Dizer o Direito

sexta-feira, 21 de março de 2014

A preferência do idoso para receber precatório não se estende a seus sucessores



Regime de precatórios
Se a Fazenda Pública Federal, Estadual, Distrital ou Municipal for condenada, por sentença judicial transitada em julgado, a pagar determinada quantia a alguém, este pagamento será feito sob um regime especial chamado de “precatório” (art. 100 da CF/88).

Caput do art. 100: “fila de precatórios”
O regime de precatórios é tratado pelo art. 100 da CF, assim como pelo art. 78 do ADCT.
No caput do art. 100 da CF/88 consta a regra geral dos precatórios, ou seja, os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em decorrência de condenação judicial devem ser realizados na ordem cronológica de apresentação dos precatórios. Existe, então, uma espécie de “fila” para pagamento dos precatórios:
Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (Redação dada pela EC 62/09)

§ 1º do art. 100: “fila preferencial de precatórios”
No § 1º do art. 100 há a previsão de que os débitos de natureza alimentícia gozam de preferência no recebimento dos precatórios. É como se existisse uma espécie de “fila preferencial”:
§ 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo. (Redação dada pela EC 62/09).

§ 2º do art. 100: “fila com superpreferência”
O § 2º do art. 100 prevê que os débitos de natureza alimentícia que tenham como beneficiários pessoas com 60 anos de idade ou mais ou portadoras de doenças graves terão uma preferência ainda maior. É como se fosse uma “fila com superpreferência”.

Recapitulando:
Os débitos da Fazenda Pública devem ser pagos por meio do sistema de precatórios.
• Quem é pago em 1º lugar: créditos alimentares de idosos e portadores de doenças graves.
• Quem é pago em 2º lugar: créditos alimentares de pessoas que não sejam idosas ou portadoras de doenças graves.
• Quem é pago em 3º lugar: créditos não alimentares.

Obs.1: a superprioridade para créditos alimentares de idosos e portadores de doenças graves possui um limite de valor previsto no § 2º do art. 100. Assim, se o valor a receber pelo idoso ou doente grave for muito alto, parte dele será paga com superpreferência e o restante será quitado na ordem cronológica de apresentação do precatório. Esta limitação de valor foi considerada constitucional pelo STF.

Obs.2: dentro de cada uma dessas “filas”, os débitos devem ser pagos conforme a ordem cronológica em que os precatórios forem sendo apresentados.

Obs.3: os débitos de natureza alimentícia são aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil.

Em que momento é analisada esta idade de 60 anos para que a pessoa passe a ter a superpreferência?
Segundo a redação literal do § 2º do art. 100, para que o indivíduo tivesse direito à superpreferência, ele deveria ser idoso (60 anos ou mais) no dia da expedição do precatório pelo juízo. Veja a redação do § 2º:
§ 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou sejam portadores de doença grave, definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.

Ocorre que, entre o dia em que o precatório é expedido e a data em que ele é efetivamente pago, são passados alguns anos. Desse modo, é comum que a pessoa não seja idosa no instante em que o precatório é expedido, mas como o processo de pagamento é tão demorado, ela acaba completando mais de 60 anos de idade durante a espera.

Diante disso, esta expressão “na data de expedição do precatório” constante no § 2º do art. 100 da CF/88 foi declarada INCONSTITUCIONAL pelo STF.
O STF entendeu que esta limitação até a data da expedição do precatório viola o princípio da igualdade e que esta superpreferência deveria ser estendida a todos os credores que completassem 60 anos de idade enquanto estivessem aguardando o pagamento do precatório de natureza alimentícia.
STF. Plenário. ADI 4357/DF, ADI 4425/DF, ADI 4372/DF, ADI 4400/DF, ADI 4357/DF, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, 13 e 14/3/2013 (Info 698).


Se o idoso estiver na “fila superpreferencial”, mas falecer sem receber o precatório, seus sucessores terão direito de continuar na “fila superpreferencial” ou deverão ir para a “fila comum”?
Deverão ir para a “fila comum”.

Segundo decidiu a 2ª Turma do STJ, o direito de preferência no pagamento de precatório, outorgado aos maiores de 60 anos de idade, NÃO SE ESTENDE aos seus herdeiros, mesmo que também idosos.

No caso concreto julgado pelo STJ, os sucessores do morto alegavam que, assim como o falecido, tinham direito ao benefício previsto pelo art. 100, § 2º, da CF/88.

O relator do recurso no STJ, Min. Humberto Martins, esclareceu que o texto constitucional é claro ao atribuir o benefício de preferência aos credores originais, não se podendo estender essa prerrogativa aos herdeiros e sucessores, considerando que esse direito de preferência no pagamento de precatórios possui caráter personalíssimo.

Veja como ficou a ementa do julgado:
1. Cuida-se de recurso ordinário interposto contra acórdão que denegou a segurança ao pleito mandamental de extensão do direito de preferência no pagamento de precatórios aos idosos; alegam os recorrentes que, por serem herdeiros e, também, idosos, possuem o mesmo direito - com base no art. 100, § 2º da Constituição Federal - outorgado ao titular falecido.
2. Os dispositivos constitucionais - introduzidos pela Emenda Constitucional n. 62/2009 - mencionam que o direito de preferência será outorgado aos "titulares que tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório" (art. 100, § 2º) e aos "titulares originais de precatórios que tenham completado 60 (sessenta) anos de idade até a data da promulgação desta Emenda Constitucional" (art. 97, § 18); bem se nota que a referência expressa somente atinge aos titulares originários dos precatórios e não aos sucessores.
3. O postulado direito de preferência no pagamento de precatórios não pode ser estendido, uma vez que possui caráter personalíssimo, tal como se infere aos dispositivos da Constituição Federal nos quais está previsto; tal interpretação encontra amparo, ainda, no art. 10, § 2º da Resolução n. 115/2010 do CNJ - Conselho Nacional de Justiça. (...)
STJ. 2ª Turma. RMS 44836/MG, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 20/02/2014.


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