Imagine a seguinte situação
hipotética:
João estudou e formou-se em
medicina em uma universidade localizada em Havana (Cuba).
Após voltar a morar no Brasil, em
Recife, ele procurou a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e deu entrada
em um pedido para que a instituição fizesse a "revalidação
automática" de seu diploma de medicina. Em outras palavras, ele pediu que a
Universidade brasileira expedisse diploma brasileiro reconhecendo a graduação
feita no exterior sem fazer qualquer outra exigência.
A UFPE não acatou o pedido e
afirmou que a revalidação do diploma estrangeiro segue determinadas exigências,
incluindo uma prova que o interessado deve fazer e ser aprovado.
Diante da negativa, João ajuizou
ação contra a UFPE pedindo que a instituição fizesse a "revalidação
automática" de seu diploma de medicina.
Como fundamento de seu pedido,
João invocou a Convenção Regional sobre o Reconhecimento de Diploma de Ensino
Superior na América Latina e no Caribe, aprovada pelo Decreto Legislativo nº
66/77 e promulgada pelo Decreto Presidencial nº 80.419/77.
Na visão do autor, o art. 5º fixou
a possibilidade de revalidação automática dos diplomas estrangeiros expedidos
em países signatários da Convenção:
Artigo 5º
Os estados contratantes se
comprometem a adotar as medidas necessárias para tornar eletivo, o quanto antes
possível, para efeitos de exercício de profissão, o reconhecimento dos
diplomas, títulos ou graus de educação superior emitidos pelas autoridades
competentes de outro dos estados contratantes.
Contestação
A Procuradoria Federal, que fazia
a assistência jurídica da UFPE, contestou o pedido invocando duas teses:
1ª) A Convenção Regional sobre o
Reconhecimento de Diploma de Ensino Superior na América Latina e no Caribe foi
revogada pelo Decreto nº 3.007/99;
2ª) Ainda que se considere que a
referida Convenção está em vigor, não se pode dizer que ela permita a
revalidação automática.
A Convenção Regional sobre o
Reconhecimento de Diploma de Ensino Superior na América Latina e no Caribe foi
revogada pelo Decreto nº 3.007/99?
NÃO. Essa Convenção não foi, de
forma alguma, revogada pelo Decreto nº 3.007/99. Isso porque o aludido ato
internacional foi recepcionado pelo Brasil com status de lei ordinária. Dessa
forma, não poderia ser revogado por um Decreto presidencial.
A Convenção Regional sobre o
Reconhecimento de Diploma de Ensino Superior na América Latina e no Caribe obriga
que as universidades brasileiras façam a revalidação automática dos diplomas
expedidos nos países signatários?
NÃO. O art. 5º da Convenção possui
um nítido caráter programático e apenas determina que os países signatários da
Convenção criem mecanismos para torná-la efetiva. Não existe, portanto, na
Convenção uma determinação específica de reconhecimento automático dos
diplomas.
Conclusões
O STJ, apreciando o caso acima em
regime de recurso especial repetitivo, chegou às seguintes conclusões:
O Decreto nº 80.419/77 (que incorporou a
Convenção Regional sobre o Reconhecimento de Estudos, Títulos e Diplomas de
Ensino Superior na América Latina e no Caribe) foi recepcionado pela CF/88 com
status de lei ordinária e, portanto, não foi revogado pelo Decreto nº 3.007⁄99.
Desse modo, essa Convenção ainda está em vigor.
No entanto, o referido Decreto nº 80.419/77
não traz norma específica que vede o procedimento adotado pelas Universidade
brasileiras de revalidação dos diplomas estrangeiros. Esse processo de revalidação
obrigatória tem respaldo nos arts. 48 e 53, V, da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Brasileira.
Em outras palavras, o Decreto nº 80.419/77
não dispensou o processo de revalidação nem impôs que a universidades
brasileiras fizessem uma "revalidação automática" dos diplomas
estrangeiros expedidos nos países signatários.
STJ. 1ª Seção.
REsp 1.215.550-PE, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 23/9/2015 (Info 570).
Revalidação de diploma
estrangeiro
Vale ressaltar que o STJ entende
que o registro de diploma estrangeiro no Brasil está submetido a prévio
processo de revalidação, segundo o regime previsto na Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Brasileira (art. 48, § 2º, da Lei 9.394/1996).
Não existe qualquer dispositivo
legal que proíba a universidade de exigir um processo seletivo para aceitar o
pedido de revalidação de diploma, além do que isso está inserido na autonomia
didático-científica e administrativa da Instituição (art. 53, V, da Lei
9.394/1996 e art. 207 da CF/88).
Portanto, desde que observados os
requisitos legais e os princípios constitucionais, deve-se garantir às
universidades a liberdade para editar regras específicas acerca do procedimento
destinado à revalidação de diplomas expedidos por universidades estrangeiras.
Assim, é legal a exigência feita por
universidade, com base em resolução por ela editada, de prévia aprovação em
processo seletivo como condição para apreciar pedido de revalidação de diploma
obtido em instituição de ensino estrangeira.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.349.445-SP, Rel. Min.
Mauro Campbell Marques, julgado em 8/5/2013 (recurso repetitivo) (Info 520).