Dizer o Direito

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Em caso de embargos de declaração protelatórios, é possível aplicar a multa do art. 538 do CPC e mais a indenização da litigância de má-fé (art. 18, § 2º)?



Olá amigos do Dizer o Direito,

Vamos começar a semana com um julgado interessantíssimo de Direito Processual Civil decidido pelo STJ sob a sistemática de recurso repetitivo.

Imagine a seguinte situação:
João, servidor público federal, propôs ação contra a União pleiteando o pagamento de determinada gratificação, tendo sido o pedido julgado procedente.
A ré/condenada interpôs apelação, mas o Tribunal manteve a sentença.
Contra o acórdão, a União opôs embargos de declaração alegando que o Tribunal não enfrentou um de seus argumentos. Ocorre que a jurisprudência é pacífica no sentido de que essa gratificação é devida, havendo, inclusive, uma súmula da AGU concordando com seu pagamento.
Diante disso, o Tribunal rejeitou os embargos de declaração e, por entender que o único objetivo da União era o de prolongar o processo, evitando o início do pagamento, aplicou duas sanções à embargante:

1ª) MULTA de que trata o art. 538, parágrafo único, do CPC:
Art. 538 (...) Parágrafo único. Quando manifestamente protelatórios os embargos, o juiz ou o tribunal, declarando que o são, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente de 1% (um por cento) sobre o valor da causa. Na reiteração de embargos protelatórios, a multa é elevada a até 10% (dez por cento), ficando condicionada a interposição de qualquer outro recurso ao depósito do valor respectivo.

2ª) INDENIZAÇÃO prevista no art. 17, VII c/c art. 18, § 2º do CPC:
Art. 17.  Reputa-se litigante de má-fé aquele que:
VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.

Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.
(...)
§ 2º O valor da indenização será desde logo fixado pelo juiz, em quantia não superior a 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, ou liquidado por arbitramento.

A embargante/condenada apresentou recurso especial alegando que não seria possível aplicar os arts. 17 e 18 do CPC, que tratam de litigância de má-fé, para os casos de embargos de declaração protelatórios. Isso porque, para os embargos protelatórios, o legislador previu uma norma processual específica, que é o art. 538, parágrafo único. Em outras palavras, segundo a União, deveria incidir apenas o art. 538, parágrafo único, do CPC e nada mais.

O Tribunal agiu corretamente? Em caso de embargos de declaração protelatórios, é possível a cumulação da multa do art. 538, parágrafo único com a indenização da litigância de má-fé dos arts. 17, VII e 18, § 2º?
SIM, é possível a cumulação. Essas sanções apresentam natureza e finalidade distintas. Confira:

Multa do art. 538, parágrafo único
Indenização dos arts. 17, VII e 18, § 2º
Tem caráter eminentemente administrativo.
Pune a conduta do recorrente que ofende a dignidade do tribunal e a função pública do processo.
Tem natureza reparatória, ou seja, de indenizar a parte contrária pelos prejuízos que ela sofreu diante da prática da litigância de má-fé.


RESUMINDO:
Em caso de embargos de declaração manifestamente protelatórios, é possível aplicar a multa do art. 538, parágrafo único juntamente com a indenização prevista no art. 18, § 2º do CPC.
A multa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC tem caráter eminentemente administrativo – punindo conduta que ofende a dignidade do tribunal e a função pública do processo –, sendo possível sua cumulação com a sanção prevista nos arts. 17, VII, e 18, § 2º, do CPC, de natureza reparatória.
STJ. Corte Especial. REsp 1.250.739-PA, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 4/12/2013 (recurso repetitivo) (Info 541).

É importante chamar atenção para esse julgado porque ele é contrário ao posicionamento majoritário da doutrina. Nesse sentido: Barbosa Moreira, Marinoni e outros. Deve-se ter cuidado redobrado, portanto, ao estudar o tema pelos livros.

Tenham uma boa semana!


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