Olá amigos do Dizer o Direito,
Hoje o post é direcionado especificamente
aos amigos que são notários e registradores, ou que estudam para estes
concursos.
Vamos falar a respeito de recente
decisão do STJ sobre a tributação de ISS incidente sobre os serviços notariais
e registrais.
Serviços
notariais e registrais estão sujeitos ao pagamento de ISS
A Lei Complementar n.° 116/2003 previu
que os “serviços de registros públicos, cartorários e notariais” deveriam
sofrer a tributação de ISS (item 21 da lista de serviços anexa).
A Associação dos Notários e
Registradores do Brasil – ANOREG ingressou, então, com uma ADI no STF
questionando esta tributação.
A Corte Suprema julgou improcedente a
ação:
(...) As pessoas que exercem atividade
notarial não são imunes à tributação, porquanto a circunstância de
desenvolverem os respectivos serviços com intuito lucrativo invoca a exceção
prevista no art. 150, § 3º da Constituição. O recebimento de remuneração pela
prestação dos serviços confirma, ainda, capacidade contributiva. A imunidade
recíproca é uma garantia ou prerrogativa imediata de entidades políticas
federativas, e não de particulares que executem, com inequívoco intuito
lucrativo, serviços públicos mediante concessão ou delegação, devidamente
remunerados. Não há diferenciação que justifique a tributação dos serviços
públicos concedidos e a não-tributação das atividades delegadas. Ação Direta de
Inconstitucionalidade conhecida, mas julgada improcedente.
(ADI 3089, Relator
p/ Acórdão: Min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, julgado em 13/02/2008)
No referido julgamento não foram
discutidas, pelo menos de forma explícita, a base de cálculo e a alíquota do
ISS que deveriam incidir sobre os referidos serviços.
Como regra geral, a base de cálculo do
ISS sobre a qual incide a alíquota é o preço do serviço (art. 7º, da LC
116/2003). Com fundamento nisso, os Municípios, em geral, têm cobrado o ISS dos
serviços notariais e registrais aplicando a alíquota sobre o valor dos
emolumentos.
Emolumento é o valor pago pelo usuário do
serviço pelos atos praticados na serventia notarial e de registro. Ex: o
tabelionato de notas do Estado X cobra 2 reais a título de emolumentos pelo
serviço notarial de autenticação de documentos.
Desse modo, os municípios têm cobrado a
alíquota do ISS (normalmente 5%), valendo-se como base de cálculo o valor dos
emolumentos. Em nosso exemplo, os 5% de ISS seriam cobrados sobre os 2 reais de
emolumentos.
Os titulares das serventias não
concordam com este parâmetro e defendem que fazem jus ao regime especial de
tributação previsto no § 1º do art. 9º, do Decreto-Lei n.° 406/68.
Regime
especial de tributação do ISS previsto no DL 406/68
A regra geral é que a base de cálculo
do ISS é o preço do serviço (art. 7º, LC 116/2003).
O § 1º do art. 9º do DL n.° 406/68 traz
uma exceção a essa regra e prevê que os contribuintes que prestam serviço sob a
forma de trabalho pessoal (pessoas físicas) têm direito ao regime do chamado
“ISSQN Fixo”, segundo o qual é fixada uma alíquota sem relação com o preço do
serviço. Vejamos o que diz o DL n.° 406/68:
Art. 9º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.§ 1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.
Segundo a tese sustentada pelos
serventuários, os serviços registrais e notariais são considerados “trabalho
pessoal”, uma vez que atendem às seguintes características:
a) Exigem-se conhecimentos intelectuais
pessoais para o exercício de tais atividades, como a formação jurídica e a
habilitação em concurso (art. 14, Lei n.° 8.935/94);
b) A serventia não possui personalidade
jurídica ou judiciária, não sendo empresa;
c) O titular da serventia assume
responsabilidade pessoal pelo serviço prestado.
Vale ressaltar que esse regime de “ISSQN
Fixo” do DL n.° 406/68 foi
previsto para ajudar as pessoas que exercem “trabalho pessoal”, sendo muito
mais vantajoso que a regra geral. Assim, na prática, se fosse acolhido o
entendimento dos notários e registradores, ele iriam pagar, em regra, menos
ISS.
Argumentos
da Fazenda Pública municipal
As Fazendas Públicas municipais refutam
a tese dos notários e registradores, ancorando-se em duas vigas fundamentais:
a)
o § 1º do art. 9º do DL n.° 406/68 não estaria mais em
vigor;
b)
ainda que estivesse vigente, os serventuários não se enquadrariam
nesse regime especial de tributação em razão de não prestarem serviço de
natureza pessoal.
O primeiro argumento do Fisco é, a
nosso sentir, absolutamente insubsistente. A LC 116/03, em seu art. 10, revogou
expressamente apenas os arts. 8º, 10, 11 e 12 do DL n.° 406/68, mantendo, a contrario sensu, a vigência do art.
9º. De igual sorte, não houve revogação tácita, considerando que LC 116/03 não
tratou inteiramente da matéria prevista no § 1º do art. 9º do Decreto-Lei. Essa
é também a opinião da doutrina e da jurisprudência do STJ (REsp 713752/PB) e do
STF (Súmula 663-STF).
Alegação bem mais forte sustentada pela
Municipalidade é a de que os serviços prestados pelas serventias não são
necessariamente pessoais. Para tanto, ressaltam que atividades como o
reconhecimento de firma, a emissão de certidões, a elaboração de escrituras,
entre outras, podem (e, na prática, são) prestadas tanto pelo titular das
serventias como por seus funcionários, indicados como substitutos (art. 20,
caput e § 1º, da Lei n.° 8.935/94). O § 4º do mesmo art. 20, por sua vez,
preconiza que os substitutos poderão praticar todos os atos que sejam próprios
dos notários e registradores, exceto, lavrar testamentos.
Tais dispositivos são utilizados pela Fazenda
Municipal para reafirmar a tese de que os serviços notariais e registrais não são
necessariamente pessoais, eis podem ser desempenhados pelos substitutos
(terceiros).
Os Municípios sustentam ainda que o
art. 14, da Lei n.° 8.935/94 somente exige requisitos pessoais para o ato
administrativo de delegação, dispensando, contudo, qualquer exigência pessoal
para o exercício das atividades, tanto que o art. 20, do Diploma em questão,
autoriza, sem amarras formais, a livre contratação dos substitutos.
O Poder Público municipal contradita o
argumento da ausência de personalidade jurídica das serventias, afirmando que
elas preenchem perfeitamente os elementos do conceito de empresa trazido pelo
art. 966, do Código Civil eis que exercem profissionalmente atividade econômica
organizada para a prestação de serviços. A atividade das serventias seria
profissional porque exercida com habitualidade; organizada porque conjugaria,
de forma metodológica, os fatores de produção; por fim, econômica, uma vez que
objetivaria lucro, conforme, inclusive, ressaltado pelo E. STF quando do
julgamento da ADI 3.089.
Quanto ao argumento de que a
responsabilidade dos serventuários seria pessoal, a Fazenda sustenta que isso
ocorre porque a serventia seria uma pessoa jurídica de direito privado, sob a
forma de empresário individual (sic),
sendo, portanto, apenas uma decorrência da responsabilidade patrimonial pessoal
pelos atos da pessoa jurídica.
Decisão
recente do STJ
Para o STJ, NÃO SE APLICA à prestação de serviços de registros públicos
cartorários e notariais a sistemática de recolhimento de ISS prevista no § 1º
do art. 9º do DL n.°
406/68.
(Primeira
Seção. REsp 1.328.384-RS, Rel. originário Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel.
para acórdão Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 4/2/2013)
O referido preceito legal impõe, como
condição para o enquadramento no regime especial de recolhimento de ISS, a
“prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio
contribuinte”. No entanto, a prestação dos serviços cartoriais não importa em
necessária intervenção pessoal do notário ou do oficial de registro, tendo em vista
que o art. 236 da CF e a legislação que o regulamenta permitem a formação de
uma estrutura economicamente organizada para a prestação do serviço de registro
público, assemelhando-se ao próprio conceito de empresa. Nesse sentido, o art.
236 da CF determina a natureza jurídica da prestação do serviço como privada,
sem determinar, contudo, a unipessoalidade da prestação de serviço cartorário,
e o art. 20 da Lei n. 8.935/1994 autoriza, de forma expressa, o notário ou
oficial de registro a contratar, para o desempenho de suas funções,
escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como
empregados.
Além do mais, a realidade comprova que,
em regra, a atividade cartorária não é prestada de modo direto apenas pelo
tabelião, mas também por atendentes, principalmente nos grandes centros
urbanos.
Desse modo, os serviços notariais e
registrais sofrem a incidência do ISS e a base de cálculo do imposto é o preço do
serviço, ou seja, o valor dos emolumentos.
Bibliografia
BELIZÁRIO, Michele Cristine.
Serviços notariais, cartorários e registros públicos e a forma de tributação do
ISSQN. Disponível em: .
MELO, José Eduardo. PAULSEN,
Leandro. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 5ª. ed., 2ª tir., Porto
Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2010.
SANT’ANNA, Gilson Carlos. Resumo
sobre o ISS. Disponível em: .