A Lei n.° 12.015/2009 acrescentou o art.
217-A ao Código Penal, criando um novo delito, chamado de “estupro de
vulnerável”:
Estupro de vulnerável
Art. 217-A. Ter conjunção
carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a
15 (quinze) anos.
Antes do art. 217-A, as condutas
de praticar conjunção carnal ou ato libidinoso com menor de 14 anos poderia ser
considerado crime?
SIM. Tais condutas poderiam se
enquadrar nos crimes previstos no art. 213 c/c art. 224, “a” (estupro com
violência presumida por ser menor de 14 anos) ou art. 214 c/c art. 224, “a”
(atentado violento ao pudor com violência presumida por ser menor de 14 anos),
todos do Código Penal, com redação anterior à Lei n.° 12.015/2009.
Desse modo, apesar dos arts.
214 e 224 do CP terem sido revogados pela Lei n.° 12.015/2009, não houve abolitio
criminis dessas condutas, ou seja, continua sendo crime praticar ato
libidinoso com menor de 14 anos. No entanto, essas condutas, agora, são punidas
pelo art. 217-A do CP. O que houve, portanto, foi a continuidade normativa
típica, que ocorre quando uma norma penal é revogada, mas a mesma conduta
continua sendo crime no tipo penal revogador, ou seja, a infração penal
continua tipificada em outro dispositivo, ainda que topologicamente ou
normativamente diverso do originário.
Se o agente praticasse atentado
violento ao pudor (ex: coito anal) com um adolescente de 13 anos, haveria crime
mesmo que a vítima consentisse (concordasse) com o ato sexual? Haveria crime
mesmo que a vítima já tivesse tido outras relações sexuais com outros parceiros
anteriormente? Essa presunção de violência era absoluta?
SIM. A presunção de
violência nos crimes contra os costumes cometidos contra menores de 14 anos,
prevista na antiga redação do art. 224, alínea “a”, do CP (antes da Lei n.° 12.015/2009), possuía
caráter absoluto, pois constituía critério objetivo para se verificar a
ausência de condições de anuir com o ato sexual.
Assim, essa presunção absoluta
não podia ser afastada (relativizada) mesmo que a vítima tivesse dado seu
“consentimento” porque nesta idade este consentimento seria viciado (inválido).
Logo, mesmo que a vítima tivesse experiência sexual anterior, mesmo que fosse
namorado do autor do fato, ainda assim haveria o crime.
A presunção de violência era
absoluta nos casos de estupro/atentado violento ao pudor contra menor de 14
anos.
STJ. 3ª Seção. EREsp 1152864/SC,
Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 26/02/2014.
E, atualmente, ou seja, após a
Lei n.°
12.015/2009?
Continua sendo crime praticar
conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso contra menor de 14 anos. Isso
está expresso no art. 217-A do CP e não interessa se a vítima deu
consentimento, se namorava o autor do fato etc. A discussão sobre presunção de
violência perdeu sentido porque agora a lei incluiu a idade (menor de 14 anos)
no próprio tipo penal. Manteve relação sexual com menor de 14 anos: estupro de
vulnerável.
A Lei n.° 12.015/2009 acrescentou o art.
217-A ao Código Penal, criando um novo delito, chamado de “estupro de
vulnerável”:
Estupro de vulnerável
Art. 217-A. Ter conjunção
carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a
15 (quinze) anos.
A fim de que não houvesse mais dúvidas sobre
o tema, o STJ pacificou a questão, fixando a seguinte tese em recurso especial
repetitivo:
Para a caracterização do crime de
estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do CP, basta que o agente
tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de
14 anos.
O consentimento da vítima, sua
eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso
entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.480.881-PI,
Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 26/8/2015 (Info 568).
Em algumas localidades do país
(ex: determinadas comunidades do interior), seria possível dizer que não há
crime, considerando que é costume a prática de atos sexuais com crianças? É
possível excluir o crime de estupro de vulnerável com base no princípio da
adequação social?
NÃO. Segundo afirmou o Min.
Rogério Schietti, a prática sexual envolvendo menores de 14 anos não pode ser
considerada como algo dentro da "normalidade social". Não é correto
imaginar que o Direito Penal deva se adaptar a todos os inúmeros costumes de
cada uma das microrregiões do país, sob pena de se criar um verdadeiro caos
normativo, com reflexos danosos à ordem e à paz públicas.
Ademais, o afastamento do
princípio da adequação social aos casos de estupro de vulnerável busca evitar a
carga de subjetivismo que acabaria marcando a atuação do julgador nesses casos,
com danos relevantes ao bem jurídico tutelado, que é o saudável crescimento
físico, psíquico e emocional de crianças e adolescentes. Esse bem jurídico goza
de proteção constitucional e legal, não estando sujeito a relativizações.
Na sentença, durante a
dosimetria, o juiz pode reduzir a pena-base do réu alegando que a vítima (menor
de 14 anos) já tinha experiência sexual anterior ou argumentando que a vítima
era homossexual?
Claro que NÃO. Em se tratando de
crime sexual praticado contra menor de 14 anos, a experiência sexual anterior e
a eventual homossexualidade do ofendido não servem para justificar a diminuição
da pena-base a título de comportamento da vítima.
A experiência sexual anterior e a
eventual homossexualidade do ofendido, assim como não desnaturam
(descaracterizam) o crime sexual praticado contra menor de 14 anos, não servem
também para justificar a diminuição da pena-base, a título de comportamento da
vítima.
STJ. 6ª Turma. REsp 897.734-PR,
Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 3/2/2015 (Info 555).