Dizer o Direito

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Médico de hospital conveniado com o SUS que cobra do paciente por uma cirurgia que já foi paga pelo plano de saúde pratica improbidade administrativa?


Imagine a seguinte situação hipotética:
Dr. Felipe é médico e trabalhava em um hospital privado que, além de pacientes privados e de convênio com planos de saúde, também atendia pela rede pública (SUS).
O referido médico cobrou mil reais para realizar o parto de Maria. Ocorre que a despesa total pelo serviço já estava sendo custeada pelo plano de saúde da gestante.
Ao tomar conhecimento do fato, o Ministério Público estadual ajuizou ação de improbidade administrativa contra o médico.
O MPE alegou que o médico exercia a função equiparada à função pública, já que prestava serviços em hospital vinculado ao SUS. Nessa condição, não poderia exigir qualquer vantagem econômica para obter proveito pessoal na tentativa de receber duas vezes pelo mesmo serviço: uma pela paciente e outra pelo convênio.

Para o STJ, o aludido médico praticou ato de improbidade administrativa?
NÃO. O fato de o referido Hospital possuir vínculo com o SUS não quer dizer que ele somente presta serviços na qualidade de instituição pertencente à rede pública de saúde. Ao contrário, o Hospital também desempenha serviços particulares de saúde.

Assim, diante desse cenário, surgem duas possibilidades:
• O Hospital fez o atendimento médico-hospitalar custeado pelo SUS: hipótese na qual o médico atuou como agente público; OU
• O Hospital fez o atendimento médico-hospitalar de forma privada, sendo esse serviço custeado pelo próprio paciente ou pelo plano de saúde: nesse caso, o médico não atuou como agente público.

Na situação concreta, o parto de Maria foi custeado pelo plano de saúde e, apesar disso, o médico também cobrou os valores da gestante. Não houve, contudo, prestação de serviços pelo SUS. Logo, o médico não atuou na qualidade de agente público, pois a mencionada qualificação somente restaria configurada se o serviço tivesse sido pago pelos cofres públicos.

Em conclusão, o fato se mostra atípico do ponto de vista da improbidade administrativa, uma vez que o médico, no caso concreto, não atuou como agente público, pressuposto necessário para a tipificação do ato ímprobo.

Foi o que decidiu a 1ª Turma do STJ em um caso análogo ao acima relatado: REsp 1.414.669-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 20/2/2014.

Vale ressaltar que, neste caso, o médico poderia, em tese, ser responsabilizado penalmente pelo crime de estelionato (art. 171 do CP).


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