Dizer o Direito

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Se, por fraude causada por terceiros, é sacado dinheiro indevidamente da conta bancária, o banco terá que pagar danos morais ao cliente?


Imagine a seguinte situação adaptada:
João mantém uma conta poupança no Banco "XX".
Determinado dia, João constata que um terceiro conseguiu realizar um saque fraudulento e retirou R$ 2 mil de sua conta.
O cliente procurou o gerente do banco em diversas oportunidades tentando resolver a questão, mas a instituição não devolveu o dinheiro, razão pela qual João teve que ingressar com ação de indenização por danos materiais e morais.

Diante disso, indaga-se: o banco tem responsabilidade pelo saque fraudulento realizado por terceiro ou poderá alegar que houve um caso fortuito? Qual é o tipo de responsabilidade aplicável?
O banco possui responsabilidade objetiva, com base na teoria do risco. Ele não poderá alegar caso fortuito porque se trata de um fortuito interno (e não fortuito externo).
O tema foi decidido pelo STJ em sede de recurso repetitivo, tendo sido firmada a seguinte tese:
"As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno."
(STJ. 2ª Seção. REsp 1.199.782/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 24/8/2011)

Para relembrar:
Fortuito interno
Fortuito externo
Está relacionado à organização da empresa.
É um fato ligado aos riscos da atividade desenvolvida pelo fornecedor.
Não está relacionado à organização da empresa.
É um fato que não guarda nenhuma relação de causalidade com a atividade desenvolvida pelo fornecedor.
É uma situação absolutamente estranha ao produto ou ao serviço fornecido.
Ex.1: o estouro de um pneu do ônibus da empresa de transporte coletivo.

Ex.2: cracker invade o sistema do banco e consegue transferir dinheiro da conta de um cliente.

Ex.3: durante o transporte da matriz para uma das agências, ocorre um roubo e são subtraídos diversos talões de cheque (trata-se de um fato que se liga à organização da empresa e aos riscos da própria atividade desenvolvida).
Ex.1: assalto à mão armada no interior de ônibus coletivo (não é parte da organização da empresa de ônibus garantir a segurança dos passageiros contra assaltos).

Ex.2: um terremoto faz com que o telhado do banco caia, causando danos aos clientes que lá estavam.
Para o STJ, o fortuito interno NÃO exclui a obrigação do fornecedor de indenizar o consumidor.
Para o STJ, o fortuito externo é uma causa excludente de responsabilidade.

Se houve saque fraudulento da conta bancária, este fato, por si só, gera direito à indenização por danos morais? Pode-se dizer que em caso de saques fraudulentos existe dano moral in re ipsa (com prejuízo presumido)?
NÃO. O STJ entende que nem sempre haverá condenação por danos morais em caso de saque fraudulento feito em conta bancária. Nesse sentido: REsp 540.681/RJ, Rel. Min. Castro Filho, julgado em 13/09/2005.
Assim, a retirada indevida de quantia depositada em conta poupança ou corrente não gera, automaticamente, dano moral passível de indenização. Não há que se falar em dano moral in re ipsa. Somente haverá dano moral se, no caso concreto, ficar provada a ocorrência de circunstâncias que demonstrem que houve sofrimento, angústia, dor, ou seja, algo maior do que um mero aborrecimento.

No exemplo narrado acima, João terá direito de ser indenizado por danos morais? Há dano moral indenizável neste caso?
SIM.

O banco deve compensar os danos morais sofridos por consumidor vítima de saque fraudulento que, mesmo diante de grave e evidente falha na prestação do serviço bancário, teve que intentar ação contra a instituição financeira com objetivo de recompor o seu patrimônio, após frustradas tentativas de resolver extrajudicialmente a questão.
STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp 395.426-DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Rel. para acórdão Marco Buzzi, julgado em 15/10/2015 (Info 574).

No caso concreto o banco não adotou as providências para resolver o problema
Na situação narrada, o STJ considerou que a instituição financeira não adotou quaisquer providências hábeis a solucionar o problema narrado pelo consumidor, tanto que se fez necessário o ajuizamento de uma ação judicial, em que pleiteado, além do dano moral, aquele de cunho patrimonial, consistente nos valores sacados indevidamente da conta bancária.
Tais circunstâncias são suficientes à caracterização do dano moral, porque não podem ser consideradas como meros dissabores, inerentes à vida social.
Diante das circunstâncias acima ressaltadas, houve violação à segurança legitimamente esperada pelo consumidor, que, além de ter seu patrimônio subtraído indevidamente, viu frustradas as tentativas de resolução extrajudicial da questão. O cliente somente conseguiu recuperar o dinheiro indevidamente retirado de sua conta bancária após ter ajuizado ação judicial que obrigou a instituição financeira a recompor os depósitos. Essa circunstância vai muito além de um mero dissabor, transtorno ou aborrecimento corriqueiro.
Além disso, há que salientar que, além do caráter compensatório, a indenização por dano moral também tem finalidades sancionatórias e preventivas, isto é, tem como objetivo desestimular novas faltas/falhas na prestação do serviço.



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