Imagine a seguinte situação
hipotética:
João é cliente de um plano de
saúde.
Após ficar doente, ele foi
internado no hospital, onde permaneceu por algumas semanas.
Até então, o plano de saúde
estava pagando todas as despesas.
O
médico que acompanhava seu estado de saúde viu que seu quadro clínico melhorou
e recomendou que ele fosse para casa, mas lá ficasse realizando tratamento
domiciliar (home care) até que
tivesse alta completa.
Ocorre que o plano de saúde não
aceitou, afirmando que o serviço de home care não está no rol de cobertura previsto
no contrato firmado com João. Segundo a operadora, apenas o tratamento
hospitalar está incluído.
A questão jurídica é, portanto, a seguinte: o
plano de saúde pode ser obrigado a custear o tratamento domiciliar (home care)
mesmo que isso não conste expressamente do rol de serviços previsto no
contrato?
SIM. No caso em que o serviço de home care (tratamento domiciliar) não
conste expressamente do rol de coberturas previsto no contrato de plano de
saúde, a operadora ainda assim será obrigada a custeá-lo em substituição à
internação hospitalar contratualmente prevista, desde que respeitados os
seguintes requisitos:
1) tenha havido
indicação desse tratamento pelo médico assistente;
2) o paciente
concorde com o tratamento domiciliar;
3) não ocorra
uma afetação do equilíbrio contratual em prejuízo do plano de saúde (exemplo em
que haveria um desequilíbrio: nos casos em que o custo do atendimento
domiciliar por dia supera a despesa diária em hospital).
STJ. 3ª Turma.
REsp 1.378.707-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/5/2015
(Info 564).
Obs1: em geral, o tratamento
domiciliar é mais barato que o tratamento hospitalar, de forma que, na maioria
dos casos, não haveria essa afetação do equilíbrio contratual.
Obs2: se o plano de saúde não
fornecer o home care por não preencher os requisitos acima, ele deverá
continuar mantendo os custos do tratamento hospitalar.
Obs3: em caso de recusa indevida
no fornecimento do home care, o plano de saúde poderá ser condenado a pagar
indenização por danos morais.
Interpretação mais favorável ao
aderente
Os contratos de planos de saúde,
além de serem classificados como contratos de consumo (relação jurídica de
consumo), são também contratos de adesão. Como consequência, a interpretação
dessas cláusulas contratuais segue as regras especiais de interpretação dos
contratos de adesão ou dos negócios jurídicos estandardizados. Assim, havendo
dúvidas, imprecisões ou ambiguidades no conteúdo de um negócio jurídico,
deve-se interpretar as suas cláusulas do modo mais favorável ao aderente. Nesse
sentido, ainda que o serviço de home care
não conste expressamente no rol de coberturas previstas no contrato do plano de
saúde, havendo dúvida acerca das estipulações contratuais, deve preponderar a
interpretação mais favorável ao consumidor, como aderente de um contrato de
adesão, conforme, aliás, determinam o art. 47 do CDC ("As cláusulas
contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor"),
a doutrina e a jurisprudência do STJ.
Serviço de home care é mero
desdobramento do tratamento hospitalar
O serviço de home care constitui desdobramento do tratamento hospitalar
contratualmente previsto. Em outras palavras, é uma etapa do tratamento. Daí o
STJ ter entendido ser possível essa obrigação em desfavor dos planos de saúde.