sexta-feira, 22 de novembro de 2013
A sentença penal poderá condenar o réu a pagar um valor de indenização para a vítima?
sexta-feira, 22 de novembro de 2013
A sentença penal condenatória, depois
de transitada em julgado, produz diversos efeitos.
Um dos efeitos é que a
condenação gera a obrigação do réu de reparar o dano causado:
Código
Penal
Art. 91. São efeitos da
condenação:
I - tornar certa a obrigação de
indenizar o dano causado pelo crime;
A sentença condenatória,
inclusive, constitui-se em título executivo judicial:
Código
de Processo Civil
Art. 475-N. São títulos
executivos judiciais:
II – a sentença penal
condenatória transitada em julgado;
Assim, a vítima (ou seus
sucessores), de posse da sentença que condenou o réu, após o seu trânsito em
julgado, dispõe de um título que poderá ser executado no juízo cível para
cobrar o ressarcimento pelos prejuízos sofridos em decorrência do crime.
Qual era, no entanto, a
dificuldade antes da Lei n.°
11.719/2008?
Apesar de ser reconhecida a
obrigação de indenizar (an debeatur),
não era possível que a vítima (ou seus sucessores) executassem imediatamente a
sentença porque não havia sido definido ainda o valor da indenização (quantum debeatur). Em outras palavras, a
sentença condenatória reconhecia que a vítima tinha direito à indenização a ser
paga pelo condenado, mas não dizia o quanto.
Com isso, a vítima (ou seus
sucessores) tinha ainda que tomar uma outra providência antes de executar: fazer
a liquidação (art. 475-A do CPC).
O legislador tentou facilitar a
situação da vítima e, por meio da Lei n.°
11.719/2008, alterou o CPP, prevendo que o juiz, ao condenar o réu, já
estabeleça na sentença um valor mínimo que o condenado estará obrigado a pagar
a título de reparação dos danos causados. Veja:
Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória:
IV - fixará valor mínimo para
reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos
pelo ofendido; (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
Desse modo, se o juiz, na
própria sentença, já fixar um valor certo para a reparação dos danos, não será
necessário que a vítima ainda faça a liquidação, bastando que execute este
valor caso não seja pago voluntariamente pelo condenado.
Veja o parágrafo único do art.
63 do CPP, que explicita essa possibilidade:
Art. 63. Transitada em julgado a sentença
condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da
reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros.
Parágrafo único. Transitada em
julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor
fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo
da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido. (Incluído pela Lei
nº 11.719, de 2008).
Confira
abaixo os comentários mais importantes sobre o art. 387, IV do CPP:
1) Qual é a natureza jurídica
dessa fixação do valor mínimo de reparação?
Trata-se de um efeito
extrapenal genérico da condenação.
2) A vítima poderá pleitear
indenização maior no juízo cível
O juiz fixará um valor mínimo. Assim,
a vítima poderá executar desde logo este valor mínimo e pleitear um valor maior
que o fixado na sentença, bastando, para isso, que prove que os danos que
sofreu foram maiores que a quantia estabelecida na sentença. Essa prova é feita
em procedimento de liquidação por artigos (procedimento cível regulado pelos
arts. 475-E e 475-F do CPC).
3) Para que seja fixado o valor
da reparação, deverá haver pedido expresso e formal do MP ou do ofendido
(...) Este Tribunal sufragou o
entendimento de que deve haver pedido expresso e formal, feito pelo parquet ou
pelo ofendido, para que seja fixado na sentença o valor mínimo de reparação dos
danos causados à vítima, a fim de que seja oportunizado ao réu o contraditório
e sob pena de violação ao princípio da ampla defesa. (...)
(AgRg no AREsp 389.234/DF, Rel.
Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 08/10/2013)
4) Deverá haver provas dos prejuízos sofridos
O STJ já decidiu que o juiz
somente poderá fixar este valor se existirem provas nos autos que demonstrem os
prejuízos sofridos pela vítima em decorrência do crime. Dessa feita, é
importante que o Ministério Público ou eventual assistente de acusação junte
comprovantes dos danos causados pela infração para que o magistrado disponha de
elementos para a fixação de que trata o art. 387, IV, do CPP. Vale ressaltar,
ainda, que o réu tem direito de se manifestar sobre esses documentos juntados e
contraditar o valor pleiteado como indenização. Nesse sentido:
A fixação da reparação civil
mínima também não dispensa a participação do réu, sob pena de frontal violação
ao seu direito de contraditório e ampla defesa, na medida em que o autor da
infração faz jus à manifestação sobre a pretensão indenizatória, que, se
procedente, pesará em seu desfavor. (...)
(REsp 1236070/RS, Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, julgado em 27/03/2012)
5) O julgador penal é obrigado
a sempre fixar esse valor mínimo?
NÃO. O juiz pode deixar de
fixar o valor mínimo em algumas situações, como, por exemplo:
a) quando não houver prova do
prejuízo;
b) se os fatos forem complexos
e a apuração da indenização demandar dilação probatória, o juízo criminal
poderá deixar de fixar o valor mínimo, que deverá ser apurado em ação civil;
c) quando a vítima já tiver
sido indenizada no juízo cível.
O exemplo citado nesta letra
“b” foi justamente o que ocorreu no julgamento do “Mensalão”. O STF rejeitou o
pedido formulado pelo MPF, em sede de alegações finais, no sentido de que fosse
fixado valor mínimo para reparação dos danos causados pelas infrações penais,
sob o argumento de que a complexidade dos fatos e a imbricação de condutas
tornaria inviável assentar o montante mínimo. Assim, não haveria como
identificar com precisão qual a quantia devida por cada réu, o que só seria
possível por meio de ação civil, com dilação probatória para esclarecimento desse
ponto (Plenário. AP 470/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 17.12.2012).
6) Além dos prejuízos
materiais, o juiz poderá também condenar o réu a pagar a vítima por danos
morais?
1ª corrente: SIM. Posição de
Norberto Avena.
2ª corrente: NÃO. Defendida por
Eugênio Pacelli.
7)
O art. 387, IV, do CPP, com a redação dada pela Lei n.°
11.719/2008, fez com que o Brasil passasse a adotar a chamada “cumulação de
instâncias” em matéria de indenização pela prática de crimes?
NÃO.
A cumulação de instâncias (ou união de instâncias) em matéria de indenização
pela prática de crimes ocorre quando um mesmo juízo resolve a lide penal (julga
o crime) e também já decide, de forma exauriente, a indenização devida à vítima
do delito. Conforme explica Pacelli e Fischer, “por esse sistema, o ajuizamento
da demanda penal determina a unidade de juízo para a apreciação da matéria
cível” (Comentários ao Código de
Processo Penal e Sua Jurisprudência. São Paulo: Atlas, 2012, p. 769). No
Brasil, não há unidade de instâncias porque o juízo criminal irá apenas, quando
for possível, definir um valor mínimo de indenização pelos danos sofridos sem,
contudo, esgotar a apreciação do tema, que ainda poderá ser examinado pelo
juízo cível para aumentar esse valor.
Assim,
continuamos adotando o modelo da separação mitigada de instâncias.
8) A previsão da indenização
contida no inciso IV do art. 387 surgiu com a Lei n.°
11.719/2008. Se o crime ocorreu antes da Lei e foi sentenciado após a sua
vigência, pode ser aplicado o dispositivo e fixado o valor mínimo de reparação
dos danos?
1ª
corrente: SIM
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2ª
corrente: NÃO
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Trata-se de norma de direito
processual. Assim, ainda que o processo tenha se iniciado antes da Lei n.° 11.719/2008, se ele for
sentenciado após a sua vigência, deverá observar a fixação do valor mínimo de
que trata o art. 387, IV, do CPP.
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Trata-se de norma híbrida (de
direito material e processual) e, por ser mais gravosa ao réu, não pode ser
aplicada a fatos praticados antes de sua vigência.
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STJ. 6ª Turma. REsp
1.176.708-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 12/6/2012.
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STJ. 5ª Turma. REsp
1.193.083-RS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 20/8/2013.
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9) O condenado poderá impugnar o
valor fixado na forma do art. 387, IV, do CPP por meio de um habeas corpus?
NÃO. A via processual do habeas
corpus não é adequada para impugnar a reparação civil fixada na sentença penal
condenatória, com base no art. 387, IV, do CPP, tendo em vista que a sua
imposição não acarreta ameaça, sequer indireta ou reflexa, à liberdade de locomoção
(HC 191.724/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 15/10/2013).
10) Se a punibilidade do
condenado for extinta pela prescrição da pretensão punitiva, haverá extinção
também do valor de reparação imposto na sentença?
SIM. Extinta a condenação pela
prescrição, extingue-se também a condenação pecuniária fixada como reparação
dos danos causados à vítima, nos termos do art. 387, IV, do CPP, pois dela
decorrente, ficando ressalvada a utilização de ação cível, caso a vítima
entenda que haja prejuízos a serem reparados (EDcl no AgRg no REsp 1260305/ES, Rel. Min. Sebastião Reis
Júnior, Sexta Turma, julgado em 12/03/2013).