Dizer o Direito

sábado, 5 de janeiro de 2013

A ordem estabelecida no cadastro de adoção não é absoluta (ECA)


 
Conceito de adoção
Adoção é...
- um ato jurídico em sentido estrito
- que depende sempre de uma decisão judicial constitutiva
- por meio do qual se cria um vínculo jurídico irrevogável de pai e filho(a) ou de mãe e filho(a)
- cujos efeitos são exatamente os mesmos decorrentes de uma filiação biológica.

Regime jurídico
A adoção de crianças e adolescentes será deferida na forma prevista pelo ECA.
A adoção de pessoas maiores de 18 anos também acaba observando as regras trazidas pelo ECA, considerando que, atualmente, o Código Civil quase nada disciplina sobre o tema.

Cadastro de adotantes (art. 50 do ECA)
O art. 50 do ECA prevê que o indivíduo interessado em adotar deverá procurar a Vara (ou Juizado) da Infância e Juventude e passar por um período de preparação psicossocial e jurídica. Após isso, será ouvido o Ministério Público e, caso o interessado satisfaça os requisitos legais e não haja nenhum impedimento, ele será habilitado e incluído no cadastro de adotantes.
A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um cadastro com as pessoas interessadas na adoção.
Vale ressaltar que a alimentação do cadastro e a convocação criteriosa dos postulantes à adoção serão fiscalizadas pelo Ministério Público (custo legis).

Segundo arguta lição do Min. Sidnei Beneti,

“O referido Cadastro de adotantes visa à observância do interesse do menor, concedendo vantagens ao procedimento legal da adoção e avaliando previamente os pretensos adotantes por uma comissão técnica multidisciplinar, o que minimiza consideravelmente a possibilidade de eventual tráfico de crianças ou mesmo a adoção por intermédio de influências escusas, bem como propicia a igualdade de condições àqueles que pretendem adotar.” (REsp 1.347.228-SC, julgado em 6/11/2012)


Justamente por isso, em regra, toda e qualquer adoção deverá observar rigorosamente a ordem de preferência do cadastro de adotantes. Vale transcrever o art. 197-E do ECA:

Art. 197-E.  Deferida a habilitação, o postulante será inscrito nos cadastros referidos no art. 50 desta Lei, sendo a sua convocação para a adoção feita de acordo com ordem cronológica de habilitação e conforme a disponibilidade de crianças ou adolescentes adotáveis.


Exceções legais ao cadastro de adotantes
O § 13 do art. 50 do ECA traz três hipóteses nas quais poderá ser deferida a adoção mesmo sem que o interessado esteja incluído no cadastro de adotantes:

§ 13.  Somente poderá ser deferida adoção em favor de candidato domiciliado no Brasil não cadastrado previamente nos termos desta Lei quando:
I - se tratar de pedido de adoção unilateral;
II - for formulada por parente com o qual a criança ou adolescente mantenha vínculos de afinidade e afetividade;
III - oriundo o pedido de quem detém a tutela ou guarda legal de criança maior de 3 (três) anos ou adolescente, desde que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação de laços de afinidade e afetividade, e não seja constatada a ocorrência de má-fé ou qualquer das situações previstas nos arts. 237 ou 238 desta Lei.
§ 14.  Nas hipóteses previstas no § 13 deste artigo, o candidato deverá comprovar, no curso do procedimento, que preenche os requisitos necessários à adoção, conforme previsto nesta Lei.


E se o caso concreto envolver uma situação não abarcada pelo § 13 do art. 50 do ECA? O que acontece, por exemplo, se um casal ingressa com o pedido de adoção de uma criança por eles criada desde o nascimento, mas este casal, que não é parente do menor, não se encontra inscrito no cadastro de adotantes? A adoção deverá ser negada por esse motivo? Essa criança deverá ser adotada pelo primeiro casal da “fila” do cadastro?
Mesmo não se enquadrando nas hipóteses do § 13 do art. 50 acima transcrito, o STJ, com extremo acerto e sensibilidade, já decidiu que a observância de tal cadastro, ou seja, a preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar determinada criança, não é absoluta.

Assim, no exemplo dado, a regra legal deve ser excepcionada em prol do princípio do melhor interesse da criança, base de todo o sistema de proteção ao menor. No caso em estudo, restou configurado o vínculo afetivo entre a criança e o casal pretendente à adoção, o que justifica seja excepcionada a exigência da ordem do cadastro.

Confira trecho da ementa do precedente do STJ:

(...) A observância do cadastro de adotantes, vale dizer, a preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar determinada criança não é absoluta. Excepciona-se tal regramento, em observância ao princípio do melhor interesse do menor, basilar e norteador de todo o sistema protecionista do menor, na hipótese de existir vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, ainda que este não se encontre sequer cadastrado no referido registro; (...)
(REsp 1172067/MG, Rel. Min. Massami Uyeda, Terceira Turma, julgado em 18/03/2010)


O STJ, recentemente, reafirmou que o cadastro de adotantes não é absoluto e que pode ser excepcionado em homenagem ao melhor interesse do menor:


(...) A observância do cadastro de adotantes, ou seja, a preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar determinada criança, não é absoluta. A regra comporta exceções determinadas pelo princípio do melhor interesse da criança, base de todo o sistema de proteção. Tal hipótese configura-se, por exemplo, quando já formado forte vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, ainda que no decorrer do processo judicial. Precedente. (...)
A inobservância da preferência estabelecida no cadastro de adoção competente, portanto, não constitui obstáculo ao deferimento da adoção quando isso refletir no melhor interesse da criança. (...)
(REsp 1347228/SC, Rel. Min. Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 06/11/2012, DJe 20/11/2012)


Trata-se de entendimento extremamente importante na prática forense e que, certamente, ainda será bastante explorado em concursos públicos.

Por hoje é só, amigos. Agora é hora de correr 10Km.

Um ótimo sábado a todos.

Dizer o Direito!