Inciso V do art. 109 da CF/88
O art. 109 da CF/88 prevê a
competência da Justiça Federal comum em 1ª instância.
Veja a hipótese trazida pelo
inciso V:
Art. 109. Aos juízes
federais compete processar e julgar:
(...)
V - os crimes previstos em
tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o
resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;
Este inciso fixa competência
criminal da Justiça Federal. Consiste em competência estabelecida em função da
matéria.
Requisitos para se enquadrar no
inciso V
Para que o delito seja de
competência da Justiça Federal com base neste inciso, são necessários três
requisitos:
a) que o fato seja previsto como
crime em tratado ou convenção;
b) que o Brasil seja signatário
de compromisso internacional de combate àquela espécie delitiva;
c) que exista uma relação de
internacionalidade entre a conduta criminosa praticada e o resultado produzido
(ou que deveria ter sido produzido).
Relação de internacionalidade
A relação de internacionalidade
ocorre quando:
• iniciada a execução do crime no
Brasil, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro;
• iniciada a execução do crime no
estrangeiro, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no Brasil.
Desse modo, não é suficiente que
o crime esteja previsto em tratado ou convenção internacional para ser julgado
pela Justiça Federal.
Exemplos de aplicação do inciso V
Podemos citar os seguintes
exemplos de crimes que poderão ser submetidos a julgamento pela Justiça Federal
com fundamento no art. 109, V, da CF/88, desde que haja relação de
internacionalidade, por serem previstos em tratados internacionais:
a) tráfico transnacional de
drogas (art. 70, da Lei nº 11.343/2006);
b) tráfico internacional de arma
de fogo (art. 18 da Lei nº 10.826/2003);
c) tráfico internacional de
pessoas para fim de exploração sexual (art. 231 do CP);
d) envio ilegal de criança ou
adolescente para o exterior (art. 239 do ECA).
Todo crime praticado pela
internet é de competência da Justiça Federal com base neste inciso V?
Obviamente que não. Segundo
entendimento pacífico da jurisprudência, o fato de o delito ter sido cometido
pela rede mundial de computadores não atrai, por si só, a competência da
Justiça Federal.
Para que o delito cometido por
meio da internet seja julgado pela Justiça Federal, é necessário que se amolde
em umas das hipóteses elencadas no art. 109, IV e V, da CF/88.
Disponibilizar ou adquirir
material pornográfico envolvendo criança ou adolescente
O ECA prevê três crimes que punem
a conduta de disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo
criança ou adolescente. Veja:
Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou
outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo
criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 4
(quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir,
distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de
sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que
contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou
adolescente:
Pena – reclusão, de 3
(três) a 6 (seis) anos, e multa.
(...)
Art. 241-B. Adquirir,
possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de
registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança
ou adolescente:
Pena – reclusão, de 1 (um)
a 4 (quatro) anos, e multa.
(...)
De
quem será a competência para julgar esses delitos caso tenham sido praticados
por meio da internet?
Justiça Federal, com base no art.
109, V, da CF/88.
Os delitos acima listados são
crimes que o Brasil, por meio de tratado internacional, comprometeu-se a
reprimir. Trata-se da Convenção sobre Direitos da Criança, adotada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas, aprovada pelo Decreto legislativo 28/90 e pelo
Decreto 99.710/90.
Se o crime é praticado por meio
da internet, o vídeo ou a fotografia envolvendo a criança ou o adolescente em
cenas de sexo ou de pornografia poderão ser visualizados em qualquer computador
do mundo. Ocorre, portanto, a transnacionalidade do delito.
A tese firmada pelo STF ficou
assim redigida:
Compete à Justiça Federal processar e
julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir material
pornográfico envolvendo criança ou adolescente [artigos 241, 241-A e 241-B da
Lei 8.069/1990] quando praticados por meio da rede mundial de computadores.
STF. Plenário.
RE 628624/MG, Rel. Orig. Min. Marco Aurélio, Red. p/ o acórdão Min. Edson
Fachin, julgado em 28 e 29/10/2015 (repercussão geral) (Info 805).
De quem será a competência
territorial?
A competência territorial é da
Seção Judiciária do local onde o réu publicou as fotos, não importando o Estado
onde se localize o servidor do site: STJ. CC 29.886/SP, julgado em 12/12/2007.
E se o réu publicou as fotos no
exterior?
Esse crime poderá ser julgado
pelo Brasil, por se enquadrar na hipótese prevista no art. 7º, II, do CP,
cumpridas as condições previstas no § 2º do mesmo art. 7º. Em sendo preenchidos
tais requisitos, o delito seria julgado no Brasil pela Justiça Federal, sendo
competente a Seção Judiciária da capital do Estado onde o acusado por último
morou ou, se nunca residiu aqui, será competente a Seção Judiciária do Distrito
Federal (art. 88 do CPP).