2º? Em outras palavras, o § 2º é aplicado também no caso de ações ajuizadas contra autarquias federais?
SIM. A regra de competência prevista no § 2º do art. 109 da CF/88 também se aplica às ações propostas contra autarquias federais.
Vale ressaltar que o § 2º do art. 109 foi idealizado pelo legislador constituinte para facilitar a propositura das ações pelo jurisdicionado contra o ente público. Logo, excluir as ações intentadas contra as autarquias federais do âmbito de incidência do § 2º significaria minar a intenção do constituinte de simplificar o acesso à Justiça.
STF. Plenário. RE 627709/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/8/2014 (Info 755).

O § 2º do art. 109 da CF/88 aplica-se também aos processos de mandado de segurança? Se o autor vai impetrar mandado de segurança contra uma autoridade federal, ele também disporá das opções de que trata o § 2º do art. 109?

O tema ainda é polêmico e existem duas correntes sobre o tema:

1ª) NÃO. Não se aplica o § 2º do art. 109 da CF/88 aos processos de mandado de segurança. Era a posição "tradicional" do STJ.

Segundo este entendimento, “em se tratando de mandado de segurança, a competência para processamento e julgamento da demanda é estabelecida de acordo com a sede funcional da autoridade apontada como coatora e a sua categoria profissional, o que evidencia a natureza absoluta e a improrrogabilidade da competência, bem como a possibilidade de seu conhecimento ex officio" (STJ. 1ª Seção. CC 41.579/RJ, Rel. Min. Denise Arruda, julgado em 14/09/2005).

Assim, se a parte resolve impetrar mandado de segurança contra uma autoridade federal, será competente a seção judiciária do local onde esta autoridade tenha sede funcional, ou seja, onde ela trabalha. Não se aplica ao autor do mandado de segurança a prerrogativa prevista no art. 109, § 2º da CF/88.

A justificativa dada é a de que, em se tratando de mandado de segurança, é a autoridade impetrada que será notificada para prestar informações. Logo, se a autoridade possui sede funcional em Brasília, o mandamus deverá ser impetrado na Seção Judiciária do DF, sendo inviável que a autoridade que more e resida em um local seja demandada em outro.


2ª) SIM. O § 2º do art. 109 da CF/88 é aplicável também quando se tratar de mandado de segurança. É a posição que vem ganhando força no STJ e já pode ser considerada majoritária.

Não há ainda decisões colegiadas do STJ, mas podem ser identificadas dezenas de decisões monocráticas nesse sentido. A título de exemplo: CC 147.266/DF, CC 147.361/DF, CC 147.261/DF, CC 138.595/DF, CC 146.430/DF, CC 148.082/DF

O constituinte, ao prever a regra do § 2º do art. 109 da CF/88, não restringiu sua incidência para determinados tipos de ação. O objetivo da Constituição foi o de facilitar o acesso ao Poder Judiciário da parte quando litiga contra a União, não havendo razão para excluir esta opção nos casos em que a ação proposta seja o mandado de segurança.

No STF encontramos decisões um pouco mais antigas, porém emblemáticas no sentido da segunda corrente:

CONSTITUCIONAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. UNIÃO. FORO DE DOMICILIO DO AUTOR. APLICAÇÃO DO ART. 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está pacificada no sentido de que as causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal. 2. Agravo regimental improvido.
(RE 509442 AgR, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 03/08/2010, DJe-154 DIVULG 19-08-2010 PUBLIC 20-08-2010 EMENT VOL-02411-05 PP-01046 RT v. 99, n. 901, 2010, p. 142-144)

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. AÇÃO INTENTADA CONTRA A UNIÃO. ART. 109, 2º, DA CONSTITUIÇÃO. AGRAVO IMPROVIDO. I – O art. 109, § 2º, da Constituição assegurou ao autor a faculdade de escolher, entre as alternativas delineadas pela Carta Magna, o foro para ajuizar as ações intentadas contra a União. Precedentes. II – O constituinte não determinou qualquer correlação entre a opção do autor e a natureza da ação proposta contra a União. Assim, o fato de se tratar de uma ação real não impede o autor de escolher, entre as opções definidas pela Lei Maior, o foro mais conveniente à satisfação de sua pretensão. III – Agravo regimental improvido.
(RE 599188 AgR, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 14/06/2011, DJe-124 DIVULG 29-06-2011 PUBLIC 30-06-2011 EMENT VOL-02554-01 PP-00202)

Por favor, atualize o Info 586 do STJ onde expliquei o tema acima, mas não falei a respeito da segunda corrente.

Agradeço ao leitor Cleanto Fernandes, que me informou a respeito das decisões monocráticas aplicando o art. 109, § 2º da CF/88 ao mandado de segurança.




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