Imagine a seguinte situação:
O Município de Belo Horizonte editou
lei conferindo à guarda municipal a competência para fiscalizar o trânsito e
impor multas.
O Ministério Público questionou a
constitucionalidade dessas normas sustentando que elas ofenderiam o pacto
federativo, pois a competência para fiscalizar o trânsito e impor multas seria
da Polícia Militar já que cabe a este órgão (PM) realizar o policiamento
ostensivo e a preservação da ordem pública, nos termos do § 5º do art. 144 da
CF/88.
A lei municipal é constitucional?
A lei municipal pode atribuir competência para que as guardas municipais realizem
a fiscalização de trânsito?
SIM. A lei municipal pode
conferir às guardas municipais competência para fiscalizar o trânsito, lavrar
auto de infração de trânsito e impor multas.
O STF entendeu que a tese do MP
não está correta porque a questão em tela não envolve segurança pública, mas
sim poder de polícia de trânsito.
Para o Min. Roberto Barroso, poder
de polícia não se confunde com segurança pública. O exercício do poder de
polícia não é prerrogativa exclusiva das entidades policiais, a quem a CF
outorgou com exclusividade apenas as funções de promoção da segurança pública
(art. 144).
A fiscalização do trânsito, com
aplicação das sanções administrativas (multas), embora possa se dar
ostensivamente, constitui mero exercício de poder de polícia, não havendo,
portanto, proibição de que seja exercida por entidades não-policiais (como é o
caso das guardas municipais).
O Código de Trânsito Brasileiro estabeleceu
que a competência para o exercício da fiscalização de trânsito é comum, cabendo
tanto a União, como aos Estados/DF e Municípios.
A receber essa competência do
CTB, o Município pode determinar, por meio de lei, que esse poder de polícia (fiscalização
do trânsito) seja exercido pela guarda municipal.
Mas o art. 144, § 8º, da CF/88,
ao tratar sobre as guardas municipais, não fala em trânsito...
Não tem problema. O art. 144, §
8º, da CF/88 define as atribuições da guarda municipal, mas não de forma
exaustiva. Assim, esse dispositivo não impede que a guarda municipal receba
funções adicionais a ela outorgadas por meio de lei. Em outras palavras, o § 8º
do art. 144 da CF/88 traz um mínimo de atribuições que são inerentes às guardas
municipais, sendo possível, no entanto, que a lei preveja outras atividades a
esse órgão, desde que de competência municipal.
§ 10 do art. 144 da CF/88
Vale ressaltar que, recentemente,
a EC 82/2014 acrescentou o § 10 ao art. 144 da CF/88 tratando sobre segurança
viária, nos seguintes termos:
§ 10. A segurança viária,
exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
seu patrimônio nas vias públicas:
I - compreende a educação,
engenharia e fiscalização de trânsito, além de outras atividades previstas em
lei, que assegurem ao cidadão o direito à mobilidade urbana eficiente; e
II - compete, no âmbito dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, aos
respectivos órgãos ou entidades executivos e seus agentes de trânsito,
estruturados em Carreira, na forma da lei.
O inciso II fortalece a ideia de
que as guardas municipais podem exercer atividades de fiscalização de trânsito
uma vez que as guardas municipais são órgãos municipais estruturados em
carreira e criados por lei. Logo, enquadram-se na previsão do inciso II.
Desse modo, os Municípios podem criar
órgãos de trânsito específicos ou, então, submeter esse serviço de fiscalização
de trânsito às guardas municipais.
Tese firmada pelo STF em sede de
repercussão geral:
É constitucional a atribuição às guardas municipais do exercício do
poder de polícia de trânsito, inclusive para a imposição de sanções
administrativas legalmente previstas (ex: multas de trânsito).
STF. Plenário. RE 658570/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o
acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 6/8/2015 (Info 793).