Dizer o Direito

domingo, 29 de maio de 2016

Revisão para o concurso de Promotor de Justiça do MP/GO 2016


Olá amigos do Dizer o Direito,

Está disponível a revisão para o concurso de Promotor de Justiça do MP/GO 2016.

Para aqueles que já estudaram pela revisão do MP/SC não é necessário ler de novo porque ela está praticamente idêntica.

Façam uma excelente prova.

Bons estudos.







sexta-feira, 27 de maio de 2016

Reembolso de despesas médicas realizadas em hospital não conveniado ao plano



Imagine a seguinte situação hipotética:
João é cliente do plano de saúde Unimed.
Determinado dia, João sofreu grave acidente e foi levado para atendimento de urgência no hospital particular "Albert Eistein".
Durante o período em que ficou ali internado, João teve que se submeter a uma cirurgia de emergência.
Ao final da internação, o hospital cobrou R$ 200 mil de João por todo o tratamento realizado.
Depois de pagar a quantia, João ingressou com pedido junto à Unimed para ser reembolsado.
A Unimed alegou que, por força de contrato, os serviços que ela oferece aos seus usuários são prestados pelos seus médicos cooperados e pelos hospitais credenciados. Excepcionalmente, a Unimed também paga os serviços que seus clientes realizarem em outros hospitais não credenciados, desde que se trate de casos de urgência ou emergência e desde que o hospital não seja de alto custo, que são aqueles previstos em tabela própria.
Obs: considera-se hospital de tabela própria (de alto custo) aquele que utiliza sua própria lista de preços e procedimentos, não se sujeitando à Tabela de Referência de Terceiros.
Como o "Albert Eistein" não é credenciado da Unimed e como este hospital só aceita receber a sua lista própria de preços, não aceitando a Tabele de Referência de Terceiros, ele é considerado como sendo de alto custo e está fora da cobertura do plano de saúde.
João não se conformou e propôs ação de cobrança contra o plano de saúde.

O que o STJ decidiu em um caso análogo a esse? O plano de saúde deverá ressarcir o usuário?
SIM. O plano de saúde deve reembolsar o segurado pelas despesas que pagou com tratamento médico realizado em situação de urgência ou emergência por hospital não credenciado, ainda que o referido hospital integre expressamente tabela contratual que exclui da cobertura os hospitais de alto custo.

Vamos entender com calma o tema:

Contrato de plano de saúde
O contrato de plano de assistência à saúde é aquele por meio do qual a operadora oferece aos usuários a cobertura de custos de atendimento e tratamento médico, hospitalar e laboratorial  perante  profissionais, hospitais e laboratórios próprios ou credenciados, recebendo, em contraprestação, o pagamento de um preço.

Cobertura do plano pode ficar limitada à rede própria ou conveniada
Em regra, o contrato de plano de saúde poderá prever que a cobertura contratada de médicos, hospitais e laboratórios ficará restrita à rede própria ou conveniada.
Essa previsão contida em quase todos os contratos de plano de saúde não é, em princípio, abusiva.

Plano de saúde deve se responsabilizar pelos serviços de urgência e emergência ainda que fora da rede
Mesmo que o contrato preveja que o plano de saúde só opera com rede própria e conveniada, caso se trate de uma situação de urgência ou emergência em que não for possível a utilização dos serviços próprios ou conveniados, o plano de saúde terá o dever de ressarcir o cliente pelas despesas que ele efetuar em outros médicos ou hospitais.
Dessa forma, se o usuário do plano, em uma situação de urgência ou emergência, tiver que ser atendido em um hospital ou médico não credenciado, terá o direito de ser reembolsado pelo plano.
Se o contrato prever que o plano não se responsabiliza por atendimentos de urgência fora da rede credenciada mesmo em casos de urgência e emergência, esta cláusula contratual é considerada abusiva e nula de pleno direito. Isso porque a Lei que rege o tema (Lei nº 9.656/98) determina esse dever aos planos de saúde. Confira:
Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:
(...)
VI - reembolso, em todos os tipos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, nos limites das obrigações contratuais, das despesas efetuadas pelo beneficiário com assistência à saúde, em casos de urgência ou emergência, quando não for possível a utilização dos serviços próprios, contratados, credenciados ou referenciados pelas operadoras, de acordo com a relação de preços de serviços médicos e hospitalares praticados pelo respectivo produto, pagáveis no prazo máximo de trinta dias após a entrega da documentação adequada;

Voltando ao nosso exemplo, havia uma cláusula no contrato prevendo que o plano de saúde não precisaria reembolsar o cliente caso este utilizasse os serviços de hospital de alto custo, mesmo sendo um caso de urgência ou emergência. Essa cláusula é válida?
NÃO. Como vimos acima, o art. 12, VI, da Lei nº 9.656/98 determina o dever do plano de saúde de reembolsar o usuário em atendimentos de urgência e emergência realizados fora da rede. O dispositivo legal não limita este direito, ou seja, não exclui o direito ao reembolso se o atendimento foi em hospital de alto custo. Logo, se a lei não impôs esta limitação, o contrato não poderia tê-lo feito. Conclui-se, portanto, que esta cláusula é abusiva.

Se o usuário utilizar os serviços de emergência ou urgência de um hospital de alto custo que não seja credenciado, ele terá direito de ser ressarcido integralmente? O mesmo valor que o usuário pagou para o hospital, ele terá direito de receber de volta do plano de saúde?
NÃO. Os hospitais classificados como de alto custo utilizam tabela própria de preços e procedimentos e não se sujeitam à "tabela de referência de terceiros". Essa tabela de referência de terceiros é uma planilha de valores que são pagos pelo plano de saúde ao hospital não credenciado quando o usuário do plano utiliza os seus serviços. É como se o plano de saúde combinasse com o hospital e dissesse o seguinte a ele: você não é credenciado, mas se um usuário meu utilizar seus serviços em caso de emergência ou urgência, você deverá cobrar os valores que estão nesta tabela de referência.
Ocorre que alguns hospitais não aceitam a tabela de referência e, por isso, são considerados como de "alto custo" porque cobram valores superiores ao da planilha.
Se o usuário do plano foi atendido em emergência ou urgência em um hospital de alto custo, o plano de saúde deverá reembolsar o cliente, mas somente com base nos valores previstos na tabela de referência.
Ex: João foi atendido no "Albert Eistein" e pela tabela própria do hospital, uma cirurgia custa R$ 130 mil. Ocorre que essa mesma cirurgia, na tabela de referência, é orçada em R$ 60 mil. Logo, o plano de saúde somente poderá ser obrigado a pagar a João R$ 60 mil.

Resumindo:
O plano de saúde deve reembolsar o segurado pelas despesas que pagou com tratamento médico realizado em situação de urgência ou emergência por hospital não credenciado, ainda que o referido hospital integre expressamente tabela contratual que exclui da cobertura os hospitais de alto custo, limitando-se o reembolso, no mínimo, ao valor da tabela de referência de preços de serviços médicos e hospitalares praticados pelo plano de saúde.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.286.133-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 5/4/2016 (Info 580).

Uma última pergunta. Imagine que o usuário, após ser atendido na emergência do hospital não credenciado ficou livre de perigo imediato, mas permaneceu ali internado para terminar de tratar a enfermidade. Neste caso, ele terá direito de ser ressarcido pelo plano de saúde por todo o período do tratamento?
NÃO. O dever do plano de saúde de ressarcir pelos custos do tratamento realizado no hospital não credenciado perdura até o momento em que cessar a situação de urgência e emergência.
Se acabar a situação de emergência  ou  de  urgência, o usuário deverá buscar a sua transferência para um hospital credenciado do plano. Caso decida continuar o atendimento/tratamento no hospital não credenciado, ele não terá direito ao ressarcimento com relação a esses custos extras.
Em outras palavras, o ressarcimento fica restrito ao período de tratamento da situação de urgência e emergência.




quarta-feira, 25 de maio de 2016

INFORMATIVO Comentado 825 STF




Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 825 STF.

Confira abaixo o índice. Bons estudos.


ÍNDICE DO INFORMATIVO 825 DO STF

Direito Constitucional
PODER JUDICIÁRIO
Lei estadual que concede ressarcimento de despesas de saúde a magistrados não viola a CF/88 nem a LOMAN.

DIREITO ADMINISTRATIVO
PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS
Observância do devido processo legal, contraditório e ampla defesa antes da inclusão de entes federativos nos cadastros federais de inadimplência.
Princípio da intranscendência e atos praticados pelas gestões anteriores.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Possibilidade de renúncia ao direito mesmo em fase de recurso extraordinário ainda não julgado.

DIREITO PENAL
DOSIMETRIA DA PENA
Condenações anteriores transitadas em julgado não podem ser utilizadas como conduta social desfavorável.

LEI MARIA DA PENHA
Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em violência doméstica.

DIREITO PROCESSUAL PENAL
INDICIAMENTO
Indiciamento envolvendo autoridades com foro por prerrogativa de função.

EXECUÇÃO PENAL
Falta de vagas nos regimes semiaberto e aberto e cumprimento da pena.







Livro PRINCIPAIS JULGADOS DO STF E STJ COMENTADOS 2015






INFORMATIVO Comentado 825 STF - Versão Resumida




Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 825 STF - Versão Resumida.

Bons estudos.




Livro JULGADOS RESUMIDOS DO STF E STJ 2012-2015





terça-feira, 24 de maio de 2016

O que fazer se não existem vagas suficientes nos regimes semiaberto ou aberto para todos os detentos? Entenda a decisão do STF sobre o tema



Regimes de cumprimento de pena:
Pela Lei (Código Penal e Lei nº 7.210/84), existem três regimes de cumprimento de pena que seguem às seguintes regras:

Fechado
Semiaberto
Aberto
A pena é cumprida na Penitenciária.
Obs.: apesar de, na prática, isso ser desvirtuado, a chamada Cadeia Pública destina-se apenas ao recolhimento de presos provisórios (art. 102 da LEP), considerando que as pessoas presas provisoriamente devem ficar separadas das que já tiverem sido definitivamente condenadas (art. 300, CPP).
A pena é cumprida em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar (art. 33, § 1º, "b", CP).

A pena é cumprida na Casa do Albergado ou estabelecimento adequado (art. 33, § 1º, "c", CP).
A Casa do Albergado deverá estar localizada em centro urbano, separado dos demais estabelecimentos prisionais, e caracteriza-se pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga. Isso porque o regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade.
O condenado fica sujeito a trabalho, dentro da própria Penitenciária, no período diurno, e a isolamento durante o repouso noturno.
O condenado fica sujeito a trabalho, dentro da colônia, durante o período diurno.
Durante o dia, o condenado trabalha, frequenta cursos ou realiza outras atividades autorizadas, fora do estabelecimento e sem vigilância.
Durante o período noturno e nos dias de folga, permanece recolhido na Casa do Albergado.

Na prática, contudo, é muito comum que não existam colônias agrícolas e industriais e casas de albergado, unidades prisionais previstas na Lei como sendo as adequadas para o cumprimento da pena nos regimes semiaberto e aberto.
O STF debateu este tema em sede de repercussão geral e firmou três teses a respeito do assunto:

TESE 1: AUSÊNCIA DE VAGAS NA UNIDADE PRISIONAL ADEQUADA E CUMPRIMENTO DA PENA NO REGIME MAIS GRAVOSO

Imagine agora a seguinte situação hipotética:
João foi condenado à pena de 5 anos de reclusão, tendo o juiz fixado o regime semiaberto.
Ocorre que, no momento de cumprir a pena, verificou-se que não havia no local estabelecimento destinado ao regime semiaberto que atendesse todos os requisitos da LEP.

João poderá cumprir a pena no regime fechado enquanto não há vagas no semiaberto?
NÃO.

A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso.
STF. Plenário. RE 641320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2016 (repercussão geral) (Info 825).

No Brasil, adota-se o sistema progressivo. Assim, de acordo com o CP e com a LEP, as penas privativas de liberdade deverão ser executadas (cumpridas) em forma progressiva, com a transferência do apenado de regime mais gravoso para menos gravoso tão logo ele preencha os requisitos legais.
O STF destacou, no entanto, que este sistema progressivo de cumprimento de penas não está funcionando na prática. Isso porque há falta de vagas nos regimes semiaberto e aberto.
Desse modo, os presos dos referidos regimes estão sendo mantidos nos mesmos estabelecimentos que os presos em regime fechado e provisórios. Essa situação viola duas garantias constitucionais da mais alta relevância:
·       a individualização da pena (art. 5º, XLVI) e;
·       a legalidade (art. 5º, XXXIX).

A manutenção do condenado em regime mais gravoso do que é devido caracteriza-se como "excesso de execução", havendo, no caso, violação ao direito do apenado.

Vale ressaltar que não é possível "relativizar" esse direito do condenado com base em argumentos ligados à manutenção da segurança pública. A proteção à integridade da pessoa e ao seu patrimônio contra agressões injustas está na raiz da própria ideia de Estado Constitucional. A execução de penas corporais em nome da segurança pública só se justifica se for feita com observância da estrita legalidade. Permitir que o Estado execute a pena de forma excessiva é negar não só o princípio da legalidade, mas a própria dignidade humana dos condenados (art. 1º, III, da CF/88). Por mais grave que seja o crime, a condenação não retira a humanidade da pessoa condenada. Ainda que privados de liberdade e dos direitos políticos, os condenados não se tornam simples objetos de direito (art. 5º, XLIX, da CF/88).


TESE 2: CONCEITO DE "ESTABELECIMENTO SIMILAR" E DE "ESTABELECIMENTO ADEQUADO"

O Código Penal, ao tratar sobre os regimes semiaberto e aberto, prevê o seguinte:
Art. 33 (...)
§ 1º - Considera-se:
b) regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;
c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

Há importante discussão acerca do que vêm a ser estabelecimento similar e estabelecimento adequado.
A Lei de Execuções Penais trata do tema nos arts. 91 a 95, mas também não define em que consistem tais estabelecimentos.
Na prática, existem pouquíssimas colônias agrícolas e industriais no país. Dessa forma, alguns Estados mantêm os presos do regime semiaberto em estabelecimentos similares, ou seja, unidades prisionais diferentes do regime semiaberto, onde os presos possuem um pouco mais de liberdade.
De igual forma, em muitos Estados não existem casas de albergado e os detentos que estão no regime aberto ficam em unidades diferentes dos demais presos.
Há discussão se essa prática é válida ou não.
O STF decidiu que os magistrados possuem competência para verificar, no caso concreto, se tais estabelecimentos onde os presos do regime semiaberto e aberto ficam podem ser enquadrados como "estabelecimento similar" ou "estabelecimento adequado".
Assim, os presos do regime semiaberto podem ficar em outra unidade prisional que não seja colônia agrícola ou industrial, desde que se trate de estabelecimento similar (adequado às características do semiaberto).
De igual forma, os presos do regime aberto podem cumprir pena em outra unidade prisional que não seja casa de albergado, desde que se trate de um estabelecimento adequado.
Veja como o STF resumiu este entendimento em uma tese:
Os juízes da execução penal podem avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como adequados a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como “colônia agrícola, industrial” (regime semiaberto) ou “casa de albergado ou estabelecimento adequado” (regime aberto) (art. 33, §1º, “b” e “c”, do CP).
STF. Plenário. RE 641320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2016 (repercussão geral) (Info 825).


TESE 3: DÉFICIT DE VAGAS NO ESTABELECIMENTO ADEQUADO E MEDIDAS QUE DEVERÃO SER TOMADAS

O que fazer em caso de déficit de vagas no estabelecimento adequado?
Havendo “déficit” de vagas, deve ser determinada:
1) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas;
2) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas;
3) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progrida ao regime aberto.
STF. Plenário. RE 641320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2016 (repercussão geral) (Info 825).

Objetivo das medidas acima é o de que surjam novas vagas nos regimes semiaberto e aberto
As vagas nos regimes semiaberto e aberto não são inexistentes, são insuficientes.
Assim, de um modo geral, a falta de vagas decorre do fato de que já há um sentenciado ocupando o lugar.
Dessa forma, o STF determinou, como alternativa para resolver o problema, antecipar a saída de sentenciados que já estão no regime semiaberto ou aberto, abrindo vaga para aquele que acaba de progredir.

Exemplo de como essas medidas fazem surgir vaga no regime semiaberto:
João estava cumprindo pena no regime fechado e progrediu para o regime semiaberto.
Ocorre que não há vagas na unidade prisional destinada ao regime semiaberto.
João não poderá continuar cumprindo pena no fechado porque haveria excesso de execução.
Nestes casos, o que acontecia normalmente é que João seria colocado em prisão domiciliar. No entanto, o STF afirmou que essa alternativa (prisão domiciliar) não deve ser a primeira opção para o caso.
Diante disso, o STF entendeu que o juiz das execuções penais deverá antecipar a saída de um detento que já estava no regime semiaberto, fazendo com que surja a vaga para João.
Em nosso exemplo, Francisco, que estava cumprindo pena no regime semiaberto, só teria direito de ir para o regime aberto em 2018. No entanto, para dar lugar a João, Francisco receberá o benefício da "saída antecipada" e ficará em liberdade eletronicamente monitorada, ou seja, ficará livre para trabalhar e estudar, recolhendo-se em casa nos dias de folgas, sendo sempre monitorado com tornozeleira eletrônica.
Com isso, surgirá mais uma vaga no regime semiaberto e esta será ocupada por João.

E se a ausência de vaga for no regime aberto? Ex: Pedro progrediu para o regime aberto, mas não há vagas, o que fazer?
Neste caso, o Juiz deverá conceder a um preso que está no regime aberto a possibilidade de cumprir o restante da pena não mais no regime aberto (pena privativa de liberdade), mas sim por meio de pena restritiva de direitos e/ou estudo.
Ex: Tiago, que estava no regime aberto, só acabaria de cumprir sua pena em 2018. No entanto, para dar lugar a Pedro, o Juiz oferece a ele a oportunidade de sair do regime aberto e cumprir penas restritivas de direito e/ou estudo. Com isso, surgirá nova vaga no aberto.
Assim, se não há estabelecimentos adequados ao regime aberto, a melhor alternativa não é a prisão domiciliar, mas a substituição da pena privativa de liberdade que resta a cumprir por penas restritivas de direito e/ou estudo.

Benefícios devem ser concedidos aos detentos que estão mais próximos de progredir ou de acabar a pena
Vale ressaltar que os apenados que serão beneficiados com a saída antecipada ou com as penas alternativas deverão ser escolhidos com base em critérios isonômicos.
Assim, tais benefícios deverão ser deferidos aos sentenciados que satisfaçam os requisitos subjetivos (bom comportamento) e que estejam mais próximos de satisfazer o requisito objetivo, ou seja, aqueles que estão mais próximos de progredir ou de encerrar a pena.
Para isso, o STF determinou que o CNJ faça um "Cadastro Nacional de Presos", com as informações sobre a execução penal de cada um deles. Isso permitirá verificar os apenados com expectativa de progredir ou de encerrar a pena no menor tempo e, em consequência, organizar a fila de saída com observação da igualdade.

Por que o STF afirma que a prisão domiciliar não pode ser a primeira opção, devendo-se adotar as medidas acima propostas?
Segundo o STF, a prisão domiciliar apresenta vários inconvenientes, que irei aqui resumir:
1º) Para ter esse benefício, cabe ao condenado providenciar uma casa, na qual vai ser acolhido. Nem sempre ele tem meios para manter essa residência. Nem sempre tem uma família que o acolha.
2º) O recolhimento domiciliar puro e simples, em tempo integral, gera dificuldades de caráter econômico e social. O sentenciado passa a necessitar de terceiros para satisfazer todas as suas necessidades – comida, vestuário, lazer. De certa forma, há uma transferência da punição para a família, que terá que fazer todas as atividades externas do sentenciado. Surge a necessidade de constante comunicação com os órgãos de execução da pena, para controlar saídas indispensáveis – atendimento médico, manutenção da casa etc.
3º) Existe uma dificuldade grande de fiscalização se o apenado está realmente cumprindo a restrição imposta.
4º) A prisão domiciliar pura e simples não garante a ressocialização porque é extremamente difícil para o apenado conseguir um emprego no qual ele trabalhe apenas em casa.


RESUMO

Teses que foram firmadas pelo STF em repercussão geral:
a) A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso;
b) Os juízes da execução penal poderão avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como adequados a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como “colônia agrícola, industrial” (regime semiaberto) ou “casa de albergado ou estabelecimento adequado” (regime aberto) (art. 33, §1º, alíneas “b” e “c”, do CP);
c) Havendo déficit de vagas, deverá determinar-se:
(i) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas;
(ii) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas;
(iii) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progride ao regime aberto;
d) Até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado.
STF. Plenário. RE 641320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2016 (repercussão geral) (Info 825).


MEDIDAS QUE O STF DETERMINOU AO CNJ

A fim de tentar minimizar os problemas acima expostos e conseguir implementar as teses que foram definidas, o STF determinou que o CNJ apresente:
A) em 180 dias, contados da conclusão do julgamento:
• projeto de estruturação do Cadastro Nacional de Presos, com etapas e prazos de implementação, devendo o banco de dados conter informações suficientes para identificar os mais próximos da progressão ou extinção da pena;
• relatório sobre a implantação das centrais de monitoração e penas alternativas, acompanhado, se for o caso, de projeto de medidas ulteriores para desenvolvimento dessas estruturas; e

B) em um ano, relatório com projetos para:
• expansão do Programa Começar de Novo e adoção de outras medidas buscando o incremento da oferta de estudo e de trabalho aos condenados; e
• aumento do número de vagas nos regimes semiaberto e aberto.


DECISÃO MANIPULATIVA

Decisão manipulativa (manipuladora)
A decisão tomada pelo STF e acima explicada pode ser classificada como uma "decisão manipulativa".
Gilmar Mendes, citando a doutrina italiana de Riccardo Guastini, afirma que decisão manipulativa é aquela mediante a qual "o órgão de jurisdição constitucional modifica ou adita normas submetidas a sua apreciação, a fim de que saiam do juízo constitucional com incidência normativa ou conteúdo distinto do original, mas concordante com a Constituição" (RE 641320/RS).
Decisão manipulativa, portanto, como o nome indica, é aquela em que o Tribunal Constitucional manipula o conteúdo do ordenamento jurídico, modificando ou aditando a lei a fim de que ela se torne compatível com o texto constitucional.
Trata-se de instituto que surgiu no direito italiano, sendo, atualmente, no entanto, adotada em outros Tribunais constitucionais no mundo.

Espécies de decisões manipulativas:
As decisões manipulativas podem ser divididas em:
1) Decisão manipulativa de efeitos aditivos (SENTENÇA ADITIVA):
Verifica-se quando o Tribunal declara inconstitucional certo dispositivo legal não pelo que expressa, mas pelo que omite, alargando o texto da lei ou seu âmbito de incidência.
"A sentença aditiva pode ser justificada, por exemplo, em razão da não observância do princípio da isonomia, notadamente nas situações em que a lei concede certo benefício ou tratamento a determinadas pessoas, mas exclui outras que se enquadrariam na mesma situação.
Nessas hipóteses, o Tribunal Constitucional declara inconstitucional a norma na parte em que trata desigualmente os iguais, sem qualquer razoabilidade e/ou nexo de causalidade.
Assim, a decisão se mostra aditiva, já que a Corte, ao decidir, 'cria uma norma autônoma'', estendendo aos excluídos o benefício. " (LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 177).

Ex1: ADPF 54, Rel. Min. Marco Aurélio, julgada em 12/4/2012, na qual o STF julgou inconstitucional a criminalização dos abortos de fetos anencéfalos atuando de forma criativa ao acrescentar mais uma excludente de punibilidade – no caso de o feto padecer de anencefalia – ao crime de aborto. Ao decidir o mérito da ação, assentando a sua procedência e dando interpretação conforme aos arts. 124 a 128 do Código Penal, o STF proferiu uma típica decisão manipulativa com eficácia aditiva em matéria penal.

Ex2: MI 670, Red. para o acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 25/10/2007, na qual o STF determinou a aplicação aos servidores públicos da Lei nº 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve na iniciativa privada, pelo que promoveu extensão aditiva do âmbito de incidência da norma.

2) Decisão manipulativa de efeitos substitutivos (SENTENÇA SUBSTITUTIVA):
Na decisão manipulativa substitutiva, a Corte Constitucional declara a inconstitucionalidade de parte de uma lei (ou outro ato normativo) e, além disso, substitui a regra inválida por outra, criada pelo próprio Tribunal, a fim de que se torne consentânea com a Constituição.
Há, neste caso, uma forma de direito judicial, considerando que se trata de um direito criado pelo Tribunal.
Ex: a MP 2183-56 alterou o Decreto-lei nº 3.365/41 e estabeleceu que, no caso de imissão prévia na posse, na desapropriação por necessidade ou utilidade pública e interesse social, havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor do bem, fixado na sentença, deverá incidir juros compensatórios de até 6% ao ano. Ao julgar ADI contra esta MP, o STF afirmou que esse percentual de 6% era inconstitucional e determinou que este percentual deveria ser de 12% ao ano (ADI 2332, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 05/09/2001).




segunda-feira, 23 de maio de 2016

INFORMATIVO Comentado 824 STF




Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 824 STF.

Confira abaixo o índice. Bons estudos.


ÍNDICE DO INFORMATIVO 824 DO STF

Direito Constitucional
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
Revogação do ato normativo que estava sendo impugnado e repetição de seu conteúdo.

PODER LEGISLATIVO
Afastamento de Deputado Federal do cargo por decisão judicial.

DIREITO ADMINISTRATIVO
RESPONSABILIDADE CIVIL
Constitucionalidade do art. 1ºC da Lei 9.494/97.

PENSÃO POR MORTE
Condição de companheira pode ser provada mesmo sem sentença judicial.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL
EXECUÇÃO
Constitucionalidade do art. 741 do CPC 1973 (art. 525, § 1º, III e §§ 12 e 14; e art. 535, § 5º do CPC 2015).

EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA
Constitucionalidade do art. 1ºB da Lei 9.494/97.

DIREITO PROCESSUAL PENAL
INQUÉRITO POLICIAL
É incabível a anulação de processo penal em razão de suposta irregularidade verificada em inquérito policial.

IMPEDIMENTO
O magistrado que atuou como corregedor em processo administrativo não está impedido de julgar o réu em processo criminal.

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL MILITAR
CONFISSÃO
Réu só tem direito à atenuante caso a autoria criminosa seja ignorada ou imputada a outrem.

INTERROGATÓRIO
Possibilidade de realização de interrogatório por meio de carta precatória.







Livro PRINCIPAIS JULGADOS DO STF E STJ COMENTADOS 2015






INFORMATIVO Comentado 824 STF - Versão Resumida




Olá amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível o INFORMATIVO Comentado 824 STF - Versão Resumida.

Bons estudos.




Livro JULGADOS RESUMIDOS DO STF E STJ 2012-2015





sábado, 21 de maio de 2016

Revisão para o concurso de Promotor de Justiça do MP/SC 2016


Olá amigos do Dizer o Direito,

Está disponível a revisão para o concurso de Promotor de Justiça do MP/SC 2016.

Espero que façam uma excelente prova.

Que Deus abençoe seus sonhos e faça o que for melhor para vocês, ainda que não seja o que vocês queiram :)

Bons estudos.






quinta-feira, 19 de maio de 2016

Conflito de atribuições envolvendo MPE e MPF deve ser dirimido pelo PGR. Entenda



Conflito de competência
Quando dois órgãos jurisdicionais divergem sobre quem deverá julgar uma causa, dizemos que existe, neste caso, um conflito de competência.
Obs: o CPP denomina esse fenômeno de "conflito de jurisdição" (art. 113 a 117), expressão, contudo, bastante criticada pela doutrina e jurisprudência porque a jurisdição no Brasil é uma só, sendo exercida por qualquer juiz e Tribunal. O que se divide é a competência, que cada juízo possui a sua.

Exemplo de conflito de competência:
Foi instaurado inquérito policial, que estava tramitando na Justiça Estadual, com o objetivo de apurar determinado crime.
Ao final do procedimento, o Promotor de Justiça requereu a declinação da competência para a Justiça Federal, entendendo que estava presente a hipótese do art. 109, IV, da CF/88.
O Juiz de Direito concordou com o pedido e remeteu os autos para a Justiça Federal.
O Juiz Federal deu vista ao Procurador da República, que entendeu em sentido contrário ao Promotor de Justiça e afirmou que não havia interesse direto e específico da União que justificasse o feito ser de competência federal.
O Juiz Federal concordou com o Procurador da República e suscitou conflito de competência.
Este conflito deverá ser dirimido pelo Superior Tribunal de Justiça, nos termos do art. 105, I, "d", da CF/88:
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I - processar e julgar, originariamente:
d) os conflitos de competência entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no art. 102, I, "o", bem como entre tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos;

Conflito de atribuições
No exemplo acima, os membros do Ministério Público discordaram entre si. No entanto, essa discordância não ficou limitada a eles e foi também encampada pelos juízes. Logo, em última análise, tivemos um conflito de competência, ou seja, um conflito negativo entre dois órgãos jurisdicionais.
Algumas vezes, no entanto, os membros do Ministério Público instauram investigações que tramitam no âmbito da própria instituição. Neste caso, em regra, tais procedimentos não são levados ao Poder Judiciário, salvo no momento em que irá ser oferecida a denúncia ou se for necessária alguma medida que dependa de autorização judicial (ex: interceptação telefônica).
A regra geral, no entanto, é que os procedimentos de investigação conduzidos diretamente pelo MP tramitem exclusivamente no âmbito interno da Instituição.
Ex: um Promotor de Justiça instaurou, no MPE, procedimento de investigação para apurar crimes relacionados com um cartel mantido por donos de postos de combustíveis. Ocorre que o Procurador da República também deflagrou, no âmbito do MPF, um procedimento investigatório para apurar exatamente o mesmo fato. Temos, então, dois membros diferentes do Ministério Público investigando o mesmo fato. Vale ressaltar que nenhum deles formulou qualquer pedido judicial, de sorte que o Poder Judiciário não foi provocado e os procedimentos tramitam apenas internamente.

Neste caso, indaga-se: se dois membros do Ministério Público divergem sobre quem deverá atuar em uma investigação, como isso é chamado? Teremos aqui também um conflito de competência?
Não. Neste caso, teremos um CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES.
"O conflito de atribuições não se confunde com o conflito de competência. Cuidando-se de ato de natureza jurisdicional, o conflito será de competência; tratando-se de controvérsia entre órgãos do Ministério Público sobre ato que caiba a um deles praticar, ter-se-á um conflito de atribuições." (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 3ª ed., Salvador: Juspodivm, 2015, p. 1113).

Obs: mais uma vez, chamo atenção para o fato de que só existe conflito de atribuições se a divergência ficar restrita aos membros do Ministério Público. Se os juízes encamparem as teses dos membros do MP, aí eles estarão discordando entre si e teremos no caso um "falso conflito de atribuições" (expressão cunhada por Guilherme de Souza Nucci). Diz-se que há um falso conflito de atribuições porque, na verdade, o que temos é um conflito entre dois juízes, ou seja, um conflito de competência.

Conflito de atribuições pode se dar tanto em matéria criminal como cível
Apesar de os exemplos acima fornecidos envolverem a investigação de crimes, é importante esclarecer que o conflito de atribuições poderá ocorrer também em apuração de infrações cíveis, como o caso de improbidade, meio ambiente, consumidor e outros direitos difusos e coletivos.
Ex: um Promotor de Justiça e um Procurador da República divergem quanto à atribuição para a condução de inquérito civil que investiga suposto superfaturamento na construção de conjuntos habitacionais com recursos financeiros liberados pela Caixa Econômica Federal e oriundos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). A Procuradoria da República no Paraná entendeu que esta atribuição seria do Promotor de Justiça, mas o MPE discordou e considerou que a apuração seria do MPF, já que envolvia recursos oriundos da CEF  (STF ACO 924).

Caso haja um conflito de atribuições entre membros do Ministério Público, quem irá decidir qual dos dois órgãos irá atuar?
Depende. Podemos identificar quatro situações diferentes:

SITUAÇÃO 1
Se o conflito se dá entre Promotores de Justiça do Ministério Público de um mesmo Estado (ex: Promotor de Justiça de Iranduba/AM e Promotor de Justiça de Manaus/AM):
Neste caso, a divergência será dirimida pelo respectivo Procurador-Geral de Justiça. Veja:

Lei nº 8.625/93
Art. 10. Compete ao Procurador-Geral de Justiça:
X - dirimir conflitos de atribuições entre membros do Ministério Público, designando quem deva oficiar no feito;

SITUAÇÃO 2
Se o conflito se dá entre Procuradores da República (ex: um Procurador da República que oficia em Manaus/AM e um Procurador da República que atua em Boa Vista/RR):
Nesta hipótese, o conflito será resolvido pela Câmara de Coordenação e Revisão (órgão colegiado do MPF), havendo possibilidade de recurso para o Procurador-Geral da República. Confira:

LC 75/93
Art. 62. Compete às Câmaras de Coordenação e Revisão:
VII - decidir os conflitos de atribuições entre os órgãos do Ministério Público Federal.

Art. 49. São atribuições do Procurador-Geral da República, como Chefe do Ministério Público Federal:
VIII - decidir, em grau de recurso, os conflitos de atribuições entre órgãos do Ministério Público Federal;

SITUAÇÃO 3
Se o conflito se dá entre integrantes de ramos diferentes do Ministério Público da União (ex: um Procurador da República e um Procurador do Trabalho):
O conflito será resolvido pelo Procurador-Geral da República:

LC 75/93
Art. 26. São atribuições do Procurador-Geral da República, como Chefe do Ministério Público da União:
VII - dirimir conflitos de atribuição entre integrantes de ramos diferentes do Ministério Público da União;

SITUAÇÃO 4
Se o conflito se dá entre Promotores de Justiça de Estados diferentes (ex: Promotor de Justiça do Amazonas e Promotor de Justiça do Acre)? Se o conflito se dá entre um Promotor de Justiça e um Procurador da República (ex: Promotor de Justiça do Amazonas e Procurador da República que oficia em Manaus/AM)?

POSIÇÃO QUE ERA ADOTADA PELO STF:
Afirmava que este conflito de atribuições deveria ser dirimido pelo próprio STF.
O Ministério Público é um órgão. Seus membros também são órgãos. Um Promotor de Justiça é um órgão estadual. Um Procurador da República é um órgão da União.
Se dois Promotores de Justiça de Estados diferentes estavam divergindo sobre a atuação em uma causa, o que nós tínhamos era uma divergência entre dois órgãos de Estados diferentes.
Se um Promotor de Justiça e um Procurador da República discordavam sobre quem deveria atuar no caso, o que nós tínhamos era uma dissonância entre um órgão estadual e um órgão federal.
Logo, nestas duas situações, quem deveria resolver este conflito seria o STF, conforme previsto no art. 102, I, "f", da CF/88:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta;

POSIÇÃO ATUAL DO STF:
No dia de hoje (19/05/2016), o STF alterou sua jurisprudência e passou a decidir que a competência para dirimir estes conflitos de atribuição é do Procurador-Geral da República (ACO 924/MG, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 19/05/2016).
Segundo restou decidido, não cabe ao STF julgar conflitos de atribuição entre o Ministério Público Federal e os Ministérios Públicos dos estados.
O argumento utilizado pelos Ministros foi no sentido de que a questão não é jurisdicional, e sim administrativa, e, por isso, a controvérsia deverá ser remetida ao Procurador-Geral da República.

Mas o Procurador-Geral da República é o chefe do Ministério Público estadual? Ele tem ingerência sobre o MPE?
NÃO. O Procurador-Geral da República é o chefe do Ministério Público da União (art. 128, § 1º da CF/88). O chefe de cada Ministério Público estadual é o seu respectivo Procurador-Geral de Justiça (art. 128, § 3º). Justamente por isso a solução que foi adotada pelo STF sempre foi criticada pela doutrina. Confira, por todos, Eugênio Pacelli:
"Merece registro, por fim, que a tese no sentido de que poderia o Procurador-Geral da República resolver os citados conflitos de atribuições (entre membros de Ministérios Públicos diferentes), jamais foi acolhida. E, a nosso aviso, corretamente (a rejeição dela).
É que o Procurador-Geral da República não ocupa qualquer posição (administrativa, funcional ou operacional) hierarquicamente superior aos Procuradores-Gerais de Justiça dos Estados." (Curso de Processo Penal. 14ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 71).

O que os Ministros argumentaram para enfrentar essas críticas que eles já conheciam?
De acordo com o Ministro Luiz Fux, “a opinião do MPF sobrepõe-se à manifestação do MP estadual, assim como prevê a súmula 150 [do Superior Tribunal de Justiça - STJ], segundo a qual cabe ao juiz federal dizer se há ou não interesse da União em determinado processo”. O relator explicou que a aplicação dessa súmula do STJ se daria por analogia.
Além disso, o Ministro afirmou que os conflitos de atribuição são uma questão interna da instituição.

O Ministro Teori Zavascki explicou que esta é uma divergência estabelecida interna corporis numa instituição que a Constituição Federal subordina aos princípios de unidade e indivisibilidade. “Divergência dessa natureza não se qualifica como conflito federativo apto a atrair a incidência do artigo 102, parágrafo 1º, letra “f”, da Constituição”, afirmou. Ainda de acordo com o Ministro, cumpre ao próprio Ministério Público, e não ao Judiciário, identificar e afirmar ou não as atribuições investigativas de cada um dos órgãos em face do caso concreto.

O Ministro Dias Toffoli, por sua vez, sustentou que “o MP é uma instituição una e indivisível, e conta com um órgão central, o procurador-geral da República”.
Para Toffoli, a Constituição Federal outorgou ao Procurador-Geral da República algumas atribuições de caráter nacional, dentre elas as seguintes:
• possibilidade de propor Ações Diretas de Inconstitucionalidade;
• prerrogativa de escolher o representante dos Ministérios Públicos estaduais no Conselho Nacional de Justiça; e
• legitimidade para apresentar ao STF pedidos de intervenção nos estados.

Desse modo, percebe-se que a CF/88 conferiu ao PGR um status de representante nacional do Ministério Público.

Volume de processos no STF
A despeito do esforço teórico para justificar a decisão, o principal motivo pelo qual o STF decidiu atribuir ao PGR esta competência está relacionado a um aspecto bem mais pragmático: volume de processos.
Eram inúmeros os conflitos de atribuição que chegavam ao STF todos os dias e a Corte simplesmente não tinha mais condições de julgá-los.
Dessa forma, o STF abriu mão desta competência e a conferiu ao PGR por razões muito mais ligadas a política judiciária e à racionalização de suas competências enquanto Corte Constitucional.

Novo entendimento vale tanto para conflitos entre MPE e MPF como também para conflitos entre Promotores de Estados diferentes
Vale ressaltar que o caso apreciado pelo STF dizia respeito a um conflito de atribuições entre um Procurador da República e um Promotor de Justiça. No entanto, pelos debates entre os Ministros, percebe-se que a solução adotada vale também para os conflitos envolvendo Promotores de Justiça de Estados-membros diferentes.
Por mais estranho que pareça, se dois Promotores de Justiça de Estados diferentes divergirem quanto à atuação em um caso, este conflito de atribuições será dirimido pelo PGR.

Resumindo:

QUEM DECIDE O CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES 
ENTRE MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO?
MPE do Estado 1 x MPE do Estado 1
Procurador-Geral de Justiça do Estado1
MPF x MPF
CCR, com recurso ao PGR
MPU (ramo 1) x MPU (ramo 2)
Procurador-Geral da República
MPE x MPF
Procurador-Geral da República
MPE do Estado 1 x MPE do Estado 2
Procurador-Geral da República


Inexistência de vinculação para o Poder Judiciário
Vale, por fim, uma observação. O Poder Judiciário não fica vinculado à decisão do PGR.
Assim, suponhamos que, em um conflito de atribuições, o PGR afirme que a atribuição para investigar e denunciar o réu é do Procurador da República.
Diante disso, o Procurador da República oferece denúncia na Justiça Federal. O Juiz Federal estará livre para reapreciar o tema e poderá entender que a competência não é da Justiça Federal, declinando a competência para a Justiça Estadual. Caso o Juiz de Direito concorde, seguirá no processamento do feito. Se discordar, deverá suscitar conflito de competência a ser dirimido pelo STJ (art. 105, I, "d", da CF/88).
O certo é que a decisão do PGR produz efeitos vinculantes apenas interna corporis, sendo uma decisão de cunho administrativo, não vinculando os juízos que irão apreciar a causa.





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