Dizer o Direito

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Revalidação no Brasil de diplomas de universidades da América Latina e Caribe



Imagine a seguinte situação hipotética:
João estudou e formou-se em medicina em uma universidade localizada em Havana (Cuba).
Após voltar a morar no Brasil, em Recife, ele procurou a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e deu entrada em um pedido para que a instituição fizesse a "revalidação automática" de seu diploma de medicina. Em outras palavras, ele pediu que a Universidade brasileira expedisse diploma brasileiro reconhecendo a graduação feita no exterior sem fazer qualquer outra exigência.
A UFPE não acatou o pedido e afirmou que a revalidação do diploma estrangeiro segue determinadas exigências, incluindo uma prova que o interessado deve fazer e ser aprovado.
Diante da negativa, João ajuizou ação contra a UFPE pedindo que a instituição fizesse a "revalidação automática" de seu diploma de medicina.
Como fundamento de seu pedido, João invocou a Convenção Regional sobre o Reconhecimento de Diploma de Ensino Superior na América Latina e no Caribe, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 66/77 e promulgada pelo Decreto Presidencial nº 80.419/77.
Na visão do autor, o art. 5º fixou a possibilidade de revalidação automática dos diplomas estrangeiros expedidos em países signatários da Convenção:
Artigo  5º
Os estados contratantes se comprometem a adotar as medidas necessárias para tornar eletivo, o quanto antes possível, para efeitos de exercício de profissão, o reconhecimento dos diplomas, títulos ou graus de educação superior emitidos pelas autoridades competentes de outro dos estados contratantes.

Contestação
A Procuradoria Federal, que fazia a assistência jurídica da UFPE, contestou o pedido invocando duas teses:
1ª) A Convenção Regional sobre o Reconhecimento de Diploma de Ensino Superior na América Latina e no Caribe foi revogada pelo Decreto nº 3.007/99;
2ª) Ainda que se considere que a referida Convenção está em vigor, não se pode dizer que ela permita a revalidação automática.

A Convenção Regional sobre o Reconhecimento de Diploma de Ensino Superior na América Latina e no Caribe foi revogada pelo Decreto nº 3.007/99?
NÃO. Essa Convenção não foi, de forma alguma, revogada pelo Decreto nº 3.007/99. Isso porque o aludido ato internacional foi recepcionado pelo Brasil com status de lei ordinária. Dessa forma, não poderia ser revogado por um Decreto presidencial.

A Convenção Regional sobre o Reconhecimento de Diploma de Ensino Superior na América Latina e no Caribe obriga que as universidades brasileiras façam a revalidação automática dos diplomas expedidos nos países signatários?
NÃO. O art. 5º da Convenção possui um nítido caráter programático e apenas determina que os países signatários da Convenção criem mecanismos para torná-la efetiva. Não existe, portanto, na Convenção uma determinação específica de reconhecimento automático dos diplomas.

Conclusões
O STJ, apreciando o caso acima em regime de recurso especial repetitivo, chegou às seguintes conclusões:
O Decreto nº 80.419/77 (que incorporou a Convenção Regional sobre o Reconhecimento de Estudos, Títulos e Diplomas de Ensino Superior na América Latina e no Caribe) foi recepcionado pela CF/88 com status de lei ordinária e, portanto, não foi revogado pelo Decreto nº 3.007⁄99. Desse modo, essa Convenção ainda está em vigor.
No entanto, o referido Decreto nº 80.419/77 não traz norma específica que vede o procedimento adotado pelas Universidade brasileiras de revalidação dos diplomas estrangeiros. Esse processo de revalidação obrigatória tem respaldo nos arts. 48 e 53, V, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira.
Em outras palavras, o Decreto nº 80.419/77 não dispensou o processo de revalidação nem impôs que a universidades brasileiras fizessem uma "revalidação automática" dos diplomas estrangeiros expedidos nos países signatários.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.215.550-PE, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 23/9/2015 (Info 570).

Revalidação de diploma estrangeiro
Vale ressaltar que o STJ entende que o registro de diploma estrangeiro no Brasil está submetido a prévio processo de revalidação, segundo o regime previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (art. 48, § 2º, da Lei 9.394/1996).
Não existe qualquer dispositivo legal que proíba a universidade de exigir um processo seletivo para aceitar o pedido de revalidação de diploma, além do que isso está inserido na autonomia didático-científica e administrativa da Instituição (art. 53, V, da Lei 9.394/1996 e art. 207 da CF/88).
Portanto, desde que observados os requisitos legais e os princípios constitucionais, deve-se garantir às universidades a liberdade para editar regras específicas acerca do procedimento destinado à revalidação de diplomas expedidos por universidades estrangeiras.
Assim, é legal a exigência feita por universidade, com base em resolução por ela editada, de prévia aprovação em processo seletivo como condição para apreciar pedido de revalidação de diploma obtido em instituição de ensino estrangeira.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.349.445-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 8/5/2013 (recurso repetitivo) (Info 520).



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