Olá amigos do Dizer o Direito,
Foi publicada hoje a Lei n.°12.990/2014, que prevê
cotas para negros em concursos públicos federais.
Vamos conhecer os detalhes sobre
a medida:
O que a lei estabelece?
20% das vagas oferecidas nos
concursos públicos realizados pela administração pública federal devem ser
destinadas a candidatos negros.
A lei obriga quais entidades?
Órgãos, autarquias, fundações,
empresas públicas e sociedades de economia mista federais, ligadas ao Poder
Executivo.
Órgãos
(ex: Ministérios)
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FEDERAIS
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ligadas ao Poder
Executivo
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Autarquias
(ex: INSS, Bacen)
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Fundações
(ex: universidades federais)
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Empresas públicas
(ex: Correios, Caixa Econômica)
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Sociedades de economia mista
(ex: Petrobrás, Banco do Brasil)
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A cota prevista na Lei n.º 12.990/2014 é válida para concursos do MPU e
dos Poderes Legislativo e Judiciário da União?
Para que vinculasse os concursos
para membros e servidores do MPU e do Poder Judiciário seria necessária a
edição de uma lei de iniciativa do MP (art. 127, § 2º, da CF/88) ou do
Judiciário (art. 96, II, “b”).
De igual forma, para que a cota abrangesse
os concursos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, seria indispensável a
edição de resolução das respectivas casas (art. 51, IV e art. 52, XIII)
normatizando o tema.
Vale ressaltar, no entanto, que o
Presidente do Senado já anunciou que está sendo elaborada uma Resolução da Casa
prevendo a reserva de 20% das vagas para negros nos próximos concursos públicos
e na contratação dos futuros funcionários terceirizados do Senado. Desse modo, haverá
também a cota no Senado, mas não por força da Lei n.º 12.990/2014 e sim por
meio de resolução.
A cota é válida para concursos da DPU?
Trata-se de tema polêmico, mas
penso que NÃO. Recentemente, a EC 80/2014 conferiu à Defensoria Pública a
iniciativa de lei para a sua organização interna (art. 134, §4º c/c art. 96,
II, da CF/88). Logo, para que haja cota em concursos públicos de membros ou
servidores da Instituição, é indispensável a edição de uma lei de iniciativa do
Defensor Público Geral.
Além disso, conforme já decidiu o
STF em reiteradas oportunidades, a Defensoria Pública goza de autonomia
administrativa (art. 134, §2º, da CF/88), razão pela qual não pode ser
considerada como sendo um órgão vinculado à estrutura do Poder Executivo (ADI 3.569,
Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 2/4/2007). Assim, “qualquer medida
normativa que suprima essa autonomia da Defensoria Pública, vinculando-a a
outros Poderes, em especial ao
Executivo, implicará violação à
Constituição Federal.” (STF. Plenário. ADI 4.056, Rel. Min. Ricardo
Lewandowski, julgado em 7/3/2012).
Considerando, no entanto, que a
Defensoria Pública sempre apoiou o sistema de cotas, é possível que adote o
entendimento institucional de que a Lei se aplica aos seus concursos. Reputo,
contudo, que esse não é o melhor caminho. O ideal seria o Defensor
Público-Geral Federal encaminhar um projeto de lei prevendo as cotas nos
concursos da DPU. Com isso, reafirmaria
a posição institucional a respeito dessa ação afirmativa e ao mesmo tempo não
permitiria mitigações à autonomia do órgão.
A cota prevista na Lei n.º 12.990/2014 é válida para concursos
estaduais, distritais e municipais?
NÃO. Conforme já salientado, a
Lei n.º 12.990/2014 é restrita ao Poder Executivo federal. Vale lembrar, no
entanto, que alguns Estados e Municípios já prevêem cotas em concursos
estaduais e municipais para negros. É o caso, por exemplo, da Lei n.º
5.695/2014, do Município do Rio de Janeiro.
Número mínimo de vagas
A reserva de vagas será aplicada
sempre que o número de vagas oferecidas no concurso público for igual ou
superior a 3 (art. 1º, § 1º).
Em outras palavras, se o concurso
prever menos que 3 vagas, não haverá cotas para negros.
O que acontece se, ao reservar os 20% de vagas aos negros, surgir um
número fracionado? Ex: em um concurso para 9 vagas, 20% será igual a 1,8 vagas.
O que fazer nesse caso?
• Se a fração for igual ou maior que 0,5 (cinco décimos): o
número de vagas deverá ser aumentado
para o primeiro número inteiro subsequente. Ex: concurso para 9 vagas (20% =
1,8). Logo, será arredondado para 2 vagas destinadas a negros.
• Se a fração for menor que 0,5 (cinco décimos): o número de
vagas deverá ser diminuído para o número
inteiro imediatamente inferior. Ex: concurso para 16 vagas (20% = 3,2). Logo,
será arredondado para 3 vagas de negros.
Edital deverá informar o número de vagas da cota
O edital do concurso deverá
especificar o total de vagas reservadas aos candidatos negros para cada cargo
ou emprego público oferecido.
Quem poderá concorrer às vagas da cota?
Poderão concorrer às vagas
reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos
ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o
quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – IBGE (art. 2º da Lei).
Esse é o grande ponto nevrálgico
da Lei, ou seja, quem pode ser considerado “pardo”, por exemplo? Existe algum
critério científico ou objetivo por meio do qual se possa chegar a essa
conclusão? Em caso de dúvidas ou situações limítrofes, quem decidirá? Infelizmente
não tenho essas respostas.
Em algumas universidades que adotam
as cotas, existe uma espécie de colegiado que analisa e decide os pedidos e eventuais
denúncias de declarações falsas.
O Decreto que regulamentar a lei
e os editais dos concursos deverão trazer regras específicas sobre como
funcionará essa autodeclaração.
Declaração falsa
Se ficar constatado que o
candidato fez declaração falsa sobre sua cor, a Lei prevê que ele será
eliminado do concurso.
Caso a declaração falsa somente
seja constatada após o candidato já ter sido nomeado, a sua admissão poderá ser
anulada, após processo administrativo em que lhe sejam assegurados o
contraditório e a ampla defesa.
Além disso, o candidato ainda poderá
ser processado criminalmente.
Os candidatos negros concorrem apenas às vagas da cota?
NÃO. Os candidatos negros
concorrerão concomitantemente às vagas reservadas e às vagas destinadas à ampla
concorrência, de acordo com a sua classificação no concurso.
Ex: em determinado concurso, 80 vagas
eram destinadas à ampla concorrência e 20 reservadas para negros. João, que se autodeclarou
preto no momento da inscrição, ficou em 25º lugar na lista de candidatos
negros. Ao mesmo tempo, na lista de ampla concorrência, ele ficou em 79º lugar.
Logo, ele será nomeado nas vagas destinadas à ampla concorrência.
Candidato negro que foi aprovado nas vagas de ampla concorrência
Os candidatos negros aprovados
dentro do número de vagas oferecido para ampla concorrência não serão
computados para efeito do preenchimento das vagas reservadas (art. 3º, § 1º).
Ex: em determinado concurso, 80
vagas eram destinadas à ampla concorrência e 20 reservadas para negros. Pedro,
que se autodeclarou preto no momento da inscrição, ficou em 19º lugar na lista
de candidatos negros. Ao mesmo tempo, na lista de ampla concorrência, ele ficou
em 79º lugar. Logo, ele será nomeado nas vagas destinadas à ampla concorrência
e a sua vaga na lista da cota (19º lugar) será utilizada por outro candidato
negro.
Candidato negro que desiste da nomeação ou posse
Em caso de desistência de
candidato negro aprovado em vaga reservada, a vaga será preenchida pelo
candidato negro posteriormente classificado.
Ex: em determinado concurso, 20 vagas
eram reservadas para negros. Lucas, que se autodeclarou preto no momento da
inscrição, ficou em 20º lugar na lista de candidatos negros. Ocorre que ele
desistiu de sua nomeação em razão de ter passado em outro certame. Logo, a
administração pública terá que convocar o 21º candidato negro.
O que acontece se as vagas reservadas aos candidatos negros não forem
integralmente preenchidas?
Na hipótese de não haver
candidatos negros aprovados em número suficiente para ocupar as vagas reservadas,
tais vagas remanescentes serão revertidas para a ampla concorrência e serão
preenchidas pelos demais candidatos aprovados, observada a ordem de
classificação.
Ex: em determinado concurso, 4
vagas eram reservadas para candidatos negros. Ocorre que somente 3 candidatos
negros fizeram a pontuação mínima exigida (nota de corte). Assim, essa quarta
vaga poderá ser preenchida por candidato não negro.
Nomeação dos candidatos
A Lei n.º 12.990/2014 prevê a
seguinte regra:
Art. 4º A nomeação dos
candidatos aprovados respeitará os critérios de alternância e
proporcionalidade, que consideram a relação entre o número de vagas total e o
número de vagas reservadas a candidatos com deficiência e a candidatos negros.
Ao final do concurso, haverá uma relação
de aprovados na ampla concorrência, outra lista de aprovados dentre aquelas
pessoas que concorreram nas vagas reservadas a negros e, eventualmente, uma
terceira lista de candidatos inscritos como deficientes.
Ex: imagine um concurso com 10
vagas. Dessas, 6 eram destinadas à ampla concorrência, 2 para negros e 2 para
deficientes. Foram aprovados 45 candidatos na ampla concorrência, 11 nas vagas
para negros e 5 nas vagas de deficientes.
A nomeação dos candidatos deverá
ser alternada e observando essa proporcionalidade. Assim, os três primeiros
candidatos nomeados serão da ampla concorrência, o quarto será da lista de
deficientes e o quinto dentre os negros; o sexto, o sétimo e o oitavo da ampla
concorrência, o nono dentre os deficientes e o décimo para negros. (obs: agradeço ao colega juiz federal Felipe Benali pelo exemplo)
Vigência do sistema de cotas para negros
O sistema de cotas para negros
previsto na Lei nº 12.990/2014 irá durar pelo prazo de 10 anos. Após esse período, acabam as cotas
para negros em concursos públicos da administração pública federal, salvo se
for verificado que a medida ainda é necessária quando, então, deverá ser
editada uma nova lei prorrogando o prazo.
Concursos cujos editais já tenham sido publicados
A Lei n.º 12.990/2014 entrou em
vigor hoje, mas ela não se aplica aos concursos públicos cujos editais já tenham
sido publicados.
Reserva de vagas para deficientes
Vale ressaltar que, nos concursos
para servidores públicos federais, a Lei já prevê a reserva de até 20% das
vagas para pessoas portadoras de deficiência (art. 5º, § 2º da Lei n.º
8.112/90).
Clique AQUI para conferir a íntegra da Lei.
Márcio André Lopes Cavalcante
Professor