A Constituição Federal, em seu art.
102, § 2º, estabelece os efeitos da decisão proferida pelo STF no controle
abstrato de constitucionalidade:
Art. 102 (...)
§ 2º As decisões definitivas de mérito,
proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de
inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade
produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante,
relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública
direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.
Vamos explicar melhor esses efeitos:
1) Quanto ao aspecto SUBJETIVO (quem é
atingido pela decisão?)
• Eficácia contra todos (erga omnes)
• Efeito vinculante
2) Quanto ao aspecto OBJETIVO
(que partes da decisão produzem
eficácia erga omnes e efeito vinculante?)
1ª corrente: teoria restritiva
Somente o dispositivo da decisão produz
efeito vinculante.
Os motivos invocados na decisão
(fundamentação) não são vinculantes.
2ª corrente: teoria extensiva
Além do dispositivo, os motivos
determinantes (ratio decidendi) da decisão também são vinculantes.
Admite-se a transcendência dos motivos
que embasaram a decisão.
Em suma, pela teoria da transcendência
dos motivos determinantes, a ratio
decidendi, ou seja, os fundamentos determinantes da decisão também teriam
efeito vinculante.
Ocorre que o STF NÃO adota a teoria da
transcendência dos motivos determinantes (teoria extensiva).
O STF já chegou a manifestar apreço
pela teoria da transcendência dos motivos determinantes, mas atualmente, a
posição da Corte é no sentido de que não pode ser acolhida.
Para
melhor explicar o tema, veja o seguinte exemplo:
“A”, Prefeito de uma cidade do interior
do Ceará, teve suas contas aprovadas pela Câmara Municipal, mas rejeitadas pelo
Tribunal de Contas.
O Tribunal de Contas tomou essa decisão
porque a Constituição do Estado do Ceará prevê que o Tribunal de Contas irá
julgar as contas dos prefeitos.
“A” afirma que a decisão do Tribunal de
Contas foi errada e que a Constituição do Ceará, nesse ponto, viola a CF/88,
considerando que, no caso dos chefes do Poder Executivo, o Tribunal de Contas
apenas emite parecer prévio, não devendo julgar as contas.
“A” defende que o STF já acolheu essa
tese, ou seja, a de que as contas dos Prefeitos não são julgadas pelo Tribunal
de Contas, mas sim pela Câmara Municipal. Cita como precedentes do STF as ADIs
3715 MC/TO, 1779/PE e 849/MT.
Desse modo, “A”, inconformado com a
decisão do Tribunal de Contas, ajuiza reclamação no STF alegando que o
entendimento do Supremo foi desrespeitado pelo Tribunal de Contas.
Essa
reclamação do Prefeito pode ser julgada procedente?
NÃO.
Quando o STF julgou as ADIs 3715 MC/TO,
1779/PE e 849/MT, ele realmente decidiu que:
• As contas dos chefes do Poder
Executivo são julgadas pelo Poder Legislativo (no caso dos Governadores, pelas
Assembleias e se for Prefeito, pelas Câmaras Municipais);
• No caso das contas dos chefes do
Poder Executivo, o Tribunal de Contas apenas emite um parecer prévio, que
poderá ser acolhido ou não pelo Poder Legislativo.
No entanto, o STF mencionou essas duas
conclusões acima expostas apenas na fundamentação do julgado. O dispositivo
da decisão foi a declaração de inconstitucionalidade de normas das
Constituições do Estado de Tocantins (ADI 3715), de Pernambuco (ADI 1779) e de
Mato Grosso (ADI 849).
O
dispositivo das ADIs 3715 MC/TO, 1779/PE e 849/MT possui eficácia vinculante e erma
omnes?
SIM. Logo, a decisão do STF de que são
inconstitucionais esses artigos das Constituições do TO, PE e MT deve ser
respeitada por todos e, em caso de descumprimento, pode-se ajuizar reclamação
no STF.
A
fundamentação utilizada pelo STF ao julgar essas ADI’s 3715 MC/TO, 1779/PE e
849/MT possui eficácia vinculante e erma omnes?
NÃO. Porque o STF não adota a teoria da
transcendência dos motivos determinantes.
O Supremo acolhe a teoria restritiva,
de forma que somente o dispositivo da decisão produz efeito vinculante.
Os motivos invocados na decisão (fundamentação) não são vinculantes.
Assim, ainda que a Constituição do
Ceará tenha um artigo com redação idêntica ao da Constituição do Tocantins (que
foi declarado inconstitucional), não se poderá ajuizar reclamação diretamente no
STF caso o Tribunal de Contas aplique normalmente esse artigo da Carta
cearense. Teria que ser proposta uma nova ADI impugnando a Constituição
cearense ou então valer-se o interessado dos instrumentos processuais para a
defesa do seu direito e a declaração difusa de inconstitucionalidade.
Resumindo:
O STF não admite a “teoria da
transcendência dos motivos determinantes”.
Segundo a teoria restritiva, adotada pelo
STF, somente o dispositivo da decisão produz efeito vinculante. Os motivos
invocados na decisão (fundamentação) não são vinculantes.
A reclamação no STF é uma ação na qual se
alega que determinada decisão ou ato:
• usurpou competência do STF; ou
• desrespeitou decisão proferida pelo STF.
Não cabe reclamação sob o argumento de que
a decisão impugnada violou os motivos (fundamentos) expostos no acórdão do STF,
ainda que este tenha caráter vinculante. Isso porque apenas o dispositivo do
acórdão é que é vinculante.
Assim, diz-se que a jurisprudência do STF é
firme quanto ao não cabimento de reclamação fundada na transcendência dos
motivos determinantes do acórdão com efeito vinculante
STF. Plenário.
Rcl 8168/SC, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin,
julgado em 19/11/2015 (Info 808).