quinta-feira, 4 de setembro de 2014
Manifestação homofóbica ainda é conduta ATÍPICA
quinta-feira, 4 de setembro de 2014
Imagine a seguinte situação:
Determinado Deputado Federal publicou
no Twitter que “a podridão dos
sentimentos homoafetivos leva ao ódio, ao crime, à rejeição”.
Diante disso, o Procurador Geral
da República ofereceu denúncia no STF contra o parlamentar, afirmando que ele
praticou manifestação de natureza discriminatória em relação aos homossexuais, o
que caracterizaria o crime previsto no art. 20 da Lei n.° 7.716/86:
Art. 20. Praticar, induzir
ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou
procedência nacional.
Pena: reclusão de um a
três anos e multa.
Segundo a tese defendida pelo MP,
é possível aplicar a Lei n.°
7.716/1989 (Lei de Racismo) para todas as formas de homofobia e transfobia,
porque tal pedido repousa na técnica de interpretação conforme a Constituição,
em que o STF poderá adotar decisão de perfil aditivo a partir da legislação
existente.
De acordo com a denúncia, a frase
do Deputado no Twitter “revela o
induzimento à discriminação dos homossexuais em razão de sua orientação
sexual”.
O STF aceitou a denúncia?
NÃO. A 1ª Turma do STF rejeitou a
denúncia entendendo que a conduta do Deputado foi atípica.
O art. 20 da Lei n.° 7.716/89 pune a
discriminação ou o preconceito incidentes sobre a raça, a cor, a etnia, a
religião ou a procedência nacional, “não contemplando a discriminação
decorrente da opção sexual do cidadão ou da cidadã”. Assim, esse dispositivo, como
toda norma penal incriminadora, possui rol exaustivo de condutas tipificadas,
cuja lista não contempla a discriminação decorrente de orientação sexual.
Nesse sentido, os Ministros
entenderam que, por mais que fosse reprovável a postura do Parlamentar, sua
conduta não poderia ser classificada como crime, diante da ausência de lei tipificando.
Aplica-se, ao caso, o art. 5º,
XXXIX, da CF/88:
XXXIX - não há crime sem
lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;
O Min. Roberto Barroso consignou
que o comentário do parlamentar teria sido preconceituoso, de mau gosto e
extremamente infeliz. Aduziu, entretanto, que a liberdade de expressão não
existiria para proteger apenas aquilo que fosse humanista, de bom gosto ou inspirado.
Ressaltou que seria razoável que houvesse uma lei tipificando condutas que
envolvessem manifestações de ódio (“hate speech”) e que isso atenderia o princípio
da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88). Apesar disso, essa lei
ainda não existe, havendo projeto nesse sentido em discussão no Congresso
Nacional.
SINTETIZANDO:
Proferir manifestação de natureza
discriminatória em relação aos homossexuais NÃO configura o crime do art. 20 da
Lei n.°
7.716/86, sendo conduta atípica.
STF. 1ª Turma.
Inq 3590/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12/8/2014 (Info 754).