Dizer o Direito

sexta-feira, 25 de abril de 2014

A Súmula 554-STF não se aplica ao estelionato no seu tipo fundamental (art. 171, caput)



Olá amigos do Dizer o Direito,

O tema de hoje é sobre Direito Penal e envolve o delito de estelionato.

Vejamos duas situações bem interessantes e a solução aplicada para cada uma delas:

SITUAÇÃO 1:
Imagine a seguinte situação hipotética:
Nivaldo, com a intenção de ludibriar e obter vantagem ilícita em seu proveito, emitiu um cheque seu, sem fundos, em favor de Carla.
Em tese, ele praticou o crime de estelionato, previsto no art. 171, § 2º, VI, do CP:
Art. 171 (...)
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:
VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o pagamento.

Carla ficou extremamente contrariada e procurou a delegacia, tendo sido instaurado um inquérito policial para apurar o fato. Percebendo que o caso ficou sério, Nivaldo, antes que o Promotor de Justiça oferecesse denúncia contra ele, procurou a vítima e pagou integralmente o valor do cheque.

O pagamento do cheque (ressarcimento integral e voluntário do dano) irá impedir o prosseguimento da ação penal?
SIM. Para a jurisprudência, se o agente que emitiu o cheque sem fundos pagá-lo antes de a denúncia ser recebida, isso impedirá que a ação penal seja iniciada. Trata-se de uma exceção mais favorável ao réu do que a regra do art. 16 do CP. Existe um enunciado antigo do STF, mas ainda válido, sobre o tema:
Súmula 554-STF: O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal.


SITUAÇÃO 2:
Imagine agora a situação um pouco diferente:
Jair foi até o mercadinho e lá comprou 5kg de carne, pagando a conta com um cheque furtado.
Quando o dono da mercearia foi descontar o título, recebeu a informação de que não havia fundos.
Em tese, Jair praticou o crime de estelionato na figura prevista no caput do art. 171 (e não no seu § 2º, VI).
Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.

Foi instaurado inquérito policial para apurar o fato e Jair, antes que o Promotor de Justiça oferecesse denúncia contra ele, procurou a vítima e pagou integralmente o valor do cheque.

O pagamento do cheque (ressarcimento integral e voluntário do dano) irá impedir o prosseguimento da ação penal?
NÃO. A jurisprudência afirma que a Súmula 554 do STF aplica-se unicamente para o crime de estelionato na modalidade de emissão de cheque sem fundos (art. 171, § 2º, VI). Assim, a referida súmula não se aplica ao estelionato no seu tipo fundamental (art. 171, caput).
Desse modo, mesmo tendo pago integralmente o valor do cheque, o Promotor de Justiça irá denunciar Jair e a ação penal contra ele prosseguirá normalmente.
(STJ. 5ª Turma. HC 280.089-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 18/2/2014).

Mas ele terá algum benefício por ter ressarcido o dano?
SIM. Isso será considerado como causa de diminuição de pena, nos termos do art. 16 do CP:
Arrependimento posterior
Art. 16. Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.



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