terça-feira, 15 de outubro de 2013
Danos morais coletivos e danos sociais
terça-feira, 15 de outubro de 2013
DANOS MORAIS COLETIVOS NO DIREITO
AMBIENTAL
Imagine que determinada empresa causou
grave dano ambiental.
O Ministério Público (ou outro
legitimado) poderá ajuizar ação civil pública pedindo que essa empresa seja
condenada a recompor o meio ambiente?
SIM, sem nenhuma dúvida.
Além disso, é possível que, na ACP,
seja pedida a condenação da empresa ao pagamento de danos morais em favor da
coletividade? Em outras palavras, é cabível dano moral coletivo em razão de
dano ambiental?
SIM. A 2ª Turma do STJ decidiu
recentemente que é possível que a sentença condene o infrator ambiental ao
pagamento de quantia em dinheiro a título de compensação por dano moral
coletivo (REsp 1.328.753-MG, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 28/5/2013).
Assim, apesar de existirem precedentes da
1ª Turma em sentido contrário (AgRg no REsp 1305977/MG, julgado em 09/04/2013),
a posição majoritária (não pacífica) é no sentido de ser cabível a
condenação por dano moral coletivo.
É possível, então, que a empresa seja
condenada, cumulativamente, a recompor o meio ambiente e a pagar indenização
por dano moral coletivo?
SIM. Isso porque vigora em nosso
sistema jurídico o princípio da reparação integral do dano ambiental, de modo
que o infrator deverá ser responsabilizado por todos os efeitos decorrentes da
conduta lesiva, permitindo-se que haja a cumulação de obrigações de fazer, de
não fazer e de indenizar.
O art. 3º da Lei n.° 7.347/85 afirma que a ACP “poderá ter
por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de
fazer ou não fazer”.
Para o STJ, essa conjunção “ou” –
contida no citado artigo, tem um sentido de adição (soma), não representando
uma alternativa excludente. Em outras palavras, será possível a condenação em
dinheiro e também ao cumprimento de obrigação de fazer/não fazer.
Veja precedente nesse sentido:
(...) Segundo a jurisprudência do STJ,
a logicidade hermenêutica do art. 3º da Lei 7.347/1985 permite a cumulação das
condenações em obrigações de fazer ou não fazer e indenização pecuniária em
sede de ação civil pública, a fim de possibilitar a concreta e cabal reparação
do dano ambiental pretérito, já consumado. Microssistema de tutela coletiva.
(...)
4. O dano moral coletivo ambiental
atinge direitos de personalidade do grupo massificado, sendo desnecessária a
demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal
qual fosse um indivíduo isolado. (...)
(REsp 1269494/MG, Rel. Min. Eliana
Calmon, Segunda Turma, julgado em 24/09/2013)
DANOS MORAIS COLETIVOS NO DIREITO
DO CONSUMIDOR
Vale ressaltar que é possível
imaginarmos a existência de danos morais coletivos em outras áreas, além do Direito
Ambiental. É o caso, por exemplo, do Direito do Consumidor. Ressalte-se que,
recentemente, a 3ª Turma do STJ decidiu o seguinte:
O banco pode ser condenado a pagar
reparação por dano moral coletivo, em ação civil pública, pelo fato de
oferecer, em sua agência, atendimento inadequado aos consumidores idosos, deficientes
físicos e com dificuldade de locomoção.
No caso concreto, o atendimento desses
clientes era realizado somente no segundo andar da agência bancária, cujo
acesso se dava por três lances de escada.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.221.756-RJ, rel.
Min. Massami Uyeda, julgado em 02/02/2012.
O CDC autoriza expressamente a
indenização por danos morais coletivos dos consumidores:
Art. 6º São direitos básicos do
consumidor:
VI - a efetiva prevenção e reparação de
danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
DANOS SOCIAIS
O que são danos sociais? Danos sociais
e danos morais coletivos são expressões sinônimas?
NÃO. Dano social não é sinônimo de dano
moral coletivo.
Danos sociais, segundo Antônio
Junqueira de Azevedo,
“são lesões à sociedade, no seu nível de vida, tanto por rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a respeito da segurança – quanto por diminuição na qualidade de vida. Os danos sociais são causa, pois, de indenização punitiva por dolo ou culpa grave, especialmente, repetimos, se atos que reduzem as condições coletivas de segurança, e de indenização dissuasória, se atos em geral da pessoa jurídica, que trazem uma diminuição do índice de qualidade de vida da população.” (p. 376).
O dano social seria outra espécie de
dano, que não se confunde com os danos materiais, morais e estéticos.
Os danos sociais são causados por comportamentos
exemplares negativos ou condutas socialmente reprováveis.
Alguns exemplos dados por Junqueira de
Azevedo: o pedestre que joga papel no chão, o passageiro que atende ao celular
no avião, o pai que solta balão com seu filho. Tais condutas socialmente
reprováveis podem gerar danos como o entupimento de bueiros em dias de chuva,
problemas de comunicação do avião causando um acidente aéreo, o incêndio de
casas ou de florestas por conta da queda do balão etc.
Diante da prática dessas condutas
socialmente reprováveis, o juiz deverá condenar o agente a pagar uma indenização
de caráter punitivo, dissuasório ou didático, a título de dano social.
Segundo explica Flávio Tartuce, os
danos sociais são difusos e a sua indenização deve ser destinada não para a
vítima, mas sim para um fundo de proteção ao consumidor, ao meio ambiente etc.,
ou mesmo para uma instituição de caridade, a critério do juiz (Manual de Direito do Consumidor. São
Paulo: Método, 2013, p. 58).
Os danos sociais representam a aplicação
da função social da responsabilidade civil (PEREIRA, Ricardo Diego Nunes. Os novos danos: danos morais coletivos,
danos sociais e danos por perda de uma chance. Disponível em: http://ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11307).
Ricardo Pereira cita alguns casos
práticos:
Um deles é a decisão do TRT-2ª Região
(processo 2007-2288), que condenou o Sindicato dos Metroviários de São Paulo e
a Cia do Metrô a pagarem 450 cestas básicas a entidades beneficentes por terem realizado
uma greve abusiva que causou prejuízo à coletividade.
Outro exemplo foi o caso de uma fraude ocorrida
em um sistema de loterias, no Rio Grande do Sul, chamado de “Toto Bola”. Ficou
constatado que a loteria seria fraudulenta, retirando do consumidor as chances
de vencer. Nesse episódio, o TJ/RS, no Recurso Cível 71001281054, DJ
18/07/2007, determinou, de ofício, indenização a título de dano social para o
Fundo de Proteção aos Consumidores. Veja a ementa do julgado:
(...) 1. Não há que se falar em perda
de uma chance, diante da remota possibilidade de ganho em um sistema de
loterias. Danos materiais consistentes apenas no valor das cartelas
comprovadamente adquiridas, sem reais chances de êxito.
2. Ausência de danos morais puros, que
se caracterizam pela presença da dor física ou sofrimento moral, situações de
angústia, forte estresse, grave desconforto, exposição à situação de vexame,
vulnerabilidade ou outra ofensa a direitos da personalidade.
3. Presença de fraude, porém, que não
pode passar em branco. Além de possíveis respostas na esfera do direito penal e
administrativo, o direito civil também pode contribuir para orientar os atores
sociais no sentido de evitar determinadas condutas, mediante a punição
econômica de quem age em desacordo com padrões mínimos exigidos pela ética das
relações sociais e econômicas. Trata-se da função punitiva e dissuasória que a
responsabilidade civil pode, excepcionalmente, assumir, ao lado de sua clássica
função reparatória/compensatória. “O Direito deve ser mais esperto do que o
torto”, frustrando as indevidas expectativas de lucro ilícito, à custa dos
consumidores de boa fé.
4. Considerando, porém, que os danos
verificados são mais sociais do que propriamente individuais, não é razoável
que haja uma apropriação particular de tais valores, evitando-se a disfunção
alhures denominada de overcompensantion.
Nesse caso, cabível a destinação do numerário para o Fundo de Defesa de
Direitos Difusos, criado pela Lei 7.347/85, e aplicável também aos danos
coletivos de consumo, nos termos do art. 100, parágrafo único, do CDC.
Tratando-se de dano social ocorrido no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, a
condenação deverá reverter para o fundo gaúcho de defesa do consumidor. (...)
(TJRS – Recurso Cível 71001281054 –
Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais – Rel. Des. Ricardo Torres
Hermann – j. 12.07.2007).
Em Goiás, a Turma Recursal dos Juizados
Especiais condenou um banco a pagar 15 mil reais de indenização por danos
sociais e 2.500 reais por danos morais em razão de um cliente ter esperado muito
tempo para ser atendido. O valor da indenização por danos morais foi destinado
ao cliente e a reparação por danos sociais revertida em favor de uma
instituição de caridade. A referida decisão, contudo, foi suspensa pelo STJ em
virtude de a condenação por danos sociais ter sido em sede de recurso do banco,
configurando reformatio in pejus (AgRg
na Reclamação Nº 13.200 – GO).
Na V Jornada de Direito Civil do
CJF/STJ foi aprovado um enunciado reconhecendo a existência dos danos sociais:
Enunciado
455: A expressão “dano” no art. 944 abrange não só os danos individuais,
materiais ou imateriais, mas também os danos sociais, difusos, coletivos e
individuais homogêneos a serem reclamados pelos legitimados para propor ações
coletivas.
Obras
consultadas:
AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Por uma
nova categoria de dano na responsabilidade civil: o dano social. In: FILOMENO,
José Geraldo Brito; WAGNER JR., Luiz Guilherme da Costa; GONÇALVES, Renato
Afonso (coord.). O Código Civil e sua
interdisciplinariedade. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.
TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim
Assumpção. Manual de Direito do
Consumidor. 2ª ed., São Paulo: Método, 2013.