Dizer o Direito

terça-feira, 24 de novembro de 2015

É possível a concessão de aposentadoria especial para contribuinte individual que seja profissional liberal?



Aposentadoria especial
Aposentadoria especial é aquela cujos requisitos e critérios exigidos do beneficiário são mais favoráveis que os estabelecidos normalmente para as demais pessoas.
O art. 57 da Lei nº 8.213/91 trata sobre a aposentadoria especial no Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e prevê que esta será concedida às pessoas que trabalhem em condições que prejudiquem a sua saúde ou integridade física:
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.

Desse modo, se a pessoa fica exposta a agentes nocivos que tornem suas condições de trabalho insalubres, perigosas ou penosas, ela poderá ter direito à aposentadoria especial. Esses agentes nocivos estão previstos em Decretos do Presidente da República, conforme autoriza a Lei nº 8.213/91:
Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.

Feitos os devidos esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética:
João é cirurgião-dentista prestando serviços em seu próprio consultório, trabalhando, portanto, como profissional liberal (autônomo).
O profissional liberal é segurado obrigatório da Previdência Social na qualidade de contribuinte individual, conforme previsto no art. 12, V, "h", da Lei nº 8.212/91:
Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
V - como contribuinte individual:
h) a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não;

Assim, todos os meses João terá que pagar contribuição previdenciária de 20% sobre o valor auferido no mês com o exercício de sua atividade de dentista. Em compensação, ele terá direito aos benefícios previdenciários pagos pelo INSS (auxílio-doença, aposentadoria etc.).

Requerimento de aposentadoria especial
João trabalhou durante 25 anos como dentista e comprovou, por meio de laudo pericial, que nesta atividade ficava exposto a agentes nocivos biológicos (germes infecciosos). Diante disso, requereu ao INSS a aposentadoria especial. A autarquia indeferiu o pedido afirmando que o art. 64 do Decreto nº 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social) só permite aposentadoria especial para contribuinte individual se este for integrante de cooperativa. Veja a redação do dispositivo:
Art. 64. A aposentadoria especial, uma vez cumprida a carência exigida, será devida ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual, este somente quando cooperado filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, que tenha trabalhado durante quinze, vinte ou vinte e cinco anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

A tese do INSS é aceita pela jurisprudência? Essa restrição imposta pelo art. 64 do Decreto nº 3.048/99 é válida? O contribuinte individual, para ter direito à aposentadoria especial, precisa ser obrigatoriamente filiado à alguma cooperativa?
NÃO. É possível sim a concessão de aposentadoria especial a contribuinte individual do RGPS mesmo que este não seja cooperado.
O art. 57, caput, da Lei nº 8.213/91, que prevê a aposentadoria especial, não traça qualquer diferenciação entre as diversas categorias de segurados. Em outras palavras, esse dispositivo não restringe a aposentadoria especial a algumas espécies de segurado. Assim, percebe-se que o art. 64 do Decreto nº 3.048/99, ao limitar a concessão da aposentadoria especial apenas ao segurado empregado, ao trabalhador avulso e ao contribuinte individual cooperado, extrapolou os limites da Lei, criando distinções onde não existia. Em razão disso, essa restrição imposta pelo art. 64 do Decreto deve ser tida como ilegal.

Em suma:
É possível a concessão de aposentadoria especial ao contribuinte individual não cooperado que cumpra a carência e comprove, nos termos da lei vigente no momento da prestação do serviço, o exercício de atividade sob condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou sua integridade física pelo período de 15, 20 ou 25 (vinte cinco) anos.
STJ. 2ª Turma. REsp 1.436.794-SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 17/9/2015 (Info 570).




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