terça-feira, 16 de fevereiro de 2016
Responsabilidade civil e banco postal
terça-feira, 16 de fevereiro de 2016
Banco postal
O Banco Postal é a marca dos
Correios que designa sua atuação como correspondente na prestação de serviços
bancários básicos em todo o território nacional. Tem como objetivo levar
serviços de correspondente à população desprovida de atendimento bancário e
proporcionar acesso ao Sistema Financeiro. (Conceito disponível no site dos
Correios: http://www.correios.com.br/).
Em outras palavras, o banco
postal é uma agência dos Correios que, além dos serviços postais tradicionais
(envio de cartas, encomendas etc.), também oferece alguns serviços bancários,
como pagamentos de contas até determinado valor.
Os bancos postais existem
normalmente em municípios do interior onde não há bancos ou onde existem muito
poucos em razão dos altos custos para se manter agências nessas localidades.
Vale ressaltar que os serviços
bancários desempenhados dentro dos Correios serão desenvolvidos por uma
instituição financeira que irá celebrar um contrato com a ECT. Ex: o Banco do
Brasil faz um contrato com os Correios para que, dentro das agências desta
empresa pública, sejam realizadas algumas operações bancárias. Quem irá
realizar tais operações, na realidade, é o Banco do Brasil, mas utilizando-se
da estrutura dos Correios. Veja o que diz a Portaria nº 588/2000 do Ministério
das Comunicações:
Art. 2º Os serviços
relativos ao Banco Postal caracterizam-se pela utilização da rede de
atendimento da ECT para a Prestação de serviços bancários básicos, em todo
território nacional, como correspondente de instituições bancárias, na forma
definida pela Resolução do Conselho Monetário Nacional de n° 2.707, de 30 de
março de 2000.
Lei nº 7.102/83
A Lei nº 7.102/83 institui normas
de segurança para os estabelecimentos financeiros. Em outras palavras, esta Lei
prevê quais equipamentos de segurança as instituições financeiras devem possuir
a fim de garantir a segurança dos clientes, dos funcionários e do dinheiro ali
depositado. Ex: câmeras de segurança, porta giratória, cabine blindada etc.
Ação civil pública ajuizada pelo
MPF
O MPF ajuizou ação civil pública
pedindo que a ECT fosse condenada a instalar nas agências dos Bancos Postais
todos os equipamentos de segurança previstos na Lei nº 7.102/83.
O pedido do MPF foi aceito? As
exigências previstas na Lei nº 7.102/83 são aplicadas também aos bancos
postais? Os bancos postais deverão cumprir a Lei nº 7.102/83?
NÃO.
A imposição legal de adoção de recursos de
segurança específicos para proteção dos estabelecimentos que constituam sedes
de instituições financeiras (Lei nº 7.102/1983) não alcança o serviço de
correspondente bancário (Banco Postal) realizado pela Empresa Brasileira de
Correios e Telégrafos (ECT).
STJ. 2ª Turma.
REsp 1.497.235-SE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 1º/12/2015
(Info 574).
Conceito de instituição
financeira
A Lei nº 4.595/64 traz a
definição do que seja instituição financeira:
Art. 17. Consideram-se
instituições financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as pessoas
jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou
acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios
ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de
propriedade de terceiros.
Parágrafo único. Para os
efeitos desta lei e da legislação em vigor, equiparam-se às instituições
financeiras as pessoas físicas que exerçam qualquer das atividades referidas
neste artigo, de forma permanente ou eventual.
Segundo interpretação da doutrina,
para que seja considerada instituição financeira, deverão estar preenchidos os seguintes
requisitos:
captação de recursos de
terceiros em nome próprio;
seguida de repasse financeiro
por meio de operação de mútuo
com o intuito de auferir lucro
derivado da maior remuneração dos recursos repassados em relação a dos recursos
coletados
desde que a captação seguida de
repasse se realize de forma habitual.
Esse conceito não se aplica ao
correspondente bancário
Os correspondentes bancários são
empresas contratadas por instituições financeiras e demais instituições
autorizadas pelo Banco Central para a prestação de serviços de atendimento aos
clientes e usuários dessas instituições.
Ao instituir o correspondente
bancário, teve-se como objetivo garantir a um maior número de pessoas o acesso
aos produtos e serviços bancários, com redução nos custos de implementação e
operacional, fazendo com que fosse possível levar tais serviços a municípios
que não atraem os bancos comerciais. Trata-se, portanto, de atividade de cunho
meramente acessório para os bancos.
Quando o banco faz um contrato
com os Correios para ele atuar como correspondente bancário, não significa que
ele esteja contratando a ECT para fazer intermediação financeira. O que há é um
contrato de prestação de serviços regido fora do escopo das normas do Sistema
Financeiro Nacional, com base no disposto no Código Civil.
Lei nº 7.102/83 não se aplica a
correspondentes bancários
Por essas razões, o STJ entendeu
que a imposição legal de recursos de segurança específicos para proteção dos
estabelecimentos financeiros não abrange o serviço de correspondente bancário
realizado pela ECT. Ao realizar contrato com o banco para atuar na função de
correspondente bancário, a ECT não se transforma em uma agência bancária nem
deixa de ser uma agência dos Correios. Sua
natureza jurídica continua a mesma. Ela não se transforma em instituição
financeira nos termos do art. 17 da Lei nº 4.595/64.
A Lei nº 7.102/83 fica restrita
aos "bancos oficiais ou privados, caixas econômicas, sociedades de
crédito, associações de poupança, suas agências, postos de atendimento,
subagências e seções, assim como as cooperativas singulares de crédito e suas
respectivas dependências" (art. 1º, § 1º).
Aplicação da Lei nº 7.102/83 a
Banco Postal inviabilizaria seus objetivos
O intuito do legislador, ao criar
o Banco Postal, não foi o de transformá-lo em uma instituição financeira e
seria financeiramente muito penoso submeter o correspondente bancário a arcar
com as obrigações típicas de segurança a que se encontram submetidas as
instituições financeiras. Correr-se-ia o risco de inviabilizar a própria
atividade do correspondente bancário em virtude dos custos dos itens de
segurança.
O fato de não se aplicar a Lei
7.102/83 não significa que os Correios estejam livres de indenizar
Imagine a seguinte situação
hipotética:
Cristiano estava pagando contas
em um banco postal, quando foi vítima de um roubo armado, tendo, inclusive,
levado um tiro.
Em razão do ocorrido, ele ajuíza
na Justiça Federal uma ação de indenização contra a Empresa de Correios e
Telégrafos – ECT (empresa pública federal).
A ECT contesta o pedido afirmando
que o banco postal, por mais que preste serviços bancários, não pode ser
obrigado a cumprir as mesmas exigências de segurança impostas aos bancos pela
Lei n.° 7.102/83, já que não é
uma agência bancária, mas sim uma agência de correios e que presta alguns
serviços bancários mais simples em determinadas regiões mais afastadas do país,
especialmente em locais onde não existem (ou são poucas) instituições
financeiras.
O pedido deverá ser julgado
procedente? Os Correios possuem responsabilidade civil neste caso?
SIM.
A ECT é responsável pelos danos sofridos
por consumidor que foi assaltado no interior de agência dos Correios na qual é
fornecido o serviço de banco postal.
STJ. 4ª Turma.
REsp 1.183.121-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 24/2/2015 (Info
559).
Realmente, os Correios estão
certos quando dizem que não é possível exigir de um banco postal todas as
exigências de segurança previstas na Lei n.°
7.102/83, tais como: equipamentos de filmagem, vigilância ostensiva, artefatos
que retardem a ação de criminosos, cabina blindada, dentre outros. Até mesmo
porque se tudo isso fosse obrigatório, acabaria inviabilizando a instalação e o
funcionamento dos bancos postais em diversas localidades do país.
No entanto, mesmo sem ter que
cumprir todas as exigências da Lei n.°
7.102/83, ainda assim a ECT possui responsabilidade civil no caso concreto com
base no Código de Defesa do Consumidor.
As pessoas que vão até a agência
dos Correios, seja para utilizar os serviços postais propriamente ditos, seja
para os serviços do banco postal, são consideradas consumidoras, desde que
sejam “destinatárias finais” do produto ou serviço. Foi o caso do cliente do
exemplo.
Os Correios, enquanto empresa
pública prestadora de serviços públicos, submetem-se à responsabilidade civil
objetiva, por força do art. 37, § 6º da CF/88, e ainda em razão do art. 14 do
CDC, devendo indenizar o consumidor.
Não
confundir:
• Os bancos
postais não estão obrigados a cumprir as regras de segurança previstas na Lei
nº 7.102/83 (REsp 1.497.235-SE).
• Apesar disso,
a ECT é responsável pelos danos sofridos por consumidor que for assaltado no
interior de agência dos Correios na qual é fornecido o serviço de banco postal
(REsp 1.183.121-SC).