Olá amigos do Dizer o Direito,
Foi publicada, na semana passada,
a Lei nº 13.300/2016, que regulamenta o mandado de injunção. Irei aqui fazer
alguns comentários a respeito da novidade legislativa, no entanto, para
facilitar o entendimento, não explicarei a lei isoladamente, aproveitando para fazer
uma revisão geral sobre o instituto.
1. NOÇÕES GERAIS
Introdução
A Constituição Federal previu uma
série de direitos e garantias fundamentais. No entanto, para que alguns deles
possam ser plenamente exercidos, é indispensável a edição de lei ou outro ato
normativo regulamentador. Ex: os servidores públicos poderão exercer greve, mas
para isso é necessária uma lei específica regulamentando o direito (art. 37,
VII, da CF/88).
A Constituição ficou preocupada,
com razão, que o legislador infraconstitucional demorasse muitos anos para
regulamentar esses direitos, impedindo, assim, que os seus titulares pudessem
exercê-los. Diante disso, foi previsto no Texto Magno um instrumento para
resolver este possível problema. Trata-se do mandado de injunção.
Sempre que um direito (em sentido
amplo) não puder ser exercido pelo titular em razão de ainda não ter sido
editada norma regulamentadora, este interessado poderá ingressar com uma ação
chamada de "mandado de injunção" pedindo que o Poder Judiciário reconheça
que o Poder Público está em mora e, então, supra a falta dessa lei ou ato
normativo e possibilite o pleno exercício do direito.
Previsão
Veja como este instrumento foi
previsto na CF/88 e na Lei nº 13.300/2016:
Art. 5º (...)
LXXI - conceder-se-á
mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável
o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;
Art. 2º Conceder-se-á
mandado de injunção sempre que a falta total ou parcial de norma
regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à
cidadania.
Parágrafo único.
Considera-se parcial a regulamentação quando forem insuficientes as normas
editadas pelo órgão legislador competente.
Conceito
Podemos assim conceituar o
instituto:
Mandado de injunção é...
- uma ação (instrumento
processual)
- de cunho constitucional
(remédio constitucional)
- que pode ser proposta por
qualquer interessado
- com o objetivo de tornar viável
o exercício de
- direitos e liberdades
constitucionais ou
- de prerrogativas relacionadas
com nacionalidade, soberania ou cidadania
- e que não estão sendo possíveis
de ser exercidos
- em virtude da falta, total ou
parcial, de norma regulamentando estes direitos.
"O mandado de injunção (MI)
é instrumento processual instituído especialmente para fiscalizar e corrigir,
concretamente, as omissões do Poder Público em editar as normas necessárias
para tornar efetivos direitos e liberdades constitucionais e prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania (art. 5º, LXXI, da
Constituição)." (BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto
Vianna Alves. Direito Constitucional. Tomo
II - Direito Constitucional Positivo. 5ª ed., Salvador: Juspodivm, 2016, p. 230).
Síndrome da inefetividade das
normas constitucionais
Se o legislador não edita as
normas regulamentadoras necessárias ao exercício dos direitos constitucionais,
há, neste caso, uma omissão inconstitucional, ou seja, um comportamento
omissivo que ofende a própria Constituição.
Essa omissão na edição do
regulamento faz com que as normas constitucionais tornem-se inefetivas (ineficazes,
na prática). Quando isso acontece, a doutrina afirma que há um fenômeno nocivo
chamado de "síndrome da inefetividade das normas constitucionais".
Nesse sentido: LENZA, Pedro. Direito
Constitucional esquematizado. 19ª ed., São Paulo: Saraiva, 2015, p. 1252.
O constituinte previu dois
instrumentos para resolver a síndrome da falta de efetividade das normas
constitucionais: o mandado de injunção e a ação direta de inconstitucionalidade
por omissão.
Neste artigo, conforme já adiantei,
irei tratar unicamente sobre o mandado de injunção.
Origem do instituto
Alguns autores afirmam que a
inspiração do mandado de injunção seria o writ
of injunction existente no direito norte-americano. Outros mencionam,
ainda, alguns institutos do direito lusitano. No entanto, a doutrina
majoritária afirma que o mandado de injunção não encontra similitude no direito
estrangeiro, sendo considerado um instrumento tipicamente brasileiro, com
contornos próprios. Nesse sentido: MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2016, p. 295.
Lei nº 13.300/2016
O mandado de injunção, como visto
acima, está previsto no art. 5º, LXXI, da CF/88.
Durante muitos anos, não houve
lei regulamentando o instituto.
O STF, no entanto, afirmou que,
mesmo sem lei, já era possível impetrar mandado de injunção porque o art. 5º, LXXI,
da CF/88 sempre foi autoaplicável. Nesse sentido: STF. Plenário. MI 107 QO, Rel.
Min. Moreira Alves, julgado em 23/11/1989.
Antes da edição da Lei do MI,
aplicava-se, por analogia, as regras procedimentais do mandado de segurança.
Com muitos anos de atraso,
finalmente foi editada a Lei nº 13.300/2016, que disciplina o processo e o
julgamento dos mandados de injunção individual e coletivo.
Espécies
Existem duas espécies de mandado
de injunção:
a) INDIVIDUAL: proposto por
qualquer pessoa física ou jurídica, em nome próprio, defendendo interesse
próprio, isto é, pedindo que o Poder Judiciário torna viável o exercício de um
direito, liberdade ou prerrogativa seu e que está impossibilitado pela falta de
norma regulamentadora.
b) COLETIVO: proposto por
legitimados restritos previstos na Lei, em nome próprio, mas defendendo
interesses alheios. Os direitos, as liberdades e as prerrogativas protegidos
por mandado de injunção coletivo são os pertencentes, indistintamente, a uma
coletividade indeterminada de pessoas ou determinada por grupo, classe ou
categoria (art. 12, parágrafo único, da LMI). O mandado de injunção coletivo
não foi previsto expressamente pelo texto da CF/88, mas mesmo assim sempre foi
admitido pelo STF e atualmente encontra-se disciplinado pela Lei nº
13.300/2016.
Espécies de ausência de norma
regulamentadora
Conforme vimos, o mandado de
injunção é concedido quando a falta de norma regulamentadora torne inviável o
exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.
Essa falta da norma
regulamentadora pode ser:
a) TOTAL: quando não houver norma
alguma tratando sobre a matéria;
b) PARCIAL: quando existir norma
regulamentando, mas esta regulamentação for insuficiente e, em virtude disso,
não tornar viável o exercício pleno do direito, liberdade ou prerrogativa
prevista na Constituição.
A possibilidade de MI em caso de omissão
parcial foi uma importante previsão do parágrafo único do art. 2º da Lei nº
13.300/2016 e que será bastante explorada nas provas de concurso.
Natureza da norma regulamentadora
O mandado de injunção só cabe
quando houver falta de norma regulamentadora, ou seja, de um ato normativo de
caráter geral e abstrato.
O ato normativo que está faltando
pode ser de duas espécies:
a) ADMINISTRATIVO: quando o
responsável pela sua edição é um órgão, entidade ou autoridade administrativo.
Ex: um decreto, uma resolução administrativa etc. Obs: se o que estiver
faltando for um ato administrativo material, não será caso de mandado de
injunção.
b) LEGISLATIVO: quando o direito
constitucional está inviabilizado pela falta de uma lei.
Diferenças entre mandado de
injunção e ação direta de inconstitucionalidade por omissão
MANDADO DE INJUNÇÃO
|
ADI POR OMISSÃO
|
Natureza e finalidade
Trata-se
de processo no qual é discutido um direito subjetivo. A finalidade é
viabilizar o exercício de um direito. Há, portanto, controle concreto de
constitucionalidade.
|
Natureza e finalidade.
A
finalidade é declarar que há uma omissão, já que não existe determinada
medida necessária para tornar efetiva uma norma constitucional.
Estamos
diante, portanto, de processo objetivo, em que há controle abstrato de
constitucionalidade.
|
Cabimento
Cabível
quando faltar norma regulamentadora de direitos e liberdades constitucionais
e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.
|
Cabimento
Cabível
quando faltar norma regulamentadora relacionada com qualquer norma
constitucional de eficácia limitada.
|
Legitimados ativos
MI
individual: pessoas naturais ou jurídicas que se afirmam titulares dos
direitos, das liberdades ou das prerrogativas.
MI
coletivo: estão previstos no art. 12 da Lei nº 13.300/2016.
|
Legitimados ativos
Os
legitimados da ADI por omissão estão descritos no art. 103 da CF/88.
|
Competência
A
competência para julgar a ação dependerá da autoridade que figura no polo
passivo e que possui atribuição para editar a norma.
|
Competência
Se
relacionada com norma da CF/88: STF.
Se
relacionada com norma da CE: TJ.
|
Efeitos da decisão
Reconhecido
o estado de mora legislativa, será deferida a injunção para:
I
- determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição da norma
regulamentadora;
II
- estabelecer as condições em que se dará o exercício dos direitos, das
liberdades ou das prerrogativas reclamados ou, se for o caso, as condições em
que poderá o interessado promover ação própria visando a exercê-los, caso não
seja suprida a mora legislativa no prazo determinado.
Obs:
será dispensada a determinação a que se refere o inciso I quando comprovado
que o impetrado deixou de atender, em mandado de injunção anterior, ao prazo
estabelecido para a edição da norma.
|
Efeitos da decisão
Declarada
a inconstitucionalidade por omissão, o Judiciário dará ciência ao Poder
competente para que este adote as providências necessárias.
Se
for órgão administrativo, este terá um prazo de 30 dias para adotar a medida
necessária.
Se
for o Poder Legislativo, não há prazo.
|
Mandado de injunção estadual
É possível que exista mandado de
injunção no âmbito estadual, desde que isso seja previsto na respectiva
Constituição Estadual (art. 125, § 1º, da CF/88). Vale ressaltar que o MI estadual
também deverá observar as normas procedimentais da Lei nº 13.300/2016.
2. LEGITIMIDADE
Assim como ocorre no mandado de
segurança, a nomenclatura no mandado de injunção é impetrante (requerente) e
impetrado (requerido).
Legitimidade ATIVA do mandado de
injunção INDIVIDUAL
São legitimados para impetrar mandado
de injunção individual:
·
as pessoas naturais; ou
·
as pessoas jurídicas
... que se afirmam titulares dos
direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à
nacionalidade, à soberania e à cidadania.
Art. 3º São legitimados
para o mandado de injunção, como impetrantes, as pessoas naturais ou jurídicas
que se afirmam titulares dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas
referidos no art. 2º e, como impetrado, o Poder, o órgão ou a autoridade com
atribuição para editar a norma regulamentadora.
O art. 3º da Lei do MI, ao
reconhecer legitimidade ativa às pessoas "que se afirmam titulares", adota
a "teoria da asserção". Para essa teoria, a legitimidade ad causam deve ser analisada à luz das
afirmações feitas pelo autor na petição inicial, devendo o julgador considerar
a relação jurídica deduzida em juízo in
status assertionis, isto é, à vista do que se afirmou. Em outras palavras,
se o autor afirma que é titular daquele direito, para fins de legitimidade
deve-se tomar essa afirmação como sendo verdadeira. Ao final do processo,
pode-se até reconhecer que ele não é realmente titular, mas aí já será uma
decisão de mérito. Para fins de reconhecimento de legitimidade e processamento
da ação, basta que o autor se afirme titular.
Legitimidade ATIVA do mandado de
injunção COLETIVO
Os legitimados ativos do mandado
de injunção coletivo estão previstos no art. 12 da LMI e variam de acordo com a
tutela requerida. Vejamos:
Legitimado
|
Situação
|
I - MINISTÉRIO PÚBLICO
|
quando
a tutela requerida for especialmente relevante para a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático ou dos interesses sociais ou individuais
indisponíveis.
|
II - PARTIDO POLÍTICO
(com representação no
Congresso Nacional)
|
para
assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas de seus
integrantes ou relacionados com a finalidade partidária.
|
III - ORGANIZAÇÃO SINDICAL,
ENTIDADE DE CLASSE OU ASSOCIAÇÃO
(legalmente constituída e
em funcionamento há pelo menos 1 ano)
|
para
assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas em favor da
totalidade ou de parte de seus membros ou associados, na forma de seus
estatutos e desde que pertinentes a suas finalidades, dispensada, para tanto,
autorização especial.
|
IV - DEFENSORIA PÚBLICA
|
quando
a tutela requerida for especialmente relevante para a promoção dos direitos
humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados, na
forma do inciso LXXIV do art. 5º da CF/88.
|
Obs: repare que o rol dos
legitimados ativos do mandado de injunção coletivo é maior do que os
legitimados que podem propor mandado de segurança coletivo (art. 21 da Lei nº
12.016/2009), sendo de se destacar a legitimidade do MP e da Defensoria
Pública.
Obs2: os direitos, as liberdades
e as prerrogativas protegidos por mandado de injunção coletivo são os
pertencentes, indistintamente, a uma coletividade indeterminada de pessoas ou
determinada por grupo, classe ou categoria (art. 12, parágrafo único).
Legitimidade PASSIVA (tanto do
individual, como do coletivo)
O mandado de injunção deverá ser
impetrado contra:
• o Poder,
• o órgão ou
• a autoridade
... que tenha atribuição para
editar a norma regulamentadora.
O mais comum é que o direito,
liberdade ou prerrogativa esteja sendo inviabilizado pela falta de uma lei. Nestes
casos, a omissão seria, em regra, do Poder Legislativo.
É importante ressaltar, no
entanto, que se esta lei é de iniciativa reservada do chefe do Poder Executivo,
do Supremo Tribunal Federal, do Procurador Geral da República etc, a omissão,
em princípio, não será do Poder Legislativo, já que os parlamentares não
poderão iniciar o projeto de lei tratando sobre o tema. Em tais exemplos, se
ainda não houver projeto de lei tramitando no Congresso Nacional, o mandado de
injunção deverá ser impetrado contra o Presidente da República, contra o
Presidente do STF ou contra o PGR para que eles apresentem a proposição ao
parlamento.
Se já houver projeto de lei
tramitando, mas este ainda não ter sido votado, temos aí uma mora do Poder
Legislativo em deliberar o assunto. Trata-se da chamada inertia deliberandi. Logo, o mandado de injunção será contra o
Congresso Nacional.
Algumas outras vezes, a norma faltante
é um ato normativo infralegal (exs: um decreto, uma resolução, uma instrução
normativa). Em tais hipóteses, o mandado de injunção deverá ser impetrado
contra o órgão ou autoridade que tenha a atribuição para editar o mencionado
ato. Ex: mandado de injunção contra o CONTRAN pela não-edição de uma
determinada resolução de trânsito.
3. COMPETÊNCIA
Competência originária
As regras de competência para
impetrar o mandado de injunção são disciplinadas na própria Constituição
Federal e variam de acordo com o órgão ou a autoridade responsável pela edição
da norma regulamentadora. Confira:
Competência
|
Quando a atribuição
para elaborar a norma for do(a)(s) ...
|
STF
(art. 102, I,
"q")
|
• Presidente da República
• Congresso Nacional
• Câmara dos Deputados
• Senado Federal
• Mesas da Câmara ou do Senado
• Tribunal de Contas da União
• Tribunais Superiores
• Supremo Tribunal Federal.
|
STJ
(art. 105, I,
"h")
|
órgão, entidade ou autoridade
federal, excetuados os casos de competência do STF e dos órgãos da Justiça
Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal.
|
Juízes e Tribunais
da Justiça Militar, Justiça Eleitoral, Justiça do Trabalho
|
órgão, entidade ou autoridade
federal nos assuntos de sua competência.
|
Juízes Federais e
TRFs
|
órgão, entidade ou autoridade
federal, se não for assunto das demais "Justiças" e desde que não
seja autoridade sujeita à competência do STJ.
Ex: compete à Justiça Federal
julgar MI em que se alega omissão do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN)
na edição de norma de trânsito que seria de sua atribuição (STJ MI 193/DF).
|
Juízes estaduais e
TJs
|
órgão, entidade ou autoridade
estadual, na forma como disciplinada pelas Constituições estaduais.
|
Competências recursais envolvendo
MI expressamente previstas na CF/88
• Compete ao STF julgar, em
recurso ordinário, o mandado de injunção decidido em única instância pelos
Tribunais Superiores, se denegatória a decisão (art. 102, II, "a", da
CF/88).
• Compete ao TSE julgar o recurso
interposto pelo autor contra a decisão do TRE que denegar mandado de injunção
(art. 121, § 4º, V).
4. PROCEDIMENTO
Regramento
O procedimento do mandado de
injunção é disciplinado pela Lei nº 13.300/2016. Caso ela não preveja solução
para alguma situação, o intérprete deverá aplicar, subsidiariamente, as regras
contidas na Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009) e no novo Código
de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).
Petição inicial
A petição inicial do mandado de
injunção deverá preencher os requisitos previstos nos arts. 319 e 320 do
CPC/2015.
Se a inicial não cumprir os
requisitos legais ou apresentar defeitos e irregularidades capazes de
dificultar o julgamento de mérito, o juiz ou Relator deverá determinar que o impetrante,
no prazo de 15 (quinze) dias, emende-a ou complete-a, devendo o magistrado
indicar com precisão o que deve ser corrigido ou completado (art. 321 do
CPC/2015). Se o autor não cumprir a diligência, a petição inicial será
indeferida.
Petição inicial deve indicar o
impetrado e a pessoa jurídica
Na petição inicial, o autor
deverá indicar não apenas o órgão impetrado, mas também a pessoa jurídica que
ele integra ou está vinculado (art. 4º da LMI).
Ex: se o mandado de injunção é
proposto em razão da demora do Presidente da República em encaminhar projeto de
lei ao Congresso Nacional, a ação deverá indicar o Presidente (órgão impetrado)
e também a União (pessoa jurídica que ele integra).
Trata-se de regra semelhante à
existente para o MS (art. 6º da Lei nº 12.016/2009).
Indeferimento da petição inicial
A petição inicial do mandado de
injunção deverá ser desde logo indeferida quando a impetração for:
• manifestamente incabível; ou
• manifestamente improcedente.
Manifestamente incabível: ocorre
quando faltar algum pressuposto processual. Aplica-se aqui as hipóteses
previstas no art. 330 do CPC/2015. Ex: parte manifestamente ilegítima.
Manifestamente improcedente:
ocorre quando o mérito do pedido for claramente improcedente. Ex: se a lei
requerida já foi editada. Aplica-se aqui também as causas de improcedência
liminar previstas no art. 332 do CPC/2015.
Art. 332. Nas causas que
dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu,
julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar:
I - enunciado de súmula do
Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça;
II - acórdão proferido
pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em
julgamento de recursos repetitivos;
III - entendimento firmado
em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de
competência;
IV - enunciado de súmula
de tribunal de justiça sobre direito local.
Antes de indeferir a petição
inicial, o magistrado deve aplicar o disposto no art. 321 do CPC/2015, dando
oportunidade à parte para sanar o vício. Nesse sentido: Enunciado 392 do FPPC.
Recurso contra o indeferimento da
petição inicial
• Se o indeferimento da petição
inicial for feito pelo JUIZ (em 1ª instância): será realizado por meio de
sentença, que desafia apelação, admitindo-se até que o magistrado faça juízo de
retratação, se assim entender (art. 331 do CPC/2015).
• Se o indeferimento ocorrer por
decisão monocrática do RELATOR (em processos de competência originária do
Tribunal): o recurso cabível é o agravo interno.
Muito cuidado neste ponto. O
agravo interno de que trata esta situação é o previsto no art. 6º, parágrafo
único, da Lei nº 13.300/2016, não se aplicando, portanto, o art. 1.021 do
CPC/2015. Isso é importante porque o agravo interno previsto no CPC/2015 tem
prazo de 15 dias, mas a Lei do MI, que é especial, fixa o prazo reduzido de 5
dias.
Agravo interno do CPC/2015: 15
dias.
Agravo interno da Lei do MI: 5
dias.
Art. 6º (...) Parágrafo
único. Da decisão de relator que indeferir a petição inicial, caberá agravo, em
5 (cinco) dias, para o órgão colegiado competente para o julgamento
da impetração.
Obs: aqui também são dias úteis.
Isso porque a LMI não traz regra diferente, devendo-se, portanto, aplicar o
art. 219 do CPC/2015.
Cópias da petição inicial e dos
documentos
O autor deverá apresentar a
petição inicial e os documentos que a instruem acompanhados de tantas vias
(cópias) quantos forem os impetrados (art. 4º, § 1º da LMI).
Se a petição for transmitida por
meio eletrônico (processo eletrônico), não serão necessárias as cópias.
Documento em repartição pública
ou na posse de autoridade ou de terceiro
O autor, na petição inicial,
poderá alegar que não conseguiu juntar determinado documento que seria
necessário para que ele provasse suas alegações em virtude de ele se encontrar
nos arquivos de um órgão público ou em poder de autoridade ou de terceiro e de
não ter conseguido obter uma certidão ou cópia. Em tal situação, o autor deverá
requerer que o juízo requisite do órgão, da autoridade ou do terceiro que
apresente este documento. Veja:
Art. 4º (...)
§ 2º Quando o documento
necessário à prova do alegado encontrar-se em repartição ou estabelecimento público,
em poder de autoridade ou de terceiro, havendo recusa em fornecê-lo por
certidão, no original, ou em cópia autêntica, será ordenada, a pedido do
impetrante, a exibição do documento no prazo de 10 (dez) dias, devendo, nesse
caso, ser juntada cópia à segunda via da petição.
§ 3º Se a recusa em
fornecer o documento for do impetrado, a ordem será feita no próprio
instrumento da notificação.
Providências a serem tomadas após
o recebimento da petição inicial (art. 5º)
Recebida a petição inicial, o
juiz ou Relator dará um despacho ordenando:
I - a notificação do impetrado (ex:
Presidente da República) sobre o conteúdo da petição inicial, devendo-lhe ser
enviada a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que,
no prazo de 10 (dez) dias, preste informações;
II - a ciência do ajuizamento da
ação ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada (ex:
AGU), devendo-lhe ser enviada cópia da petição inicial, para que, querendo,
ingresse no feito.
Manifestação do MP (art. 7º)
Após terminar o prazo para o
impetrado prestar as suas informações, tendo ele apresentado ou não, será
ouvido o Ministério Público, que deverá oferecer parecer no prazo de 10 dias.
Sentença ou acórdão
Esgotado o prazo para
manifestação do MP, com ou sem parecer, os autos serão conclusos para decisão
(sentença ou acórdão).
Liminar
A Lei nº 13.300/2016 não prevê a
possibilidade de concessão de medida liminar.
Antes da regulamentação, o STF já
possuía precedentes afirmando não ser cabível liminar.
5. EFICÁCIA OBJETIVA DA DECISÃO
Um dos pontos mais polêmicos a
respeito do mandado de injunção diz respeito aos efeitos da decisão que julga
esta ação. Sobre o tema, existem as seguintes correntes:
5.1) CORRENTE NÃO-CONCRETISTA
Segundo esta posição, o Poder
Judiciário, ao julgar procedente o mandado de injunção, deverá apenas comunicar
o Poder, órgão, entidade ou autoridade que está sendo omisso.
Para os defensores desta posição,
o Poder Judiciário, por conta do princípio da separação dos Poderes, não pode
criar a norma que está faltando nem determinar a aplicação, por analogia, de
outra que já exista e que regulamente situações parecidas.
É uma posição considerada mais
conservadora e foi adotada pelo STF (MI 107/DF) até por volta do ano de 2007.
5.2) CORRENTE CONCRETISTA
Para esta corrente, o Poder
Judiciário, ao julgar procedente o mandado de injunção e reconhecer que existe
a omissão do Poder Público, deverá editar a norma que está faltando ou determinar
que seja aplicada, ao caso concreto, uma já existente para outras situações
análogas.
É assim chamada porque o Poder
Judiciário irá "concretizar" uma norma que será utilizada a fim de
viabilizar o direito, liberdade ou prerrogativa que estava inviabilizada pela
falta de regulamentação.
I – Quanto à necessidade ou não
de concessão de prazo para o impetrado, a posição concretista pode ser dividida
em:
a) Corrente concretista direta:
o Judiciário deverá implementar uma solução para viabilizar o direito do autor
e isso deverá ocorrer imediatamente (diretamente), não sendo necessária nenhuma
outra providência, a não ser a publicação do dispositivo da decisão.
b) Corrente concretista
intermediária: ao julgar procedente o mandado de injunção, o Judiciário,
antes de viabilizar o direito, deverá dar uma oportunidade ao órgão omisso para
que este possa elaborar a norma regulamentadora. Assim, a decisão judicial fixa
um prazo para que o Poder, órgão, entidade ou autoridade edite a norma que está
faltando.
Caso esta determinação não seja
cumprida no prazo estipulado, aí sim o Poder Judiciário poderá viabilizar o
direito, liberdade ou prerrogativa.
II – Quanto às pessoas atingidas
pela decisão, a corrente concretista pode ser dividida em:
a) Corrente concretista individual:
a solução "criada" pelo Poder Judiciário para sanar a omissão estatal
valerá apenas para o autor do MI.
Ex: na corrente concretista
intermediária individual, quando expirar o prazo, caso o impetrado não edite a
norma faltante, a decisão judicial garantirá o direito, liberdade ou
prerrogativa apenas ao impetrante.
b) Corrente concretista geral:
a decisão que o Poder Judiciário der no mandado de injunção terá efeitos erga omnes e valerá para todas as demais
pessoas que estiverem na mesma situação. Em outras palavras, o Judiciário irá
"criar" uma saída que viabilize o direito, liberdade ou prerrogativa
e esta solução valerá para todos.
Ex: na corrente concretista intermediária
geral, quando expirar o prazo assinalado pelo órgão judiciário, se não houver o
suprimento da mora, a decisão judicial irá garantir o direito, liberdade ou
prerrogativa com eficácia ultra partes ou
erga omnes.
5.3 POSIÇÃO ADOTADA NO DIREITO
BRASILEIRO
Qual é a posição adotada pelo STF?
A Corte inicialmente consagrou a
corrente não-concretista. No entanto, em 2007 houve um overruling (superação do entendimento jurisprudencial anterior) e o
STF adotou a corrente concretista direta geral (STF. Plenário. MI 708, Rel.
Min. Gilmar Mendes, julgado em 25/10/2007).
A Lei nº 13.300/2016 tratou sobre
o tema?
SIM. Aumentando a polêmica em
torno do assunto, a Lei nº 13.300/2016 determina, como regra, a aplicação da
corrente concretista individual intermediária. Acompanhe:
Primeira providência é fixar
prazo para sanar a omissão:
Se o juiz ou Tribunal reconhecer
o estado de mora legislativa, será deferida a injunção (= ordem, imposição) para
que o impetrado edite a norma regulamentadora dentro de um prazo razoável
estipulado pelo julgador.
Segunda etapa, caso o impetrado
não supra a omissão:
Se esgotar o prazo fixado e o
impetrado não suprir a mora legislativa, o juiz ou Tribunal deverá:
• estabelecer as condições em que
se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas
reclamados; ou
• se for o caso, as condições em
que poderá o interessado promover ação própria visando a exercê-los.
Exceção em que a primeira providência
poderá ser dispensada:
O juiz ou Tribunal não precisará
adotar a primeira providência (fixar prazo) e já poderá passar direto para a
segunda etapa, estabelecendo as condições, caso fique comprovado que já houve
outro(s) mandado(s) de injunção contra o impetrado e que ele deixou de suprir a
omissão no prazo que foi assinalado nas ações anteriores.
Em outras palavras, se já foram
concedidos outros mandados de injunção tratando sobre o mesmo tema e o
impetrado não editou a norma no prazo fixado, não há razão lógica para estipular
novo prazo, devendo o juiz ou Tribunal, desde logo, estabelecer as condições
para o exercício do direito ou para que o interessado possa promover a ação
própria.
Em suma:
Desse modo, em regra, a Lei nº
13.300/2016 determina a adoção da corrente concretista intermediária (art. 8º,
I). Caso o prazo para a edição da norma já tenha sido dado em outros mandados
de injunção anteriormente propostos por outros autores, o Poder Judiciário
poderá veicular uma decisão concretista direta (art. 8º, parágrafo único).
Veja o texto do art. 8º, que é o
ponto mais importante da Lei nº 13.300/2016:
Art. 8º Reconhecido o estado de mora
legislativa, será deferida a injunção para:
I - determinar prazo razoável para que o
impetrado promova a edição da norma regulamentadora;
II - estabelecer as condições em que se
dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados
ou, se for o caso, as condições em que poderá o interessado promover ação
própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora legislativa no prazo
determinado.
Parágrafo único. Será dispensada a
determinação a que se refere o inciso I do caput quando comprovado que o
impetrado deixou de atender, em mandado de injunção anterior, ao prazo
estabelecido para a edição da norma.
E quanto à eficácia subjetiva, a
Lei nº 13.300/2016 adotou a corrente individual ou geral?
Em regra, a corrente individual.
• No mandado de injunção
individual, em regra, a decisão terá eficácia subjetiva limitada às partes
(art. 9º).
• No mandado de injunção
coletivo, em regra, a sentença fará coisa julgada limitadamente às pessoas
integrantes da coletividade, do grupo, da classe ou da categoria substituídos
pelo impetrante (art. 13).
Excepcionalmente, será possível
conferir eficácia ultra partes ou erga omnes
A Lei nº 13.300/2016 afirma que
poderá ser conferida eficácia ultra
partes ou erga omnes à decisão,
quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade
ou da prerrogativa objeto da impetração (art. 9º, § 1º).
Essa possibilidade se aplica
tanto para o MI individual como para o coletivo (art. 13).
6. COISA JULGADA NO MANDADO DE
INJUNÇÃO COLETIVO
A Lei nº 13.300/2016 traz uma
regra específica sobre a coisa julgada no mandado de injunção coletivo:
Art. 13. No mandado de injunção
coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente às pessoas integrantes da
coletividade, do grupo, da classe ou da categoria substituídos pelo impetrante,
sem prejuízo do disposto nos §§ 1º e 2º do art. 9º.
Parágrafo único. O mandado de injunção
coletivo não induz litispendência em relação aos individuais, mas os efeitos da
coisa julgada não beneficiarão o impetrante que não requerer a desistência da
demanda individual no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada
da impetração coletiva.
7. SUPERVENIÊNCIA DA NORMA
REGULAMENTADORA
Suponha que determinado autor
ajuizou mandado de injunção questionando a ausência de norma que seria
necessária para o exercício de seu direito. Durante a tramitação, antes de ser
prolatada a decisão, o Poder Público supre a omissão e edita a norma faltante.
O que acontece neste caso?
O mandado de injunção fica
prejudicado e o processo deverá ser extinto sem resolução de mérito (art. 11,
parágrafo único, da LMI).
Imagine agora que determinado
autor ingressou com mandado de injunção que foi julgado procedente e o Poder
Judiciário, após conferir prazo ao impetrado, diante de sua omissão,
"criou" uma norma para assegurar o direito ao requerente. Anos mais
tarde, é finalmente editada a lei que regulamenta esse direito. A situação
deste autor continuará sendo regida pela norma "criada" pela decisão
judicial ou pela nova lei que foi publicada?
Pela nova lei. A partir do
momento em que entra em vigor, a norma regulamentadora que estava faltando
passa a reger todas as situações que ela disciplinar, mesmo que já tenha havido
decisão transitada em julgado em mandado de injunção "criando" outra
solução para o caso concreto.
E os efeitos jurídicos produzidos
antes da vigência da norma serão afetados pela lei editada?
Como regra, não. Em regra, a lei
editada não modifica os efeitos que a decisão do MI já produziu. A norma produz
efeitos apenas a partir de sua vigência.
Há, no entanto, uma exceção: a
norma regulamentadora superveniente produzirá efeitos ex tunc caso ela seja mais favorável ao beneficiário (autor do MI
que foi julgado procedente no passado).
Veja o que previu a Lei nº
13.300/2016:
Art.
11. A norma regulamentadora superveniente produzirá efeitos ex nunc em relação
aos beneficiados por decisão transitada em julgado, salvo se a aplicação da
norma editada lhes for mais favorável.
8. AÇÃO DE REVISÃO
A Lei nº 13.300/2016 prevê a
possibilidade de ser proposta ação de revisão da decisão concessiva do mandado
de injunção. Confira:
Art.
10. Sem prejuízo dos efeitos já produzidos, a decisão poderá ser revista, a
pedido de qualquer interessado, quando sobrevierem relevantes modificações das
circunstâncias de fato ou de direito.
Parágrafo
único. A ação de revisão observará, no que couber, o procedimento estabelecido
nesta Lei.
Não confundir com ação rescisória
Não se trata de ação rescisória. O
objetivo aqui não é desconstituir a coisa julgada que foi formada, mas sim o de
rediscutir a aplicabilidade da decisão oferecida pelo Poder Judiciário diante
da modificação das circunstâncias de fato e de direito.
Mudança nos elementos fáticos ou
jurídicos
A revisão da decisão está
condicionada à comprovação de que houve uma mudança relevante nas
circunstâncias de fato ou de direito que motivaram a solução dada pelo Poder
Judiciário.
Efeitos jurídicos permanecem
intactos
Caso a ação de revisão seja
julgada procedente, os efeitos jurídicos já produzidos pela decisão no MI
permanecem hígidos.
Competência
Será competente para a ação de
revisão o juízo que proferiu a decisão no mandado de injunção.
9. OBSERVAÇÕES FINAIS
MI julgado improcedente por falta
de provas poderá ser reproposto
O indeferimento do pedido por
insuficiência de prova não impede a renovação da impetração, desde que fundada
em outros elementos probatórios (art. 9º, § 3º).
Em geral, são propostos vários
mandados de injunção individuais tratando sobre o mesmo tema (ex: diversos
servidores públicos que dependem de uma lei para viabilizar um direito
constitucional). Após ser julgado procedente o primeiro MI, aplicando-se uma
norma para o caso concreto, é possível que o Tribunal "aproveite"
essa decisão para os demais processos?
SIM. Transitada em julgado a
decisão que julgou procedente o mandado de injunção, seus efeitos poderão ser
estendidos aos casos análogos por decisão monocrática do relator (art. 9º, §
2º, da LMI).
Márcio André Lopes Cavalcante
Professor. Juiz Federal. Foi
Defensor Público, Promotor de Justiça e Procurador do Estado.