Dizer o Direito

sexta-feira, 28 de março de 2014

Condenação por fato posterior ao crime em julgamento não gera maus antecedentes


Imagine a seguinte situação:
Em 05/05/2012, Antônio cometeu um roubo e iniciou-se uma ação penal contra ele.
Em 06/06/2013, ele praticou um furto, o que gerou outro processo criminal para apurar, desta vez este delito.
Em 07/07/2014, antes que o processo referente ao roubo chegasse ao fim, o réu foi condenado pelo furto, tendo havido trânsito em julgado após o prazo do recurso.

Na sentença condenatória pelo furto, o juiz poderá agravar a pena pelo fato de Antônio estar respondendo a um processo por roubo?
NÃO. O STJ afirma que, em face do princípio da presunção de não culpabilidade, os inquéritos policiais e ações penais em curso não podem ser considerados maus antecedentes. Existe, inclusive, um enunciado:
Súmula 444-STJ: É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.

Em 08/08/2014, Antônio foi condenado pelo roubo.

Na sentença condenatória pelo roubo, o juiz poderá considerar Antônio reincidente, o que caracteriza uma agravante (art. 61, I, do CP)?
NÃO. Antônio não é reincidente, uma vez que, quando praticou o segundo crime (furto), ainda não havia sido condenado pelo primeiro (roubo) com trânsito em julgado. Logo, não se enquadra na definição de reincidência.

Para relembrar: definição de reincidência
A definição de reincidência, para o Direito Penal, é encontrada a partir da conjugação do art. 63 do CP com o art. 7º da Lei de Contravenções Penais. Com base nesses dois dispositivos, podemos encontrar as hipóteses em que alguém é considerado reincidente para o Direito Penal (inspirado no quadro contido no livro de CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 401):

Se a pessoa é condenada definitivamente por
E depois da condenação definitiva pratica novo(a)
Qual será a consequência?
CRIME
(no Brasil ou exterior)
CRIME
REINCIDÊNCIA
CRIME
(no Brasil ou exterior)
CONTRAVENÇÃO
(no Brasil)
REINCIDÊNCIA
CONTRAVENÇÃO
(no Brasil)
CONTRAVENÇÃO
(no Brasil)
REINCIDÊNCIA
CONTRAVENÇÃO
(no Brasil)
CRIME
NÃO HÁ reincidência.
Foi uma falha da lei.
Mas gera maus antecedentes.
CONTRAVENÇÃO
(no estrangeiro)
CRIME ou CONTRAVENÇÃO
NÃO HÁ reincidência.
Contravenção no estrangeiro não influi aqui.


Na sentença condenatória pelo roubo, o juiz poderá considerar a condenação pelo furto, já transitada em julgado, como circunstância judicial negativa?
Também NÃO.

O réu, na sua sentença, é julgado pelos fatos e circunstâncias que ocorreram até a data do crime. Assim, para o STJ, na dosimetria da pena, os fatos posteriores ao crime em julgamento NÃO podem ser utilizados como fundamento para valorar negativamente a pena-base (culpabilidade, os antecedentes a personalidade, a conduta social do réu etc.).
STJ. 6ª Turma. HC 189.385-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/2/2014.

(...) Impossibilitada a aplicação de antecedentes criminais relativos a infrações praticadas após àquela objeto da denúncia. Precedentes. (...)
STJ. 5ª Turma. HC n. 268.762/SC, Min. Regina Helena Costa, DJe 29/10/2013.

Em suma, as condenações por fatos posteriores ao delito em julgamento (ainda que transitadas em julgado) não podem ser utilizadas para agravar a pena-base.

Vamos mudar um pouco o exemplo? Imagine a agora seguinte situação:
Em 05/05/2012, Pedro cometeu um roubo.
Em 06/06/2013, ele foi condenado pelo roubo, mas recorreu contra a sentença.
Em 07/07/2013, Pedro praticou um furto, iniciando outro processo penal.
Em 08/08/2013, a condenação pelo roubo transitou em julgado.
Em 09/09/2013, Pedro é condenado pelo furto.

Na sentença condenatória pelo furto, o juiz poderá considerar Pedro reincidente (art. 61, I, do CP)?
NÃO. Pedro não é reincidente uma vez que, quando praticou o segundo crime (furto), a condenação pelo delito anterior (roubo) ainda não havia transitado em julgado. Logo, não se enquadra na definição de reincidência que vimos no quadro acima.

Na sentença condenatória pelo furto, o juiz poderá considerar a condenação pelo roubo, já transitada em julgado, como circunstância judicial negativa?
SIM. A condenação por fato anterior ao delito que se julga, mas com trânsito em julgado posterior, pode ser utilizada como circunstância judicial negativa, a título de antecedente criminal (STJ. 5ª Turma. HC n. 210.787/RJ, Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 16/9/2013).


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