terça-feira, 9 de abril de 2013
Entenda a decisão do STF que declarou a inconstitucionalidade parcial da EC 62/2009
terça-feira, 9 de abril de 2013
Olá amigos do Dizer o Direito,
Vamos hoje comentar sobre o julgamento
do STF que declarou inconstitucional alguns dispositivos da Constituição
Federal inseridos pela Emenda Constitucional 62/2009, que trata sobre os
precatórios.
Trata-se de assunto difícil e
denso. Iremos apenas destacar os pontos principais para que vocês entendam o
que foi decidido. Ainda haverá muitas implicações decorrentes deste julgado,
mas ainda é cedo para avaliarmos com segurança.
Regime de precatórios
Se a Fazenda Pública Federal, Estadual,
Distrital ou Municipal for condenada, por sentença judicial transitada em
julgado, a pagar determinada quantia a alguém, este pagamento será feito sob um
regime especial chamado de “precatório” (art. 100 da CF/88).
EC
62/2009
A EC 62/2009 alterou o art. 100 da
CF/88 e o art. 97 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da
CF/88 prevendo inúmeras mudanças no regime dos precatórios.
As modificações impostas pela EC
62/2009 dificultaram o recebimento dos precatórios pelos credores e tornaram
ainda mais vantajosa a situação da Fazenda Pública. Por esta razão, a alteração
ficou conhecida, jocosamente, como “Emenda do Calote”.
ADI
Foram propostas quatro ações diretas de
inconstitucionalidade contra esta previsão:
• ADI 4357/DF – Conselho Federal da OAB
e Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB);
• ADI 4425/DF – Confederação Nacional
das Indústrias – CNI;
• ADI 4400/DF – Associação Nacional dos
Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra);
• ADI 4372/DF – Associação dos
Magistrados Estaduais (Anamages).
Legitimidade para propor ADI
Os legitimados para propor ADI
estão previstos no art. 103 da CF/88:
Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação
declaratória de constitucionalidade:
I - o Presidente da República;
II - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV - a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do
Distrito Federal;
V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
Legitimados universais e não-universais
(especiais)
A jurisprudência do STF construiu
a tese de que alguns desses legitimados poderiam ajuizar ações diretas de
inconstitucionalidade questionando leis ou atos normativos que tratassem sobre
todo e qualquer assunto. Tais legitimados seriam, portanto, legitimados ativos universais.
Por outro lado, o STF afirmou que
os demais legitimados, ao proporem a ADI, deveriam comprovar que possuem legítimo
interesse na ação. São, por isso, chamados de legitimados ativos especiais. Este legítimo
interesse que precisa ser demonstrado é chamado de pertinência
temática.
Legitimados ativos
da ADI e ADC
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UNIVERSAIS
(NEUTROS)
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ESPECIAIS (NÃO
UNIVERSAIS)
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São aqueles que podem propor
ADI e ADC contra leis ou atos normativos que versem sobre qualquer matéria, sem
a necessidade de comprovar interesse específico no julgamento da ação.
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São aqueles que somente podem propor
ADI e ADC contra leis ou atos normativos que tratem sobre matérias que digam
respeito às funções ou objetivos do órgão ou entidade. O autor especial terá
que provar o seu interesse específico no julgamento daquela ação.
Terá que ser provada a pertinência
temática entre a norma impugnada e os objetivos do autor da ação.
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Quem são os legitimados
universais:
• Presidente da República;
• Mesa do Senado e Mesa da
Câmara;
• Procurador-Geral da
República;
• Conselho Federal da OAB
• Partido político com representação no CN.
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Quem são os legitimados
especiais:
• Mesa de Assembleia
Legislativa ou da Câmara Legislativa do DF;
• Governador de Estado/DF;
• Confederação sindical;
• Entidade de classe de âmbito
nacional.
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O STF já decidiu que, quando o
Governador de um Estado impugna lei de outro Estado, ele deverá demonstrar que há
uma repercussão do ato para os interesses do seu Estado. Isso é a pertinência
temática (ADI 2.747, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 16/5/2007).
A entidade de classe de âmbito
nacional (ex: Associação Nacional dos Defensores Públicos), por ser um
legitimado especial, deverá provar que a legislação questionada guarda relação
de pertinência temática com as finalidades institucionais dessa entidade (ADI
2.903, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 1/12/2005).
No caso que estamos analisando, o
STF não conheceu (julgou extintas sem apreciação do mérito) as ações propostas
pela Anamages e pela Anamatra, por considerar que não havia pertinência
temática (relação direta) entre o assunto tratado pela EC 62/2009 e os fins
institucionais dessas entidades de classe.
Quanto à AMB, embora esta
igualmente não detenha legitimação universal, o STF considerou que havia pertinência
temática, pois uma das alegações na petição inicial da ADI da AMB era a de que a
EC 62/09 violava o princípio da separação de Poderes, sendo a defesa do Judiciário
nacional uma das finalidades desta associação. Ademais, entre as finalidades
previstas no Estatuto da AMB está a defesa do Estado democrático e a
preservação dos direitos e garantias individuais e coletivos.
Inconstitucionalidade formal
A CF/88 determina que a proposta de
emenda constitucional seja discutida e votada, em cada Casa do Congresso
Nacional, em dois turnos
de votação, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, 3/5 dos votos
dos respectivos membros (§ 2º do art. 60).
No Senado, a EC 62/2009 foi votada e
aprovada, em dois turnos de votação. No entanto, estes dois turnos aconteceram
no mesmo dia, ao longo de duas sessões legislativas ocorridas com menos de 1h
de intervalo entre ambas. A “estratégia” utilizada pelos parlamentares foi a
seguinte: após votar a PEC em 1º turno, o Presidente da Casa encerrou a sessão
legislativa e, na mesma noite, após alguns minutos, abriu uma nova sessão
legislativa e votou a proposta em 2º turno.
Diante disso, os autores da ADI
alegavam que houve violação à regra do § 2º do art. 60 da CF/88. O STF concordou com a tese?
NÃO. Neste ponto, prevaleceu o voto do
Min. Luiz Fux. O Ministro afirmou que a exigência constitucional de dois turnos
de votação existe para assegurar a reflexão profunda e a maturação das ideias
antes da modificação de documento jurídico com vocação de perenidade (a CF). No
entanto, a partir dessa finalidade abstrata, não é possível se extrair a exigência
de que é imprescindível a existência de interstício mínimo entre os turnos. Em
outras palavras, a CF/88 não exigiu um tempo mínimo entre as duas votações.
O constituinte, quando quis, exigiu expressamente
intervalo mínimo, conforme se pode observar, em dois casos: para criação de lei
orgânica municipal (art. 29, caput, da CF/88) e da Lei Orgânica do DF (art. 32,
caput, CF/88). No caso de aprovação de EC, o Texto Constitucional não fez esta
mesma exigência. Houve, portanto, um silêncio eloquente do texto
constitucional.
Assim, para o Ministro, quando o § 2º
do art. 60 fala em dois turnos, ele está apenas exigindo a realização de duas
etapas de discussão.
No caso da EC 62/2009, esta regra foi
cumprida porque as votações ocorreram em duas sessões distintas.
Vale ressaltar que existe uma norma no
Regimento Interno do Senado determinando o intervalo de 5 dias úteis entre os
turnos de votação, mas o STF entendeu que a sua inobservância está sujeita
apenas ao controle feito pelo próprio Congresso e não do Poder Judiciário.
Caput e § 1º do art. 100 da CF/88
O regime de precatórios é tratado pelo
art. 100 da CF, assim como pelo art. 78 do ADCT.
No caput do art. 100 consta a regra
geral dos precatórios, ou seja, os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em
decorrência de condenação judicial devem ser realizados na ordem cronológica de
apresentação dos precatórios. Existe, então, uma espécie de “fila” para
pagamento dos precatórios:
Art. 100. Os pagamentos devidos pelas
Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de
sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de
apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a
designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos
adicionais abertos para este fim. (Redação dada pela EC 62/09)
Obs: não há qualquer
inconstitucionalidade no caput do art. 100 da CF, que permanece válido e
eficaz.
No § 1º do art. 100 é previsto que os
débitos de natureza alimentícia gozam de preferência no recebimento dos
precatórios. É como se existisse uma espécie de “fila preferencial”:
§ 1º Os débitos de
natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos,
proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e
indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em
virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com
preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no §
2º deste artigo. (Redação dada pela EC 62/09).
Obs: não há qualquer
inconstitucionalidade no § 1º do art. 100 da CF, que permanece válido e eficaz.
§
2º do art. 100 da CF/88
O § 2º do art. 100 prevê que os débitos
de natureza alimentícia que tenham como beneficiários pessoas com 60 anos de
idade ou mais ou portadoras de doenças graves terão uma preferência ainda maior.
É como se fosse uma “fila com superpreferência”.
Recapitulando:
Os débitos da Fazenda Pública devem ser
pagos por meio do sistema de precatórios.
* Quem é pago em 1º lugar: créditos alimentares de idosos e
portadores de doenças graves.
* Quem é pago em 2º lugar: créditos alimentares de pessoas que
não sejam idosas ou portadoras de doenças graves.
* Quem é pago em 3º lugar: créditos não alimentares.
Obs1: a superprioridade para créditos
alimentares de idosos e portadores de doenças graves possui um limite de valor
previsto no § 2º do art. 100. Assim, se o valor a receber pelo idoso ou doente
grave for muito alto, parte dele será paga com superpreferência e o restante será
quitado na ordem cronológica de apresentação do precatório. Esta limitação de
valor foi considerada constitucional pelo STF.
Obs2: dentro de cada uma dessas “filas”,
os débitos devem ser pagos conforme a ordem cronológica em que os precatórios forem
sendo apresentados.
Obs3: os débitos de natureza
alimentícia são aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos,
pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por
morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil.
Obs4: em que momento é analisada esta
idade de 60 anos para que a pessoa passe a ter a superpreferência?
Segundo a redação literal do § 2º do
art. 100, para que o indivíduo tivesse direito à superpreferência, ele deveria
ser idoso (60 anos ou mais) no dia da expedição do precatório pelo juízo. Veja a redação
do § 2º:
§ 2º Os débitos de natureza alimentícia
cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do
precatório, ou sejam portadores de doença grave, definidos na forma da
lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor
equivalente ao triplo do fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste
artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante
será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.
Ocorre que, entre o dia em que o
precatório é expedido e a data em que ele é efetivamente pago, são passados alguns
anos. Desse modo, é comum que a pessoa não seja idosa no instante em que o
precatório é expedido, mas como o processo de pagamento é tão demorado, ela
acaba completando mais de 60 anos de idade durante a espera.
Diante disso, esta expressão “na data de expedição do precatório”
constante no § 2º do art. 100 da CF/88 foi declarada INCONSTITUCIONAL. O STF entendeu
que esta limitação até a data da expedição do precatório viola o princípio da
igualdade e que esta superpreferência deveria ser estendida a todos os credores
que completassem 60 anos de idade enquanto estivessem aguardando o pagamento do
precatório de natureza alimentícia.
Obs5: o restante do § 2º do art. 100 da
CF foi declarado constitucional e permanece válido.
§§ 9º e 10 do art. 100 da CF/88
Segundo o § 10 do art. 100, antes de
expedir o precatório, o Tribunal solicitará à Fazenda Pública devedora que
informe se existem débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa
e constituídos contra o exequente. Em outras palavras, o Tribunal indagará à
Fazenda se o beneficiário original do precatório possui débitos com o Poder
Público.
Ex: determinada sentença transitou em
julgado condenando o Estado do Amazonas a pagar 500 mil reais a João. Antes de
expedir o precatório, o Tribunal deveria indagar à Fazenda Pública amazonense se
João devia algum valor líquido e certo ao Estado do Amazonas. Veja:
§ 10. Antes da expedição dos
precatórios, o Tribunal solicitará à Fazenda Pública devedora, para resposta em
até 30 (trinta) dias, sob pena de perda do direito de abatimento, informação
sobre os débitos que preencham as condições estabelecidas no § 9º, para os fins
nele previstos. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 62/09).
Se existissem débitos, estes seriam abatidos
do valor a ser pago pela Fazenda Pública. Assim, o § 9º previa uma compensação
entre o que era devido pela Fazenda e o que era devido pelo exequente.
Voltando ao nosso exemplo, João tinha a
receber 500 mil reais, mas possuía uma dívida de 100 mil com a Fazenda estadual.
Logo, haveria uma compensação e o precatório seria expedido no valor de 400
mil.
Veja o que diz o § 9º:
§ 9º No momento da expedição dos
precatórios, independentemente de regulamentação, deles deverá ser abatido, a
título de compensação, valor correspondente aos débitos líquidos e certos,
inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela
Fazenda Pública devedora, incluídas parcelas vincendas de parcelamentos,
ressalvados aqueles cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação
administrativa ou judicial. (Incluído
pela Emenda Constitucional nº 62/09).
O STF entendeu que os §§ 9º e 10 do
art. 100 são INCONSTITUCIONAIS.
Para o Supremo, este
regime de compensação obrigatória trazido pelos §§ 9º e 10, ao estabelecer uma
enorme superioridade processual à Fazenda Pública, viola a garantia do devido
processo legal, do contraditório, da ampla defesa, da coisa julgada, da
isonomia e afeta o princípio da separação dos Poderes.
§ 12 do art. 100 da CF/88
Como já vimos, entre o dia em que o
precatório é expedido e a data em que ele é efetivamente pago, são passados
alguns anos. Durante este período, obviamente, se a quantia devida não for
atualizada, haverá uma desvalorização do valor real do crédito em virtude da
inflação. Com o objetivo de evitar essa perda, o § 5º do art. 100 determina que
o valor do precatório deve ser atualizado monetariamente quando for pago.
Como é calculado o valor da correção
monetária e dos juros de mora no caso de atraso no pagamento do precatório?
A EC n.° 62/09 trouxe uma nova forma de cálculo
prevista no § 12 do art. 100:
§ 12. A partir da promulgação desta
Emenda Constitucional, a
atualização (obs: correção
monetária) de valores de requisitórios, após sua expedição, até o efetivo
pagamento, independentemente de sua natureza, será feita pelo índice oficial de remuneração
básica da caderneta de poupança, e, para fins de compensação da mora (obs2: juros de mora), incidirão juros simples no mesmo percentual de juros
incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência
de juros compensatórios. (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 62/09)
Desse modo, o § 12 determinava que a
correção monetária e os juros de mora, no caso de precatórios pagos com atraso,
deveriam adotar os índices e percentuais aplicáveis às cadernetas de poupança.
Regra semelhante está prevista no art.
1ºF da Lei n.°
9.494/97:
Art. 1º-F. Nas condenações impostas à
Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização
monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência
uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração
básica e juros aplicados à caderneta de poupança. (Redação dada pela Lei nº
11.960/09)
O § 12 do art. 100, inserido pela EC
62/09, também foi questionado. O que decidiu a Corte?
O STF declarou a inconstitucionalidade da
expressão “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança”, constante
do § 12 do art. 100 da CF.
Para os Ministros, o índice oficial da
poupança não consegue evitar a perda de poder aquisitivo da moeda.
Este índice é fixado ex ante, ou seja, previamente, a partir
de critérios técnicos não relacionados com a inflação considerada no período.
Todo índice definido ex ante é incapaz
de refletir a real flutuação de preços apurada no período em referência.
Dessa maneira, como este índice (da
poupança) não consegue manter o valor real da condenação, ele afronta à
garantia da coisa julgada, tendo em vista que o valor real do crédito previsto na
condenação judicial não será o valor real que o credor irá receber efetivamente
quando o precatório for pago (este valor terá sido corroído pela inflação).
A finalidade da correção monetária
consiste em deixar a parte na mesma situação econômica que se encontrava antes.
Nesse sentido, o direito à correção monetária é um reflexo imediato da proteção
da propriedade.
Vale ressaltar, ainda, que o Poder
Público tem seus créditos corrigidos pela taxa SELIC, cujo valor supera, em
muito, o rendimento da poupança, o que reforça o argumento de que a previsão do
§ 12 viola a isonomia.
Como vimos acima, o art. 1º-F. da Lei n.° 9.494/97, com redação dada pelo art.
5º da Lei n.°
11.960/2009, também previa que, nas condenações impostas à Fazenda Pública, os
índices a serem aplicados eram os da caderneta de poupança.
Logo, com a declaração de
inconstitucionalidade do § 12 do art. 100 da CF, o STF também declarou
inconstitucional, por arrastamento (ou seja, por consequência lógica), o art.
5º da Lei n.°
11.960/2009, que deu a redação atual ao art. 1º-F. da Lei n.° 9.494/97.
O STF também declarou a
inconstitucionalidade da expressão “independentemente de sua natureza”, presente
no § 12 do art. 100 da CF, com o objetivo de deixar claro que, para os
precatórios de natureza tributária se aplicam os mesmos juros de mora incidentes
sobre o crédito tributário.
Assim, para o STF, aos precatórios de
natureza tributária devem ser aplicados os mesmos juros de mora que incidem
sobre todo e qualquer crédito tributário.
§ 15 do art. 100 da CF/88
O grande problema e a vergonha deste
país no que tange aos precatórios diz respeito aos Estados e Municípios. Existem
Estados e Municípios que não pagam precatórios vencidos há mais de 20 anos. Tais
dívidas se acumulam a cada dia e, se alguns Estados fossem obrigados a pagar tudo
o que devem de precatórios, isso seria muito superior ao orçamento anual.
Na União e suas entidades a situação
não é tão deficitária e os precatórios não apresentam este quadro absurdo de
atraso.
Pensando nisso, a EC n.° 62/09 acrescentou o § 15 ao art. 100, afirmando
que o legislador infraconstitucional poderia criar um regime especial para
pagamento de precatórios de Estados/DF e dos Municípios, estabelecendo uma
vinculação entre a forma e prazo de pagamentos com a receita corrente líquida desses
entes. Veja a redação do dispositivo:
§ 15. Sem prejuízo do disposto neste
artigo, lei complementar a esta Constituição Federal poderá estabelecer regime
especial para pagamento de crédito de precatórios de Estados, Distrito Federal
e Municípios, dispondo sobre vinculações à receita corrente líquida e forma e
prazo de liquidação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009).
O objetivo era que este regime especial
previsse uma forma dos Estados/DF e Municípios irem reduzindo esta dívida de
precatórios sem que o orçamento dos entes ficasse inviabilizado.
A EC n.° 62/09 incluiu ainda o art. 97 ao ADCT
prevendo um regime especial de pagamento dos precatórios enquanto não fosse
editada a lei complementar. Confira:
Art. 97. Até que seja editada a lei
complementar de que trata o § 15 do art. 100 da Constituição Federal, os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios que, na data de publicação desta Emenda Constitucional, estejam
em mora na quitação de precatórios vencidos, relativos às suas
administrações direta e indireta, inclusive os emitidos durante o período de
vigência do regime especial instituído por este artigo, farão esses pagamentos de acordo com as normas a
seguir estabelecidas, sendo inaplicável o disposto no art. 100 desta
Constituição Federal, exceto em seus §§ 2º, 3º, 9º, 10, 11, 12, 13 e 14,
e sem prejuízo dos acordos de juízos conciliatórios já formalizados na data de
promulgação desta Emenda Constitucional. (Incluído pela Emenda Constitucional
nº 62/2009)
O regime especial instituído pelo art.
97 do ADCT prevê uma série de vantagens aos Estados e Municípios, sendo permitido
que tais entes realizem uma espécie de “leilão de precatórios” no qual os
credores de precatórios competem entre si oferecendo deságios (“descontos”) em
relação aos valores que têm para receber. Aqueles que oferecem maiores
descontos irão receber antes do que os demais.
Assim, o regime especial excepcionou a
regra do art. 100 da CF/88 de que os precatórios deveriam ser pagos na ordem
cronológica de apresentação. Logo, se alguém estivesse esperando há 20 anos,
por exemplo, para receber seu precatório, já seria afetado por este novo regime
e, para aumentar suas chances de conseguir “logo” seu crédito, deveria conceder
um bom “desconto” ao ente público.
Leonardo da Cunha afirmou, com razão,
que a EC n.° 62/09
previu uma espécie de “moratória” ou “concordata” para os Estados/DF e
Municípios (DIDIER JR., Fredie; et. al.
Curso de Direito Processual Civil. Salvador:
Juspodivm, 2013, p. 764). Daí a alcunha dada, de forma justa, por sinal, de “emenda
do calote”.
Não vamos dar mais detalhes sobre como
era este regime especial pelo fato de que ele perdeu importância, uma vez que foi
considerado inconstitucional pelo STF.
O Supremo declarou inconstitucionais o
§ 15 do art. 100 da CF/88 e todo o art. 97 do ADCT.
Com a EC n.° 62/09, o Poder Público reconheceu que descumpriu,
durante anos, as ordens judiciais de pagamento em desfavor do erário. Admitiu,
ainda, que existem inúmeras dívidas pendentes, as quais se propõe a pagar, mas de
forma limitada a um pequeno percentual de sua receita.
Por fim, fica claro que, com o
comportamento inadimplente do Poder Público e com o novo regime instituído, o
objetivo foi forçar os titulares de precatórios a participarem dos leilões,
concedendo “descontos” ao erário em relação a valores que são devidos por força
de decisão judicial transitada em julgado.
O STF concluiu que a EC n.° 62/09, ao prever este “calote”, feriu os
valores do Estado de Direito, do devido processo legal, do livre e eficaz
acesso ao Poder Judiciário e da razoável duração do processo. Além disso,
mencionou-se a violação ao princípio da moralidade administrativa, da
impessoalidade e da igualdade.
Afirmou-se que, para a maioria dos
entes federados, não falta dinheiro para o adimplemento dos precatórios, mas
sim compromisso dos governantes quanto ao cumprimento de decisões judiciais.
Nesse contexto, observou-se que o pagamento de precatórios não se contraporia,
de forma inconciliável, à prestação de serviços públicos. Além disso,
arrematou-se que configuraria atentado à razoabilidade e à proporcionalidade
impor aos credores a sobrecarga de novo alongamento temporal dos créditos que
têm para receber.
A decisão do STF foi tomada por maioria
de votos.
Resumindo
Dispositivos
declarados integralmente inconstitucionais:
• § 9º do
art. 100 da CF/88
• § 10 do
art. 100 da CF/88
• § 15 do
art. 100 da CF/88
• Art. 97
(e parágrafos) do ADCT
• Art.
1º-F. da Lei n.° 9.494/97
Dispositivos
declarados parcialmente inconstitucionais:
• § 2º do
art. 100 da CF/88
• § 12 do
art. 100 da CF/88
Quanto ao
§ 2º do art. 100 da CF/88, foi declarada inconstitucional a seguinte expressão:
“na data
de expedição do precatório”
Quanto ao
§ 12 do art. 100, foram declaradas inconstitucionais as seguintes expressões:
• “índice
oficial de remuneração básica da caderneta de poupança”
• “independentemente
de sua natureza”
Os demais
dispositivos permanecem válidos e eficazes.
Modulação
dos efeitos
Durante os debates, surgiu a discussão
se a presente decisão deveria ter seus efeitos modulados. Os Ministros
resolveram, no entanto, que iriam deliberar sobre isso apenas mais para frente,
quando fossem provocados.
Vale ressaltar que alguns Estados, que
figuravam no processo com amicus curiae,
já ingressaram com pedidos para que haja a modulação dos efeitos da decisão.
Vamos aguardar para verificar se o STF irá aceitar este pedido feito pelos amici e como ocorrerá esta modulação.
Dúvidas
A presente decisão é complexa e irá
gerar consequências ainda não totalmente conhecidas. Inúmeras dúvidas têm
surgido, mas ainda é muito cedo para arriscar respostas. Por enquanto, é
importante conhecer apenas o que já foi decidido e que consta acima.
Processos
a que se referem a explicação
STF. Plenário. ADI 4357/DF, ADI
4425/DF, ADI 4372/DF, ADI 4400/DF, rel. Min. Ayres Britto, 6 e 7/3/2013.