quarta-feira, 17 de junho de 2015
STJ cancela a súmula 470. Entenda
quarta-feira, 17 de junho de 2015
Cancelamento da súmula 470-STJ
Na semana passada, o STJ cancelou
a sua súmula 470, que tinha a seguinte redação:
Súmula 470-STJ: O
Ministério Público não tem legitimidade para pleitear, em ação civil pública, a
indenização decorrente do DPVAT em benefício do segurado.
Vamos entender porque o enunciado
foi cancelado, mas antes é necessário fazer uma breve explicação sobre o que
consiste o DPVAT.
O que é o DPVAT?
O DPVAT (Danos Pessoais Causados
por Veículos Automotores de Via Terrestres) é um seguro obrigatório contra
danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua
carga, a pessoas, transportadas ou não.
Em outras palavras, qualquer
pessoa que sofrer danos pessoais causados por um veículo automotor, ou por sua
carga, em vias terrestres, tem direito a receber a indenização do DPVAT. Isso
abrange motoristas, passageiros, pedestres ou, em caso de morte, seus
respectivos herdeiros.
Ex.: dois carros colidem e, em
decorrência da batida, acertam também um pedestre que passava no local. No
carro 1, havia apenas o motorista. No carro 2, havia o motorista e mais um
passageiro. Os dois motoristas morreram. O passageiro do carro 2 e o pedestre
ficaram inválidos. Os herdeiros dos motoristas receberão indenização de DPVAT
no valor correspondente à morte. O passageiro do carro 2 e o pedestre receberão
indenização de DPVAT por invalidez.
Para receber indenização, não
importa quem foi o culpado. Ainda que o carro 2 tenha sido o culpado, os
herdeiros dos motoristas, o passageiro e o pedestre sobreviventes receberão a
indenização normalmente.
O DPVAT não paga indenização por
prejuízos decorrentes de danos patrimoniais, somente danos pessoais.
Quem custeia as indenizações pagas pelo
DPVAT?
Os proprietários de veículos automotores.
Trata-se de um seguro obrigatório. Assim, sempre que o proprietário do veículo
paga o IPVA, está pagando também, na mesma guia, um valor cobrado a título de
DPVAT.
O STJ afirma que a natureza jurídica do
DPVAT é a de um contrato legal, de cunho social.
O DPVAT é regulamentado pela Lei nº
6.194/74.
Qual é o valor da indenização de DPVAT
prevista na Lei?
• no caso de morte: R$ 13.500,00 (por
vítima)
• no caso de invalidez permanente: até
R$ 13.500,00 (por vítima)
• no caso de
despesas de assistência médica e suplementares: até R$ 2.700,00 como reembolso,
a cada vítima.
Como a pessoa obtém a indenização do
DPVAT?
A pessoa deverá procurar uma das
empresas seguradoras que seja consorciada ao DPVAT e apresentar a documentação
necessária.
Para requerer o seguro DPVAT não
é necessário advogado, despachante ou qualquer outra ajuda de terceiros.
Caso a pessoa beneficiária do
DPVAT não receba a indenização ou não concorde com o valor pago pela
seguradora, ela poderá buscar auxílio do Poder Judiciário?
Sim. A pessoa poderá ajuizar uma
ação de cobrança contra a seguradora objetivando o pagamento decorrente da indenização
de DPVAT.
Se uma grande quantidade de
pessoas está tendo problemas com determinada seguradora consorciada ao DPVAT
(que tem deixado de pagar os beneficiários ou o faz em valores inferiores ao
devido), o Ministério Público poderá ajuizar uma ação civil pública em favor
dessas pessoas?
Aqui é o cerne da questão. O STJ
entendia que não, ou seja, o MP não teria legitimidade para pleitear a
indenização decorrente do DPVAT em benefício do segurado. Por isso, a Corte
editou a Súmula 470.
Ocorre
que o tema chegou ao STF. E o que decidiu o Supremo?
O Plenário do
STF entendeu que o Ministério Público tem sim legitimidade para defender
contratantes do seguro obrigatório DPVAT (RE 631.111/GO, Rel. Min. Teori
Zavascki, julgado em 06 e 07/08/2014. Repercussão Geral).
Para o STF, o objeto (pedido)
dessa demanda está relacionado com direitos individuais homogêneos. Assim,
podem ser defendidos pelos próprios titulares (segurados), em ações
individuais, ou por meio de ação coletiva.
O Ministério Público possui
legitimidade ativa para ajuizar essa ação coletiva (no caso, ação civil
pública) porque estamos diante de uma causa de relevante
natureza social (interesse social qualificado), diante do conjunto de
segurados que teriam sido lesados pela seguradora.
Desse modo, havendo interesse
social, o Ministério Público é legitimado a atuar, nos termos do art. 127 da
CF/88:
Art. 127. O Ministério
Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Como bem observado pelo Min.
Teori Zavascki, “o seguro DPVAT não é um seguro qualquer. É seguro obrigatório
por força de lei e sua finalidade é proteger as vítimas de um recorrente e
nefasto evento da nossa realidade moderna, os acidentes automobilísticos, que
tantos males, sociais e econômicos, trazem às pessoas envolvidas, à sociedade e
ao Estado, especialmente aos órgãos de seguridade social. Por isso mesmo, a
própria lei impõe como obrigatório (...)”
Logo, pela natureza e finalidade
desse seguro, o seu adequado funcionamento transcende os interesses individuais
dos segurados. Há, portanto, manifesto interesse social nessa controvérsia
coletiva.
Em outras palavras, trata-se de
direitos individuais homogêneos, cuja tutela se reveste de interesse social
qualificado, autorizando, por isso mesmo, a iniciativa do Ministério Público
de, com base no art. 127 da Constituição, defendê-los em juízo mediante ação
coletiva.
Decisão do STF motivou o
cancelamento da súmula
Como a decisão do STF foi
proferida em sede de repercussão geral e manifestou-se em sentido contrário ao
que decidia o STJ, este Tribunal decidiu, acertadamente, cancelar a Súmula 470.
Agora, tanto o STF como o STJ entendem que o
Ministério Público detém legitimidade para ajuizar ação coletiva em defesa dos direitos
individuais homogêneos dos beneficiários do seguro DPVAT, dado o interesse
social qualificado presente na tutela dos referidos direitos subjetivos.
STJ. 2ª Seção. REsp
858.056/GO, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 27/05/2015.
STF. Plenário. RE
631.111/GO, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 06 e 07/08/2014.