segunda-feira, 20 de janeiro de 2014
Qual é o termo inicial da prescrição executória no processo penal?
segunda-feira, 20 de janeiro de 2014
Conceito de prescrição:
Prescrição é a perda do direito
do Estado de punir (pretensão punitiva) ou de executar uma punição já imposta
(pretensão executória) em razão de não ter agido (inércia) nos prazos previstos
em lei.
Existem duas espécies de prescrição:
I – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA,
que pode ser:
I.a) Prescrição da pretensão punitiva
propriamente dita;
I.b) Prescrição superveniente ou
intercorrente;
I.c) Prescrição retroativa
II – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA
Prescrição da pretensão executória
(prescrição da condenação):
Ocorre quando o Estado perde o
seu poder-dever de executar uma sanção penal já definitivamente imposta pelo
Poder Judiciário em razão de não ter agido nos prazos previstos em lei.
Cálculo da prescrição executória
no caso de pena privativa de liberdade:
A prescrição da pretensão
executória da pena privativa de liberdade é calculada com base na pena concreta, fixada na
sentença ou no acórdão, que já transitou em julgado e, portanto, não pode mais
ser alterada.
Termo inicial
Como vimos, o Estado tem um prazo
máximo para fazer com que o réu condenado inicie o cumprimento da pena. Caso
não faça isso, ocorre a prescrição executória.
A pergunta é: a partir de que dia começa
a correr esse prazo que o Estado tem para fazer com que o condenado inicie o
cumprimento da pena? Dito de outra forma: qual é o termo inicial do prazo da prescrição
da pretensão executória?
A resposta encontra-se no art. 112, I,
do CP:
Termo inicial da prescrição após a
sentença condenatória irrecorrível
Art. 112. No caso do art. 110 deste
Código (que trata da prescrição
executória), a prescrição começa a correr:
I - do dia em que transita em julgado a sentença
condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão
condicional da pena ou o livramento condicional;
Desse modo, segundo o art. 112, I, do
CP, o termo inicial da prescrição executória é a data do trânsito em julgado da
sentença condenatória para a acusação.
E se o MP não recorre, mas a defesa apresenta
recurso?
Nesse caso, a sentença condenatória
transitou em julgado para a acusação. Logo, segundo a redação do art. 112, I,
do CP, inicia-se a contagem do prazo de prescrição executória mesmo ainda
estando pendente a apreciação do recurso interposto pela defesa.
Veja o seguinte exemplo hipotético:
João foi condenado a 4 anos pela
prática de roubo.
O Promotor de Justiça concorda com o
veredito do juiz e não recorre, razão pela qual a sentença condenatória
transita em julgado para a acusação no dia 10/01/2006.
O advogado do réu apresenta recurso de
apelação, de forma que, para a defesa, não houve trânsito em julgado.
Qual é o prazo de prescrição executória
se o réu for condenado a 4 anos?
A prescrição ocorrerá em 8 anos (art. 109,
IV, do CP). Em outras palavras, se o réu for condenado a 4 anos, o Estado tem o
poder-dever de fazer com que esse condenado inicie o cumprimento da pena em até
8 anos. Se passar desse prazo, o Estado perde o poder de executar a sanção e o condenado
não mais terá que cumprir a pena imposta.
Em nosso exemplo, quando se iniciou a
contagem do prazo de prescrição executória (levando-se em consideração a regra
do art. 112, I, do CP)?
No dia 10/01/2006, data em que a
sentença transitou em julgado para a acusação. Isso significa que o Estado
tinha um prazo de 8 anos para fazer com que o réu iniciasse o cumprimento da
pena.
Se o réu não começou a cumprir a pena até
10/01/2014, aconteceu a prescrição.
Essa é a regra que está presente no
art. 112, I, do CP.
Crítica à regra do art. 112, I, do CP
A CF/88 prevê que ninguém poderá ser
considerado culpado até que haja o trânsito em jugado da sentença penal
condenatória (art. 5º, LVII). Por força desse princípio, não existe, no Brasil,
a execução provisória (antecipada) da pena. Assim, enquanto não tiver havido trânsito
em julgado para a acusação e para a defesa, o réu não poderá ser obrigado a
iniciar o cumprimento da pena. Se ainda estiver pendente de julgamento qualquer
recurso da defesa, o condenado não iniciará o cumprimento da pena porque ainda é
presumivelmente inocente (SF. Pleno. HC 84078, julgado em 05/02/2009).
Desse modo, perceba a seguinte situação
que o art. 112, I, pode ocasionar:
• se o réu for condenado, a defesa
recorrer e o MP não, esse condenado não poderá iniciar o cumprimento da pena
enquanto estiver pendente o recurso;
• apesar disso, já começa a correr o
prazo da prescrição executória.
Diante desse paradoxo que pode ser
ocasionado pela regra do art. 112, I, do CP, alguns doutrinadores e membros do
Ministério Público idealizaram a seguinte tese:
O início do prazo da prescrição
executória deve ser o momento em que ocorre o trânsito em julgado para ambas as
partes, ou seja, tanto para a acusação como para a defesa.
Não se pode dizer que o prazo
prescricional começa com o trânsito em julgado apenas para a acusação, uma vez
que, se a defesa recorreu, o Estado não pode dar início à execução da pena, já
que ainda não haveria uma condenação definitiva.
Se há recurso da defesa, o Estado não inicia
o cumprimento da pena não por desinteresse dele, mas sim porque há uma vedação
de ordem constitucional decorrente do princípio da presunção de inocência. Ora,
se não há desídia do Estado, não se pode falar em prescrição.
Veja o que escreveu o Min. Jorge Mussi
sobre o tema:
“O termo inicial do prazo prescricional
da pretensão executória, por sua vez, deve ser considerado a data em que ocorre
o trânsito em julgado para ambas as partes, porquanto somente neste momento é
que surge o título penal passível de ser executado pelo Estado, em respeito ao
princípio contido no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, sendo
forçosa a adequação hermenêutica do disposto no artigo 112, inciso I, do Código
Penal, cuja redação foi dada pela Lei n. 7.209/84, ou seja, é anterior ao atual
ordenamento constitucional.” (STJ HC 137.924/SP).
Essa tese que desconsidera a regra do art. 112, I, do CP é
aceita pela jurisprudência?
NÃO. Houve alguns julgados antigos do
STJ acatando essa tese, porém atualmente ela não é mais aceita.
Assim, para o STF e o STJ, conforme
determina o art. 112, I, do CP, o termo inicial da prescrição da pretensão
executória é a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a
acusação, ainda que a defesa tenha recorrido e que se esteja aguardando o
julgamento desse recurso.
Principais argumentos da jurisprudência
para rechaçar a tese:
• O argumento de que se deveria
aguardar o trânsito em julgado para ambas as partes não tem previsão legal e
contraria o texto do Código Penal.
• Além disso, não se pode querer “corrigir”
a redação do art. 112, I, do CP invocando-se o art. 5º, LVII, da CF/88, porque
nesse caso se estaria utilizando um dispositivo da Constituição Federal para
respaldar uma “interpretação” totalmente desfavorável ao réu e contra expressa
disposição legal.
• Exigir o trânsito em julgado para
ambas as partes como termo inicial da contagem do lapso da prescrição da
pretensão executória, ao contrário do texto expresso da lei, seria inaugurar
novo marco interruptivo da prescrição não previsto no rol taxativo do art. 117
do CP, situação que também afrontaria o princípio da reserva legal.
• Assim, somente com a devida alteração
legislativa é que seria possível modificar o termo inicial da prescrição da
pretensão executória, e não por meio de "adequação hermenêutica".
• Vale ressaltar que o art. 112, I, do
CP é compatível com a norma constitucional, não sendo o caso, portanto, de sua
não recepção.
Precedentes
STJ. 5ª Turma. HC 254.080-SC, Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze, julgado em 15/10/2013.
STF. 1ª Turma. HC 110133, Rel. Min.
Luiz Fux, julgado em 03/04/2012.